Boudica

Ola pessoal, quem tem alguma matéria sobre a RAINHA DA ERA DO BRONZE- BOUDICA, posta aqui. Vi o filme, mas acho que deve-se ter muito mais a falar sobre essa grande mulher.

Pra começar, este titulo é horrível. Os celtas já estavam carecas de dominar a metalurgia do ferro, no que eram inclusive melhores que romanos. A Britânia havia sido conquistada pelas tropas de Claudius em 40 e poucos depois de Cristo, apesar da resistência local, só escapando a região norte que Roma não tomou só porque fez uma análise risco-custo-beneficio correta. As melhores terras bretãs já estavam com Roma e as tribos que voluntariamente se romanizavam já estavam com ela. A principal ameaça ao domínio romano, pelo menos pela ótica dos próprios romanos eram os druidas, pois da experiência que tiveram com os gauleses, viram que eles eram a coluna vertebral da cultura celta e que a dificuldade de romanizar só poderia partir deles. Somente quando um druida falava todos escutavam. Paulinus Suetonius acabou com a maioria dos druidas bretões de um só golpe durante uma festa religiosa na Ilha da Lua.
Já era governo de Nero. A Britânia romana parecia sob controle. Boudica era rainha dos icenios, uma das tribos bretãs. O legado romano local atraiçoou seu marido, Prasugatus, estuprou-a e a suas filhas, mal justificando-se que estavam mancomunados com os trinovantes, os bretões que mais trabalho deram à conquista romana de Britânia. Londinium e Eboracum arderam com a revolta, muitas tribos bretãs se juntaram a ela, enquanto ela venceu. Mas quando Suetonius reorganizou as forças romanas restantes, os revoltosos começaram a ser derrotados. Tribos inteiras trocaram de lado deixando Boudica sozinha. ACHO que Boudica se suicida no ultimo combate. As notícias circulavam lentamente e distorcidamente e apesar de Boudica nem mesmo ter ameaçado o controle romano sobre a Gália, em Roma, as mães tentavam convencer seus filhos a comer repolho ameaçando-as com um bicho-papão chamada Budicéia.

Interessante notar as habilidades de comandante militar que uma mulher da elite celta poderia ter. Não há como não lembrar da irlandesa Madb, rainha de Conact liderando a guerra contra o rei de Ulster e seu perigoso campeão Cuchulain, com tática e estratégia inteligente. Mas não creio que isto possa ser contado como característica histórica da cultura celta.

Artemisia da Caria, do mundo grego, mas colaboracionista do império persa, também tinha esta habilidade, mas naquela cultura não foi ouvida por ser mulher.

Zenobia de Palmira (árabe? aramaica?) também faz o estilo Boudica e como ela era mais rica e o império romano estava mais fraco, teve bem mais sucesso que Boudica, apesar de viver numa cultura machista.

Quando se sai da alta hierarquia militar, vemos alguns exemplos de guerreiras na linha da batalha fazendo bonito em outras culturas também: Germanos (celtizados???) da invasão enfrentada pelo gênio militar romano Marius, lutavam com suas esposas. Elas realmente deram trabalho. Mas parece que a coisa não era tão institucionalizada, e os caras armaram as mulheres porque estavam em condições extremas.

A acrescentar diria ainda sobre Boudica :

- Boudica era conhecida pelo apelido sugestivo de "Rainha Vermelha" (como alusão aos seus longos cabelos ruivos)

- A tribo dos Iceno é classificada como celtas insulares do período lateliano.

- Era muito provavelmente devota de Brigith, apesar que alusão dela ser seguida sempre por corvos fosse alusão que talvez Morrigan fosse sua deusa (ou quem sabe em certa época mais sombria da sua vida)

- Os romanos não reconheciam direito de herança a mulher e nem as admitiam em cargos de governança, os celtas já eram abertos a estas possibilidades

- A Rainha Boudica teria sido chicoteada e suas filhas (Rigana e Argantilla) estupradas quando contestou diante de coletores de impostos de Roma o direito de herança imperial e a realização do confisco dos bens e recursos para saldar dívidas fiscais de seu falecido marido.

- Diante da contestação de Boudica é que os romanos partiram para barbarizar e saquear o reino Iceno. A praxe era pagar para depois contestar ou era visto o ato como rebelião.

- A devastação da ilha de Mona (Anglesey), "reduto druida", ocorreu na mesma época.

- Boudica teria cometido suicídio ao final para fugir de um destino pior pelas mãos romanas, a saber mais chicotadas, estupro e por fim crucificação.

