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Miranda do Douro

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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 13:53

Artesanato

Trabalhos em madeira, verga e ferro forjado – Os trabalhos são feitos por artesãos, fazendo-se miniaturas de arados, rocas, carros de bois e outros objectos tradicionais da zona.
Miranda do Douro - Página 2 Trabalhos_madeira

Facas de Palaçoulo – facas maravilhosas, em vários formatos para uso culinário. Para além de que um Transmontano típico traz sempre este acessório como se mais uma peça de roupa se tratasse.
Miranda do Douro - Página 2 Facas

Colchas e tapetes em lã e linho 
Através dos tempos as mulheres aprenderam a transformar a lã dos rebanhos em cobertores, 
meias, capuchas e tapetes. As suas mãos experientes, teciam, bordavam e moldavam cestos e chapéus de palha e vime. Aos homens estiveram sempre reservadas as tarefas mais duras, as matérias mais rudes. A latoaria, a olaria, a tanoaria, a correaria, a tamancaria ocupavam as horas e os dias do homem do Douro ao mesmo tempo pastor e agricultor. Nas aldeias e vilas, as casas, as pontes, as calçadas são feitas de granito e xisto moldado por gerações de habitantes que perpetuaram na história os seus saberes e artes.
Miranda do Douro - Página 2 Tapete

Capa de Honras – Feita de burel, ricamente bordada, com capuz e uma espécie de pala nas costas, claramente inspirada na  liturgia capa de asperges gótica, e que é invergada por homens importantes.
Miranda do Douro - Página 2 Foto1
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 13:54

Raças Tradicionais

A raça bovina mirandesa é a mais notável de Portugal pelas suas aptidões de trabalho, de engorda e de reprodução, e ainda por ser a que apresenta exemplares mais finos, elegantes e bem proporcionados em todos os seus membros. O boi mirandês de raça fina deve ter segundo se diz na região: 
três pequenos – cabeça, testa e agulha;
três grandes – meleneira, pelindrengues e estriga de rabo;
três curtos – focinho, pescoço e perna;
três largos – tromba, nuca e «nalgas»;
e três direitos – espinhaço, cana do nariz e perna.
Miranda do Douro - Página 2 Raca_mirandesa

Burro mirandês – O burro mirandês é uma raça com características singulares que se encontra em vias de extinção, restam apenas cerca de mil exemplares. Isto levou a que a União Europeia (UE) a  considere raça protegida. Actualmente está a ser utilizado na terapia de crianças com problemas especiais. A experiência desenvolvida numa aldeia de Miranda do Douro começa a dar frutos,   principalmente no que toca à relação dos mais novos com o exterior. As características do Burro de Miranda são em resumo:
Altura elevada superando os 1,35 cm ao garrote;
Extremidades do corpo muito grande, com cabeça volumosa, orelhas grandes e fortes, cascos amplos e uma cauda longa;

Pelagem castanha escura, com gradações mais claras nos costados e face interior do tronco, branca no focinho e contorno dos olhos;

Pêlo abundante, comprido e grosso, aumentando em extensão e abundância nos custados, face, orelhas e extremidades dos membros. Crinas abundantes.
Carácter tranquilo, dócil e de grande força de tracção.

Miranda do Douro - Página 2 Burro
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 13:56

Gaita de foles (Gaita de fuôlhes)
Instrumento tradicional de riquíssimas tradições, que emerge da mais ancestral tradição musical mirandesa. Trata-se de um instrumento de sopro típico desta região que tem um fole feito, tradicionalmente, de pele de cabra.
Miranda do Douro - Página 2 Galandum

Miranda do Douro - Página 2 Castanholas4
Miranda do Douro - Página 2 Castanholas3
Miranda do Douro - Página 2 Castanholas2
Miranda do Douro - Página 2 Castanholas1
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 14:00

Gastronomia


A gastronomia caracteriza-se, quer pela elevada qualidade dos produtos que utiliza,
quer pela relativa simplicidade dos processos de elaboração

Posta Mirandesa
Nas feiras de onde é originária, era apenas passada na brasa, temperada com sal e comida com pão típico da região.
Hoje em dia, esse belíssimo naco de vitela assada, pode ser encontrado nos principais restaurantes da região, servido com batata a murro numa simbiose perfeita.
Miranda do Douro - Página 2 Posta1

Folar de Carne
É da abundância de fumeiro que resulta por ocasião das festas Pascais o “Folar” – pão de ovos recheado de enchidos.
Miranda do Douro - Página 2 Folar-de-carne

Bola Doce Mirandesa
Miranda do Douro - Página 2 Bola_doce

Fumeiro
Enchidos regionais (fumeiro), encontrando-se o presunto, as alheiras (também designadas de tabadeias), o salpicão e o butelo, entre os mais afamados representantes.
Menos conhecida, são as cascas ou casullas, prato elaborado à base de vagens secas de feijão sujeitas a cozedura prolongada, que constituem um excelente acompanhamento de Inverno, principalmente para os butelos.
Miranda do Douro - Página 2 Enchidos

Caça e Pesca
Perdiz; Coelho; Lebre; Javali; Rola.
Lagostim de água doce; Carpa; Barbo.
Miranda do Douro - Página 2 Perdiz-com-cogumelos
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 14:08

Receitas


 Posta à Mirandesa

Ingredientes:
Posta de carne mirandesa devidamente certificada (naco de carne entre 250 a 300 gramas, grossa e não espalmada), por pessoa;
Sal,
Miranda do Douro - Página 2 Posta1

Confecção:

Assar em brasas principalmente de lenha de carvalho.
O assado deve ser feito alternando somente uma vez as duas faces da posta de maneira a que esta fique mal assada;
Tirar a carne e colocá-la numa travessa ao lado do lume para que esta deixe escorrer o molho que vai ser necessário para a elaboração do molho de acompanhamento.

Molho:

Junte-se azeite caseiro com vinagre, sal, louro, um dente de alho picado, uma malagueta, mexa-se tudo de maneira a que o molho fique a dar ao vinagre e por fim adicione-se o molho da carne (em proporção) que tinha ficado a escorrer na bandeja junto ao lume.

Nota: Quando a carne é boa não precisa de molho, só sal.

Acompanhamento:

Batatas a murro
Uma boa pinga caseira
Pão caseiro
Pimentos assados



Bola Doce Mirandesa

3 ovos;
1 copo de vinho de gordura;
½ copo de margarina;
½ copo de azeite;
1 tigela de água;
1 tigela de leite;
(+/-) 50 g de fermento padeiro;
1kg de farinha.

Miranda do Douro - Página 2 Bola_doce

Confecção:
Deita-se a farinha num tacho e juntam-se os ovos, a gordura e a água misturada com o leite. Amassa-se tudo muito bem e se for preciso mais água, acrescenta-se.
Vai levedar num lugar quente ou embrulhado numa toalha ou cobertor.
Quando duplicar de tamanho ou quando a massa abrir gretas, está leveda.
De seguida aquece-se um tabuleiro de alumínio e unta-se com margarina ou azeite. Estende-se um bocadinho de massa com um rolo e forra-se o tabuleiro de forma que fique massa para fora do tabuleiro (esta camada deve ser mais grossa do que as seguintes). Pincela-se com óleo.
Numa tigela, mistura-se açúcar escuro e canela e coloca-se uma camada por cima da massa.
A partir daqui põem-se camadas de massa e açúcar o mais finas possível.
A última camada tem que ser mais grossa e cobrir totalmente o tabuleiro. Viram-se as pontas de massa que ficaram de fora na primeira camada e comprime-se com um garfo. Polvilha-se com açúcar branco se canela.
Com um palito pica-se a massa mas sem atingir a primeira camada.
A bola está cozida se ao abana-la ela se desprender.
Ao desenformar deve ter-se o cuidado de a virar para cima.



Rancho

Ingredientes:
Para 6 pessoas

250 g de massa cortada ou de meada ;
500 g de grão (cerca de 7,5 dl) ;
1 kg de batatas ;
500 g de vitela de cozer ;
1 linguiça (chouriço de carne) ;
200 g de presunto ;
1,5 dl de azeite ;
1 cebola ;
colorau ;
malagueta ;
hortelã ;
sal

Confecção:

Põe-se o grão de molho na véspera.

Descascam-se as batatas e cortam-se 2 ou 3 em cubos. As restantes cozem inteiras com os ingredientes citados, com excepção da cebola e dos temperos.
Entretanto, pica-se a cebola e aloura-se com o azeite.
Quando todos os ingredientes estiverem cozidos, retiram-se as batatas inteiras, esmagam-se e voltam a introduzir-se na panela. Deita-se também na panela o refogado a ferver. Tempera-se com sal, colorau e malagueta.
Retiram-se as carnes, cortam-se em bocadinhos e deitam-se outra vez na panela. Rectifica-se o tempero e junta-se a hortelã, ou cada um deita no seu prato um raminho.



Caldo de vagens e abóbora

Ingredientes:
200 g de feijão amarelinho (de entre o milho);
500 g de vagens cortadas à mão, limpas de fios;
Abóbora q. b.;
Duas cebolas;
Toucinho q. b.;
1 dl de azeite,

Confecção:
Põe-se o feijão de molho de véspera. No dia seguinte, colo­ca-se ao lume numa panela com água fria, juntamente com o toucinho e o azeite.
Depois de cozido o feijão, junta-se a cebola picada, as vagens cortadas à mão, a abóbora aos cubinhos e o sal.
Depois de muito bem cozido, serve-se este caldo em tigelas
Fonte: Cozinha Regional de Trás-os-Montes
de: Maria de Lurdes Torres Pereira
Publicações Europa-América



Bacalhau Assado com pão de Centeio

Ingredientes:
Para 4 pessoas

4 postas de bacalhau;
2 dentes de alho;
4 fatias de pão de centeio;
3,5 dl de azeite (aprox.);
800 g de batatas.

Confecção:
Demolha-se o bacalhau muito bem. Depois escorre-se e coloca-se num recipiente que possa ir à mesa e ao forno (geralmente assadeira de barro). Pica-se os dentes de alho e espalham-se sobre o bacalhau. Tempera-se com pimenta e rega-se abundantemente com o azeite.
Esfarela-se uma fatia de pão sobre cada posta de bacalhau e leva-se a forno bem quente durante 20 m. Durante a assadura deve regar-se o bacalhau várias vezes com o azeite.
Acompanha com batatas cozidas com a pele e inteiras, se forem pequenas; se as batatas forem grandes, faz-se-lhes uma racha (golpe).



Licor de Cidreira e Hortelã

Ingredientes:
Um litro de aguardente;
Um quilo de açúcar;
Cidreira;
Hortelã-pimenta.

Fazer uma base com a aguardente e o açúcar que demora cerca de três meses para atingir o ponto certo. A garrafa deve ficar fechadas e deve ser agitada para dissolver o açúcar.
Em três copos de água a ferver juntar 500 gramas de cidreira e um pouco de hortelã pimenta. Adicionar à base de aguardente e açúcar e agitar.
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 14:12

NATAL 1978


Miranda do Douro - Página 2 Natal1978-01

Quando tudo se transforma em festa da Natureza


Miranda do Douro - Página 2 Natal1978-02

As vozes dos moços rijos e sadios da terra transmontana vão, de novo, reboar por sob as abóbadas das sés muitas vezes seculares e das igrejas de lajedo carcomido (onde mal se lêem já as inscrições tumulares que as recobrem) dispersas pelas cidades e vilas, pelas aldeias, pelos simples povoados que assomam por entre as fragas ásperas, se alcandoram nos contrafortes das serras, se anicham no fundo dos vales, para lá do Marão.
Beijai o Menino
beijai-o agora,
beijai o Menino
de Nossa Senhora

Formam regra geral, um grupo cerrado ao fundo do templo. Atrás do mulherio. dos mais velhos, da raparigada. E as vozes crescem por sobre as de todos, lembram um trovão reboando pelas paredes frias e grossas das sés velhíssimas.
Beijai o Menino
beijai-o no pé,
beijai o Menino
que é de São José

E são eles sempre, por tradição, a fechar o cortejo lento e coleante do povo que, sempre cantando se põe em movimento, terminada a Missa do Galo, para desfilar ante o presépio armado, a beijar o pé do menino.
Lá fora  no adro de todas as igrejas de todos os povoados, arde desde o principio da noite uma fogueira imensa e crepitante, à volta da qual todo o povo se ajuntou e terminada a Missa, se voltará a ajuntar, para consoar em comum. Em Miranda, por exemplo, é já da tradição que ela arda, ininterruptamente, por três noites: a de 24, a de 25 e a de 26. Para isso – e uma vez mais para este Natal de 1978 isso aconteceu – todos os rapazes e homens válidos do lugar se meteram ao mato, dois ou três dias antes da grande noite que vai chegar a trazer os seus carregos de lenha que vão ajuntando, entre risos e descantes, no adro da sé, da igreja, da capela. Consoante o lugar e a importância do povoado, em suma. E quanto maior for o monte da lenha que se ajuntar, maior e mais prolongada será a fogueira de todos, na noite branca e de paz.
Ali, novos e velhos folgarão em honra de Jesus nascido. E ricos e pobres se irmanarão na dádiva comum da consoada gera. O bacalhau cozldo, com a couve – a troncha. O polvo, cozido com batatas ou guizado, de arrozada, As rabanadas e os fritos de farinha.
O afã pelas casas vai já solto desde há dias, Ajeitaram-se melhor os mantimentos no piso inferior da casa típica transmontana – a loja, lhe chamam -, onde se arrecada o azeite de um amarelo-quase-verde, résteas das cebolas, os toucinhos, os presuntos, onde sobre as secas abertas se derrama a batata que não poderá faltar pelo inverno adentro, a estará presente na ceia da noite que se avizinha.
E já se tende a massa para os fritos, já  da fonte ou do poço se alevantam os carregos de água para as limpezas que a festa impõe, Para lá do Douro, para além-Maráo, as gentes preparam-se, este ano como ontem e sempre, para viver a sua festa maior. De fora,  da Alemanha, na sua maioria de França, estão chegando já os filhos emigrados, as noras, os netos estão chegando os irmãos, os primos, os que a vida dispensou.
Mas há, para além da tónica comum, todo um salpicar curioso e pitoresco de tradições e usos e costumes à nossa espera, por toda a terra transmontana.
Em Genísío, já mais para as bandas de  Bragança, desde há dias já que prepara. afanosamente como todos os anos acontece, suas oferendas ao menino que vai nascer.
Ao soar da meia-noite, irão em cortejo alegre e buliçoso depositar junto ao presépio os ovos e as maçãs, os paios, os chouriços que todos consigo levam.  Que o Menino já nasceu – e vem fome.
Em Duas Igrejas, à roda da grande fogueira que tal como em todas as demais vilas e povoados de Trás-os-Montes arderão na noite de Natal, moços e moças de há muito catrapiscando-se, celebrarão seu «casamento a rigor, com padre e sacramento. Só que numa coragem súbita e aos olhos de todos, se darão entre si o braço e proclamarão bem alto, entre a galhofa geral, que «agora estamos casados». Como que numa espécie de juramento público, a anteceder o casamento que, mais tarde ou mais cedo, na verdade entre os dois se celebre. E tudo à volta fica, a partir daí, a saber do compromisso havido e que diante das palhinhas do presépio se assumiu. Para a vida e para a morte.
Mas porque o nascimento do menino é coisa de festa e própria para folgar, logo se dedica a cada uma das noites que se seguem à de Natal propriamente dita, um significado próprio. É esta a festa dos casados. Logo depois a dos solteiros. Com seus cantares próprios, suas mofas, seus dichotes, seus folguedos adequados. Dir-se-ia que para as gentes que entre as fragas morenas vivem, na terra fria e distante da lonjura portuguesa, o nascimento do Deus-Menino ganha de repente, em suas almas rudes e chãs, toda a força telúrica de uma imensa maravilhosa romaria popular. Em que a serra e os rios; os lobos; as ovelhas; turinas de fartos úberes; as pedras ásperas; as gentes curtidas de sóis e gelos, se confundem, afinal, no mesmo e único explodir de Natureza em festa.
Miranda do Douro - Página 2 Natal1978-07
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 14:12

O patriarca de Paradela

Com a chegada do Natal e a festa dos Reis, Paradela ganha nome, na boca do seu patriarca. É o senhor Francisco Martins, mais conhecido por «o Lérias».

Famoso entre as gentes da raia transmontana. É figura buscada repetidamente quer pelos jornais do Norte com sede no Porto, quer pela própria Televisão – a portuguesa e a espanhola, até. Porque nos seus setenta anos rijos, que dois olhos cheios de estranha luminosidade mais ainda animam, o senhor Lérias, de Paradela, torna-se na quadra festiva que chega, uma espécie de porta-voz do Senhor. Talvez melhor ainda: um outro Baptista, que não do Jordão, mas dos montes que, entre Miranda e Bragança, uns de encontro aos. outros tropeçam.

