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O Inferno Grego

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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:37

Havia apenas um vazio total. Nele, o Grande Espírito existia sem consciência de sua própria existência. Não havia o Tempo, nem o Amor, nada havia. Mas a não-consciência do Grande Espírito não impedia sua existência, mergulhada em sono eterno, sono que pulsava em cadências de expansão e recolhimento. E este movimento, chamado Demiurgo, começou a organizar o Caos (Khaos) em ondas de energia. E passou a existir a consciência dessa energia.

Foi no Caos que o Grande Espírito conheceu a sua própria existência. E sentiu o impulso de projetar-se pelo espaço infinito, de abrir suas imensas asas e limitar nelas o Universo então vazio.

E começou a vibrar. À medida que se expandia através do Caos, ia deixando impressa a possibilidade da existência. A consciência da existência fez vibrar o Caos com intenção. O Caos vivia sozinho em um espaço completamente vazio e nada existia a seu redor. Não havia nem o Sol, nem a Luz, nem o Céu, nem a Terra. A única coisa que existia em algum ponto do Universo era uma escuridão sem forma. Por isso, cansado da solidão, foi que teve a idéia de criar. Daí, dotado de grande energia prolífera, deu forma à escuridão, formou-se uma energia que se foi reunindo em negros agrupamentos: fez surgir Nix, ou Nýks (a Noite), tornando-se a existência das trevas superiores, envolvendo-as com seu manto negro. Junto com Nix surgiu seu irmão, Érebos, as Trevas inferiores. E os dois irmãos, unidos, mas tão opostos, coexistiram no seio do Caos.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:37

Nix e Érebos, tencionados em si mesmos, explodiram em luz e depois desta explosão, Érebos mergulhou para sempre nas profundezas mais inferiores. Se tornou parte do Orco, onde seriam acolhidas as criancinhas mortas prematuramente, as vítimas de falso julgamento e os suicidas por motivo de paixão... Antes de chegarem ao Érebos, se encontrariam as almas perdidas, que não haveriam de ser sepultadas. Quanto a Nix, solta no Caos agora cheio de luz, começou a encurvar-se até transformar-se numa esfera, que começou a vibrar, procurando expandir-se ainda mais. Assim, nasceu Fanes, a Luz.

Estavam criadas a luz e as trevas. Luz e trevas eram a consciência dualizada. Eram o mais e o menos, o positivo e o negativo. Nix pulsava e se expandia, mergulhada na luz. E teve a consciência de que a Luz era o oposto que a complementava. E na tentativa de expansão, a esfera em que havia se transformado partiu-se ao meio e as duas metades se separaram. Era o Ovo Primordial que se partia graças à ação da luz. Do esforço único dessa separação nasceu Ágape (ou Éros), o Amor, Amor-energia, Amor ígneo que ocupou o Nada, impregnou o Universo despertando a semente da Vida. Deu-lhe movimento. Com isso, o Amor uniu, por fim, a Luz e as Trevas. E as duas metades de Nix converteram-se numa abóbada, e nasceu a Terra, na forma de uma deusa muito bela: Géa, a Tellus Mater dos latinos, a “Mãe-Terra”, ou Magna Mater, a “Grande Mãe”.

Éros tinha duplo sexo e asas de ouro e, com suas quatro cabeças, rugia às vezes como um touro ou um leão, silvava como uma serpente e balia como um cordeiro.

Cheia de vida e de alegria, Géa foi crescendo e envolvendo grandes extensões com seu abraço. E foi graças a ele que o mundo nasceu.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:38

Caos engendrou o pavoroso Tártaros e sua Corte Noturna, enquanto que, unindo-se a Nix, Érebos criou a alegre e radiante Heméra (o Dia) e Éter, ou Aithér (a personificação do ar luminoso). Ou seja, os princípios da obscuridade deram origem à luz. Com isso, Érebos não tinha mais espaço para viver entre as divindades aladas do Cosmos, então penetrando nas entranhas da Terra, se transformou na Sombra interior do Orco.

O Orco, por sua vez, tornou-se demasiadamente sombrio. Ficava nas profundezas da Terra, enquanto Caos imperava no ponto mais alto do espaço. Uma bigorna, do Caos ao Orco, levaria nove dias e nove noites para cair, e só no décimo dia atingiria o chão. Todo ser que atingisse o Orco, sugado pela Terra e desnorteado por fortíssimos redemoinhos, mesmo no espaço de um ano, não conseguiria atingir os pontos extremos daquele mundo subterrâneo e não alcançaria a saída, a menos que fosse guiado por algum deus ou demônio do lugar. Era no coração desse mundo pavoroso, do qual até os deuses primordiais tinham medo, que vivia escondida atrás de nuvens negras, a Corte de Nix, a Noite.

Géa continha em si as densas partículas do mundo físico e as mais sutis do mundo astral e, quanto mais consciência tinha em si mesma, mais promovia as transformações iniciais de sua existência física. No mundo astral, Géa começou a modelar um corpo para si mesma, um corpo que pudesse caminhar pela luz, mover-se agilmente e observar em suas viagens a formação da matéria no mundo físico — o planeta Terra. Uma Terra primordial que começava a se formar, a se comprimir ou a se afastar.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:38

Depois de Caos haver feito a sua parte, foi a vez de Géa, a Mãe-Terra, ajudar na criação do mundo. Ela quis, então, engendrar algo muito bonito, que pudesse servir de elo entre as divindades e que pudessem realizar uma série de gerações futuras. E foi que engendrou Úranos (o Céu), enquanto dormia. Ao nascer, ele, olhando-a carinhosamente de cima, derramou a chuva fértil sobre suas rachaduras secretas, e dela surgiram a relva, as flores e as árvores. Géa abriu seus olhos, olhou para cima e viu que, da outra metade do Ovo Primordial, se expandia pela eternidade o Firmamento. Era Úranos, sua criação e seu irmão natural. Então, através de Ágape, engendrou os Úreas (as Montanhas), que infestaram a Terra.

