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Poesias extraordinárias

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Mensagem por Dante 30/5/2019, 19:08


II
O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de vez em quando olhando para trás...
E o que vejo a cada momento
E aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem...
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do mundo...
Creio no mundo como num malmequer,
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender...
O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...
Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar...
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência não pensar...
V
Há metafísica bastante em não pensar em nada.
O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.
Que idéia tenho eu das cousas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo?
Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da minha janela (mas ela não tem cortinas).
O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério!
O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é o sol
E a pensar muitas cousas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o sol,
E já não pode pensar em nada,
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos
De todos os filósofos e de todos os poetas.
A luz do sol não sabe o que faz
E por isso não erra e é comum e boa.
Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores?
A de serem verdes e copadas e de terem ramos
E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar,
A nós, que não sabemos dar por elas.
Mas que melhor metafísica que a delas,
Que é a de não saber para que vivem
Nem saber que o não sabem?
«Constituição íntima das cousas»...
«Sentido íntimo do Universo»...
Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada.
É incrível que se possa pensar em cousas dessas.
É como pensar em razões e fins
Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores
Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão.
Pensar no sentido íntimo das cousas
É acrescentado, como pensar na saúde
Ou levar um copo à água das fontes.
O único sentido íntimo das cousas
É elas não terem sentido íntimo nenhum.
Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!
(Isto é talvez ridículo aos ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as cousas,
Não compreende quem fala delas
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)
Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.
Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.
E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?),
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora.
IX
Sou um guardador de rebanhos.
O rebanho é os meus pensamentos
E os meus pensamentos são todos sensações.
Penso com os olhos e com os ouvidos
E com as mãos e os pés
E com o nariz e a boca.
Pensar uma flor é vê-la e cheirá-la
E comer um fruto é saber-lhe o sentido.
Por isso quando num dia de calor
Me sinto triste de gozá-lo tanto,
E me deito ao comprido na erva,
E fecho os olhos quentes,
Sinto todo o meu corpo deitado na realidade,
Sei a verdade e sou feliz.

(Alberto Caeiro)
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Mensagem por sombriobyte 12/6/2019, 02:24


Gênios universais ou pseudo-poetas?

Vou começar citanco o Romântico (no bom sentido da palavra) Stendhal:
"... ce travail offre un autre découragement: que de choses hardies, et que je n´avance qu´en tremblant, seront pe plats lieux conuns dix ans aprés ma mort..."
(este trabalho ainda oferece um outro desencorajamento: que todos os penosos reveses com que me encontro e sobre os quais apenas vacilante prevaleço, serão fatos triviais dez anos após minha morte)

A vida de um certo artista não vem a ajudar a compreensão de uma obra (claro se falarmos na gênese é outra história) e acho que ela tem mínimo interesse na fruição estética da Arte. A Beleza se encontra fora do artista, internamente as coisas só possuem sentido para o próprio. O que importa é a relação da obra comigo e não com o criador. Uma obra de Arte não possuiu juízo de valor atrelado à sua pateticidade, isso seria um pensamento por demais romântico (no pior sentido da palavra) para ser universalizado. O arrebatamento emotivo que temos ao ligarmos a vida à obra de um certo romântico está ligado mais ao sentimento de complacência e pena do que ao efeito que temos ao ver algo realmente belo.

Se a biografia dá um outro gosto à arte, dá. Mas escapa do âmbito estético para cair no moral, daí nascem os mitos e as deificações...

A Arte levada ao âmbito moral gera os mitos e as deificações. E a nossa arte foi uma arte de quase anônimos até o Romantismo e o culto ao gênio, e quem mais sofreu com isso fomos nós: um Goethe transformado em figura mitológica deu gênese a inúmeros símiles inaptos perpetuando uma poesia ruim que podemos ver nos Lieder de Schubert e Brahms.

A biografia também é capaz de transformar personalidades artísticas discutíveis em gênios universais. E o maior exemplo se encontra na poesia preferida de 10 entre 10 pseudo-intelectuais: Rimbaud.