Ali o fomos também encontrar, na sua Paradela natal, passado que foi o povoado de Ifanes, choutando suas jericas com a pequenada à volta, os velhos dele se abeirando, enquanto de sua boca jorrava, ora em prosa de curioso sabor bíblico ora em verso ali mesmo improvisado, «a História maravilhosa do Filho de David e da sua palavra de Salvação». História que ele conta ao mesmo tempo que a vai comentando, numa filosofia muito sua e repassada de deliciosos conceitos regionais. Entre as serras; envolto na neblina do inverno cinzento e branco que à sua volta enregela; entre os homens e as crianças; entre os bichos e as casas rústicas – o patriarca de Paradela é, de repente, um estranho e curioso Auto da Natividade a uma só voz e um só intérprete.
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 14:15

ROCAS ENFEITADAS


Terra Portuguesa


Revista Ilustrada de Arqueologia Artística e Etnográfica


Natal de 1916


ROCAS ENFEITADAS

Miranda do Douro, na raia de Espanha, entestando com territórios do antigo reino de Leão, por quem foi muito influenciada, afasdada quasi um cento de quilometros das estações ferroviarias de Bragança ou Carviçaes, é ainda -emquanto espera um caminho de ferro que Ihe roubará metade do seu valor etnografico e, talvez, da sua felicidade economica, – o que se chama uma região inexplorada.
Linguisticamente, alguns autores – e todos razoavelmente mal, segundo afirmam os naturaes, que disso supoem entender melhor do que ninguem – investigaram de raizes, descobriram morfologias, publicaram documentos acêrca do denominado dialecto mirandês.
Arqueologicamente, um ou outro investigador recolheu vestigios materiaes dos remotos possuidores da terra, pre-romanos ou romanos. Etnograficamente, porem, póde dizer-se que está tudo por fazer.
Miranda do Douro - Página 2 Rocasenfeitadas01Fig. 1 - Mirandeza de Malhadas, fiando


A habitação mirandêsa, curiosissima na sua disposição estrutural e no seu recheio, os utensilios e os usos agricolas, os vestuarios tipicos ainda mantidos, sobretudo ao longo do Douro e nas freguesias raianas do norte, os custumes familiares, civis e religiosos, tudo merece urn estudo desenvolvido, cuidadoso, e,  principal mente, amorável.
Que Jupiter, pae dos deuses, nos defenda desses  etnografos empedernidos, em cujas mãos a mais delicada, sentida e perfumada produção da alma popular perde o viço e emurchece, como se fosse tocada de um pestífero!
Que perda incalculavel nao foi, por todos os motivos, a de Rocha Peixoto!
Mas que, depois de conhecida, não se tente tornar Miranda uma região de turismo! A sua linda capa de honras entraria a figurar nas entrudadas citadinas, e as suas moçoilas, pesadas e bisonhas, deixariam de vestir saias de xerga por’ elas proprias fiadas, e passariam a cantar ·couplets de revista arquitonta, que, por emquanto, – Deus seja louvado! – ainda lá não chegaram …
Para ca de Pinello começa o planalto, que depois se prolonga para o nascente, até às àguas do rio e, para o sul, até às serras do Mogadouro.
Por todo ele, terrenos ora schistosos ora graniticos, raramente mosqueados de afloramentos de marmore, como em Santo Adrião do Vimioso; largos cabeços de levissima ondulação; vales pouco profundos, onde o arvoredo se adensa; grandes aldeias rodeadas e entrecruzadas de troncos seculares de negrilhos ou de amoreiras, restos de veihas plantações; gados abundantes, que são a principal riqueza dos moradores. E eis, num bater de azas, no que consiste o planalto mirandês.
Nesta vasta região, fundamentalmente agricola e pastoril, os costumes, sem nada da aspereza serrana das nossas montanhas transmontanas ou dos planaltos barrosão e montemurense, conservam uma frescura e uma graça de primitividade feliz, que em parte alguma se torna mais a encontrar.
Miranda do Douro - Página 2 Rocasenfeitadas02Fig. 2 - Roca Mirandesa com prendedor

Nada de brutal, grosseiro, ou miseravel. Ao contrario: a gente mirandeza é polida, amavel, embora  desconfiada, e rica. Desenvolveu, no seu isolamento, uma civilização em que nada nos fere e que só se distingue da do resto da provincia em se conservar mais pitoresca e, porventura, mais feliz.
Uma das manifestações mais notaveis e, decerto, mais basilares desta civilização particularista, laivada ainda de traços de comunismo primitivo, é o trabalho feminil da fiação e tecelagem caseiras.
Pode dizer-se que a gente de Terra de Miranda se veste e se agasalha com a lã das suas canhonas (ovelhas), ou com o linho dos seus lameiros e encostas. Hoje ainda, quando já em todo o resto do pais a maior parte dos tecidos são fornecidos pelas fabricas, no planalto, a  mulher e o homem conservam, em grande parte, os seus vestuarios antigos de burel, com meia pisa ou pisa inteira.
Rocha Peixoto, no seu extraordinario artigo sobre o Trajo Serrano, um dos mais interessantes estudos etnograficos publicados até hoje, entre nós, deixou inventariadas as pec;as principaes e tipicas do vestuario regional.
Miranda do Douro - Página 2 Rocasenfeitadas03Fig. 3 - Ornatos desdobrados da vara

A moça espantadiça e perfeitaça da fig. 1 está vestida com o trajo carateristico da Terra: saia de xerga, ou burel, com meia pisa, tingido de negro; colete de seda com ramagens – talvez daquela mesma seda que se tecia aqui ou em terras de Bragança-, apertado com cordões e deixando entrever, cingindo os seios, a larga faixa vermelha de lã; bajú, o pitoresco casaquinho preto com as mangas presas em duas ordens de prégas, ao caír do ombro, e com o seu flamante, rebordado, rabécho, atrás; camisa de linho alvo com a góla guarnecida de rendinhas feitas à agulha; lenço de seda, de franjas, apertando a cabeça, no gosto classico da região. Nas orelhas, tem argolas; ao pescoço, cingido, um colar de perolas de ouro, filigranado; nas mãos a róca carregada de lã alvissima, apertada em manêlo por um baraço, e o fuso de grandes dimensões, em maçarocado já.
Miranda do Douro - Página 2 Rocasenfeitadas04Fig. 4 - «Roquil» de madeira de uma roca de Caçarelhos, com a ornamentação desdobrada

Está aqui, completo, o tipo da mulher do povo do planalto mirandês.
As velhas, conservam integralmente, religiosamente, este trajo, excétuando o colete e o lenço de seda, que só se usam em festas, e são substituidos, na vida quotidiana, por lenços e coletes de lã ou algodão.
Por seu turno, o homem veste-se de burel e cobre-se, de inverno, com a capa de honras, pesado e pitoresco agasalho feito de pardo ou canhona, burel completo e de cor natural, enfeitado com outro tingido de preto.
Quando não anda pelos campos, mourejando, como os homens e mais do que eles – é tradição, mentirosa mas significativa, de algumas terras que, emquanto a mulher ía lavrar, o homem ficava na taberna a fazer meia, – a mirandeza fia o linho, a estôpa e, principalmente, a lã, para peças de vestuario e para cobertôres, mantas e sacaria grossa. Todos os sacos que se usam na região são, efectivamente, de estôpa ou de lã, nos tons naturaes, ou divididos em faixas, alternadamente brancas e pardas. Algumas vezes, parte dessas faixas são tingidas por processos primitivos em côr de vinho, tal qual como soe fazer a gente rude das serras vizinhas de Castro Daire.
Aqui, portanto, melhor do que em qualquer outra parte, se pode aplicar, para a muIher, aquela sentença do rifão popular: «Mãe, que cousa é casar? Filha, é fiar, parir; chorar».
Se o movimento demografico acusa grande natalidade, não sei; agora, que as mirandezas passam metade da vida a fiar, disso póde qualquer assegurar-se percorrendo o planalto.
E é esse um dos grandes encantos da região. O que noutros sítios se faz isoladamente, tendo de procurar-se, para se poder estudar, e aqui geral; em toda a parte se nos patenteia o trabalho do linho ou da lã, como função indispensavel, basilar, da vida.
Miranda do Douro - Página 2 Rocasenfeitadas05Fig. 5 - Ornamentação de uma roca de Genizio

A mulher, velha ou nova, no tempo que Ihe fica livre do arranjo da habitação, fia sempre: dentro de casa, á porta da rua, quando vae para a fonte esperar a vez, quando segue para os campos guardar ou colher novidades, ou levar a comida a pessoas de familia. Para que as creanças não Ihe impeçam o trabalho, se tem de saír de casa, põenos às costas, dentro de uma especie de saco que fórma com o chale, precisamente como as negras, as japonesas, ou, mesmo na Europa, as ciganas e as suecas, que, para poderem servir-se livremente das mãos e fazer meia, as colocam dentro de um saquinho de pele, segura às cóstas com alças, como uma mochila.
Chamam a isto, aqui, poner los niños á chimchim.
Um dos mais pitorescos costumes da Terra de Miranda, relacionado com o trabalho da fiação, é, sem duvida, o do fiadouro.
Entrado outubro, já um pouco fresco e de dias mais curtos, e, depois, meses de inverno fóra, quando o tempo o permite, começa o mulherio das aldeias a reunir-se, á noite, nos fiadouros. No meio da rua, ao ar livre, em volta de uma fogueira que alumia e aquenta, reunem-se dez, vinte ou mais mulheres, velhas e novas, que querem seroar, trabalhando.
A casa mirandesa tem sempre, ao lado ou á frente, um pateo amplo, em parte coberto, cercado de muros, fechado por um grande  portão. É o cabanal. Apesar disso, o fiadouro faz-se na rua, sendo o recinto do cabanal só utilizado se chove em meio da partida.
A casa mirandesa tem sempre, ao lado ou á frente, um pateo amplo, em parte coberto, cercado de muros, fechado por um grande  portão. É o cabanal. Apesar disso, o fiadouro faz-se na rua, sendo o recinto do cabanal só utilizado se chove em meio da partida.
Miranda do Douro - Página 2 Rocasenfeitadas06Fig. 6 - Ornamentação de uma roca mirandeza

Cada uma das mulheres que comparecem deve trazer a sua mancheia de lenha, a sua gabéla de cavacos, troncos secos, brossa ou tascos, que são os palhuços que ficaram do linho, depois de batido e espadelado e tiradas a estopa a estopinha e as cabeças.Á roda do fogo, então, umas fiam, outras fazem meia, outras, finalmente, cantam, chalaceiam, divertem-se, namoram. As casadoiras quasi que não fazem mesmo outra cousa, pois, como é natural, o fiadouro não se reduz á assembleia feminina. Cercando as raparigas, aparece a mocidade do lugar ou da rua, parentes, amigos, conversados das presentes.Tive ocasião de assistir, casualmente, a um destes fiadouros, e a impressão que recolhi é das que tenho mais fortemente vincadas na memoria.
Seguia meu caminho, noite fechada, quando, ao lado da estrada, sobre a esquerda, divisei, rodeando o fogo alto e claro, um agrupamento ruidoso, que o meu guia designou logo com o nome genérico de fiadouro.
Imaginae um trecho de rua aldeã, em ligeiro pendor, irregular no piso e na largura, entre um portão de cabanal, larguissimo, a verga pesando sobre cachorros toscamente lavrados, e uma casa com alpendre aguentado em espéques desafeiçoados de madeira. Por tecto, o ceu estrelado, longinquo.
Miranda do Douro - Página 2 Rocasenfeitadas07Fig. 7 - Ornamentação de uma roca

Em róda da fogueira, duzia e meia de mulheres, velhas e novas, de casaquinhos curtos, as saias grossas, alargando, campanudas, os lenços cingidos á cabeça, como toucas, olhos luzindo do reverbero das chamas, nas faces largas, roliças ou encarquilhadas. Á volta delas os rapazes, de pé, as capas de honras, pardas, caindo dos ombros em pregas sobrias, nobres, quasi rigidas, as honras e as franjas das alêtas agitadas, irrequietas, saltitantes, conforme o movimento irregular das cabeças.
 
Miranda do Douro - Página 2 Rocasenfeitadas08Fig. 8 - Esmohas de estanho, de Malhadas
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 14:16