Póntos (o Mar) nasceu da união simbólica de Géa com Éter. E entre os filhos engendrados a partir do Ovo Primordial, Úranos era o deus maior, o mais poderoso. Porém, todos passaram a temer e respeitar um filho que nascia de Nix e o Caos: chamava-se Móros (o Destino adverso), que todos os seres, até mesmo os deuses, se submetiam. Como era um ser indefinido, sem sexo, também foi chamado de Moîra, ou Aîsa (do dialeto árcado-cipriota), a grande condicionadora da vida, a parte, o lote, o quinhão, aquilo que a cada um cabia por sorte, o próprio Destino. Não pôde ser personificado e, em conseqüência, não foi antropomorfizado, pairando soberano acima dos deuses e dos homens, não como um rei (ou rainha), mas como um ser imutável. E foi habitar na escuridão de uma gruta do Orco, a “morada subterrânea dos mortos”. E Nix, depois de gerar sozinha Tânatos (a Morte) e Aerumna (a Aflição), engendrou ainda muitos filhos com seu irmão Érebos, como Hipnos (o Sono), Epífron (“o que reflete sobre o acontecimento”), Caronte (o barqueiro dos Infernos), Guéras (a Velhice), Oizys (a Pobreza), Poenía (a Miséria) e a Petulância.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:39

Uniu-se ainda a seu filho Hipnos e gerou os Óneiros: Morfeus, Fântasos, Ícelos, Forbétor (o Pesadelo), e ainda Momos (o Sarcasmo, a Culpa), a Fábula e a Preguiça. E com seu filho Momos, teve uma filha, a Fraude. E, nascida para procriar, teve ainda uma série de filhos: as Queres (deusas do Destino, da Morte violenta), Hipocrisia (o Fingimento), Ácis (a Desgraça), Hybries (a Arrogância), Apate (o Engano), Fílotas (a Ternura, a Amizade), Apetes (o Engano), Leza (a Fúria), Epífrone (a Prudência), Éris (a Discórdia), Ftonos (a Inveja), Autos (o Egoísmo), Sigê (o Silêncio), Kryerous (o Frio), Eufrósine (a Benevolência), Styx (o Ódio, a Raiva), Limos (a Fome), as Kakas (os Vícios), Elpis (a Esperança), Pento (a Tristeza), Kedea (os Pesares), Lysímele (o Amor), Léton (a Dissolução), a Obstinação, a Peste e muitos outros. Com seus filhos, formou a sua Corte Noturna, no Orco, mas construiu seu palácio na Esméria, no Extremo-Oeste do mundo. Os demônios, seus filhos, se ocultavam durante o dia, mas quando o Sol se punha, saíam para dominar a superfície da Terra. Quanto às Queres, deusas ou demônios terríveis, que saíam para rasgar as carnes dos cadáveres, seus nomes passariam a não ser pronunciados para jamais serem invocadas; eram Anaplekte (a Morte dolorosa), Akhlys (a Ânsia de morte), Nosos (a Doença), Ker (a Destruição) e Stygere (o Ódio).

Por sua vez, Éter e Heméra, os filhos do Caos e da Noite, uniram-se e geraram Ergo (o Trabalho), Aletéa (a Verdade), Crísis (a Credulidade) e a Inocência.

Úranos, então, assim que viu o Cosmo completo, para firmar o seu poder, envolveu a Terra com seu manto azul e cobriu-a de uma extremidade a outra. Úranos sentava-se em seu majestoso trono de ouro, construído sobre nuvens de muitas cores. De lá, reinava sobre o mundo e todas as demais divindades.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:39

Tártaros, pressionado pela hegemonia de Úranos, que passava a dominar o Cosmos, foi sepultado no Orco, passando a fazer parte do mesmo. No lugar de seu sepulcro, em forma de uma gigantesca masmorra, seriam encerrados os grandes criminosos, que cumpririam seus mais terríveis suplícios, açoitados pelas algozes Erínias, segundo a forma de como cada um teria vivido e o pecado que teria cometido.

Lugar sombrio e frio, a partir de então, o Orco passou a ser dividido em dois setores independentes e distantes um do outro: o Érebos e o Tártaros, primeiramente destinados às divindades que se encontravam em desarmonia com o Cosmos.

Então, Géa, estendendo os braços para acudi-lo, uniu-se ao Tártaros e engendrou os rios Flégeton e Cócitos e a terrível Campê.

Só que Géa percebeu que Úranos também tinha para si um corpo astral, leve, que se destacava de toda aquela energia etérea e flutuava na imensidão.

Úranos e Géa, em seus corpos sutis que vagavam pelo Universo também sutis, aproximaram-se e amaram-se. E Géa encheu-se de doçura e submissão, e aconchegou-se nos braços de Úranos, que a fecundou. Consumava-se a hierogamia, a união sagrada.

No mundo físico, a Terra tornou-se a virgem pronta a ser penetrada por uma chuva que ainda não tinha acontecido e a ser rasgada por um arado que um dia seria criado por algum ser humano que ainda não existia, nem mesmo nos pensamentos do Grande Espírito.

No mundo astral, Géa tornou-se mãe. Desse parto magnífico nasceu o primeiro ser divino, a serpente Ógigos (ou Ofíon), o Titã por excelência.

No entanto, logo que Ógigos percebeu ser superior, extremamente grande, enrolou-se ao redor da Terra e ameaçou-a com seu sibilo horripilante, mostrando ser páreo para governar o mundo no lugar de seu pai. Porém este, ameaçado, estendeu seu braço poderoso, agarrou a serpente e atirou-a no Orco, as prisões infernais, onde jazia o Tártaros.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:40

Para substituir o filho indesejado, Géa continuou a parir através da semente de Úranos. Nasceram as Forças da Natureza que também iriam se manifestar no mundo físico. Eram os Titãs — o primogênito Océanos (Okéanos), Crios (Kreios), Céos (Koios), Hiperíon (Hyperíon), Jápetos (Iápethos) e o jovem Cronos (Krónos), e as Titânidas — a mais velha delas, Téa (Theía ou Aethra), Réia (Rhéa), Urânia ou Têmis (Themis), Mnemósine (Mnemosyne), Febe (Phoíbe) e Tétis (Têthýs).