Galahad:

Só não concordo que os atos de violência romana contra Boudica e suas filhas tenham sido por conta de uma suposta vingança por achar os Icenos aliados dos Trinovantes.

Mesmo ouso dizer que o voluntarismo e passionalidade de Boudica que podem ter levado a esta situação extremada que na raiz era administrável ao meu ver, isto é, ela e suas filhas teriam garantido o sustento até o fim da vida, o reino ficaria sob controle mais direto de Roma e conseguiriam os recursos necessários de subjugarem os Trinovantes bem como também fazer do reino deles parte dos Icenos.

Os romanos eram cruéis, mas não insanos e principalmente nem um pouco tolos em questões políticas.

Sobre os Trinovantes

A fundação de colônias de veteranos romanos (cerca de 03 mil em cada) em território Trinovante foi o grande foco de formação de hostilidade entre este povo e o Império Romano na época de Boudica, já que relatos davam contam que os velhos militares eram bem digamos "abusados" e as desapropriações de terras para dar moradia, construção de fortes e etc minavam os já minguados recursos materiais existentes.

Igualmente no resto da Britânia não era incomum ouvir falar de abusos cometidos por legionários estacionados numa e outra guarnição que ao lado destas colônias de veteranos eram fontes de descontentamento constante entre os locais.

O fato é que Roma criava estas colônias de veteranos tanto como meio de se livrar destes ex-combatentes quanto criar uma forma mais barata de controle sobre seus domínios na medida que guarnição regulares saíam caras para manutenção. (tanto era assim que um belo dia simplesmente o Império Romano "desiste" da Britânia e entrega ela a própria sorte)

No caso dos Trinovantes a oscilação no poder e a luta pelo controle do destino da tribo era comum e dava os romanos a opção "cara" de possuir guarnições armadas até os dentes para fazer presença lá ou largar tudo nas mãos dos veteranos que como mercenários davam frente a este dever.

O fato é que com todo seus problemas os Trinovantes eram a tribo mais poderosa e mesmo tinha a maior cidade bretã da época (Camulodunum) que servia como capital da Britânia. Sendo esta mesma cidade destruída completamente por um incêndio justamente na Revolta de Boudica.

Qual a realidade?

Insisto no fato que para além desta visão um tanto romântica de ver Boudica como "heroína" de uma resistência "honrada" aos "malvados" romanos há o fato que no fundo olhava com cobiça para os territórios vizinhos (principalmente Camulodunum) e lutava por si mesma e sua estirpe na sucessão de seu falecido marido.

Por outro lado como negar o quanto pelo menos foi imprevidente Prasutagus?(o marido falecido de Boudica). Quer dizer, sabendo que não tinha herdeiros homens, atolado em débitos e ainda fazendo um desastrado testamento que era fácil deduzir seria contestado?

Ou vale a versão que o heroico rei morre daí a valorosa rainha agora viúva com suas filhas despojadas de seus bens, dignidade e nobreza pelos vilões romanos parte para o resgate de sua honra e liberdade de seu oprimido povo?

O que faz pensar mesmo é o fato recorrente de aliança entre tribos virarem pó, deixando sempre a frente sozinho aquele que seria a liderança forjadora da união tribal na luta contra um inimigo comum. (ou mesmo quem foi tolo de insistir no combate sozinho) Veja o que ocorreu no caso de Vercingétorix dos arverianos não foi semelhante, por exemplo, ao que sucedeu a Boudica dos Icenos!

Uma curiosidade :

"Camulodunum" dos Trinobantes é tida como a origem da lendária Camelot do Rei Arthur e o nome da tribo uma menção a Tróia na alusão que seria remanescentes dos troianos. (tudo é claro pura especulação)

De toda maneira é interessante ver que na lenda Arthur que ao fundo vemos que ele num reino conturbado cujo o rei está morto e o sucessor legitimo não surge. - fato corriqueiro na vida dos trinobantes.

A respeito do marido de Boudica, o rei Prautagus:

- Prasutagus estava em dívida no pagamento de tributos com Roma principalmente por conta dos gastos de guerra com os Trinovantes (então inimigos dos romanos)

- Prasutagus muito provavelmente teria um acordo de lutar contra os Trinovantes em troca de unificar os domínios em seu controle sob a benção do Imperador e criar um reino mais estável pró-Roma.

- Estando Prasutagus em dívida com Roma nada poderia ser testado a ninguém mesmo cumpridas todas formalidades.