Galhófa, risos, derrête. Urn, tóca na fraita de madeira, bordada de feitios coloridos de vermelho, módinhas de gosto barbaro.
Outro, alterna com ele, gemendo no harmonium acompanhamentos ingenuos, cem vezes repetidos.
Ora em vez, um par, dois pares, erguem-se e dansam (1) umas cousas primitivas, alegres e compassadas.
Chega um ou outro curioso, de cara descoberta ou embuçado, com o carapuço da capa deitado sobre a cabeça, em biôco. Se vem de cara franca, conversa um bocado, ri, arrancha, ou segue o seu caminho para outro ponto; que, ás vezes, ha tres e quatro fiadouros na mesma terra. Se vem embuçado, é saudado com perguntas, cochichar desmarcado entre as novas, motejos, a ver se se dá a conhecer.
Quando o não faz, é algum rival despeitado, que vem gosar o gosto amargo de ver a sua preferida toda atenções para outro; ou então algum adepto doutro fiadouro a quem interessa examimar o andamento da função.
E assim se passa o tempo até altas horas, por vezes até ao cantar dos galos. Normal é, porém, que se termine a partida pela meia noite.
É natural que este costume se tenha conservado na região desde os tempos mais remotos, por ventura desde que o conhecimento da fiação ali chegou, trazido de fóra por algum barbaro indigena da pedra polida. Julgo que terá alguma rclação com esta usança primitiva a passagem de um Livro de Obitos da cidade de Miranda, dos anos de 1728 a 1786, que em nota transcrevo (2).
Na Beira Alta e no Minho, é costume, nas aldeias, reunirem-se mulheres e raparigas em serão para fiarem e fazerem meia, ora em casa de uma, ora de outra. Mas esses serões, embora alegres, São bem diferentes, por limitados na assistencia e na organização, das liberrimas reuniões de Terra de Miranda.
Por toda a zona raiana, que abrange os concelhos de Vimioso, Miranda e parte do do Mogadouro, as rócas aparecem–nos de urn tipo especial, carateristico, definido, generalizado, com exclusão, quasi, de outros tipos ..
Perto de uma das extremidades de uma vara de madeira, fazem-se dois entalhes circulares, bastante profundos, ao meio dos quaes se mete uma argolinha de cortiça, em geito de verticilus de fuso. Firmando nos entalhes mencionados os tôpos aguçados de uma serie de caninhas – quasi sempre 26 -, os construtores de rócas obteem uma gaióla biconica, formada de minusculas aduélas, imcompletamente unidas, que, para maior segurança, ora se entalham no rebôrdo da cortiça, ora se firmam sobre ela com uma cinta de couro, pregada com tachas amarelas. Essas tachas, porém, não se cravam nas canas, mas no intervalo que medeia entre aduéla e aduéla.
Como se vê, as fugas da róca passam aqui a ser extranhas á vara. A rodéla interior, essa, corresponde ao siso, ao cesoiro e ao rocão de outras bandas.
Na gaiola formada, metem, antes de a cerrarem, duas ou tres sementes, muitas vezes uns simples feijões, que, soltos no interior, denunciam sempre ruidosamente a, sua presença a cada deslocação do utensílio. Costume idêntico perdura na Sicilia, onde as pedrinhas que se deixam dentro da roca teem como fim principal o manter acordada, ao serão, a fiandeira, que, se se deixasse dormir fiando, podia ser atacada pelos maus espíritos.
Chamam a isto os ruges da róca.
Estas as partes fundamentaes. Resta sómente, agora, a decoração. O espaço que fica livre, para cima e para baixo do bôjo, pertence aos artistas.
E que artistas !
Tenho corrido o meu pais quasi por completo, estudando-o etnografica, arqueologica e artisticamente. Trago dentro em meu peito, como resa a cantiga, a lembrança amoravel e consoladora das suas paisagens risonhas e dos seus costumes particularistas; de memoria conservo a divisão das suas provincias de Etnografia Artistica, os trabalhos executados pelos trabalhadores ruraes e pelos pastores de todo Portugal. Em parte aIguma encontrei nunca arte rustica de tão recatado e acentuado carater, e de tão minuciosa execução.
Tenho descrito, quasi cantado, os Iavôres alentejanos e algarvios executados sobre madeira, cortiça e chifre, dos cajados, cossoiros, chavões, rôlhas, sovinos, tarros, caixas, colheres, etc. Estava convencido de que nada existiria, na decoração pupular miúda, que se lhe podesse comparar. Miranda veiu demonstrar, com as suas rócas, que os habitantes do planalto eram capazes de igualar, senão de superar, em bordados sobre madeira, os habitantes das planicies.
A arte popular alentejana difere essencialmente desta, porque é profundamente tradicional, empregando com inaudita frequencia a roseta sexifolia e a suastica, simbolos cuja representação tem acompanhado todas as civilizações, desde tempos remotissimos. Aqui, as figurações são todas biomorficas, e de mais minuciosa execução que os Iavôres ruraes do Alentejo.
Em meu entender, toda a arte popular portuguesa evoluciona entre dois tipos diversos de obras, que são tambem duas extraordinárias manifestações de engenho e execução: em grande, as cangas e jugos de entre Vouga e Lima; em pequeno, as rócas mirandesas.
Em Terra de Miranda, a parte inferior da róca ornamenta-se de forma diversa da da superior, que, em alguns pontos se denomina as torres. E, na verdade, todo furado de janelinhas, quadrangulares ou de volta redonda, o tronco da vara lembra, sem contestação, uma torre, que, em alguns casos, aparece até provida de minusculos sinos.
Nos espaços que medeiam entre as ventanilhas, encurvam-se traços de flores ou alinham-se fiadas de riscos, em geito de nervura de folha ou espinha de peixe.
A gaiola do bôjo recebe tambem algumas vezes a sua ornamentação, levemente riscada sobre as aduelasinhas que a campôem.
Na parte inferior é que, porem, se manifesta, exuberantemente, a arte rustica mirandesa.
Em faixas, separadas par massas cerradas de desenhos com caracter geometrico, acumulam-se as representações fito, skuo, ou biomorficas: flôres; frutos; corações floridos; corações rodeados das encantadas chaves de os abrir; o altar em que os dois se hão-de casar, as alfaias sagradas – calix, custodia, castiçães, sacrario – alinhadas sabre a banqueta: o nome dela, ou a seu apelido – «Ana Maria» ou «Babula»; dedicatorias ingenuas, como a da fig. 7: ESTA ROCA.ADE: SER; EM TUDO FERVUROZA. CACARI(L)HOS. ANNO D 1883.
Noutras tiras, peixes, uma cobra, uma rã, cães ou raposas, um picapau, um marcêgo, uma arvela, qualquer outro animal conhecido ou peculiar da região.
Frequentemente, as figuras dos dois: o namorado que borda e aferece a róca, e a dona do seu pensamento, representados com as atributos respectivos. Na fig. 4, o homem segura na mão direita a ferramenta do oficio; ela, num braço, um ramo de flôres, no outro, uma armação de madeira em que, na região, se conduzem os bolas de noivado.
Julguei, ao principio, que o objecto fosse um esquadro ou nivel, a antiga libella de pedreiro; mas, como é ela que a segura, não Ihe vejo outra interpretação. Na fig. 6, ele, o sexo bem definido, a espingarda ao lado, extende a mão esquerda sabre o coração onde ela pousa tambem a sua dextra. Ela é bem a mulher de Miranda, acampanhada da sua róca, onde o prendedor se dívisa nitidamente, e do longo fuso regional.
Varia tambem um pouco, de terra para terra, a nomenclatura das partes componentes do popular instrumento de fiação.
No Vimioso, á parte superior chamam as torres da roca; ao bôja, roquilho; á correia de segurar o fuso, prendedôr ou descanso; ao baraço de envalver a manélo, cinta ou correia; á agulheta em que esse baraça termina, espicha. O linho encoifa-se com o cartapácio.
Em Campo de Viboras, temos os nomes de vara, roquil, correia, espicha e cartapaço (que é, geralmente, feito com cartas de jogar). Obram-se aqui, no dizer dos habilantes, rocas mui guapas.
Em Caçarelhos encontramos a vara com a sua cabeça (parte superior), a roquil, formado de costelas, a prendedôr, a correia de manêlos e o cartapaço.
A pouca distancia desta aldeia, em Genizio, ouvi chamar á parte superior da vara roquil ou roquilho – é possivel que o meu informador se enganasse –; ao bôjo, côstas; á parte inferior, rabo. Os nomes restantes são comuns. Ha em Genizio um fuseiro e varios roqueiros, que, por $J20 fazem já uma róca bem guapa.
Todas (3) as de Malhadas usam no extremo da correia uma espicha de estanho, lavrada de desenhos.
Na propria cidade de Miranda, a terminolagia é, pouco mais ou menos, a mesma.
Informou-me a tecedeira que móra «aos Quarteis» de que, ao passo que nas aldeias chamam copo á rocada de lã, na cidade Ihe chamam manêlo. Efectivamente, á medida que se caminha para o sul, essa designação aldeã e a mais empregada.
Sendim do Douro, na raia, terra grande e rica, chegada ao rio, tem fama nos conceIhos de Miranda e Mogadouro, pelo trabalho das suas rócas: Ha-as de variadissima ornamentação, com as varas vestidas em grande parte de estanho, floreadas tal qual como se fossem de madeira. Botou fama por longe, no seu tempo, o Antonio Patalão, que as lavrava como poucos!
No Museu Municipal de Bragança, existem, entre outros objectos etnograficos dignos de nota, duas rócas da região mirandesa, uma das quaes entrada para o edificio já em 1897. Ha muito, portanto, que a forma e a decoração do utensilio de fiação preocupavam os investigadores regionaes.
Uma é do tipo vulgar, atrás descrito, apresentando torres bem enfeitadas, e as aduelazinhas de cana unidas á vara e á rodela inferior com tres fitinhas de seda, pregadas com tachas amarelas. A outra, proveniente da freguesia raiana de Angueira, tem o roquil em forma de cabaça e é totalmente revestida de palha tingida de verde e amarelo, em dois tons.
E aqui se interrompem as minhas notas sobre o utensilio principal da fiação mirandesa.
Que proveito e que conclusões se poderão tirar deste longo e, porventura, fastidioso estudo?
Alem das indicações sobre uma industria popular, tipica, e sobre costumes regionaes, deixadas no decorrer dele, fica estabelecida, em primeiro lugar, a persistencia do uso do popular instrumento de fiação, entre nós, no ano da graça, ou de desgraça, de 1916. Em segundo lugar, marca-se para a arte regional mirandesa o posto que lhe cabe.
Do estudo que tenho realizado acêrca da nossa arte popular, julgo poder concluir que os seus documentos aparecem escalonados, em ordem ascendente, em três categorias ou estilos, que abrangem:
1.° Estilo. Ornatos geometricos.
2.° Estilo. Ornatos geometricos; motivos naturalisticos, biomorficos e skuomorficos.
3.º Estilo. Ornatos geometricos; motivos naturalisticos, biomorficos e skuomorficos; motivos tradicionaes.
Não desenvolvo, nem justifico, agora, esta divisão.
Basta dizer, com referencia ao lavôr artistico manifestado nas rócas, que os habitantes do planalto de Montemuro e os de parte de Trás-os-Montes, se encontram ainda no estádio dos ornatos geometricos, simples.
Desde o neolitico que se conservam nele. Passaram os seculos, caíram, umas após outras, as civilizações, e eles permaneceram na sua rudeza inabalavel, tal como grande numero de tribus africanas, cuja arte decorativa apresenta uma quasi identidade de formas e processos com a deles.
A gente da Terra de Miranda encontra-se no segundo estadio. Representa a vida, tal como a vê, como a concebe estreitamente. É Iimitada e é feliz.
No terceiro estilo, inaplicavel ás rócas, cabe a arte dos jugueiros interamnenses e a dos pastores alentejanos. Caracteriza-se pelo emprego da roseta sexifolia e do suastica.
O que é maravilhoso, é como, sendo a região de Miranda o mais rico foculare português da representação destes dois simbolos nos tempos romanos, o povo não os incorporou, ahi, decisivamente, na escala dos seus motivos ornamentaes.
E para concluir. Todas estas obras decorativas juntas, não valem, sequer, eu sei, a mais modesta figurinha de presepio setecentesco.
Nem por isso devemos deixar de as descrever e reproduzir, pois elas são a mais pura e genuina manifestação estética da alma popular, ignorante e rude, mas sincera.
Lisboa, Dezembro de 1916 (Desenhos do autor).
(1) Grandes dansadores os da Terra de Miranda! Quando se quer significar que uma coisa é própria para outra, indispensavel mesmo, emprega-se, para termo de comparação: «Como as de Malhadas para a dança».
Quem não se lembra ainda da dança dos paulitos, que, no centenário de 1898, embasbacou os lisboetas?
(2) «Aos vinte e seis dias do mes de Janeyro nesta, digo, de mil setecentos e secenta e dois nesta cidade de Miranda com idade de secenta e cinco annos pouco mais ou menos faleceo da vida presente Maria. Martins Montejra viuva que ficou de Pedro Sebastião moradora nesta cidade, e natural de Uva. Não se sabe a que horas morreo, nem levou sacramento algum por que hontem que se contavão vinte cinco do mesmo mes estava boa e de saude e esteve a fiar the dishoras da nojte, como alcancei por informação … ».
(3) Que o leitor, se algum dia passar em Malhadas. risque do seu vocabulario a palavra todas.
As mulheres do povo consideram o seu emprego um irreparavel ultrage para a sua honra colectiva.
Vergílio Correia – Historiador de arte (Peso da Régua, 19.10.1888 – Coimbra, 3.6.1944). Formou-se em Direito na Universidade de Coimbra, em 1911, que iria ainda conferir-lhe o grau de doutor em Letras, em 1935, e nela regeu as cadeiras de estética e História de Arte (desde 1921) e de Arqueologia (a partir de 1923).
Foi conservador do Museu Etnológico Português (1912) e do Museu Nacional de Arte Antiga (1915), vindo a assumir a direcção do Museu Machado de Castro (1929) em acumulação com a sua actividade de professor.
Fundou as revistas Arte e Arqueologia (1930) e Terra Portuguesa (1916) e dirigiu o Diário de Coimbra (1938-1944).
Publicou valiosos estudos sobre a história da arte portuguesa, arqueologia e etnografia. Estreou-se com os volumes A Igreja de Lourosa da Serra da Estrela, 1912, e Etnografia Artística, 1916.
Outras obras dignas de realce: Vasco Fernandes, 1924, Pintores Portugueses dos Séculos XV e XVI, 1928, A Arquitectura em Portugal no Século XVI, 1929, A Escultura em Portugal, Os Séculos XII, XII e XIV, A Arte em Coimbra e Arredores, 1949, Azulejos, 1956, e Obras, 1946-1978, em cinco volumes.
A morte prematura, em 1944, interrompeu uma carreira brilhante, indissociável do Inventário Artístico Nacional e da investigação de Conímbriga e do criptopórtico de Aeminium.
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 14:19

Danças Mirandesas - Apresentação

Neste capítulo sobre danças de Terra de Miranda vamos apresentar algumas danças paralelas, também alguns repasseados, e, apenas, duas danças a dois.

Na panoramica geral da coreografia popular mirandesa, que apresentamos e ainda pouco dos muitos e ariados bailados populares mirandeses, que se dançam com ou sem coros, om ou sem musica, e, muitas vezes com o assobio pastoril.
Para levar a cabo um trabalho que abrangesse a grande tão significativa riqueza da coreografia popular de Terra de Miranda, seriam precisos vários anos de trabalho exaustivo com um grupo de colaboradores valorosos e adestrados.
Limitamo-nos, por agora, a tratar cinco bailados paralelos ou de coluna – o Galandum, o Pingacho, Ligas Berdes, o Maganão e o Redondo, oito bailados repasseados – As Geriboilas, a Solidana, o Verde Gaio, Para namorar morena, Fui-me a confessar, o Maripum, o Balentim Tras-tras e a Madre Abadessa, e duas danças a dois – a Fraile Cornudo e o Mira-me Miguel.

Bailados paralelos

Os bailados paralelos, também chamados de coluna, são caracterizados por, no começo da dança, os pares se dispôrem em duas filas paralelas em que homens e mulheres se colocam frente a frente.
São comuns na Terra de Miranda e frequentes em quase todas as aldeias deste recanto do Entre-Sabor-e-Douro e ainda noutras regiões do Leste de Trás-os-Montes.
Ainda no mês de Outubro de 1980 vimos (A. M.) um grupo de rapazes e raparigas de Rio de Onor dançar, ao som de gaita de fole, danças paralelas semelhantes às mirandesas.
Estudamos os seguintes bailados paralelos: o Galadum, o Pingacho, Ligas Berdes, o Maganão e o Redondo.
Os dois primeiros foram publicados in «Douro Litoral», Boletim da Comissao Provincial de Etnografia e História, o primeiro em 1953 e o segundo em 1957, que agora se republicam com alguns acrescentos.

Coreografia Popular Transmontana        Prof. Santos Junior
                                                         Dr. António Mourinho
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 14:21