Póntos (o Mar) gerou sozinho a Nereus, o “velho do mar”, e, depois, unindo-se a Géa, teve os filhos Taumas (o Espanto), Fórcis (a Espuma do mar) e Ceto (os Terrores do mar), que deram origem aos monstros das águas, e também Cefeus (ou Egéon), Euríbia (a Fúria do mar), a ninfa Hália (a Salinidade) e os Télquines, os primeiros habitantes da ilha de Rodes, que se chamou Telquínia.

Os Télquines (Telkhînes) eram magos, encantavam por meio de sortilégios, benévolos no início, mas logo tomaram um caráter malfazejo, lançando o mau olhado e destruindo as colheitas. Faziam chover, nevar, saraivar ou ventar conforme desejavam. Colhiam a água do Estige, regavam com ela o solo e faziam nascer enfermidades e desgraças, como a fome, a peste e a seca. Divindades marinhas, assumiam a forma de Tritões, ou adquiriam a forma de serpentes. Chamavam-se Argíron, Críson, Licos e Cálcon.

Aqueronte, filho de Hiperíon e Géa, foi envolvido pelo manto negro de Nix, que a ele se uniu e engendrou as terríveis Erínias, destinadas a serem deusas da Vingança, do Remorso, do Castigo. E foram chamadas de Alecto, Mégera e Tisífone. Nasceram velhas, repulsivas, aladas e com os cabelos entrelaçados de serpentes. Passaram a empunhar tochas e chicotes, envolvidas de um manto negro, como a Noite. Não se comoviam com as lágrimas e as súplicas. Foram levadas ao Tártaros para castigar os criminosos, tirando-lhes toda esperança de misericórdia. Percorrendo o espaço silenciosamente, acompanhavam os criminosos durante a vida e desciam com eles aos Infernos.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:41

Entretanto, eram doces e complacentes com os homens bons e piedosos. Passariam a proteger o viajante, o estrangeiro e o mendigo. Tornaram-se deusas da moralidade e da ordem social, e asseguravam o reino do direito e da lei, sendo chamadas pelos atenienses de Eumênides.

Aqueronte teve, também, uma filha chamada Orfne, e com ela teve uma relação incestuosa. E deles nasceu Ascálafos.

Éris, “conflito”, “disputa”, era a deusa da Discórdia. Tinha asas nos ombros e nos pés, era impiedosa e sanguinária, animadora de conflitos e das guerras, com os quais se alegrava. Era a “senhora da dor”. Deu origem a vários filhos, quase todos ligados à guerra, ao combate, entre os quais Ate (a Ruína, o Erro), Disnomia (a Confusão), Neikea (os Litígios), Androktasias (a Carnificina), Algea ou Algós (a Dor), Limos (a Fome), Lógos (a Fofoca), Ponós (o Trabalho, a Fadiga), Himínias ou Isminas (o Combate, a Luta), as Pseudo-logoi ou Pseudéias (a Mentira), as Nicéias (os Litígios), Amfilogie (a Disputa), Lethe (o Esquecimento), Disnômia (a Desobediência às leis), Máquias ou Makahi (as Batalhas), Kydoemos (a Balbúrdia), Fonós (o Homicídio) e Hórkos (o Juramento). Ao dar à luz o último filho, foi auxiliada em seu parto pelas Erínias, que tinham como função perseguir e assassinar quem quer que não honrasse os próprios votos.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:41

O Inferno a partir de Zeus

Até então, sob o início do reinado de Zeus, o destino dos homens, e não menos dos deuses, era decidido por Móros, ou Moîra, a divindade sem forma ou gênero, o Destino Cego. Como divindade primordial, jamais morrerá e permanecerá para todo o sempre. No entanto, Zeus, que pretendia ser senhor absoluto do Universo, precisava que o Destino lhe fosse aliado, precisava gerar um ou mais seres que se distinguissem de Móros, que se tornara semelhante às Queres, impessoal e inflexível, cuja projeção de sua lei nem mesmo os deuses podiam transgredir, sem colocar em perigo a ordem universal. Para isso se reverter, Zeus uniu-se mais uma vez a Têmis, que detinha a Lei Universal.

De sua união com Têmis, nasceram três deusas místicas, nasceram velhas em aspecto, cada qual trazendo consigo uma atribuição: Cloto (Klothô), “a fiandeira”, segurando um fuso, do qual já desenrolava o fio da vida; Láquesis (Lákhesis), “a sorteadora”, e já começou a enrolar o fio da vida e sortear o nome de quem, vivo naquele instante, devesse morrer; e Átropos, “a que não volta atrás”, menor em estatura, a implacável, a inflexível, que já começou cortando o fio da vida de alguém, sem dar-lhe tempo de escolher ou de despedir-se dos seus. Mais tarde, se juntaria a elas Ilítia, para presidir ao nascimento.

Ao contrário de Móros (ou Moîra), que foi habitar no Orco, as Moiras tiveram seu lugar no Olimpo, bem próximas da sala do trono de Zeus. As divindades Olímpicas e os seres-humanos continuaram a crer na impossibilidade de alterar os destinos pré-determinados, mas no fundo Zeus sabia que poderia fazê-lo, sem dá-lo a entender. E isto diversas vezes ocorreria, Zeus tomando a decisão para cada ser (os destinos de Tróia), homens enganando a Morte (como Héracles e Sísifos), ou as Moiras, em dois momentos, pararem de fiar (no caso de Orfeus e no caso da morte de Admetos), até mesmo alguns homens com a faculdade de ressuscitar os mortos (como Asclépios e Políidos).
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:42

Nestes casos, estaria o destino dos homens e das divindades nas mãos e na vontade de Zeus?

Zeus, sagrado vencedor dos Titãs, instaurando nova era, após dias e noites (300 anos?) em lua-de-mel com Héra no monte Ida dos frígios, na ilha de Sámos, na riquíssima Etiópia, nas longínquas Ilhas Hespérides e em outros tantos pontos paradisíacos, retornou ao convívio dos demais deuses a fim de decidir pela sorte o seu quinhão com seus irmãos. Zeus, Hádes e Poseidon, candidatos ao governo do mundo, tiraram a sorte em um elmo, que decidiria a liderança do Céu, do Mar e do Orco, o Mundo Subterrâneo, ficando a Terra comum a todos. Como já se pretendia, por Zeus ter sido o responsável conspiração contra Cronos, enfim, coube-lhe o Céu, ocupando o trono do Olimpo e governando sobre deuses e seres humanos, monstros e animais da Terra. Agora, senhor supremo, Zeus partilhou com os seus irmãos o mando dos sentimentos e dos caminhos da vida, como das trilhas da Morte.