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Mensagem por Lilith 12/6/2019, 13:12


Pseudo-intelectuais gostam é de Paulo Coelho...
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Mensagem por Freud explica 12/6/2019, 13:52


Caro Sombriobyte,

Seu conhecimento impressiona. Mas o que impressiona mesmo são suas investidas contra certas "verdades". Acho interessante isso. No entanto, quais são os defeitos que você encontra em Rimbaud? E você acha sinceramente que um drama homossexual pode dar ao poeta um valor que ele não tem? (Poxa, Sombrio, você deve ter razão. O escritor Oscar Wilde também teve problemas com seu homossexualismo, foi preso e humilhado. Talvez, por isso, ele seja considerado um “gênio”)

p.s.: Sobre Schubert não discuto, mas Brahms, quais são as poesias ruins?
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Mensagem por sombriobyte 13/6/2019, 01:45


Freud,
Não acho Rimbaud um poeta ruim, aliás ele é um bom poeta. Mas é um poeta menor que, por exemplo Verlaine, Mallarmé, Baudelaire, só que muito mais fácil de entender. Ele foi valorizado excessivamente pelo seu "drama". Aliás, a comparação com Oscar Wilde foi fantástica, e Oscar Wilde, atualmente é mais válido pelas suas posturas iconoclastas e pela sua vida do que pela sua obra.

Tenho a integral dos Lieder do Brahms e, de fato se acha um Goethe, um Heinrich Heine ou mesmo o sempre curioso Das Knaben Wunderhorn, mas em muito maior quantidade se acha uns tais de Friedrich Daumer ou Karl Simrock produtores de uma poesia tão inócua...

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Mensagem por Necromante 13/6/2019, 12:04


Sombrio,
primeiramente gostaria de me posicionar a seu favor no "ataque" à Rimbaud, de fato nunca vi poesia suficiente nele para coloca-lo ao lado sequer de Byron, Wordsworth e mesmo Coleridge. Entretanto, a arte anterior ao romantismo não foi uma arte de anônimos. Rubens, Rabelais, Velazquez, Erasmo de Rotterdam (sim, ele também fez arte), entre outros confirmam minhas palavras. Sim, a sociedade burguesa levou o culto de personalidades às últimas consequências, mas não criou assim nada de novo. (talvez tenha "criado", sim, o fenômeno do virtuose.) Procissões de admiradores das Belas-Artes em busca de contato com as obras e os ateliês dos artistas já não eram incomuns nem mesmo na baixa idade média e na reforma (Van Eyck, Brueghel e Michelangelo que o digam). Há de se notar que o caráter individualista foi também atenuado pelas formas de propagação e imprensa obsoletas além de mil anos de sociedade teocêntrica, mas o culto de personalidades não foi invenção de Thayer, Paganini, David ou Ingres.

P.S: voltando à poesia, gostaria de impor meu apoio incondicional à causa de Pushkin e Liermontoff, tão cruelmente atacados pelos "Russófobos" como tenho visto em inúmeros lugares...
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Mensagem por sombriobyte 14/6/2019, 02:17


Necromante,
O culto aos artistas pré-românticos se dava de uma outra maneira, Arte e artista eram distintos, o culto era à obra. O interesse na biografia e na criação de uma alma mítica integrada à sua obra, que no século XX veio a repercutir no interesse pela gênese e na exegese das obras de acordo com a biografia, nasceu com o Romantismo e seus bezerros de ouro. Quando eu falei em anônimos eu não quis dizer que eles não eram reconhecidos mas sim que suas individualidades não eram cultuadas.

Eu também gostaria de iniciar outros ataques a diversas vacas sagradas, mas aqui não é lugar para isso, posso ferir diversos egos... Mas eu gostei de você ter lembrado de Byron (o único que conheço dos que citaste), que é um poeta que gosto bastante, embora conheça pouco. Diria que Rimbaud é do nível de Lamartine...

Sds

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Mensagem por sombriobyte 14/6/2019, 02:19


PS: De Púchkin só conheço as peças que viraram óperas (não apenas as óperas, mas as peças mesmo, que comprei-as): Evgeni Onegin e Boris Godunov, ótimas, e alguns contos, que não gostei. Não conheço Liermontov, sou mais próximo da arte russa do final do século XIX / início do XX: Tolstói, Dostoiévski, Maiakovski, Tchekov...