Danças Mirandesas - Conclusões

Este nosso trabalho, feito em muitos anos de convivência em convívio directo com o povo e com as suas manifestações Iúdricas, musicais e coreográficas, abordou o estudo de danças do Entre-Sabor-e-Douro, mas não de todas, pois há mais algumas que não puderam ser estudadas, quer de tradição recente, quer de tradição remota ainda com maior ou menor vivência, especialmente na Terra de Miranda.
Quer dizer então quanto a Trás-os-Montes?
Oxalá que um dia se venha a fazer o estudo íntegro de todas as manifestações lúdricas de toda a província de Trás-os-Montes, quina sagrada do nosso sacrossanto Portugal, onde há tantas relíquias etnográficas, de velhos e patriarcais usos e costumes, que se pode, com toda a propriedade, chamar-lhe relicário da etnografia portuguesa.
Sobre as danças de Moncorvo apenas duas palavras.
A Dança dos Pretos é uma criação calendárica de celebração solsticial de inverno, sustentada pela Confraria de Nossa Senhora do Rosário de Moncorvo, para festejar, pelas ruas da mesma vila, o nascimento de Jesus, no Dia de Reis.
A letra é expressão inspiradora da salvação dos dançantes e ouvintes, em forma de prece e de louvor.
A coreografia enquadra-se bem nas danças de composição paralela ou de coluna, muito do gosto dos séculos XVII e XVIII, que proliferaram por toda a parte, principalmente nas confrarias de mesteirais que tomavam parte nas procissões solenes do Santíssimo Sacramento, com seus santos padroeiros, seus estandartes, seus instrumentos musicais e dançantes.
A Dança das Fitas é uma dança, pode dizer-se, dispersa por todos os continentes do globo. Está ligada às celebrações da Primavera, e é simbólica dança da fertilidade, de culto e homenagem ao ressurgimento do cicIo da flora, garantia da perenidade da vida sobre a terra.
A dança satírica do Felgar está ligada às celebrações críticas e jocosas do Carnaval.
Quanto às danças mirandesas pouco mais teremos a dizer.
Simplesmente que foi o próprio povo rústico da Terra de Miranda que as criou, ou adaptou, como expressões de alegria colectiva, e festiva das tardes domingueiras do ano, excepto no Advento e Quaresma, tempos clausos para o canto e a dança profanas.
No entanto, algumas tinham os seus dias grandes no ano, como o Pingacho, o Galandum, as Ligas Berdes e o Redondo, nas festas de inverno, em honra de Santa Catarina, em Ifanes, Miranda do Douro, a 25 de Novembro, de Santo Estevão e S. João, nos dias 26 e 27 de Dezembro, em Duas Igrejas.
Os repasseados, em número de uma dúzia (os que conhecemos) tinham também os seus dias maiores, nas festas citadas, e em todas as aldeias deste Nordeste Trasmontano, durante a tarde e a noite, ao toque da gaita de fole, da caixa e do bombo, ou simplesmente da flauta pastoril e do tamboril, actualmente do realejo, com carácter mais universalizado, em todas as festas das aldeias, quer de inverno quer de primavera, quer ainda do fim do verão, estas consideradas como as festas das colheitas.
Os repasseados eram longa e exuberantemente dançados nas romarias da Santíssima Trindade, de Fonte de Aldeia, da Senhora do Rosário, de S. Pedro da Silva, da Senhora da Luz, de Constantim, da Senhora do Naso, da Póvoa, todas do concelho de Miranda do Douro, e em Duas Igrejas e em Sendim, em 15 de Agosto e nos dias Santos de Natal. Recordo com saudade (A. M.) como os pares rodopiavam nos repasseados ponteados ao toque das gaitas de fole sopradas e ponteadas pelo Tio Pepe de Freixiosa e por Silvestre Louçano de Vila-Chã Os rapazes, com botas de bezerro branco, calças e jaquetas de serguilha lustrosa e grande chapéu, camisa branca de linho de cantos redondos, e chapéu de aba larga. As moças ainda de saia rodada de 22 palmos de roda, de pano de saragoça, preto, castanho ou azul, com barra de veludo, ou já liviadas no peso, de castorina ou outro pano de la, com barras e vivos de seda acordoada ou veludilho, casaca do mesmo pano grosso e lenço de lã colorido, de barra ligeiramente esfiapada. Era de ver os rapazes irem com ligeireza ao centro da roda dar duas meias voltas, a maneira de galarozes, sem perder o ritmo do repasseado, nem os seus lugares, nem os seus pares.
Sentia-se que algo de telúrieo havia nestas danças e sente-se ainda hoje a mesma expressão telúrica e forte vibração, quando o atavismo e o mesmo sangue ainda lhe corre nas veias.
A Terra de Miranda, no extremo Nordeste de Portugal, que tem como capital a velha e nobre cidade de Miranda do Douro, tem conservado estas danças espontâneas e bem exclusivamente suas, além do seu dialecto, o mirandês, e de um conjunto de velhos usos e costumes que merecem cuidadoso estudo e carinhoso amparo.
Os autores, como dissemos atrás, há anos que se dedicam, em estreita colaboração, ao estudo do folclore trasmontano.
Na medida em que as ocupações presentes de cada um o têm permitido, as observações e recolhas tèm sido feitas mais ou menos interpoladas, mas sempre dentro do plano unitário do colheita e estudo destas reIíquias etnográficas, que não são poucas. Muitas mais ainda se conservam cheias de salutar vivencia no povo de Trás-os-Montes, e, de modo especial, no da Terra de Miranda. Mas por quanta tempo?
Dos apontamentos e notas recolhidas, sucessivamente acrescidos e ajustados, surgiu o presente trabalho que não julgamos perfeito porque ninguém neste mundo realiza um trabalho perfeito. Com as deficiências que porventura forem encontradas, sejam-nos estas relevadas e permita-se, ao menos, reconhecer a boa vontade que tivemos de registar e conservar, para a história e a vida do folclore nacional, estas manifestações do património cultural que o povo criou e mantem ainda vivas.
Os bailados mirandeses de coluna ou paralelos, de dois dos quais fazemos a publicação nesta colectânea, o Galadum e o Pingacho, são da mesma família coreográfica, mas de musicas e letras diferentes, e a própria coreografia também algo difere, aos quais acrescentamos as «Ligas Berdes», que também se chamava antigamente Habas Berdes, o que nos faz conjecturar ser a sua origem espanhola, bem como o Maganão.
Ainda nos ficam de fora mais alguns para outra oportunidade, se nos sobrar o tempo e a saúde.
Os três primeiros têm letra em puro dialecto mirandês, só o «Maganão» tem letra em português. Cremos (A. M.) que o P. Firmino Martins já registou esta letra como bailado, sem o especificar, no seu «Folclore do Concelho de Vinhais», vol. I, pág. 544.
O significado dos dois últimos não difere do significado que se dá àcerca dos dois primeiros, dos quais fizemos um estudo exaustivo.
Quanto aos repasseados, que são expressão coreográfica puramente mirandesa, julgamo-Ios de criação autóctone. Ainda pensamos que teriam qualquer familiaridade com a Murinheira Galega (creio que o disse algures e em algum tempo, ou o escrevi (A. M.), mas, depois de ter observado bem a coreografia da «Murinheira», nada encontramos nela de familiar com os repasseados mirandeses.
Estes constituem um numeroso grupo de danças que conservam simultaneamente viva, elegante e simples, uma das mais puras expressões da coreografia popular não só mirandesa e trasmontana, mas também portuguesa e peninsular.
Estes repasseados constituem uma verdadeira família coreográfica, tendente a aumentar em número (a qualidade e sempre a mesma) que se executam sempre por grupos de 4 dançantes mixtos, múltiplos de 4. Quanto maior for o número de grupos mais rica se toma a sua expressão panorâmica e mais espectacular a sua roda e a individualização dos grupos em autentico formigueiro dançante, com graça e certeza de passos.
É um bailado de terreiro que tanto se executa ao som de canto, com ou sem acompanhamento instrumental, como só ao toque dos instrumentos de música local e popular, como a gaita de fole, caixa e bombo, a flauta pastoril monotubular, de três orifícios, o tamboril, o realejo, o bombo e ferrinhos.
Actualmente também aparece já a ser dançado nos terreiros das nossas aldeias ao toque do acordeon, ferrinhos e bombo.
Referimo-nos atras (A. M.) às romarias do Naso, da Trindade e de Duas Igrejas, em que se bailava o repassado durante dois dias e duas noites, sobretudo no Naso. Os pastores, pastoras e boieiros, iam preparados e aparelhados, para dançarem ao desafio em grupos isolados. Num grande campo, por toda a parte, se viam e ouviam os realejos e os pares dançando sem parança. Os próprios tocadores eram bailadores. Então sim, era expressão campestre de alegria, bem pura e espontânea, de uma mocidade, que vivia o seu mundo de tradição e da própria natureza rural.
Cronologicamente não nos é fácil estabelecer datas de origem, mas a sua expressão circular inicial e o namoro repasseado frente a frente com singular galanteio, levam-nos para trás do século XVII.
A letra traduz-se em quadras de redondilha, sempre menor, para os passos repassados, as vezes redondilha maior para as partes circulares, em Solidana, Para Namorar Morena, Verde Gaio e Maripum, e menor nas circulares de Giriboilas, Fui-me a Confessar, Madre Abadessa e Balentim Trás Trás. De todos os repasseados, serão as Giriboilas o mais castiço e primitivo, ;cuja letra, como a de Para Namorar Morena, são em mirandês puro. Os outros têm letra em português, fruto de posterior criação popular.
Estes bailados são expressão de pura rusticidade. Não cremos que tenham tido qualquer influência vinda de salões aristocráticos, que nesta zona, apenas os houve no renascimento, na velha cidade de Miranda, mas que não devem ter influenciado nesta matéria os aldeãos, que se viram fulminados pelos bispos dos séculos XVII e XVIII, nas disposições das visitas pastorais, com penas que iam desde multa pecuniária à prisão e excomunhão (1).
Não incluímos aqui os bailados repasseados de acompanhamento simplesmente instrumental, que como dissemos ficam para outra ocasião.
Iniciamos estes singulares bailados repasseados pelas Geriboilas, que julgamos o mais antigo e castiço com estudo permenorizado e indicação dos vários passos da dança, indicados como padrão, em desenhos coreográficos esquemáticos com a respéctiva letra.
Corno os vários repasseados são todos do mesmo tipo das «Giriboilas» (12), visto que os seus passos e trespasses são perfeitamente sobreponíveis, limitamo-nos a apontar para cada um aquilo que os distingue, quer por ser mais rápido, ou mais lento, ou mais ou menos pulado, nesta ou naquela fase do conjunto coreográfico.
No discorrer do estudo de algumas danças, por acidental comparação, referimo-nos a um ou outro aspecto de manifestação etnográficas similares noutras regiões.
O tema merecia análise comparativa mais demorada para melhor sistematização dos aspectos similares, ou como seu enquadramento nos complexos da cultura popular tradicional, ou em determinados estados de evolução.
Mas como dissemos atrás, e repetimos novamente, a tarefa seria longa e custosa.
Bem é prevenir a quem não esteja familiarizado com os modernos estudos etnográficos de Folclore, que certos aspectos de expressão da alma e da vida tradicional dos povos estão bem longe de serem aquilo que muitos supõem: simples mascaradas burlescas ou puros devaneios de imaginações mais ou menos delirantes.
As criações populares que a tradição e o uso consagraram são criações sérias, instrumentos e elementos da vivência popular, expressões culturais que fazem parte do património cultural e espiritual das regiões e das pátrias.
Há longínquas e respeitáveis origens magico-anímicas, em muitos aspectos, ou manifestações etnográficas, embora algumas à primeira vista pareçam absurdas e porventura ridículas.
Todas têm as suas motivações e podem ser elos preciosos de uma cadeia de factos culturais, que nos levam a enriquecer e enobrecer cientificamente a História e a Antropologia Cultural.
O nosso povo sempre soube, e sabe, cantar, bailar e rir.
O canto, e a dança refletem muitas vezes, indole milenária de emoções dos mais variados estados de alma. Tantas vezes exteriorizam sentimentos profundos de veneração e culto pelas forças da Natureza, criadora da renovação cíclica das plantas, com suas flores, frutos e sementes, renovação que é, essencialmente, razão da continuidade da vida na Terra.
Setembro de 1980.
Senhor Galandum
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 14:22

(1) Vale a pena transcrever o códice, que segue, provisão do bispo de Miranda D. Frei Aleixo, dada em Duas Igrejas, aos 26 de Outubro de 1760.

– «Temos noticia que, neste lugar de Duas Igrejas não há festividade maior em que não deixem de sair com sua Comedia pública, acabando com várias Danças de homens com mulheres;·e porque semelhantes representações induzem hum adjunto que he a occasião de muitos escandalos e pecados, misturando assim o profano com o Sagrado e, tudo originado das Comédias que continuamente fazem, principalmente na ultima Oitava da Paschoa, na festividade de Santa Bárbara: pelo que mandamos ao Reverendo Párocho, sob pena de suspensão de suas Ordens e as mais a nosso Arbítrio totalmente impidão semelhantes Comedias, feitas a titulo de Devoção; porque senão impedimos aos Povos os seus divertimentos, não podemos consentir estes como cultos oferecidos aos Santos, porque seria consentirmos uma Chimera … ».
Era a lei do chicote que de nada valeu, e o povo de Duas Igrejas, continuou a exibir na Festa de Santa Barbara, ou «Festa das Flores», a mesma «Dança das Flores», até aos nossos dias e a fazer a Pandorca, ou cortejo de chocalhos em volta das fogueiras, à porta de todas as casas, na véspera da mesma, ou seja no sábado (em vez do arraial, com aglomerado e baile colectivo), com os cânticos de grupos a Santa Barbara, pedindo livre os «trigos e centeios», «também os serôdios», de «Raios e pedras» enquanto os rapazes, os gaiteiros e os mordomos, vão circundando todas as fogueiras que na noite se vão acendendo às portas das habitações, como chama propiciatória à Santa Virgem e Mártir Bárbara, padroeira contra as trovoadas, como celebração de Maio.
Mas no capitulo 16 das disposições sobre a mesma visita pastoral determina mais o seguinte, com terríveis ameaças que de nada valeram, porque os povos continuam e as tradições têm muita força, pois foram e serão sempre um «impulso vivo», como Ihe chamou urn dia em urn congresso de História, o Prof. de História Medieval da Universidade de Barcelona, Doutor Emilio Saiz. Eis a disposição episcopal: «E porque devemos atalhar os pecados e escândalos que nascem de dançarem homens com mulheres, e que já se tem proibido por pastorais de nossos antecessores, para desviarem ruínas espirituais que se seguem de similhantes danças, de que anda sendo guia o inimigo comum; mandamos aos Reverendos Parochos prohibão totalmente semelhantes desordens; e sob pena de suspensão Ihes determinamos condenne as mulheres q. se meterem a dançar com os homens, e aos homens que se meterem a dançar com as mulheres pela primeira vez em dez tostões; e na segunda, nos dê parte p.a Ihes fazermas pagarem dous mil reis de Aljube; e não querendo pagar a dita condenação primeira de dez tostões, dentro de três dias, os evite p.a fora da Igreja, e carregando-lhe as censuras atté de participantes, e pagando os absolvão».
No capitulo seguinte, os compara com «os Bárbaros e Gentilismo». Cap.o 17. «- E porque sabemos que os moradores deste lugar imitando os Bárbaros e Gentilismo costumão aplaudir as suas festas com lutas» …
Estas seriam as lutas entre casados e solteiros, na festa de S. João, em 27 de Dezembro, na cerimónia do Encerramento do Corregedor em que solteiros e casados, antes da missa da festa, lutavam por vezes durante várias horas, para não deixar encerrar o corregedor, que era, e é ainda, o ultimo rapaz que casou nesse ano na povoação, e depois de várias andanças aos ombros dos dois mordomos de S. João, que são sempre solteiros, o corregedor é encerrado no curral da casa da Abadia, mas os casados não o querem deixar encerrar, opondo-se às portas do mesmo curral, que são de carro, para ande os mordomos que o levam aos ombros, depois da última jornada ao som dos gaiteiros, tentam atirá-Io. Então se gera a luta e castumam vencer os casados que têm levado os salteiros a reboque, corpo a corpo, a mais de trezentos metros de distência. Para essa luta, constumavam levar os fatos mais velhos, donde sempre saiam para mais não poderem ser vestidos.
Lembramos que S. Martinho de Braga em seu «De Carrectione Rusticorum» já no séc. v se levanta contra as celebrações salsticiais e calendaricas dos seus cristãos suevos, nossos antepassadas. Costumes que eles traziam do Gentilismo, e como o Douro continuou a correr para o mar, as festas da Rusticidade, continuaram até aos nossos dias, no ultimo quartel da século xx. De nada valeram as combinações despóticas, porque nunca se quis reconhecer a verdadeira alma do povo, «a alma funda das gerações», como lhe chamou o grande Pontífice Pio XII. (Ver António Maria Mourinho, «A Dança na Antiguidade e na Idade Média», in «Revista de Dialectalogia y Tradiciones Populares», Tomo XXXII, Madrid, 1976- ADERNOS 1.°, 2.°, 3.° y 4.° págs. 382-383; e «DE CORRECTIONE RUSTlCORUM” de S. Martinha de Braga, in «HESPAÑA SAGRADA», Tomo xv, págs. 425-433» Apend. 3, «SANCTI MARTINI RAGARENSIS Opera».
Esta gente da Riba Daura, e muita particularmente das povoações confinantes com as suas arribas, são de forte descendência castreja pre e proto-histórica, e Duas Igrejas é uma das de maior documentação arqueológica e socio-cultural.
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 14:23

Danças Mirandesas - Balentim, Trás, Trás! ...


Este bailado repasseado é de extrema rapidez. As suas voltas coreográficas desenvolvem-se segundo as desenhos das giriboilas, para todos os efeitos. A sua letra é de tema curto, repetindo-se sempre as duas redondilhas, com o respectivo estribilho.Foi trazido cerca de 1950 para Duas Igrejas, por rapazinhos ciganos, aqui nascidos e criados.

Aquel rapaz,
Das botas amarelas,
Já me perguntou,
Se eu era donzela,

Se eu era donzela,
E eu que sou, que sou?
Aquél rapaz
Já me perguntou …

Estribilho
Só quero o Balantim,
Balantim, Trás, Trás! …
Só quero o Balantim,
Que há-de ser o meu rapaz!.

Repete a primeira parte, depois a segunda, até quatro ou cinco voltas.
Miranda do Douro - Página 2 Balentim01Fig. 1 - Musica do bailada Balentim, Trás, Trás.


Última edição por Senhor Galandum em 6/2/2024, 14:42, editado 1 vez(es)
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 14:30

Danças Mirandesas - Fraile Cornudo


Este bailado é do tipo dança a dois, isto é, no terreiro, de cada vez só dança um par. Todos os outros formam roda, tocando e cantando, à espera que lhe chegue a vez de irem a terreiro dar prova das suas capacidades coreográficas.
Esta canção e bailado e de nítida importação espanhola.
De quando? Não sabemos. E por quem? Possivelmente por emigrantes, ou ceifeiros que, para as zonas de Burgos e Salamanca, daqui partiam em meados de Julho e regressavam em meados de Agosto. Também pode ter sido trazida por contrabandistas, ou por soldados, durante vários ciclos guerreiros que esta região sofreu, mais frequentes nas guerras da Restauração e na da Sucessão de Espanha, em que a praça forte de Miranda esteve ocupada um ano e meses por tropas espanholas, ou ainda na Guerra dos Sete Anos, 1762-63.
Domingo Hergueta y Martin, no seu já citado Folklore Burgalês, Burgos, 1928, pags. 102-105, transcreve três ou quatro versões de El Trepoletrê em que se mistura e confunde a Geringonça ou Cirigoça, com El Trepoletré e Geringonça del Fraile. Numa passagem de El Trepoletre (1), cita-se mesmo:

El Trepoletré
Que yo quiero bailar con usted
Dejadmele solo
A mi perindolo,
Que le quiero ver bailar
Danzar y brincar,
Y escaramujear
Y andar por el aire.
Aire, aire, aire, …

………………………………

Esta es la tonadita
Que trujo un fraile,
Fraile Francisco,
Francisco fraile,
Que descalzo y desnudo
Va por la calle.
Busca una amiga tuya
Que te acompañe.
Con su Gerigonza.
Ay! Que bien que la baila ese mozo.
Dicen cantando
Que a ese mozo Ie gusta el fandango.
Dejarle solo, dejarle soJo. (Queda solo bailando).
Ay! Que bien que la baila ese mozo,
Dicen cantando
Que a ese mozo Ie gusta el fandango.
Busque compaña. (Busca compañnia).
Baile usted y ande usted por el aire
Que esta es la Gerigonza del Fraile,
Con su Gerigonza.
Ay! Que bien que la baila esa moza,
Dicen cantando
Que a esa moza la gusta el fandango,
Dejarla sola, dejarla sola. (Queda sola bailando).