A Héstia, a irmã mais velha, entregou o fogo, força e mistério maior com que houvesse calor, fazendo dela a justa protetora das famílias e dos lares.

Decidido, determinou, pela sorte, que o bravo e soturno Hádes se encarregasse do vasto Reino das Sombras, onde haviam sido aprisionados os Titãs e para onde seriam levadas as almas dos que iriam morrer.

— Sê, meu irmão, senhor do lugar onde se encontram e mais se encontrarão as almas e as lembranças de tudo o que é mortal, logo após passada a vida. Se alguém bater no chão com a palma da mão, vem logo atendê-lo. E, não sendo este o caso, permanece em teu trono, não mais de lá saindo, apenas recebendo a quem lá chegar!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:42

A princípio, Hádes não se conformou com o seu quinhão, mas, com o tempo, haveria de se tornar o mais rico dentre todas as divindades, devido às incontáveis riquezas inexauríveis das entranhas da Terra. Portanto, como os seres humanos teriam medo de pronunciar seu nome para não invocá-lo, chamaram-no também de Plúton, o “rico”. Aliás, até então, o Orco era um lugar terrível, escuro, pútrido, ausente de luz e de beleza. Com a ascensão de Hádes ao trono do Mundo Subterrâneo, tudo isso mudou, passou a ser iluminado e organizado em setores, como uma grande cidade, com direito até mesmo aos Campos Elísios; palácios foram construídos, muros foram erguidos, canais foram ligados, as paredes foram enfeitadas, e para ele foi esculpido na rocha um trono esplêndido, repleto de pedras preciosas. Hádes formou um grande exército de demônios e organizou para ele um séquito, fazendo valer um estilo de vida idêntico ao do Olimpo, não menos belo e luxuoso. Apenas o Tártaros permaneceu ainda odioso, cuja entrada foi fechada por portais de ferro.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:43

O Inferno descrito no rapto de Perséfone

Depois que Zeus e seus irmãos terem derrotado os Titãs e os expulsado para o Tártaros, constantemente a Terra era sacudida por terremotos. Provavelmente provocados pelas tentativas dos Titãs se libertarem. E Hádes sentiu-se alarmado, receoso de que seu reino pudesse ser aberto à luz do Sol, já sobraram muitas fendas no solo terrestre. Presa dessa apreensão, Hádes já planejava ir verificar a extensão dos danos.

Hádes era o soberano do Reino dos Mortos, das obscuras cavernas do Tártaros. Ali vivia ele a fazer companhia, sozinho, às almas dos defuntos, e sua solidão entristecia-o. Não era propriamente um deus sombrio, mas os Infernos tornaram-se seu quinhão, muito diferente donde brincavam e viviam as Ninfas das florestas e dos regatos e os Amores, criaturas lindas e serenas, que acompanhavam o séquito de Afrodite. Entre eles, havia um pequenino ser, filho da deusa, que divertia-se atirando a esmo as flechas da paixão no coração de todos os seres. Isso incomodava um pouco sua mãe, porque muitas vezes a paixão podia ter conseqüências desastrosas. E isto atiçava a curiosidade de Éros.

— Por que, mamãe, mesmo no Céu, alguns desprezam nosso poder? Atena, a sábia, e Ártemis, a caçadora, desafiam-nos.

— Cuidado, Éros, porque poderás atiçar a paixão do mais gélido ser, e isto poderá trazer tristeza ao mais sublime coração.

Coisas do Destino. Éros, o deus do amor, posicionado sobre o monte Érix, ao atirar sem destino uma flecha infalível da paixão, ela entrou por uma fenda no chão e foi ferir o coração frio de Hádes, o deus dos mortos.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:44

Hádes, sem entender o que sentia, procurou buscar o entendimento na sua fonte mágica, que lhe indicaria um motivo para lhe revelar esse sentimento novo: ao fixar os olhos na fonte reveladora, viu um rosto de menina, uma flor em forma de deusa, com cabelos da cor do trigo, e teve por ela um grande interesse. Ao vê-la tão radiante, do fundo do abismo, por ela se apaixonou e uma fulminante atração atormentou seu corpo. Supôs que, desposando-a, levadas pela graça de uma linda mulher, a luz e a alegria penetrariam e permaneceriam nos profundos abismos, para dissipar-lhe a melancolia. Porém, ao pensar sobre isso, não pensou um só momento nas conseqüências que poderiam advir do seu procedimento. Procurava um meio de localizá-la, quando viu surgir, diante de seus olhos, uma nova cena: a menina corria a abraçar sua mãe, a deusa Deméter.

— Mas então é minha sobrinha...!

O soberano das sombras, vestindo seu manto negro, ordenou que preparassem para ele sua carruagem, pois precisava ia até o Olimpo; e foi pedir a Zeus que fizesse um pedido a Deméter que lhe desse sua filha em casamento. Queria tê-la consigo em seu reino, para com ele viver e reinar.

— Estou apaixonado por tua sobrinha, meu irmão.

— Sobrinha? Que sobrinha?

— Core, filha de Deméter. Aquela a quem não se sabe quem é o pai...! Tu, por acaso, não sabes quem é o pai... não é mesmo?

Zeus, preocupado, olhou para um lado e para outro, pôs o dedo sobre os lábios para lhe pedir silêncio, e sussurrou:

— O que pretendes, irmão?

— Será que tu me darias tua permissão para eu fazê-la minha esposa?

— Esposa?!