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Mensagem por Freud explica 14/6/2019, 13:33


Esta conversa não me atrai muito, mas quero aqui deixar claro que Rimbaud é primeira linha, e não é pelo fato de ele ter tido um afaire com Verlaine que o tornou mais conhecido, e sim por sua vida aparentemente ilógica, com sua morte antes dos 40 anos depois de uma vida estranha na África. E tudo o que conhecemos dele escreveu com menos de 20 anos. Acho ele muito superior a Verlaine. Mas é diferente. Oscar Wilde é um escritor de primeira linha. Sua conduta não fez dele um personagem tão popular como suas obras o fizeram...
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Mensagem por Bibi 1/7/2019, 01:01


ANTIMATÉRIA
Contra o veneno um antídoto vindo do próprio veneno
Contra a doença um anticorpo que sempre vença
Contra a inflamação um antibiótico com sua ação
Contra a concepção artificial um anticoncepcional é vital
Contra a escuridão o clarão de um anticrepúsculo não é minúsculo
Contra a Salvação das profecias surgem até antimessias
Contra o erro da maioria uma antidemocracia já é tardia
Contra a vertigem um antidínico e à virgem um cínico
Contra cada novo invento uma antigalha se auto retalha
Contra a falta de anticorpo o antígeno ausente no indígeno
Contra a alergia um anti-histamínico devolve a alegria
Contra toda a baixaria uma antipatia haveria
Contra escolas que não evoluem dia-a-dia uma antipedagogia
Contra a peste criada por teste um antipestoso nos reste
Contrário ao japonês um brasileiro antípoda operário se fez
Contra todo novo errado um antiquado deve ser observado
Contra a raiva o antirrábico e à saraiva um abrigo arábico
Contra os germes um antisséptico e anti-cético mundo ético
Para a aniquilação de toda a matéria uma antimatéria
Antipolítica, antidemocrática, anticapitalista e ante uma lista

LERIAS, Washington Roberto, O Romance da Física - 2003, p75
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Mensagem por Bibi 1/7/2019, 01:02


PRODUÇÃO E ANIQUILAÇÃO DE PARES

No processo de produção de pares
Fótons perdem energia com a matéria
Este processo depende dos azares
A colisão com o núcleo é mais séria

Ao se colidir com o núcleo maciço
Surge matéria da pura energia
Partículas elementares nascem disso
Matéria e antimatéria é a Magia

Elétron e pósitron (usual nomenclatura)
Mesma massa mas com diferença segura
O pósitron tem carga positiva
E a carga do elétron é negativa

Este pósitron perde energia em colisões
Até com um elétron se combinar
Este "átomo" de positrônio em ilusões
Gira na "Dança da Morte" até se aniquilar

em 0,00000000000001 s

LERIAS, W.R., O Romance da Física (em poesias) p.188
Bibi
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Mensagem por sombriobyte 9/7/2019, 02:21


Vai aí um poema para mostrar aos adoradores de Rimbaud e Drummond como eles são poetas menores.

É a famosa "balada dos enforcados" de François Villon, o maior poeta francês junto com Baudelaire, mas como eu odeio Baudelaire (e quase toda a literatura francesa pós-Balzac), ele é para mim o maior dos franceses, sozinho.

Villon não é muito conhecido no Brasil, pois não caiu nas graças dos idiotas intelectualóides daqui. E é uma pena, o intelectual médio brasileiro é de um nível muito baixo e Villon é fantástico.

Postada minha mensagem, vai a balada, em grafia medieval, deve ser lido em pronúncia medieval para soar bem (basicamente: lendo os "s" mas não os "z", "r" dental, ditongo "oi" lido como "ué", sem distinção entre "e" e "é" e "y" como como "ü")

XIV Ballade

Frères humains qui après nous vivez,
N'ayez les cuers contre nous endurcis,
Car, se pitié de nous povres avez,
Dieu en aura plus tost de vous mercis.
Vous nous voiez cy attachez cinq, six:
Quant de la char, que trop avons nourrie,
Elle est pieça devoree et pourrie,
Et nous, les os, devenons cendre et pouldre.
De nostre mal personne ne s'en rie;
Mais priez Dieu que tous nous veuille absouldre!