Modernamente se ha modificado algo la musica y letra de este baile, haciendolas de aire más ligero y aun variándolas, segun las localidades. Esta diversión suele utilizarse para pasar alegremente las veladas o tresnochos, donde los hombres hablan de sus asuntos, las mujeres hilan y las mozas y mozos cantan y bailan, y tambien por el dia, en los de fiestal,como pasa en el Valle de Valdivielso, y aun en las ruedas que formam las muchachas solas en Torresandino. Generalmente se reunen gran número de mujeres y de hombres en lugar a propósito, donde suelen lucir sus habilidades coreográficas los bailarines, pues se ha de advertir que éstos bailan solos, une vez una mujer y otra vez un hombre, como lo indica el cantar, cuyo contenido ha de seguir o imitar el bailador, so pena de un crédito muy vergonzoso como tal. Para animarles y aun para cansarles, los cantadores y el que toca algun instrumento, aunque sea unos hierrillos o formado de cañas a las que hieren con un cuerpo duro, agregan letrillas y mas letrillas.
Puesta una pareja en el centro del local, comienzan todos a cantar a lo llano una copla de cuatro versos, como ésta:

Y eres hermosa en el dar
Y graciosa en el pedir;
Para todo tienes sal,
Hasta en el mismo dormir.

A canção é acompanhada de pandeiros, pandeiretas, ferrinhos, castanholas, conchas e palmas e continua até se esgotarem os bailadores no terreiro.
Miranda do Douro - Página 2 Fraile-cornudo01

                                                       Música da dança a dois Fraile cornudo.

Y ahora viene el estribillo, que varia según los lugares y según quede bailando solo hombre o mujer. Cuando queda esta:

La Gerigonza,
Por lo bien que la baila esta moza
Déjala sola.
………………………………
A el Tenterentén,
Que déjela usted
Sola, sola.
………………………………
Y al Trempolentrén,
Allá va dama
Por usted.
………………………………
Miranda do Douro - Página 2 Fraile-cornudo02Fig. 1 - Entrou um par e de entrada e a assistência canta: «Fraile cornudo echa-te al baile».
Miranda do Douro - Página 2 Fraile-cornudo03Fig. 2 - Entrou outro par no ínicio de outra estrofe e canta-a seguida do estribilho. O homem a tocar, carracas, conchas de vieiras.

Miranda do Douro - Página 2 Fraile-cornudo05Fig. 3 - No evoluir da dança aproximam-se tocando-se levemente como mostra esta fotografia
Miranda do Douro - Página 2 Fraile-cornudo03Fig. 4 - Na mesma evoluída dança muitas vezes afastam-se.

Em Terra de Miranda tem o nome de Fraile cornudo. É esta a nossa versão, colhida em Duas Igrejas em 1950.

Fraile cornudo,
Echa-te al baile,
Que te quiero ver beilar,
Saltar i brincar,
I andar por el aire.

Estribilho
Esta es la
Tonadica del fraile!

Busca companha,
Que la quiero ber beilar,
Saltar i brincar
I andar por el aire.
Esta es la
Tonadica del fraile!

Deixa la solaQue la quiero ber beilar,
Saltar i brincar
I andar por el aire!
Esta es la
Tonadica del fraile!

Repetem esta letra até que todos os bailadores que formavam roda tenham entrado a bailar.

Al Trepoleté,
Que déjela usted
Sola, sola.

Al Trepoleté,
Que yo quiero bailar con usted.
Dejala soja, sola,
Solita, sola.

Esto lo repiten varias veces, entre tanto que se retira el compañero y se prepara la mujer para bailar, siguiendo el campas de la letra, que acostumbra ser muy vivo.

Que la queiro ver bailar
Danzar y saltar,
Y escaramujear,

No começo entra a terreiro um só bailador ou bailadeira e dançando canta a primeira estrofe seguida do estribilho.

Ao iniciar a segunda estrofe, quando cantam busca com panha, vai á roda e, dançando, escolhe parceira, que, com ele vem bailar a meio do terreiro.

Aire, aire, aire;
Bailar a lo bobo
Y dale que dale.
Y esta es la tonadilla
Que trajo un fraile,
Fraile franciscano,
Francisco fraile.
Que busque uno de su gusto
Que la acompañe.

Busca en efecto uno de su simpatia, y puestos los dos en médio de la sala, comienza otra vez el baile con la consabida copla, y despuês este estribillo, retirándose la dama cuando lo indique la letra.

A el Trepolete
Que yo quiero bailar con usted.
Dejádmele solo
A mi perindolo,
Que le quiero ver bailar
Danzar y brincar,
Y escaramujear
Y andar por el aire,
Aire, aire, aire,
Bailar a lo bobo
Y dale que dale.
Esta es la tonadita
Que trujo un fraije,
Fraile francisco
Francisco fraile,
Que descalzo y desnudo
Va por la calle
Que descalzo y desnudo
Busca une amiga tuya
Que te acompañe,
Con una jarra de vino
Y una merienda
Para esta tarde.
Añe, añe,
Para esta tarde.

Ao canto do primeiro verso da terceira estrofe. Deixa-la sola, ele sai e fica ela em terreiro. Continua a bailar sozinha, até findar a estrofe e o estribilho.

O bailado continua, e agora é a ela que compete ir à roda escolher parceiro.

A dança prossegue, com saídas e entradas, um a um, de todos os bailadores e bailadeiras até que se tenham fartado de mostrar as respectivas habilidades coreográficas.

…..

(1) 0 texto completo do El trepoleté no citado Folklore Burgalês pág. 102-105 é como segue: De esta canción y baile a lo llano se ocupó el Sr. Olmeda en su Cancionero Popular de Burgos; pero de una manera incompleta que yo quiero ahora subsanar. Dice que en los partidos de Castrojeriz, Lerma y Briviesca llaman a este canto coreográfico el Trepoletre, y en los de Roa, Aranda y Salas de los Infantes, la Geringoza o Peringoza, y yo añado, que en los de Burgos y Villarcayo, el Trepoleté;
en el de Lerma, el Tenterenten; en el de Villadiego, el Trempolentren; en Extremadura, la Ciringoncia de un fraile, y antiguamente, la Garigonza del Fraile; cuya letra, mas pesada que la moderna, nos conservó D. Tomás Segarra en su rarísima colección de Poesias Populares, publicadas en Leipzig, F. A. Brockhaus, 1862.
Baile usted y ande usted por el aire

Que esta es la Garigonza del Fraile,

A dança é mesmo um desafio ou competição, em que, individualmente ou em par, se demonstram as habilidades coreográficas dos bailadores e a sua resistência, até se esgotar o terreiro.

Senhor Galandum
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 14:45

Danças Mirandesas - Fui-me a confessar


Este bailado repasseado deve ter sido adaptado tardiamente, haverá 50 anos, pois esta canção Fui-me confessar, era cantada em todo o Pais, nos princípios deste século, com requebros de romantismo e muito vagarosamente.

Os mirandeses, experimentaram a letra a dançar e surgiu-Ihes este repasseado, em alegretto.

As suas voltas são as mesmas das Giriboilas.
Miranda do Douro - Página 2 Fui-me-a-confessar01Fig. 1- Musíca do bailado repasseado Fui-me confessar.

A letra, cantada ao som da músíca (Fig. 1) repete-se, em tema curto. Acrescenta-se no fim uma quadra em mirandês.
E toda em redondilha menor.

Naquela capelinha.
Fui-me a confessor,

O que disse ao padre,
Ninguém o adivinha,

Ninguém o adivinha,
Não adivinha não…

O que disse ao padre,
Na minha confissão.

Xaramago berde,
Berde xaramago!..

Coje la perdiç,
I agarra-la pul rabo!… 
Senhor Galandum
Senhor Galandum

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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 14:50

Danças Mirandesas - O Galandum


O Galandum é um bailado mirandês, entre os muitos que se dançam na região.
Pertence ao grupo dos bailados paralelos (1).

A primeira vez que vimos e ouvimos (P.e AM.) cantar e dançar O Galandum, foi por volta de 1944, à Sra. Maria Nunes, a «Tia Alonsa», de Cércio, pequena povoação mirandesa da freguesia de Duas Igrejas e do concelho de Miranda do Douro, com o «Tio Zé Pires», homem também de Cércio. Acrescentavam, no fim outra letra obscena, ao som da mesma música e com trejeitos lúbricos dos dois dançantes.
Esta velhota, simpática e cheia de vivacidade, era um cancioneiro vivo de canções e bailados mirandeses.
Pelo ana de 1945 percorremos (P.e A. M.) as terras de Miranda, dentro do concelho, deparando com muitas novidades que não conheciamos, e notando que boa parte das gentes da raia «se faziam zorros» (2), desconfiando do interesse que tínhamos em the aprender as canções e bailados. Por isso aos primeiros contactos, manifestavam acanhamento em se exibirem.
Conseguimos (A. M.) no entanto, animar as aldeias mirandesas a participar no grande certame folclórico em organização, para receber os ministros do Estado, na comemoração do IV Centenário da elevação de Miranda do Douro à categoria de cidade.
Chegado o dia 10 de Julho desse ano de 1945, data em que fazia quatrocentos anos que D. Joao III dera a Miranda foros de cidade e as prerrogativas das maiores cidades do país, várias centenas de figurantes, com seus trajos típicos e tradicionais e seus instrumentos musicais populares, alinharam aos lados das ruas da preciosa cidade quinhentista. Assim foram recebidos os ministros do Governo da Nação, com uma das mais imponentes e bizarras manifestações de cor, movimento e som, que se têm realizado em Portugal.
Eram 10 ou 12 grupos de «Pauliteiros» de outras tantas aldeias mirandesas; grupos de rapazes e raparigas com lindas canções e bailados e com as manifestações festivas das suas terras, nas diferentes quadras do ano.
Entre o sem-número de bailados que então se exibiram, apareceu o Galandum, cantado e bailado por um grupo de rapazes e raparigas de Malhadas e por outro de Constantim. Esta dança, pelo seu ineditismo flagrante e pela gravidade dos seus passos, impressionou agradavelmente toda a assistência.
Era precisamente aquele Galandum que no ano transacto tínhamos ouvido cantar e visto dançar à «Tia Alonsa» e ao «Tio Zé Pires» em Cércio, mas sem o complemento obsceno a que acima nos referimos.
Outras velhotas de Duas Igrejas depois mo ensinaram.
Chamei ainda a «Tia Alonsa», minha paroquiana, a ensiná-lo na sua antiga pureza aos componentes do Grupo Folclórico Mirandês de Duas Igrejas, então acabado de fundar.
Este bailado, pela natureza do ritmo e pelo sotaque da letra, nitidamente raiana, deve ter sido importado da Espanha, talvez por contrabandistas, talvez por ceifeiros, ou por outras vias que desconhecemos (3).
Não sabemos, porém, quando nem de que região.
É também certo que, entre os bailados espanhóis que conhecemos, nenhum encontramos, até hoje, de marcada semelhança; a com o Galandum, a não ser talvez a semelhança parcial com alguns passos dos «Picaios» da região de Santander.
A interpretação do nome Galandum oferece certas dificuldades. É possível, e até provável, que este nome esteja relacionado com o adjectivo «galan» (4), termo frequentíssimo em terras espanholas fronteiriças, bem como em toda a Espanha.
Conhecemos em Sendim de Miranda uma família de Galanes ou Galans, já hoje muito ramificada e oriunda de uma «Tia Galana».
Um pouco por toda a «terra de Miranda», e sobretudo em Sendim, é frequente o emprego do adjectivo galano e galana para significar bonito, esbelto, bem parecido, garboso, pimpão.
Galandum será, pois, uma palavra derivada de galan; pois são muito frequentes em «terras de Miranda» derivações deste tipo: por exemplo: marchandum, tamandum, morundum, etc.
A mesma terminação dum se encontra em mirandum, nome de um dos laços ou lhaços da dança dos paulitos, célebre dança mirandesa dançada só por homens ao som do tamboril e da gaita de fole, também chamada gaita galega ou gaita pastoril.

São os seguintes os versos do laço do mirandum:
Mirandum, mirandum, mirandela
Mirandum se fué à la guerra.
No sé cuando vendrá.
No sé se vendrá por lá páscua,
Se por la eternidad…
Se por la eternidad…
La eternidad se passa.
Mirandun, mirandun, mirandela,
Mirandun se vieno (vino) ya.


No Galandum o primeiro verso do canto é o seguinte: Senhor Galandum, galandun, galandaina …
Este galandaina não deve ser mais do que a repetição do nome anterior com o sufixo popular aina (5) muito frequente em terras de Miranda, e aqui empregado para evitar a monotonia da trirrepetição de galandun.
Os ademanes deste bailado, como sejam as vénias e genuflexões dos homens diante das damas e vice-versa, reflectindo urna flagrante gentileza de maneiras, fazem-nos entrever nele uma certa aristocracia.
Isso nos leva a perguntar se, nos séculos XVII ou XVIII, ou mesmo posteriormente, não teria ele sido transplantado dos salões da nobreza espanhola para os terreiros rurais donde se estendeu a. Miranda, e ali tem permanecido até hoje?


Instrumentos musicais

O galandum dança-se ao mesmo tempo que se canta.
A letra, um misto de espanhol e de português, e raiano característico. Algumas vezes cantam-no em puro mirandês. O canto é acompanhado pelos instrumentos musicais típicos da região, a saber: tamboril, gaita-de-fole, flauta, castanholas, carrascas e ferrinhos.
O tamboril é um tambor pequeno que se toca com duas baquetas. É um instrumento de especial agrado dos mirandeses.
Nas festas de terras de Miranda é frequente verem-se rapazes raparigas dançarem horas seguidas ao som repicado e vibrante do tamboril, sem acompanhamento de qualquer outro instrumento.
A gaita-de-fole e a clássica gaita pastoril ou gaita galega, mais estridente, por via de regra, do que as similares da Galiza: é também mais tosca, e por isso talvez mais típica.
A flauta pastoril, monotubular de três buracos, em mirandês fraita, feita ao torno manual, é de pau de buxo, ou de freixo e tocada só com três dedos duma mão, o polegar, o indicador e o médio (6).
Em terras de Miranda, na região espanhola de Saiago e na fronteira leonesa do Norte, o tocador de flauta acompanha com a outra mão um repicar de tambor pendurado no ombro ou a tiracolo.
Outro instrumento muito típico e o pandeiro, tocado pelas raparigas.

É o mesmo adufe bairão português de quatro esquinas, composto de quatro tábuas de mais ou menos 7 centimetros de largura e coberto com pele de ambos os lados. A pele geralmente é de ovelha, sendo muito boas também as peles de cão, cabrito ou novilho acabado de nascer.
Também há pandeiros em forma de losango e hexagonais ou de 6 esquinas. Parece que os havia redondos, com arco de cortiça, como se deduz da primeira das seguintes quadras mirandesas:
Este pandeiro que you toco
Ten um aro de cortiça
You toco na Castanheira
Responde na Belariça.


Este pandeiro que you toco
Dua çamarra d’oubeilha
Inda onte comiu ierba
Hoije toea que berreia.


Castanheira e Belariça são duas pequenas povoações, quase juntas na vertente da serra de Mogadouro, a confinar com terras de Miranda.
Uma outra quadra popular, também mirandesa, em que se alude ao pandeiro, é esta:
Indo you la sierra arriba
Delantre de mi piara
Repicando no pandeiro
Remendando la çamarra.


E esta outra também mirandesa em que, ampliando a locução proverbial – o que for soará – se diz:
Meu pai tem um perrico
Que dizem lo sfolhara;
De la çamarra quere fazer um pandeiro.
Lo que for ele sonará.


Esta ultima vem publicada pelo Abade de Baçal no T. IX das suas Memórias Arqueológico-Históricas do distrito de Bragança, pag. 264.
Mais para o sul, em terras de Moncorvo, cantavam há algumas dezenas de anos, e possivelmente ainda hoje cantam, as seguintes quadras:



Este pandeiro qu’eu toco
Não e meu qu’e de Maria;
Que lh’o pedi emprestado
Para ir a romaria.


Este pandeiro qu’eu toco
Não e meu qu’e de Miguel.
So o toca ele e eu
E mais quem ele quiser.