— É... eu ando meio solitário em meu Reino Sombrio. Não tenho com quem dividir o meu leito, e acho que já está mais do que na hora. Preciso de uma esposa, casta e digna de reinar. Meu reino no subterrâneo é triste e melancólico, e precisa de uma presença feminina como a da formosa Core. Eu a tornarei feliz, te prometo.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:45

Zeus teve receio de ofender Hádes negando-lhe a sobrinha, que escondia ser sua filha. Mas teve receio também de ofender Deméter com sua permissão. Por isso, sem dizer uma palavra, limitou-se a piscar o olho para o irmão, aprovando em silêncio, o que trouxe satisfação ao deus Hádes. Zeus intercedeu e enviou até a deusa, em seu templo, a divina e multicolorida Íris levando a mensagem de Hádes.

— Branda Deméter, quer Hádes casar-se com a bela Core. E Zeus se mostra a favor, se assim o quiseres, só aguardando nos Céus o seu justo consentimento!

— Core?! É muito moça ainda, e eu a quero comigo para aprimorar a vida no destino que lhe cabe. Respeito Hádes meu irmão, mas ele deve se conter e esquecê-la! Que ele procure suas amantes! Dize a Zeus que assim penso, desta forma zelo e protejo minha filha aqui na Terra!

Íris desceu aos Infernos e comunicou a decisão negativa de Deméter:

— Senhor das trevas, deus dos mortos, soberano do Tártaros, imploro-te que controles a tua ira divina e ajuda a manter o bom relacionamento com o Olimpo. Esquece a tua paixão, porque Deméter nega teu pedido. Quanto a Zeus, fez o que fez, nada mais, em relação ao teu matrimônio com Core, como desejas!

O rei Hádes se calou em seu trono. Conhecia bem sua irmã e tinha por ela apreço, mas, também, reconhecia sua teimosia. Era definitiva. Jamais ouviria um “sim” de Deméter. Porém, matutou sobre o caso, sem deixar que percebessem, ainda, em seu coração, a fulminante paixão pela deusa das flores, Core, sua sobrinha.

Após Hádes surgir surpreendentemente diante de Core e tentar galanteá-la, levou-a para o carro nos braços. Em seguida, tocou os animais, que levantaram voo. Core gritava, à medida que a estranha viagem começava.

Hádes, sem lhe dar ouvidos, tocou sua carruagem em direção da fenda. Mas aquela cena foi presenciada por Cíane, uma de suas amigas, que havia ido procurá-la. Perséfone gritou pelo seu nome, mas ela nada pôde fazer senão implorar:

— Espera, cruel divindade! Deixa-a em paz!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:45

Hádes, temeroso por ter sido descoberto, desviou seu caminho e tocou os cavalos para longe da fenda e desapareceu. E, para não deixar vestígios, ordenou que a fenda se fechasse. Nesse momento, uma vara de porcos por ali passava, misturando seus rastros com os rastros dos corcéis de Hádes. E, ao começar a fechar-se o abismo, os porcos nele caíram e morreram. Quanto a Cíane, saiu correndo para avisar do rapto, mas suas pernas fraquejaram e, sem forças para continuar, dobrou os joelhos e esticou-se sobre a relva. Num instante, seu corpo foi transformado numa fonte, e jamais ela pôde revelar quem era o raptor da filha de Deméter.

Após uma longa viagem, Começava a escurecer e rumores de trovoada e anúncios de tempestade era tudo o que se ouvia então. E quanto mais trevas desciam, mais alegria brilhava no tenebroso rosto daquele rei.

— Hélios não tem beleza, menina. A luz do Sol não tem majestade. Luz maravilhosa é a que encontrarás no meu reino. Luz de tochas encantadas, luz que resplandece refletida nos diamantes e no ouro das paredes do palácio que vais ver agora. Queres ver?

— Então eu poderei voltar depois?

— Isso se resolve depois. Olha, estamos chegando...

O carro, depois de atravessar densa quantidade de neblina negra, transpunha um imponente portão, e logo os cavalos se detinham, retidos pelas rédeas.

E um enorme cão negro de três cabeças, dócil e contente, surgiu a correr e esperava ansioso a descida de seu dono. Core, surpresa, arrancou um grito de sua garganta.

— Não te assustes, garota, ele pertence a mim. Vem, meu querido Cérberos!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:46

Hádes acariciou, uma por uma, as três cabeças daquele cão de guarda, que para Core eram terríveis, apesar de vê-lo muito manso e amigo. Cérberos gania de satisfação, ao receber a carícia do dono, agitando a cauda. Core aquietou-se. Mas qual não foi a sua surpresa ao olhar, com mais atenção, a cauda que o cachorro agitava. Era nada menos que um autêntico dragão, com olhos ferozes e garras de assustar qualquer gigante. Em seguida, reparou que, por baixo dos pelos do pescoço do animal, mexiam-se o que pareciam ser cobras, e de fato eram. Core assustou-se.

— Eu tenho medo, senhor, leva-me de volta...!

— Não temas, querida. Cérberos é o meu amigo mais fiel. Não faz mal a ninguém, a não ser àqueles que queiram entrar em meus domínios sem terem sido chamados... ou que pretendam sair sem permissão...

Hádes estugou de novo os animais e, atravessando rios lodosos e flamejantes, pelo ar, o carro percorreu os jardins interiores de um belíssimo palácio.

— Olha quanta riqueza...

As pedras do caminho eram pedras preciosas.

Chegaram a uma ponte.

— Olha o rio que passa aí embaixo.

Ela olhou e sentiu frio na alma. Era um rio negro, lamacento, de marcha pesada.

— Esse é o Létes, nunca ouviste falar?

— É um rio muito feio.

— Mas do meu particular agrado. Tem uma água estupenda, mesmo não parecendo. Basta um gole dessa água para fazer esquecer imediatamente todos os cuidados e tristezas. Se a provares, deixarás de sentir saudade de tua mãe e nada haverá na tua memória que possa te atormentar e impedir a tua felicidade em meu palácio.

Isso dizendo, Hádes chamou um de seus servos e ordenou-lhe que trouxesse, numa vasilha de ouro, um pouco da água do rio Létes.

Core atirou longe a água e o vaso de ouro. Não quis beber.

— Eu prefiro continuar infeliz e não esquecer minha mãe, que eu não devia ter desobedecido...

— Temos tempo.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:46

Hádes desceu do carro, tomou a menina em seus braços e conduziu-a até o vestíbulo, para além da porta do palácio, que estava amplamente iluminado pelo reflexo da luz nas pedras preciosas incrustadas nas paredes.