Se vous clamons, freres, pas n'en devez
Avoir desdaing, quoy que fusmes occis
Par justice. Toutefois, cous sçavez
Que tous hommes n'ont pas bon sens rassis;
Excusez nous, puis que sommes transis,
Envers le fils de la Vierge Marie,
Que sa grâce ne soit pour nous tarie,
Nous preservant de l'infernale fouldre.
Nous sommes mors, ame ne nous harie;
Mais priez Dieu que tous nous veuille absouldre!

La pluye nous a buez et lavez,
Et le soleil dessechiez et noircis;
Pies, corbeaulx nous ont les yeux cavez,
Et arrachié la barbe et les sourcis.
Jamis nul temps nous ne sommes assis;
Puis ça, puis la, comme le vent varie,
A son plaisir sans cesser nous charie,
Plus becquetez d'oyseaulx que dez a couldre.
Ne soiez donc de nostre confrarie;
Mais priez Dieu que tous nous veuille absouldre

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Mensagem por Dante 9/7/2019, 16:46


Augusto do Anjos é um dos maiores poetas brasileiros, ele com seu único livro EU.

Meu amor, em sonhos erra,
Muito longe, altiva e ufana
Do barulho do oceano
E do gemido da terra!

O Sol está moribundo.
Um grande recolhimento
Preside neste momento
Todas as forças do Mundo.

De lá, dos grande espaços,
Onde há sonhos inefáveis
Vejo vermes miseráveis
Que hão de comer os meus braços.

Ah! Se me ouvisses falando!
(E eu sei que às dores resistes)
Dir-te-ia coisas tão tristes
Que acabarias chorando.

(Augusto dos Anjos)
Dante
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Mensagem por Dante 9/7/2019, 16:49


De Augusto dos Anjos meu poema favorito é "O Morcego".

O Morcego

Meia-noite. Ao meu quarto me recolho.
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede:
Na bruta ardência orgânica da sede,
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.

"Vou mandar levantar outra parede..."
- Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre a minha rede!

Pego de um pau. Esforços faço. Chego
A tocá-lo. Minh’alma se concentra.
Que ventre produziu tão feio parto?!

A Consciência Humana é este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto!
Dante
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Mensagem por sombriobyte 10/7/2019, 02:51


Bonita poesia, essa do Morcego. Uma coisa quase Naturalista.

sombriobyte

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Mensagem por Johann Wolfgang 20/1/2021, 05:37

Existe poesia barroca?

Acho que o Barroco foi um movimento artístico mais voltado para a música, escultura e principalmente pintura. Não lembro de ter havido poesias no Barroco.
Johann Wolfgang
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Mensagem por Monalisa 20/1/2021, 07:03

Claro!

Gregório de Matos fez poesias bem legais.


E os sermões de padre Vieira?! Muito lindos também.
Monalisa
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Mensagem por Monalisa 20/1/2021, 07:05

Gregório de Matos

Ó tu do meu amor fiel traslado
Mariposa entre as chamas consumida,
Pois se à força do ardor perdes a vida,
A violência do fogo me há prostrado.

Tu de amante o teu fim hás encontrado,
Essa flama girando apetecida;
Eu girando uma penha endurecida,
No fogo que exalou, morro abrasado.

Ambos de firmes anelando chamas,
Tu a vida deixas, eu a morte imploro
Nas constâncias iguais, iguais nas chamas.

Mas ai! que a diferença entre nós choro,
Pois acabando tu ao fogo, que amas,
Eu morro, sem chegar à luz, que adoro.
Monalisa
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Mensagem por William de Baskerville 20/1/2021, 14:09