- Se Prasutagus tivesse deixado prole masculina como herdeiro a sucessão teria ocorrida sem problemas

- Prasutagus para fazer testamento legitimo teria de cumprir além da formalidade de buscar o consentimento do imperador também destinar recursos (só parte do total para fins de sustento) a parente homem que serviria de "protetor" de suas filhas e viúva.

- Com a morte de Prasutagus é provável que lideranças trinovantes tenham estimulado Boudica em suas pretensões na ideia de formar posteriormente uma "aliança dinástica" por assim dizer entre os reinos que faria oposição a Roma.

A Genealogia

Para dar uma conferida numa breve exposição da árvore genealógica da Rainha Boudica que seria a Quinta Geração de "Imanuentius" (Imanuêncio) que era rei dos Trinovantes lá por volta de 55 a.C e desafiou nada mais que o próprio Júlio César.

Nesta pesquisa das origens de Boudica que dá para perceber os laços "beligerantes" latentes entre os Icenos e os Trinovantes, isto é, parte da família acabou saindo dos territórios originários para ir mais ao longe e lá ter seus próprio domínios enquanto os remanescentes se digladiavam.

Principalmente dá para notar o quanto o território Iceno devia sua existência a Roma e mesmo o casamento da "Rainha Vermelha" com Prasutagus em grande parte foi acertado pelos romanos.

Grande Legolas! Como sempre é um prazer ler tuas postagens, aprendo sempre contigo!

Só não concordo que os atos de violência romana contra Boudica e suas filhas tenham sido por conta de uma suposta vingança por achar os Icenos aliados dos Trinovantes.

Mesmo ouso dizer que o voluntarismo e passionalidade de Boudica que podem ter levado a esta situação extremada que na raiz era administrável ao meu ver, isto é, ela e suas filhas teriam garantido o sustento até o fim da vida, o reino ficaria sob controle mais direto de Roma e conseguiriam os recursos necessários de subjugarem os Trinovantes bem como também fazer do reino deles parte dos Icenos.

Por isso disse, "MAL disfarçada". A atitude me parece começar com a falta de tato do representante local, como você relembra, muitos eram veteranos aposentados, com visão mais tacanha, paroquial. Como a Britânia tinha mais caráter de fronteira do fim do mundo e não era tão vital ao imperador ter um controle mais direto como no Egito. É bem mais provável que a falta de tato tenha começado com ele e não com Boudica, que também não era tão passional assim e deveria ter visto pra onde o vento soprava. De todo modo a revolta dela começa quando o massacre dos druidas já tinha acabado, não?

Sim, seria depois do massacre daquela que seria o equivalente a "Grande Jerusalém" do druidismo na ilha de Mona. Ao meu ver o marco do fim do druidismo como religião definitivamente.

Particularmente considero que o declínio da influência dos druidas marcou também o fim do modo "diárquico" como era exercido o poder político entre os celtas da época, isto é, se no poder tinha a dobradinha rei & druida de um momento para o outro reis ficaram livres para exercer o poder de maneira monocrática. (claro isto não ocorre de imediato)

Imagine o impacto disto politicamente? Quer dizer, você como rei finalmente está livre para agir sem ter que consultar ninguém dos seus atos e tampouco ouvir ninguém contestando o que faz!

Agora não resta dúvida que a Britânia naquela época era um local mais para desterro de elementos marginais do Império Romano (exemplo veteranos) e mesmo "castigo informal" de quem aprontava alguma (não era um posto desejado pela maioria) - Mal comparando, a URSS tinha sua Sibéria e o Império Romano a Britânia.

Militar, burocrata ou qualquer que fosse as funções que o sujeito ocupasse no Império Romano o fato era que ir para Britânia não representaria o ponto "alto da carreira", muito pelo contrário, era sinal que tinha feito algo de muito errado e não tinha "padrinho" para escapar daquele destino. - Ir para Britânia? Fim de carreira, meu amigo...

Por conta disto não resta dúvida por conta disto que os representantes do Império Romano na Britânia não estavam entre os mais capazes e nem eram os mais felizes dos romanos, mas muito provavelmente era quase certo achar lá os mais ambiciosos e "furiosos" romanos que buscavam meios de remediar o destino sofrível de estar ali.

Há mesmo uma pista, dada por Tácito, que o pivô desta crise com Boudica e o Império Romano foi o procurador Catus Decianus que agiu com extrema "rapacidade" após a morte do marido da Rainha Vermelha.

Se assim for creio que o procurador Catus Decianus agiu mais em mote próprio do que em nome do Império Romano, movido por ambições pessoais e desejo de fortuna fácil.