Chamou depois o chefe dos cozinheiros reais e ordenou-lhe que preparasse um banquete opulento e saboroso como nunca houvera outro, nem mesmo no Olimpo, que era onde viviam os deuses supremos.

— E não te esqueças de um cálice de ouro e diamantes, o mais belo que houver, com água do Létes, para a nossa linda visitante.

E olhou-a com um forçado carinho.

— Não é mesmo, queridinha?

Core, que não queria, por nada que lhe descem em troca, esquecer sua mãe e que preferia morrer de fome a ficar no reino de Hádes, não respondeu. Mas jurou a si mesma, dentro de seu coração, que nada beberia e que nada comeria, por maior sede ou fome que tivesse, naquele palácio de falsas riquezas.

Mal sabia Core que, agindo assim, seria a sua salvação. Porque, segundo as leis antigas, todo aquele que entrasse numa terra ou nos domínios mágicos e ali comesse ou bebesse qualquer coisa, nunca mais voltaria ao seu lugar de origem.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:47

O Inferno segundo o mito de Orfeus e Eurídice

Orfeus, tomando suas coisas, após pedir a ajuda e a proteção dos deuses, seguiu caminho aleatório, buscando uma entrada para a Terra dos Mortos a fim de buscar sua amada Eurídice. Orfeus, porém, não dispunha do auxílio dos deuses, estava somente com sua determinação e coragem. Era mortal e temia os mistérios do Inferno, mas tinha certeza de vencer todos os obstáculos. Em seu coração, Eurídice continuava viva e era insensato abandoná-la nas garras do Senhor dos Mortos. Ele que, apesar de simples, apaziguava os elementos da Natureza em fúria, enfeitiçava animais e plantas, seduzia até mesmo os deuses com a beleza de sua música, descobriria um meio de resgatá-la; seu amor faria o milagre acontecer. A morte de Eurídice não fazia sentido; fora prematura e cruel. Para ele, os deuses talvez tivessem cometido um engano.

Orfeus sabia da existência de quatro misteriosas cavernas na Hélade de onde partiam as estradas sem retorno, mas não conseguia descobrir a porta que o levaria ao seu destino. Ninguém sabia. E o aconselhavam:

— Orfeus, não deves prosseguir. O escuro Mundo das Sombras não é para os vivos.

— Até para os mortos é muito difícil suportá-lo, Orfeus, e todos desejam desesperadamente ver a luz do dia outra vez.

— Hádes é implacável e inflexível, e Cérberos, que vigia incessantemente os portões do mundo subterrâneo, nunca te deixará trazer tua amada de volta.

— Tu não és a única pessoa do mundo a perder alguém que ama, filho de Éagros. Muitos já choraram por isso antes, e muitos já sentiram que iam morrer de tanta dor, mas pouco a pouco suas lágrimas secaram, as feridas cicatrizaram. Se pretendes mesmo levar isto adiante, há uma entrada na Aquerúsia, na longínqua Tesprótia, mas é meu dever adiantar-te que o destino do homem é duro e que ninguém pode mudá-lo.

Mas Orfeus não deu ouvidos nem a sábios nem videntes, nem daria ouvidos aos seus amigos mais íntimos, a heróis mais famosos, talvez nem mesmo os conselhos dos deuses.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:48

— Essa não é a resposta que procuro. Apenas preciso que alguém me mostre o caminho para Hádes.

Só mesmo o Acaso poderia ajudá-lo, pois, pretendendo seguir o caminho da Tesprótia, ninguém lhe apontava o caminho, e começou a descer cada vez mais para o sul da Hélade.

Zeus, comovido por ver Orfeus determinado a não desistir, depois de muito andar, de um lado para outro, ordenou a Hermes levá-lo para o Mundo dos Mortos, indicando-lhe um caminho seguro. Talvez, com sua música, ele pudesse convencer Hádes, o deus dos Infernos, a devolver Eurídice para junto dos vivos, embora isso fosse coisa que Hádes nunca havia permitido a nenhuma outra alma do mundo.

Num fim de tarde, andando pela região do Taígetos, no sul da Hélade, esgotado e faminto, subiu por um aclive para observar o vale abaixo. O deus Hermes, invisível, empurrou-o pelas costas e fê-lo escorregar e rolar como uma pedra, caindo de uma altura considerável. A queda foi amortecida por uma espessa ramagem que, sem dúvida, salvou-lhe a vida, de certa forma planejada por Hermes. Tonto de tanto rodar, rasgado e sujo, começou a olhar em volta, até perceber uma gruta, que até então estivera obstruída pelos arbustos quebrados com a sua queda.

A abertura era muito estreita, e Orfeus viu-se obrigado a cavar uma depressão para poder entrar. Poderia ser o covil de uma fera, mas resolveu arriscar. E, tendo aberto uma depressão com as mãos, sem notar que estava sangrando, ascendeu um archote, respirou fundo e, antes que pusesse o pé gruta adentro, o deus Hermes, na forma de um montanhês, lhe chamou a atenção:

— Ei! Aonde tu estás indo? Volta! Nenhum mortal pode tomar esse caminho, e ninguém ousaria penetrar nessa garganta. É melhor não vê-la e sequer pensar nela. Desvia-te e volta para casa!

Orfeus não lhe deu ouvidos e entrou naquele lugar. Jamais pensava que poderia morrer ou jamais retornar, mas lembrava-se de Eurídice... ela ocupava-lhe a razão.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:48

Andou muito, por um tortuoso túnel, onde só espinhos cresciam ali e as únicas criaturas vivas eram serpentes e pequenos insetos, até chegar a uma bifurcação de caminhos opostos. E um deles era um enorme buraco negro, pelo qual nada se podia distinguir. Qualquer outro teria recuado ao ver a apavorante passagem; Orfeus não: avançou resoluto e deixou o resto de luz que ainda havia para trás, pois estava em busca do Inferno e decidia seguir pelo mais soturno, com paredes de rocha espinhenta que parecia abrigar os mais assustadores perigos.