 As pandeiretas, tão frequentes de norte a sul do país, que desnecessário se torna descrevê-las, são também instrumentos próprios do acompanhamento do Galandum.
Miranda do Douro - Página 2 Galandum-figura1Fig. 1 - Música do Galandum colhida pelo Maestro Afonso Valentim

As castanholas estralejam também no Galandum. São tocadas pelos homens e por eles feitas a navalha e enfeitadas com desenhos abertos à ponta da mesma navalha.
As conchas ou carracas, (onomatopaico mirandês) são as vulgares conchas de S. Tiago, ou seja as válvulas ventrais do molusco lamelibrânquio do genera Pecten de que há várias espécies na costa atlântica de Portugal e da Galiza. Deve tratar-se do Pecten maximus L. comum nos fundos próximos da costa. São as bem conhecidas vieiras, também designadas pelos nomes vulgares de leques, pentes ou romeiras.
Estas conchas, ou carracas, tocam-se esfregando-as uma de encontro à outra. As costelas ressaltando umas nas outras produzem um ruido seco, que lembra um pouco o das matracas.
Os ferrinhos são a bem conhecida barra de aço triangular, percurtido por um pequeno pedaço de verguinha de ferro.
Finalmente, o típico assobio pastoril executado vulgarmente pelas raparigas pastoras, proveniente do sopro emitido sob pressão por entre a língua e os dentes incisivos superiores.

A musica

Foi recolhida em Duas Igrejas no ambiente próprio e na própria região dos dançantes. As exibições fizeram-se no terreiro ou «curral» da residência paroquial, e no salão da mesma destinado aos ensaios do grupo folclórico de Duas Igrejas (7).

A música é um binário perfeito e parece nada ter de especial; vai reproduzida na página anexa.

A letra

Damos a seguir a letra do Galandum que assim se pode apreciar no seu conjunto e ao lado no dialecto mirandês.
Senhor Galandum,
Galandum, galandaina.
Madre la Biscaia …
Com las tres traseiras,
Com las delanteiras;
Dá-me la mano esquerda,
Dá-me la direita.
E arrendem-se atrás
Que manda la rebrência.
Não nos manda EI-Rei
Que manda a justicia.
Estes bailadores
Que se caiem com la risa;
Que se caiam,
Que se caiam.
Não vos manda EI-Rei
Que vos manda el alcaide.
Estes bailadores
Que se levantem,
E que bailem.
Que bailem,
Que bailen


Senhor Galandun,
Galandun, galandaina.
Madre la Biscaia ..
Cu-Ias tres traseiras,
Cu-Ias delanteiras;
Dá-me la mana isquierda,
Dá-me la dereita.
I arredem-se atrás
Que manda la reb’rência.
Nun bos manda I Rei
Que manda la justicia.
Estes beiladores
Que se caien cu-la risa;
Que se caian,
Que se caian.
Nun bos manda l Rei
Que bos manda l alcalde.
Estes beiladores
Que se Ihebanten,
I que bailen,
Que bailen,
Que bailen.


 Nem sempre a rigidez desta letra é respeitada. Há uma ou outra variante que, no entanto, não lhe altera a essência. Assim os versos 8.º, 9.º e seguintes, às vezes são cantados nesta forma:


Arreden-se atrás
I fagan la reb’rência.
Que nun manda l Rei
I manda la justicia.
Esses beiladores
Que se caien cu-Ia risa;
Que se caian,
Que se caian.

Que num manda l Rei
Que yá manda l alcalde


 Outras vezes os versos 8.º e 9.° aparecem na forma:


I arreda-te atrás
Que manda ]a reb’rencia


Nesta variante cada dançante dirige-se directamente ao seu parceiro que convida a afastar-se segundo manda a reverência ou etiqueta. Esta fórmula parece-nos mais popular do que a anterior na qual a expressão «Arredem-se atrás» tem um significado colectivo.


A dança
O Galandum é um bailado cheio de beleza coreográfica.
Por’ via de regra dançam-no quatro ou cinco pares, se bem que possam dançar o número de pares que se quiser.
Postos frente a frente em duas filas paralelas, homens numa, mulheres noutra, executam uma série de compassos, alguns bem lindos, numa sequência que não deixa de ter artístico encadeamento. Ao mesmo tempo que bailam vão cantando, em coro, a respectiva letra ao som da música já indicada.
Os homens tocam ou castanholas ou carracas, as mulheres pandeiros ou pandeiretas que trazem pendentes do ombro e que só repicam em determinados passos.
Postos frente a frente, em duas filas paralelas separadas cerca de dois metros, aos primeiros acordes da musica dançam saltitando, num ritmo binário. Aproximam-se, recuam e voltam a aproximar-se, como indica a Fig. 2, ao mesmo tempo que vão cantando:


Miranda do Douro - Página 2 Galandum-figura2Fig 2 - A - Primeiro passo do Galandum. Neste desenho e seguintes o simbolo de Júpiter indica os homens e o de Vénus as mulheres: B - Segundo passo. Meia volta à direita e em seguida meia volta à esquerda: C - Dá-me la mano esquerda: E - Afastam-se às arruecas, para em seguida votarem a aproximar-se: F - Homens de joelhos em terra. Mulheres bailam em volta cantando: Num vos manda l Rei que vos manda l alcalde.


Senhor Galandun,
Galandum, galandaina, } bis
Madre la Biscaia…


Ao terminar o último verso «Madre la Biscaia» devem ficar as duas filas muito próximas: homem e mulher de cada par frente a frente.
Assim termina o primeiro passo de dança, a que se segue o desenho coreográfico seguinte num encadeamento imediato, sem qualquer pausa a separar estes dois passos.
Prossegue a dança desandando cada figurante meia volta sobre a direita como se indica na Fig. 2, o que faz com que os pares fiquem de costas voltadas.
Ao mesmo tempo que adquirem esta posição, cantam:

Cu-las três traseiras,

Em seguida cada um faz meia volta sobre a esquerda, para os parceiros de cada par tornarem a ficar frente a frente (Fig. 3). Enquanto desandam vão cantando:



Cu-las delanteiras.


Depois dançam frente a frente em passo miudinho, numa espécie de picado, como quem marca passo, o corpo bamboleando num ritmo gracioso e suave, e dão as mãos esquerdas ao cantarem:


«Da-me la mana isquierda»


Acto continuo desligam as maõs para, imediatamente, com a mesma graciosidade, acompanhada de uma vénia discreta, darem as mãos direitas, que mantêm agarradas e sacodem levemente a maneira de cumprimento (Fig. 4); ao mesmo tempo cantam:


«Dá-me la dereita»


Como esta parte cantante é curta, os dançantes têm que actuar rápidos e bem sincronizados.


Todos os movimentos destes graciosos cumprimentos de mãos, ora esquerdas ora direitas, são bem cadenciados e as mãos levantadas à altura dos ombros ou mesmo mais acima, em altitudes de requintada elegância e gentileza.


Y arrenden-se atrás


Que manda la reb’rência.


Ao ritmo cadenciado deste cantar, sempre face a face, vão recuando uns e outros, afastando-se bastante, para, em seguida, e rápido, voltarem a aproximar-se. Ao mesmo tempo cantando:
Nun bos manda l Rei
Que manda la justícia.
E ao aproximarem-se, sem quebrarem o andamento ininterrupto do canto e da dança, elas, de mão direita levantada e dedo indicador estendido, apontam cada uma o seu par cantando todos:
Estes beiladores
Que se caien cu-la risa;
E logo num gesto com seu quê de imperioso, sacudido, algo enérgico como quem obriga a ajoelhar, cantam:
Que se caian,
Que se caian,
Os homens, como que obedecendo a essa ordem, põem um joelho em terra e assim ficam, tocando as castanholas ou carracas. As mulheres, empunhando os pandeiros que vão repicando a compasso, desandam um quarto de volta sobre a esquerda para, em fila indiana, seguirem bailando sobre a direita, passarem por detrás dos homens ajoelhados e tornaram a ficar cada uma em frente do seu par, após uma volta completa (Fig. 6). Durante este baiIado em torno dos homens ajoelhados, todos cantam:
Nun bas manda l Rei
Que bas manda l alcalde.
Estes dois versos são bisados ou mesmo trisados, de tal modo que o seu cantar permita dar a volta completa.
Em regra o bisado é suficiente para que cada mulher volte a ficar em frente do seu par ajoelhado.
Em seguida, elas, num gesto elegante de cortesia, estendem a mão direita aos seus pares, como que convidando-os a levantarem-se. Ao mesmo tempo cantam:
 
stes beiladores
Que se hebanten.
Y que bailen;
Que bail en,
Que bailen.


Eles erguem-se num pronto e bailam juntos, frente a frente, cada um com seu par. Ao cantarem o último «que bailen», pincham todos a pés juntos, marcando assim um forte remate estacado.
Depois de uns rápidos momentos de descanso, todos aguardam o andamento da música para a execução da segunda parte.
Nesta tudo se passa de modo semelhante ao que vai referido e esquematizado no desenho da Fig. 6, com a diferença de que agora são elas que ajoelham, ao mesmo tempo que todos cantam:
Estas beiladeiras
Que se caien cu-la risa;
Que se caian,
Que se caian.


E na parte final, convidando-as a levantarem-se, cantam:


Estas beiladeiras
Que se lhebanten,
Y que bailen.
Que bailen,
Que bailen.



Como no final da primeira parte, também aqui, ao cantarem o último «que bailen», pincham todos, à uma, a pés juntos, marcando do mesmo modo um forte remate estacado, aqui talvez mais enérgico, como remate que é do bailado.

Algumas considerações

a) Um dos aspectos interessantes na letra do Galandum é o que diz respeito aos versos 10.°, 11.° e 16.° e 17.° nas suas formas:

Nun bas manda l Rei
Que manda la justícia
………………………
………………………
Nun bos manda l Rei
Que bos manda l alcalde.

Antepôs-se, como se vê, o poder judicial ao poder do Rei, digamos, ao poder da realeza. Parece que se quis pôr em realce o poder jurídico como sendo de maior valia do que o poder real.
Numa variante às vezes cantam:
Ya nun manda l Rei
Que manda la justícia.

O que pode muito bem interpretar-se como referência a quebra ou desaparecimento do poder absoluto da realeza, e, ao mesmo tempo, constituir a exaItação e o devido acatamento à lei, cuja integral aplicação compete às autoridades vigiar e fazer cumprir. As autoridades representadas aqui pelo alcaide ou alcalde.

b) São muito curiosos os versos:

Que se caien cu-la risa;
Que se caian,
Que se caian.

A significação desta passagem pode interpretar-se assim:
«os dançantes de tanto se rirem ate se deixam cair; pois que se caiam».
O certo, porém, é que, nem neste passo, nem em qualquer outro do Galandum, nenhum dos dançantes se ri, nem muito nem pouco.
Ora, como atrás dissemos, é de presumir para esta dança uma origem aristocrática.

Quererá nestes três versos aludir-se ao facto de, na sua fase primitiva, esta dança, copiada dos bailados elegantes da nobreza, constituir, neste passo, uma espécie de caricatura à vénia acompanhada de genuflexão correntia na etiqueta do séc. XVIII?
No campo os habitos são, por via de regra, cheios de naturalidade.
Ao povo das aldeias, com o seu singelo e habitual cumprimento ou saudação «das boas horas» ou do «Deus vos salve», a genuflexão elegante e presumida com que os «peraltas» galanteavam as «sécias», devia apresentar-se-lhe acentuadamente, ridícula. Dai o riso explosivo e chocarreiro, a tal ponto que, de tanto se rirem, ate caiam ao chão.
Se esta interpretação da passagem apontada está certa, poderá admitir-se ter sido no declínio dos ademanes aristocráticos do sec. XVIII que o Galandum passou a ser dançado pelo povo.

c) O vocábulo risa, em mirandes, é corrente.
É frequente em quase todo o leste da província de Trás-os-Montes, no Entre-Sabor-e-Douro, o povo dizer riso, em vez de risa, e dar a risa em vez de rir.
É correntio o rifão «guardar de la risa para la llora» (Cool.
Na Quinta de S. Pedro, freguesia de Meririnhos, concelho de Mogadouro, temos ouvido (S. J.) frases como estas:
«Umas vezes causa grima (9) vê-lo, outras, mal o vejo, dá-me a risa».
«Quando acabei a minha conta (10) é que lhes deu a risa».

Em terras de Miranda é muito conhecida a anedota da mulher que mandou a filha ao moinho e o moleiro abusou dela.
– Mirai, à mai. El molineiro metiu-me cul culo no farneiro y fizo-me el que quijo.
– Quei dizes tonta?! e tu porque nun gritabas?
– Sim … y quien podie cu ia risa! … nun me mandarades alhá! …

CONCLUSÕES

O Galandum é um bailado mirandês fixado de preferência nas povoações confinantes com a raia espanhola. Deve ter sido importado da Espanha, possivelmente das danças aristocráticas dos séculos XVII ou XVIII, e fixado entre as populações rurais mirandesas, que com as gentes espanholas de Zamora e Saiago, sempre tiveram relações sociais e económicas estreitas, o que explica, muito naturalmente, o intercambio recreativo, demonstrado pelo numero e qualidade das canções e bailados de natureza castelhana e leonesa ainda com vida no folclore mirandês.
Uma natural e bem patente comunidade de condições de vida, resultante de similares ocupações agrárias, de idênticas condições geológicas e climáticas e até de estreitas afinidades no que respeita a sua origem remota, comum ou afim, fazem com que aquelas populações fronteiriças portuguesa de Terra de Miranda e espanhola de Zamora, as terras do velho reino de Leão, tenham manifestações folclóricas semelhantes.
É lógico.
Repetindo o que escrevemos (S. J.) quanta ao Minho e a Galiza (11) podemos dizer: mirandeses e leoneses, em muitas das suas manifestações folclóricas, mostram-nos múltiplos laços de parentesco que estreitamente os unem, a despeito da fronteira que as condições sociais e politicas ergueram a separá-los.
(1) O Galandum que agora se republica com ligeiros acrescentos, foi publicado no trabalho Coreografia popular trasmontana – III – 0 Galadum (Miranda do Douro), por Maestro Afonso Valentim, Padre António Marinho e Doutor Santos Junior, in «Douro Litoral», Boletim da Comissão Provincial de Etnografia e História, 5.ª Serie, n.º VII e VIII, Porto, 1953, pag. 3 a 18, 6 figs.
Rebelo Bonito, em artigo intitulado o Galandum e os seus problemas – Considerações a propósito de uma dança popular trasmontana, publicado em «Douro Litoral», 6.ª Serie, n.º III e IV, Porto 1954, pág. 3 a 25 e 9 figs., ocupou-se do nosso trabalho. Com ampla erudição musical e artística faz dele uma análise crítica pormenorizada, terminando pelas seguintes conclusões que passamos a transcrever:
a) – O galandum é uma Gavotte coreada como dança de coluna, no estilo do sec. XIX; b) – A música será da mesma época, todavia, elementos arcaizantes-hibridismo, antifonismo, cadencia irregular – permitem também supor que ela seja do sec: XVII, coeva da Gavotte papular coreada como dança derivada da Branle e influenciada pela Galharda; c) – É bastante provável que o Galandum seja oriundo da Biscaia, ou que tenha cameçado a popularizar-se a partir dessa região; d) – O Galandum, como dança, corresponderá a uma variedade da Gavotte oitocentista implicando o emprego da expressão galant homme; e) – De galant homme se tera formado a palavra Galandum.
Não se nos afigura (A.M.) aceitável esta génese de Galandum.


(2) Zorro, nesta acepção, significa matreiro, ficadiço, desentendido, calaceiro, manhoso. Possivelmente, senão mesmo de certeza, este vocábulo provém da palavra espanhola zorra que significa raposa, o animal matreiro par excelência.
Zorro, significa também filho natural ou ilegitimo.


(3) É bem possível que o Galandum tenha sido importada da Espanha. Não só por ter no seu conjunto, um não sei quê que nos faz lembrar a graça, a leveza e a vibração de certas danças e cantares populares espanhóis, mas também por nos parecer (P.e A. M.) existir certa semelhança entre alguns passos do Galandum e autros dos «Picaios», dança popular da região de Santander.
Além disso outros bailados mirandeses parecem ter parentesco com algumas danças espanholas do nosso conhecimento, o que é mais uma razão a juntar às anteriores.
Assim, par exemplo, o «Flaire cornudo» (Flaire e palavra mirandesa que significa frade), outro bailado mirandês, tem afinidades, ao menos na letra com um bailado que se dança em Burgos e na Extremadura espanhola, onde tem os nomes de «El Trepoletré» e «La Geringonza del Fraile». Conf. Domingo Hergueta y Martin Folklore Burgalés, Burgos, 1934, 240 págs.; vd. Pág. 102-105. Ver também Olmeda, Cancioneiro popular de Burgos: apud Domingo Hergueta y Martin cit.