Há mesmo uma pista, dada por Tácito, que o pivô desta crise com Boudica e o Império Romano foi o procurador Catus Decianus que agiu com extrema "rapacidade" após a morte do marido da Rainha Vermelha.

Se assim for creio que o procurador Catus Decianus agiu mais em mote próprio do que em nome do Império Romano, movido por ambições pessoais e desejo de fortuna fácil.

Perfeito, era isto que eu conhecia, só não lembrava do nome do romano. E também concordo contigo que Boudica não era santa, e talvez não fosse tão vítima assim.

Com relação a conquista romana no governo de Claudius I, o herói anti-romano local bretão foi Caradawc/Caractacus/Caradossus. Nos mitos arturianos este nome torna a aparecer.

Os bretões caíram na esparrela de uma batalha campal ao invés de continuar com guerrilha. Os bretões usaram bigas (e os romanos já estavam carecas de lidar com bigas celtas desde a tomada da Gália Cisalpina, hoje Itália do norte), já os romanos de Claudius usaram até elefantes! Apesar de elefantes na época também serem considerados "fáceis de lidar", para os bretões, aqueles javalis narigudos gigantes vinham diretamente do Anwn!

Antes que alguém pergunte sobre material em português ou até em espanhol disponível na internet não se acha, pelo menos até o momento fiz de tudo para achar e nada.

Agora fica a sugestão: É essencial a leitura dos clássicos! Nada com a interpretação de quem viveu na época para ter uma noção aproximada do que seriam mesmo os fatos.

Foi publicado no Brasil um romance histórico de 3 volumes sobre a Boudica, estive folheando. O autor fez pesquisa detalhada, mas há um forte viés espiritualista. Vou le-lo todo e depois vou comentar aqui.

Renascimento do druidismo na Britania pós-romana

Com o massacre em Mona, ilha da Lua. Esmagamento de Boudica. Esmagamento de druidismo na Gália. Surgimento de cristianismo, mitraísmo, isismo, seguidores de Júpiter Doliqueno no império romano incluindo Britânia. invasão de saxões ainda bem odinistas.
Como o druidismo ressurgiu na Britânia apos saídas das legiões?
Vieram da irlanda? Mas não foi exatamente outro o movimento de exportar religião nesta época (cristianismo da Britânia para Irlanda)?

Creio que você mesmo deu conta da resposta: Simplesmente não seria possível o ressurgimento do druidismo e aquilo que veio ali aparecer apenas recebia a auto-nomeação de druidismo sem o ser na verdade. Imagino que muitos tenham feito isso de boa-fé numa tentativa sincera de resgate de uma religião que foi reduzida a escombros e outros tantos apenas focaram o status que um druida possuía para conseguir uma certa influencia e liderança no meio social.

Pense só na seguinte situação: Um sujeito num meio social conturbado como aquele na Britânia pós-romana muy espertamente chega a uma aldeia todo devidamente paramentado declarando ao povo inculto que ali mora de que é um "druida" e possui os "conhecimentos ancestrais" que escaparam a salvo da sanha destruidora dos romanos e ainda por cima possui "poderes mágicos". Dali forma discípulos, ganha influência, assume liderança... - não seria a primeira e nem a última religião que ocorre isso.

Humm. Obrigado.
Você como sempre é esclarecedor. Pena que o Merlin do Bernard Cornwell, então parece mais que nunca uma impossibilidade histórica, aliás como ele mesmo disse no posfacio.

Seja lá o que for que tenha sobrevivido, se é que sobreviveu, não diz respeito a digamos "verdadeira" tradição druídica. (se muito uma releitura bem peculiar em forma deturpada e cheia de lacunas preenchidas com sincretismo e superstição)

''Colocou-se então uma guarnição nas casas dos vencidos e foram destruídas suas madeiras consagradas a cruéis superstições.'' - Publius Cornelius Tacitus (55 /120 d.C) em seu livro "Anais" contando de maneira breve o que na prática levou a destruição da cidadela druida na ilha de Mona (atual Anglesey)

Como as descrições a respeito dos costumes na época de Boudica foram feitas pelos romanos, seus inimigos declarados e os culpados pelas revoltas dessa rainha, não acredito em uma vírgula do que foi escrito. Os romanos gostavam de fazer campanha de difamação... Vide o que fizeram contra os cartagineses...O que sei é que Boudica se revoltou depois de terem feito ela assistir suas duas filhas serem estrupadas por um contingente inteiro de soldados romanos...