Não havia dado muitos passos, quando alguém lhe segurou a mão com firmeza, dando-lhe um susto, e uma luz divina surgiu em redor. Voltando a cabeça, viu um belo homem que segurava um bastão com duas serpentes entrelaçadas. Usava um gorro com asas e também tinha asas nos calcanhares. Orfeus reconheceu Hermes, o deus que, por ordem de Zeus, freqüentemente conduzia os mortos ao mundo subterrâneo. Orfeus ficou admirado, pois sabia que os deuses só apareciam assim para pessoas especiais, grandes heróis e homens justos.

— Aprecio tua coragem, Orfeus, mas tu estás tentando fazer o impossível. O rei dos mortos, irmão de Zeus e Poseidon, é rígido e intransigente, e desconhece a dor humana. É verdade que deixa Perséfone, sua esposa, voltar para sua mãe todos os anos, mas é por determinação do próprio Zeus e para cumprir com os propósitos da Mãe-Natureza. Portanto, não esperes por aquilo que jamais acontecerá. Deixa-me reconduzir-te ao mundo dos homens.

— Leva-me até o rei deste mundo.

Esta foi a resposta de Orfeus. Em sua voz havia tanta firmeza que Hermes ficou em silêncio por um momento, depois guiou-o para mais além, segurando-o pela mão.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:49

O calor era insuportável; a caverna deveria estar bem próxima das forjas de Hefaístos — ora, pelo menos, deveria estar bem próximo às lavas incandescentes de um vulcão. Estava, certamente, nas entranhas da Terra. Esse era um lugar que até os deuses Olímpicos evitavam visitar. Com exceção de Hermes, raramente ia a mensageira Íris ao Reino de Hádes a fim de buscar o Orco, a água do Estige para o juramento dos deuses.

Orfeus percebeu que descia cada vez mais, abandonando o mundo conhecido pelos homens. Uma estranha e tênue claridade provinha do chão. Orfeus e Hermes chegaram a uma abóbada imensa onde estalactites milenares se penduravam transformadas em figuras macabras, criando um cenário espectral porém maravilhoso. O salão subterrâneo era sinistro e quieto. Nenhum sopro, nenhum som.

De repente, Orfeus imaginou que mãos sinistras pretendiam agarrá-lo, e olhou para todos os lados.

— Eurídice! Eurídice!

Falou baixinho, Hermes esboçou-lhe um sorriso, e o medo que se apossou dele desapareceu, trazendo-lhe paz.

Mais calmo, soltando um forte suspiro, voltou os olhos para frente e seguiu caminho. Não havia morcegos naquele lugar, nem lacraias, aranhas ou escorpiões, como costumava ter em cavernas comuns. Nenhuma vida pulsava. Era tudo vazio... indicava ter chegado ao fim de sua busca. Mas ainda não havia alcançado exatamente o portal do Inferno. A não ser fluidos pesados e insuportáveis que começaram a sufocá-lo. Comovido, agradeceu a Zeus, mesmo que aquilo lhe tirasse a vida, pois sentia estar mais perto de Eurídice. Caminhou por extensões cada vez mais tenebrosas, até o silêncio ser interrompido pelo som suave e ritmado de água escorrendo entre pedras. Orfeus viu que se aproximavam da margem de um rio subterrâneo, cujas águas negras ferviam em bolhas.

E disse-lhe Hermes:

— É o Aqueronte que vês, meu amigo. É o rio das dores.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:50

E Orfeus começou a observá-lo atentamente. Um vapor pegajoso pairava um pouco acima da superfície escura. Haviam outros rios que circundavam aquele reino sombrio. Havia o Cocitos, o rio dos gemidos e das lamentações, o Estige, o gélido rio dos horrores, e o Piriflégeton, das chamas inextinguíveis, todos horripilantes, mas havia ainda o Létes, do esquecimento, em cujas águas as almas se banhavam para esquecer suas vidas passadas.

Em silêncio, Orfeus ouvia atentamente às palavras do deus-mensageiro, mas uma voz rouca quebrou esse silêncio:

— Pára, intruso! Quem tu és, alma desventurada?

Orfeus não ousou responder. Queria, primeiro, saber quem o chamava, pois não conseguia vê-lo. E percebeu que Hermes o havia deixado.

— Responde, infeliz! Não contraria Caronte, o barqueiro do Aqueronte... Precisarás dos meus serviços para atravessar este rio. Vamos, responde!

— Sou Orfeus!

— Orfeus!... Há quanto tempo deixaste os vivos?

— Não sei... estou ainda meio confuso.

— Tu te acostumarás...

E começou a rir. Então, continuou:

— Trouxeste o óbolo?

— Como?

— O óbolo, mísera sombra! A moeda com a qual me pagarás a viagem para o outro lado. Sem ela ficarás sofrendo aí mesmo, respirando eternamente esta podridão. Mau barco é a única ligação para a Terra dos Mortos. Tu não tens escolha, alma!

A voz do barqueiro vinha de longe, mas Orfeus não distinguia coisa alguma.

— Aproxima-te, Caronte! Como posso pagar-te se não posso ver-te?

— Aqui estou, desgraçado!

A quina de um barco negro encostou silenciosamente na margem, saído de uma densa neblina que envolvia o Aqueronte. Nele estava sentado a criatura mais repulsiva que jamais vira: desgrenhada, fétida, sórdida. Estava o barqueiro vivo ou morto? Apesar de muito perturbado pela experiência fúnebre, Orfeus pensava num meio de barganhar com a figura asquerosa. Não teve tempo, pois Caronte soltou um grito áspero de espanto e cólera ao vê-lo:

—Aaahhhhh!!! Tu estás vivo!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:50

Orfeus olhou-se e tocou-se, depois respondeu:

— Sim, estou!

— Ei, Hermes! Tu não sabes que não levo passageiros vivos em minha barca? Por que o trouxeste aqui?

— Não, meu senhor, fui eu mesmo que decidi vir.

— Por acaso, tu és um herói? Algum deus? São os únicos que ainda têm permissão de visitar este lugar enquanto vivos!

— Talvez... Sou o filho de Éagros, o rei da Trácia, e quero seguir adiante. Disseram-me que minha mãe é uma deusa, a musa Calíope.Quero seguir adiante. Desejo falar com o senhor do mundo subterrâneo.