Bem, como amante da poesia barroca, me sinto na obrigação de te fazer um resumo do que foi o período literário Barroco, iniciado com a morte de Luís de Camões, em 1580, e se estendeu até 1756, quando a fundação da Arcádia Lusitana evidenciou novas propostas estéticas na literatura brasileira. No Brasil, os limites do Barroco LITERÁRIO são a publicação do poema "prosopopéia" de Bento Teixeira, em 1601, e das "Obras poéticas", de Cláudio Manuel da Costa, em 1768.
A literatura barroca produziu manifestações em vários gêneros e formas: POESIA lírica e épica, PROSA de ficção, Prosa moralizante, SERMÕES, CARTAS e TEATRO, usados quer como entretenimento, quer como forma de ação e debate social.
A literatura barroca evidencia profunda elaboração formal. Suas principais características são: Paralelismo; Correlações; Simetrias; Inversões e exploração de sonoridades e imagens.
Basicamente tenta-se conciliar opostos procurando fundir realidades antagônicas, particularmente os valores teocêntricos contra-reformistas e as concepções antropocêntricas renascentistas.
Nessa conciliação os poetas barrocos praticavam também a SÁTIRA direcionada aos costumes sociais, figuras da nobreza, do clero e do povo, não deixando escapar nem suas próprias obras.
Na elaboração textual há duas tendências principais:
O conceptismo, que prevê o manuseio de ideias e conceitos num jogo intelectual que por meio do raciocínio, desenvolve agudezas, sutilezas capazes de provocar o prazer da inteligência.
E o Cultismo (também chamado de cuteranismo ou gongorismo) que confere grande importância à experiência sensorial, utilizando jogos de palavras (exploração de múltiplos significados), jogos de imagens (metáforas, hipérboles e comparações), e jogos de construção (correlações, inversões, simetrias e "disseminação e recolha"), a fim de surpreender-nos com sensações e emoções.
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Mensagem por William de Baskerville 20/1/2021, 14:16

...e no Brasil...

Por que falam tanto de Gregório de Matos e Pe. Antonio Vieira?
Gregório de Matos foi considerado por estudiosos como James Amado, não só um autor, mas toda uma época literária brasileira. Esse baiano nasceu em 1633 e exerceu magistraturas de direito em Portugal até 1681, quando voltou ao Brasil, provavelmente fugindo de inimizades causadas por suas obras satíricas, que deram a ele o apelido carinhoso de "boca do inferno" ou "boca de brasa". Na Bahia voltou a sofrer perseguições pelas mesmas causas, sendo finalmente desterrado para Angola, voltando apenas em 1695. Fixou-se então no Recife, onde morreu no ano seguinte. Sua produção ampla e multifacetada inclui a temática AMOROSA, REFLEXIVA, RELIGIOSA E SATÍRICA.

Pe. Antônio Vieira representa a prosa barroca. Sua produção inclui toda a elaboração formal que a literatura barroca dispõe. Português, mas viveu grande parte de sua vida no Brasil. Sua extensa obra reflete sua intensa participação nos debates sociais e políticos de Portugal e do Brasil no século XVII. Desta forma seus sermões e cartas abrangem, além de temas mais especificamente religiosos, questões polêmicas da época, como a luta da independência portuguesa, confronto dos holandeses no nordeste, a escravidão índia e nagra, a defesa dos judeus e cristãos novos contra a intolerância da Inquisição. Também escreveu obras de caráter profético, dentre essas obras merece destaque a "História do Futuro".

Bem, espero que tenha ajudado...
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Mensagem por Johann Wolfgang 20/1/2021, 15:26

Quanta informação, William! Muitíssimo obrigado pelos esclarecimentos. Só resta a dúvida: Gregório mesmo denunciando os abusos que a Igreja cometia na Colônia, inclusive narrando os estupros cometidos pelos padres contra as negras, é assim considerado um poeta barroco. É realmente de se estranhar. But...
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Mensagem por William de Baskerville 20/1/2021, 17:37

Bem... a poesia barroca, como você pode ver, não fala só da religião, e eles exercem bastante a sátira, so...
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Mensagem por Gárgula 20/1/2021, 18:23

Lógico que existe!

Leia "Barroco: do Quadrado à Elipse" de Affonso Romano de Sant'anna. Uma leitura deliciante e esclarecedora sobre as diversas manifestações barrocas, independente de época histórica.
Gárgula
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Mensagem por Johann Wolfgang 20/1/2021, 18:41

Obrigado pela dica, Gárgula. Está anotada a obra.
Johann Wolfgang
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Mensagem por Gárgula 20/1/2021, 18:53

Depois fala se gostou.

O único senão do livro são suas ilustrações de baixa resolução. Tomara que tenham corrigido este defeito numa edição mais nova.
Gárgula
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