— De que vale a nobreza neste lugar?! Queres argumentar com Hádes e pedir-lhe favores. Eu gostaria de entender porque te deste o trabalho de fazer uma jornada dessas. Sabendo que é pouco provável persuadir-me e mais improvável ainda persuadir meu mestre. Não posso ajudar-te. Meu barco só transporta almas. E, se fores mesmo filho da musa Calíope, só poderás cruzar o Aqueronte se me mostrares que os deuses te deram tal permissão.

Orfeus estava confuso, pois nada sabia a respeito. Olhou para todos os lados para ver se encontrava Hermes, não o viu, e restou-lhe uma resposta:

— Faze uma pequena exceção! Apenas uma vez! Quem iria notar?

— Impossível! Tenho ordens expressas de Hádes. Somente os que abandonaram a vida podem entrar nos seus domínios. Agora, sai da minha frente, antes que eu te acerte com o remo e faça-te arrepender-te por tamanha insolência. Volta para o mundo lá de cima e espera tua vez, espera a Morte, se queres que eu te leve para o outro lado.

E Orfeus, sem muito que argumentar, tomou sua lira que trazia ao ombro e, enquanto corria os dedos pelas cordas, ia-lhe dizendo:

— Eu te menti, barqueiro! Estou só metade vivo. O que havia de melhor em mim morreu. Minha alegria, meu canto, minha inspiração. Falo, ando e respiro, mas isto nada significa. Estou tão desgraçado quanto a mais miserável e desamparada das almas. O mundo não tem mais razão diante do meu desconsolo. O que é viver, barqueiro? Já esqueci!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:52

Caronte jamais havia ouvido notas tão encantadoras naquelas negras paredes.

— Que sons são esses?

Mal o barqueiro de coração duro completara seu pensamento, as notas da lira encheram o ar outra vez, e ele ficou imóvel, apoiado no remo, como enfeitiçado.

Como que em transe, Caronte disse-lhe, comovido:

— Tu és o primeiro que me implora transporte. Todos choram e se lamentam com medo de atravessar o rio.

— Pois então?

— Está bem. De qualquer forma, a sua outra metade não sobreviverá mesmo. Entra no barco!

Orfeus dirigiu-se para a barca e entrou, seguido pelo atônito deus Hermes, que decidiu aparecer. Caronte, levantando o remo com ambas as mãos, empurrou a barca para longe da margem rochosa, fazendo-a deslizar silenciosamente pelas águas negras do Aqueronte.

A travessia foi demorada, não tanto pela largura do rio, mas porque o barqueiro remava sem pressa. Os grandes portões foram abertos. Gritos, demônios e sombras assustadoras enchiam de pânico aquele fúnebre lugar. Mas Orfeus não tinha medo. Queria encontrar Hádes o mais rápido possível e sair dali com Eurídice.

— Não precisas ter pressa, humano. Deves perceber a importância desta viagem. Não é um detalhe. A Eternidade te espera do outro lado.

Caronte parou o barco e soltou uma gargalhada, dizendo:

— Não vou te perguntar os motivos que te trazem a este mundo, Orfeus, pois não me dizem respeito. Desce! Tu também, Hermes. Logo vereis a entrada do Érebos!

Na margem sombria do Aqueronte, envolto por misteriosa neblina, o príncipe mal viu o barqueiro se afastar em busca de outros passageiros. Tomado por frenética urgência, Hermes levou-o para um caminho fora daquele lugar funesto. Ouviu latidos furiosos e pressentiu perigo. Um animal sinistro com três cabeças parou a pouca distância, rosnando de forma ameaçadora. Era Cérberos, o guardião daquele lugar, que pressentia ser Orfeus um invasor. Os olhos rubros do cão brilhavam incandescentes, e uma baba venenosa escorria de suas bocas com presas afiadas.

— Calma... Calma!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 14/3/2021, 02:52

Orfeus tentou aplacar-lhe a fúria, não sabendo ele que somente bolos de cevada e mel podiam tranquilizá-lo, e, mesmo que soubesse, não os tinha consigo. Nem mesmo Hermes poderia acalmá-lo, já que Orfeus era um estranho na presença daquela fera. Orfeus não havia-se prevenido, pois só havia pensado em Eurídice. De repente, uma lembrança antiga voltou-lhe à memória: a fascinação dos animais aos sons de sua lira. Já o havia conseguido antes com outras feras, e talvez pudesse fazê-lo de novo. Bem suavemente, sem movimentos bruscos, retirou sua lira pendente às suas costas, como se fosse um carcás, e a empunhou. Delicadamente, começou a tangê-la, entoando uma das canções que fizera para Eurídice. Repetiu-se, então, o milagre: a sanha assassina da fera diminuiu até cessar. Cérberos, depois de lamber-lhe os pés, deitando-se, apoiou no chão suas cabeças, semi-cerrando os seis olhos. Continuando a tocar, o príncipe passou pelo mastim pacificado, até adormecê-lo, e esgueirou-se para adiante. Havia vencido o primeiro obstáculo.

Foi então que Hermes parou e, tendo guiado Orfeus para o interior do Mundo das Sombras, teve que deixá-lo prosseguir, pois já havia cumprido as ordens de Zeus. E o filho de Éagros tomou o seu caminho, incerto mas decisivo.

Chegou no Asphodel. Uma planície nevoenta e cheia de tortuosas árvores estava à sua frente. Estranhos lírios negros brotavam do solo rachado e árido. Um vento irritante zumbia sem parar, levantando uma poeira fina. Era difícil respirar. Não havia, ali, claro nem escuro; tudo era cinzento, uma desolação neutra em meios-tons. Viu vultos indistintos vagando ao léo, penando decididamente sem rumo. Orfeus, tapando os ouvidos para fugir do zunido inquietante, aproximou-se de um deles.

— Quem és tu? Que lugar é este?

A sombra, surpresa, estacou e voltou-se para aquela voz.

— Já bebi a água do rio Létes... não sei mais quem fui. Sou agora somente uma sombra... e tudo o que tenho é isto... a Planície dos Narcisos!

— Narcisos?
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