(4) Nos lhaços ou bailados dos Pauliteiros há um chamado «La Berde, de carácter amoroso em que se canta: «Reten-te eiqui, reten-te eili, Molidogan, moço, galan, corregidor…», observação que não escapou ao Prof. Leite de Vasconcelos, Estudos de Filologia Mirandesa.
(5) É flagrante a familiaridade da mesma derivação no estribilho do rimance «Abre-me a porta, morena» que é:
«Ó redun, dun, dun, daina».
O sufixo aina aparece também noutras canções populares mirandesas como por exemplo nesta de sabor espanhol:

«EI cura está malo,
El cura está malo.
Malito na cama …
Chiribiribi, chiribiribaina
No me dá la gana».

Ou nesta perfeitamente mirandesa:
«Ua bielha dou un peido,
Chiribiribi.
A la porta de la scola,
Chiribiribaina.
A la porta de la scola.
Salirun ls studantes todos.
Chiribiribi.
– Santa Bárbola qu’atrona! …
Chiribiribaina.
– Santa Bárbola qu’atrona!…. »

(6) Os buracos são abertos ao fundo, dois na frente e um na rectaguarda. Os da frente ponteados para indicador e médio, o da rectaguarda pelo polegar da mão esquerda, enquanto a direita toca o tamboril com a baqueta.
(7) Fundamos (P.e A. M.) 0 Grupo Folclórico Mirandês de Duas Igrejas, congregando alguns elementos da freguesia que paroquiamos, a saber um grupo de Pauliteiros, uma secção mista de canções e bailados e o grupo das «Flores», que por ocasião das festas de Santa Bárbara se exibia pelas ruas da aldeia.
Em 1947 foi-lhe reconhecido mérito etnográfico e folclórico, quer sob o ponto de vista de pureza e carácter tradicionais, quer de riqueza artística, aquando do Concurso dos Ranchos Regionais do Norte, organizado no Porto pelo Secretariado Nacional de Informação. Nesse concurso o Grupo de Duas Igrejas foi premiado.
Em 1948 tomou parte nas comemorações do tricentenário da Restauração de Angola. Percorreu aquela província durante 3 meses.
Em 1949 filiou-se na F.N.A.T. e, em sua representação, tomou parte no Grande Concurso Internacional de Canções e Danças Populares realizado em Madrid. Conquistou o 1.º prémio de danças masculinas, um accessit ao 3.° prémio em danças mistas com acompanhamento de coro, e um accessit ao 5.° prémio em danças mistas sem coro. Estes prémios foram alcançados em competição com 260 grupos folclóricos de 16 nações.
Em 1950 foi seleccionado para tomar parte no festival internacional de Londres, a pedido da «The English Folk Dance Society».
Em 1953 comparticipou no VIII Concurso Internacional de Canções e Danças Populares de Madrid; também em 1953 foi o grupo seleccionado pelo S.N.I. para os festivais da «Societe de l’Ommegang» na Bélgica e em Biarritz, nos quais não pode comparticipar por motivo das ocupações agrícolas das pessoas que constituem o grupo. Em 1981, mantêm-se operacional, depois de já ter participado em festivais internacionais em França, Alemanha, Suiça, Áustria, América do Norte e em muitos mais de Espanha e Portugal, com a mesma espontaneidade e pureza com que foi criado.

(Cool Dr. Ferreira Deusdado, Escorços trasmontanos, Ensaio de literatura regional, Angra do Heroísmo, 1912, pag. 318.
(9) Grima e provincianismo que em Trás-os-Montes temos ouvido a cada passo na acepção de pena, mágua, dó. Com este significado o registamos (S. J.) no capítulo sobre vocabulário a pág. 172 do nosso trabalho: Santos Junior, Estudo Antropológico e etnográfico da populacão de S. Pedro (Mogadouro), in «Trabalhos da Sociedade Portuguesa de Antropologia e Etnologia, Vol. II, Porto, 1924, pags. 85 a 186, 17 figs.
(10) Na Quinta de S. Pedro (Mogadouro) não dizem «contar um conto» mas «contar uma conta». Do mesmo modo que em vez de riso dizem risa, também em vez de conto dizem conta.
(11) Santos Junior, Portugal e a Galiza irmã, in «Apolinea», Rev. mensal ilustrada, n.” 5, Out.° de 1933, Porto, 1933, pag. 12: id. Cantares Vianeses e o folclore da Galiza, in «Anuario do distrito de Viana do Castelo », vol. I, Viana do Castelo, 1932. Sobre o mesmo tema ver ainda Santos Junior, Afinidades galaico-portuguesas de folclore, in «Trabalhos da Sociedade portuguesa de Antropologia e Etnologia», vol. IV, Porto, 1929, pags. 183 a 190.
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 14:59

Danças Mirandesas - Ligas Berdes ou Habas Berdes



Esta dança era conhecida pelos dois nomes, há mais de setenta anos. É já citada por autores antigos que tratam de coisas mirandesas, nos princípios deste século, como José Maria Neto e julgo (A. M.) também pelo Albino Morais Ferreira. Era comum a toda a terra de Miranda e sobreviveu em Duas Igrejas, até ao presente (1981). Como se observará, a letra, é ora em mirandês, ora em português.

É uma dança paralela, ou de coluna que termina cada volta com um embater de nádegas dado por cada par dançante.


              Ligas, ligas, ligas berdes,
              Bien las beio berdegar (1)
              No palácio de meu pai,
             Quem me dera de lá Star(i)!    – BIS


Estribilho

              Toma-las alhá!
              Toma amor las ligas berdes!
              Toma-las alhá! (1)
              Dá-las tu a quie tu quergas,
              Q’ a mi nada se me dá (2).

Miranda do Douro - Página 2 Ligas-berdes01Fig. 1 - Música das Ligas Berdes ou Habas Berdes

Miranda do Douro - Página 2 Ligas-berdes02Fig. 2 - Prestes a iniciar a dança das Ligas Berdes

Miranda do Douro - Página 2 Ligas-berdes03Fig. 3 - Exaltação de picado em preparação para a costelada ou embate de nádegas

Miranda do Douro - Página 2 Ligas-berdes04Fig. 4 - Dançam frente a frente, ao mesmo tempo que cantam:

Miranda do Douro - Página 2 Ligas-berdes05Fig. 5 - Remate final. Cantam: Dá-las tu a quem quergas, qu'a mi nada se me dá.

Antóninho crabo roixo,
Cara de leite coado;
Foste-te a gabar ao Porto,
Que me tinhas dado urn crabo.

– Toma-las alhá! etc.

Não foi cravo não foi rosa,
Foi um lencinho bordado.
Numa ponta tinha a lua,
Noutra tinha o sol dourado.

– Toma-las alhá! etc.

Chameste-me Mira, Mira,
Yöu nu söu de Mirandela;
Söu de Miranda de Trás-dels-Montes,
Dües Eigreijas, la mie tierra.

– Toma-las alhá! etc.

Chamestes-me Mira, Mira…
Yöu nu söu de Miramar(i);
Söu de Miranda de Trás-dels-Montes,
Dües Eigreijas, miu lhugar(i) (3)

– Toma-las alhá! Etc

Ligas berdes e bailado saltitante num ritmo binário, Os elementos de cada par primeiro aproximam-se, depois afastam-se, para de novo se aproximarem e voltarem a afastar-se, segue-se nova aproximação em que bailam frente a frente num saltitar repicado, que termina por um estacado súbito batido a pés juntos, logo seguido de bailado em marcha saltitada com três passos à esquerda e três passos à direita, rematados por meia volta com embate de nádegas.
Vimo-la (S. J.) dançar a primeira vez em S. Pedro da Silva, em 26 de Setembro de 1957 por dois pares, em que os elementos femininos eram duas simpáticas velhotas, Mariana da Piedade Esteves de 68 anos e Teresa Ramos de 70 anos, e que bem e animadamente elas dançaram!

Iniciaram a dança em roda, de mãos dadas, sobre a direita, depois de braços levantados e numa espécie de peneirado, rodando o corpo ora à esquerda ora à direita.

(1) Aqui todos os dançantes fazem um estacado súbito com forte bater de pés.

(2) Meia volta rápida com embate das regiões nadegueiras.
(3) Variante do mesmo tema e a quadra seguinte: Chamaste-me Mira, Mira, / Eu não sou de Mirandela. / Sou de Miranda de Trás-os-Montes, / Duas Igrejas é mi tierra.
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 21:08

Danças Mirandesas - Madre Abadessa


Este bailado repasseado é comum à terra de Miranda, do lado Norte.
A letra deste bailado, é de natureza maledicente, talvez de crítica a alguma fragilidade conventual.



Senhora madre abadessa,
– Quem me chama?
-Tenha conta noconvento,
-Mas porquê?…
Aquela freira mais nova,
-Então que fez?…
Meteu o frade la dentro,
-Mas por onde?!…
Anda que eu te agarrarei,
-Mas onde?
No meu quarto às escuras,
-Mas porque?…



Repete-se esta letra, até quatro ou cinco voltas.

Miranda do Douro - Página 2 Madreabadessa01Fig. 1 - Musíca do bailado Madre Abadessa
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 21:11

Danças Mirandesas - MARIPUM


 
Bailado repasseado recolhido em Duas Igrejas em 1945.
Dança-se como as Geriboilas com os passos indicados Fig. 2 e cantado com a musica da Fig. 1.

Este bailado repasseado foi-me (A.M.) recitado pela senhora Maria Pires Gregório, de 56 anos, de Duas Igrejas.
Segue-se a letra que é cantada com a música da (Fig. 1).

A moda do Maripum,
Não tem nada que saber;
É andar c’ pé no ar
Outro no chão a bater.

 
   Estribilho

        Ai Maripum!
        Maripum, coitado!
        Não pagaste o vinho,
        Hás-de ser queimado!

A moda do Maripum,
É c’má folha do mineiro

O moço não paga o vinho,
Sem a namorar primeiro!…
        Ai Maripum!
        Maripum, coitado!, etc.

Este repasseado ouvi-o (A. M.) e vi-o cantar e dançar muitas vezes, em Duas Igrejas há mais de trinta anos. Ainda se canta e dança às vezes em terreiro. Pelo contexto da letra, parece ser um bailado de ocasião irónico-satírico, ameaçador  para o moço que não pagava o vinho, que levava como prémio, a ser queimado, em efígie. Ainda me recordo da pena que se aplicava aos novos casados que não pagavam a patente.

 
Miranda do Douro - Página 2 Maripum01Fig. 1 - Música do bailado repasseado Maripum.

 
 
Em Sendim – Miranda do Douro, organizavam um grande cortejo de chocalhos e latas velhas, e tudo o que fizesse barulho e arruído, e a mocidade em grande esturdia, gastava uma tarde domingueira a dar voltas ao povo, na «chocalhada» e levavam na frente dois monos de palha, homem e mulher, que no fim, queimavam no centro da povoação. Aqui temos parte da explicação da letra do bailado deste Maripum. Para o Norte e centro da concelho de Miranda, em Cércio, Duas Igrejas, Malhadas, e Raia, a pena era esta mesma, quando não era mais dura, principalmente para os moços apanhados a namorar, em terra alheia, isto é, que não eram da povoação da namorada.
Miranda do Douro - Página 2 Maripum02Fig. 2 - Sino dos rapazes de Sanhoane - Mogadouro.

 
Intimados a pagar o vinho, pela Junta do Mocidade, se estes se negavam, eram levados ao chafariz ou à fonte de mergulho do meio da povoação e eram baldeados lá dentro a corpo inteiro, mesmo que fosse em pleno inverno.

Igual costume existia no concelho do Mogadouro, onde ainda se conservam, no centro da aldeia de Urrós e da de Sanhoane (1) OS sinos, nas respéctivas sineiras, fora do campanário da Igreja para tocarem a rebate, quando sentiam rapaz estranho de noite, a rondar rapariga do povo. Ao toque da sineta, reuniam imediatamente, cercavam o rondador e, multa do vinho para a mocidade, ou mergulho na fonte.
Miranda do Douro - Página 2 Maripum03Fig. 3 - Torre sineira de alvenaria tosca na povoação de Urrós - Mogadouro, com o sino dos rapazes. Este sino ainda hoje tem o condão exclusivo de conclamar a mocidade masculina, quando é surpreendido um rapaz de fora da aldeia a namorar rapariga da terra. Ao seu toque a mocidade junta-se e o moço é abrigado a «pagar o vinho», se não, é levado e baldeado na «fonte do lugar».

 
(1)   Em Sanhoane a sineira de tal sino está situada na parede da residência paroquial a faciar a rua.
Em Urrós, está no centro da povoação sobre um muro alto pequena torre rectangular de alvenaria.
Em Saldanha, do mesmo concelho era levado a um poço da ribeira marginal, ainda hoje chamado o «Bodelo» – «Levai-o ao Bodelo!. – diziam os conclamantes.
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 21:14

Danças Mirandesas - O Maganão


O Manganão é um bailado paralelo com os passos de dança típicos deste género de bailados. Passos coreográficos semelhantes aos das Ligas Berdes mas sem o embate de nádegas ao findar o estribilho.
É grande o número de quadras que se cantam com o Maganão. As que se indicam são as mais correntes em Duas Igrejas.
No fim de cada quadra é bailado e cantado o Ai maganão, maganão, maganão, que deu o nome à dança.

Dançava-se e dança-se ainda em Duas Igrejas.

Oh que linda fita verde! – Bis
Leva o rei, na carapuça!. – Bis
Quem tem sarna que la coce, – Bis
Quem tem catarro que o tussa. – Bis

Estribilho

Ai, maganão, maganão, maganão! – Bis
Oh ditoso maganão! – Bis
Darás-me um abraço? —-
Isso sim! Isso sim!… |
Darás-me um beijinho, |> Bis
Isso não! não! não!… —-

Rua abaixo, rua acima,
Toda a gente me quer bem,
Só a mãe do meu amor, – Bis
Não sei que raiva me tem. – Bis

Estribilho

Alumeia-me candeia
Que me quero ir deitar,
Sem torcida, nem azeite, – Bis
Como te he i-de alumiar – Bis

A coreografia desenvolve-se em duas filas paralelas, como o Galandum, o Pingacho e as Ligas Verdes, frente a frente, para a direita e para a esquerda e termina frente a frente, em passo saltitado, sem qualquer particularidade. No entanto, é uma dança cheia de energia e vigor e de muito aprumo.
Miranda do Douro - Página 2 Maganao01Fig. 1 - Musica do bailado O Maganão
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Miranda do Douro - Página 2 Empty Re: Miranda do Douro

Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 21:16

Danças Mirandesas - O Pingacho


O Pingacho é um estranho bailado mirandês. Como o Galandum (1), é um bailado paralelo ou de coluna, misto, isto é, dançando por homens e mulheres, dispostos em duas filas, eles numa fila, elas na outra.
Vimo-lo dançar pela primeira vez (A. M.) em 10 de Julho de 1945, a um grupo de rapazes e raparigas da freguesia raiana de Paradela, a quando das comemorações centenárias da elevação de Miranda a categoria de cidade. O cortejo folclórico desse dia de Julho de 1945 teve o condão de nos revelar muitas coisas ignoradas do folclore mirandês, de que o Pingacho (2) é uma das suas mais interessantes manifestações.
Dançaram-no oito rapazes e oito raparigas, em trajes antigos, da terra de Miranda, queimados e crus com a charneca da região raiana de Paradela e das terras leonesas confinantes.
A dança era acompanhada de coro ao som de um singular instrumento de corda, que tinha por caixa de ressonância a parte fundeira duma lata de petróleo, em forma de cubo e com tampa furada do lado das cordas. Tocava este original instrumento o Sr. Francisco Domingues, lavrador-propriétario, natural e residente naquela freguesia. Este paradelense é um grande entusiasta das tradições mirandesas. É homem dotado de memória prodigiosa: sabe de cor a história de Portugal completa e em verso, a par de grande número de canções e rimances e uma parte muito grande da Bíblia.
Quem visse de chofre aqueJes oito pares a dançar frente a frente, e, logo, aos encontrões, primeiro de flanco ou de lado, depois pela frente e por último pela retaguarda, encostando-se pelos flancos, simulando encostar os umbigos e batendo com toda a força as fundos das costas em pleno realismo, sentir-se-ia, se não ruborizado de pejo, pelo menos fortemente impressionado.
As vozes duras, como os trajes e os gestos, contribuíam para dar ao conjunto um especial vigor.
Em 28 de Setembro de 1954 fomos os três (A. M., S. J. e 8. B.) a Paradela para estudar o Pingacho. Colheu-se a música, tomaram-se muitas notas e tiraram-se fotografias e um filme cinematográfico.
Fomos muito bem recebidos. Prontamente se organizou um baile no prado, onde novos e velhos dançaram o Pingacho, para que 0 pudéssemos ver e estudar à nossa vontade.
Paradela, freguesia do concelho de Miranda do Douro, fica situada na linha de fronteira, e é a aldeia mais oriental de Portugal metropolitano (3).
O Pingacho sempre se dançou em Paradela e, segundo nos disse 0 Sr. Francisco Rodrigues, também se dançava em Ifanes, Póvoa e Constantim, freguesias do concelho de Miranda e, como Paradela, também pertencentes a zona raiana.
Hoje, pode dizer-se que está quase circunscrito a Paradela.
As pessoas que mais dançam este bailado são os homens e as mulheres de idade. As moças de hoje, sob a influencia da vida moderna, já se envergonham de dançar os bailados de suas mães e avós: pelam-se pela música de disco e do alto-falante, música de ritmos importados que elas não sabem compreender nem dançar, mas que pincham e rodopiam porque são da moda.
O Sr. Francisco Rodrigues disse-nos que alguns em Paradela diziam Pindacho. Mas a tia Balbina Gonçalves, de 64 anos (1954), natural da Paradela, afirmou que sempre 0 dançara com o nome de Pingacho, sempre assim dissera e sempre assim ouvira.
Este bailado e, como já dissemos, do tipo paralelo dos bailados mirandeses ou de coluna, como o Galandum, a Bicha, o Redondo, as Ligas Berdes, Abas Berdes, ou Augas Berdes, o Maganão, a Saia da Carolina, etc. Os ritmos destes bailados são nitidamente desta região raiana leonesa-mirandesa, e todos parentes uns dos outros, na música, na coreografia, na mímica e alguns deles até na letra. Não nos parece que haja neles qualquer influência extra-peninsular.
Na terra de Miranda há bailados circulares, tipo fandango, como a Geriboila, e bailados passeados, que se dançam com uma infinidade de ritmos. Há também os bailados de par, como o puro e límpido Mira-me-Miguel, de carácter pastoril, e o Flaire (4), e ainda a característica e única Dança-do-Berço e o pantomínico e inédito Scarabanilho, bailado aos pares com o corpo dobrado para a frente e as mãos presas uma a outra por baixo das coxas. Há também o Maragato.
O Pingacho está hoje circunscrito ao lugar e freguesia de Paradela, fronteira com a povoação espanhola de Castro de Ladrones, Castro Ladron, ou Castro de Alcanices, na provincia de Zamora. Este bailado, que, como se disse, era também dançado em algumas aldeias vizinhas, tem na aldeia de Paradela o seu dia próprio no ano; é o dia 25 de Novembro, dia de Santa Catarina.
Embora esta e outras danças se possam bailar em qualquer ocasião têm, no entanto, dias assinalados no ano, que lhe são, pode dizer-se, especialmente consagrados. Assim sucede, por exemplo, com o Redondo, em Ifanes, e a Bicha e o Fandango, em Duas Igrejas.
Quase todas as povoações da terra de Miranda têm a sua festa de inverno dedicada a um santo, S. João, Santo Estêvam, Santo Amaro, S. Sebastião, S. Brás, Santa Catarina, Santa Luzia, etc., na qual há divertimentos tradicionais com comes bebes e danças próprias. Isto vem confirmar as remeniscências, vagas ou claras, das antigas celebrações pagãs, muitas de cunho fálico, ligadas as rituais gentílicas do solstício, como eram as saturnais, as dionisíacas, as lupercais, as amburbais, etc. (5).
A propósito das danças próprias de algumas festas trasmontanas, o grande etnógrafo Abade de Baçal escreveu (6): «A dança faz parte integrante destas festas que, em todas as modalidades, representam, não a rudeza selvática desta gente, mas sim o documento vivo de uma civilização a extinguir-se, … ».
Ao grande trasmontano que foi o eminente Abade de Baçal não queremos deixar de, neste momento, prestar a nossa homenagem à sua gloriosa memória. O Abade de Baçal foi um estudioso, apaixonado pela etnografia, pela arqueologia e pela história das terras do distrito de Bragança.
Miranda do Douro - Página 2 Pingacho01Fig. 1 - Música de O Pingacho típico bailado mirandês, escrita por Bento Bessa

Em longas caminhadas a pé por montes e vales, vilas e aldeias, e em longos anos nos legou muitos e valiosos estudos, e, nomeadamente, nos 11 volumes da sua obra monumental Memórias Arqueológico-Históricas do distrito de Bragança, que, sob muitos aspectos, fazem a consagração dum Mestre.

INSTRUMENTOS MUSICAIS

Em 1945, 0 Sr. Francisco Domingues, nosso informador, de Paradela, tocava no cortejo de Miranda do Douro uma guitarra estranha, que pela sua bizarria e ineditismo chamou a atenção de toda a gente letrada e iletrada. Era uma lata de folha de Flandres em cubo, de capacidade de uns 10 litros, que servira para o petróleo, rota em circulo, num dos lados, a servir de caixa de ressonância e o bravo com as cordas apoiado numa das extremidades, passando as cordas por cima da abertura. Emitia um som estranho e fazia o único acompanhamento musical aos bailadores e bailadeiras do Pingacho e de outras cantigas e danças de Paradela, executadas no centenário de Miranda, ainda existentes em 1979.
O gaiteiro de Ifanes ainda tocava a Pingacho na sua gaita de fole. Este gaiteiro chamava-se José da Igreja, morreu de desastre em 1975. Não há mais quem toque na gaita de fole a musica desta dança.
A música e o repicado dos passos dos bailadores prestam-se muito bem ao toque das castanholas e dos ferrinhos, assim como ao rufo do tamboril feiticeiro da Terra de Miranda, ao ritmo do bombo, da gaita e da flauta pastoril.
No dia em que fomos todos três ver a Pingacho a Paradela e recolhemos estas notas, a Sr. Francisco Domingues tocava para os bailadores, uma bela e moderna guitarra portuguesa.

A música

Foi recolhida em Paradela, no ambiente próprio, na própria região dos dançantes. As exibições fizeram-se no prado que fica no cimo do cabeço e sobranceiro à povoação, que se estende logo abaixo no abrigueiro da encosta, eira comunal.

A música, em compasso lifeiro 3/8, vai reproduzida na página anexa.

Apesar de Paradela estar afastada de vale ou planície e de estar assente em região agreste, dura e penhascosa, o Pingacho não deixa de ser rico de movimento, vivacidade e alegria.

Analisando bem a sua contextura musical, pela sequência dos seus desenhos, pela sua linha melódica e rítmica e, sobretudo, pelos seus últimos compassos (7), chegamos (B. B.) à conclusão de que se trata dum bailado oriundo de Espanha, que aqui se fixou, porventura, se transformou, e, recebeu, como é natural, um pouco de feição portuguesa.
A data da sua importação poderá situar-se, a nosso ver (B. B.), entre os séculos XVII e XVIII.

O Pingacho é um bailado típico, curioso e cheio de interesse.

Mais realce alcançaria e, sem dúvida, um cunho de maior beleza, pureza e primitivismo, se em vez de ser acompanhado pela guitarra portuguesa, como o ouvimos, o fosse por instrumentos típicos da região tais como, a gaita de fole, o tamboril, a flauta e as castanholas.

A letra

Dámo-la a seguir em mirandês, bem raiano e de marcado sabor espanhol.
              Pur beilar l pingacho    – bis
              Dórun-m’un rial           – bis

 
         Estribilho:
              Beila-lo, beila-ló picorcito,
              Beila-lo que te quiero un pouquito.
              Beila-lo.
              Beila-lo de Ihado,
              De l’ outro ancustado,
              I de delantreira,
              Tamien de traseira.
              Ora assi que te quiero morena,
              Ora assi que te quiero salada.
              Por beilar l pingacho
              Dórun-me di reis.
              Beila-se de quatro
              I tamien de seis.

         Estribilho:

              Beila-Io, beila-Io picorcito, etc.
              Se lo beilares bien
              Darei-te un teston.
              Los que beilan bien
              Sei you quales son.

         Estribilho:

             Beila-Io, bejla-Io picorcito, etc

A letra e respeitada com relativa rigidês. No entanto ouvimos algumas divergências, que, sem constituirem propriamente variantes, não queremos deixar de registar.

Assim o primeiro verso do estribilho algumas vezes é:

              Beila-Io, beila-l0 picorcito.

Quer dizer, não se ouve o ó aberto do segundo beila-lo. Na terceira estrofe às vezes repetem a toadilha das outras duas estrofes e assim cantam:

              Pur beilar l pingacho
              Dórun-me un teston.

Também nesta terceira estrofe os homens, quase sempre, cantam:

              Las que beilan bien
              Sei you quales son.

Nos dois últimos versos do estribilho pareceu-nos que dizem indistintamente como vai indicado na letra ou assim:

              Ora si que te quiero morena,
              Ora si que te quiero salada.

Um ou outro, ao cantar acentua a sonância espanhola e então em vez de l pingacho dizem el pingacho, em vez de «Dórun-me» ouve-se «Dóro-me», e em vez de «pouquito». Mas são diferenças tao pouco acentuadas que pode afirmar-se: dum modo geral respeitam a rigidês da letra no seu falar mirandês, com o seu quê de sabor espanhol.
Miranda do Douro - Página 2 Pingacho02Fig. 2 - A - dois passos a um lado cantando Por beilar l pingacho: B - dois passos ao lado contrário para ocupar a posição primitiva, e, cantam Dorun-m'un rial: C - avanço e recuo, em picotado cheio de graciosidade, cantando os dois primeiros versos do estribilho Beila-lo, beila-ló picorcito, Beila-ló que te quiero um pouquito.

A dança

Os dançantes dipõem-se em duas filas, separadas de um metro a metro e meio; homens numa fila, mulheres na outra. o primeiro desenho coreográfico executa-se dançando dois passos a um lado, em compasso ternário (Fig. 2 A), ao mesmo tempo que cantam:

Pur beilar l pingacho.

Depois, em sequência imediata, e no mesmo compasso, executam dois passos em sentido contrario (Fig. 2 B), cantando:

Dórum-me um rial.

Voltam assim a ocupar a posição inicial.
Estes dois versos são bisados, bem como os respectivos desenhos coreográficos que os acompanham.
Miranda do Douro - Página 2 Pingacho03Fig. 3 - A - Os dançantes fazem notação concordante, tocam-se pelos quadris e cantam Beilá-lo de lhado. B - Meia volta saltitada leva-os a toparam os quadris do lado oposto, cantam De l'outro ancustado.

Depois, frente a frente, dançam um picado, atirando, de vez em quando, os pés para diante num movimento delicado e cheio de graciosidade. Quase não se arredam do mesmo sitio: apenas um ligeiro movimento de avanço e de recuo (Fig. 2 C). Estes avanços e recuos terminam com um movimento do pé direito levemente projectado para diante com certa delicadeza e muita graciosidade.

Entrementes vão cantando os dois primeiros versos do estribilho:

Beila-lo, beila-ló picorcito
Beila-lo que te quiero un pouquito.

O canto prossegue com um «Beila-lo» que constitui, por assim dizer, a preparação para a nova figura coreográfica. Esta consiste numa rotação rápida e concordante, de tal modo que os dançntes, então frente a frente, fiquem aos pares, lado a lado e voltados na mesma direcção. Ao fazerem esta rotação concordante vão cantando:

Beihi-lo de lhado.
Miranda do Douro - Página 2 Pingacho04Fig. 4 - I de delanteira. Fazem a embiaga por vezes bem realista.

E tocam-se pelos quadris, homem e mulher de cada par.
Imediatamente uma meia volta saltitada os leva a toparem os quadris ou flancos do lado oposto (Fig. 9), ao mesmo tempo que cantam:

De l’outro ancustado.

Segue-se um quarto de volta, de modo a que os pares fiquem de face. Logo dobram o corpo para trás em ligeira flexão de pernas e extensão do tronco. Deste modo simulam a aproximação dos ventres (Fig. 4) ao mesmo tempo que cantam:

I de delantreira.

Depois numa volta completa e rápida cada par fica costas-com-costas. Logo uma brusca flexão do tronco leva-os a dobrarem-se para diante, concordante e simultaneamente, e a embaterem um certo vigor as regiões nadegueiras, ao mesmo tempo que cantam:

Tamien de traseira.
Miranda do Douro - Página 2 Pingacho05Fig. 5 - Tambien de traseira. Embatem com força as regiões nadegueiras.

É impressionante o contraste entre o embate vigoroso das regiões nadegueiras e a maneira discreta com que, ao cantarem «l de delantreira», simulam a aproximação dos ventres, quando muito tocando-os levemente e as mais das vezes mantendo-se a certa distância. Passo discreto que bem atesta ser o pingacho dançado por aquela gente sem a menor sombra de malícia ou sensualismo.

Ora si que te quiero morena
Ora si que te quiero salada

São dançados num picado saltitante, costas-com-costas. Ao pronunciarem o «salada» final os dançantes de cada par fazem uma volta rápida trocando os lugares em passo cruzado.
Termina pois a dança com os pares de novo face a face.
Com cada estrofe se repete a sequência dos passos que acabamos de descrever.
Algumas considerações
Começaremos por analisar o nome do bailado.
Pingacho é um nome que se enraiza em pinga e pingar.
O sufixo acho é um diminutivo frequente na linguagem popular mirandesa e espanhola (Cool.
No dialecto mirandês não temos conhecimento do emprego da palavra pingacho. Há o vocábulo pinganilho como sinónimo de fluxo menstrual, e temos conhecimento do vocábulo pildracho designação da pele, depois de esfolada, de qualquer rez.
Desde que a palavra pingacho não aparece na fala mirandesa era lógico supor que fosse vocábulo espanhol. Porém o Dicionário da Academia Espanhola, 1852, não o regista mas refere pinganello com o significado de «0 mesmo que calamoco, canelon», ou gelo ponteagudo em pingentes, que pende dos beirais dos telhados nos dias de grande frio com nevoeirada, dias que no leste trasmontano são designados de sinceno ou sincelo. As gotas de água pendentes, com o frio intenso, vão sucessivamente gelando e formam pingentes.
Algumas palavras do canto em confirmação dos quatro diferentes toques do corpo, dão a ideia dum fundo de sensualismo: aquele picorcito é disso um exemplo.
Picor significa ardura, ardência, comichão, e ainda: quente, com ardência, com vibração, com entusiasmo.
Esta mesma palavra em espanhol significa «escoçor», comichão que resulta no paladar por ter comido alguma coisa picante. Por extensão diz-se do que se sente noutras partes do corpo: vis pruritus mordax (9).
Como vimos no final do Pingacho, depois daqueles encontrões de lado, de frente e de traseira, cantam, parece que muito satisfeitos,
Ora assi que te quiero morena
Ora assi que te quiero salada.
Este «salada» é também palavra espanhola que significa gracioso, agudo ou chistoso. Segundo o Dicionário da Academia Espanhola, salaz é um adjectivo do que é muito inclinado à luxúria.
Pelas considerações que vão feitas em relação a alguns vocábulos do contexto, parece poder conduir-se que este bailado gravita mais para o lado de Espanha do que para o lado de Portugal.
Podemos ainda acrescentar aquele «Dórun-me un rial».
O «rial» foi sempre moeda espanhola, desde longa data até ao fim da monarquia em 1931.
Há porém que referir circunstâncias que nos levam a notar no Pingacho uma certa influência portuguesa da terra de Miranda.
São elas a referência nos versos do canto as moedas portuguesas «dirreis» e «toston»: «Dirreis» é a antiga moeda portuguesa de dez reis. «Toston» é também moeda portuguesa, é o tostão que valia cinco vinténs, e que, durante a primeira grande guerra e depois dela, foi muito abundante em notas de papel emitidas pelas câmaras municipais para facilidade de trocos, dado o desaparecimento das pequeninas moedas de niquel de tostão cunhadas em niquel.
Uma das coisas que mais impressionam no Pingacho são aqueles referidos toques de corpo, de lado, de frente e de traseira, a que podemos chamar costeladas, umbigadas, e, à falta de melhor, cusadas.
O argentino Bruno C. JacoveIla, no seu trabalho Nota sobre «O Pingacho» y «La Firmeza», publicado no Vol. XIX dos «Trabalhos de Antropologia e Etnologia», Porto, 1964, pág. 372-373, realça a semelhança de Firmeza, dança argentina, com o Pingacho, pelo menos em alguns versos que se cantam em concordância com certos passos da dança.
De facto é flagrante a similitude, para não dizer identidade, com o Pingacho, dos seguintes versos da Firmeza: «Darás uma vuelta / con tu compañera. Con las tras trasera, / con la delantera. Con ese costado, / con el otro lado.
Bruno Jacovella conclui: «No son precisos mayores comentários para dar por comprobada la procedência española de La Firmeza».
A costelada é frequente nos bailados paralelos ou de coluna da região mirandesa, por exemplo nas Ligas Berdes, Habas Berdes ou Augas Berdes. No Redondo de Ifanes o bailado termina cada volta com a costelada.
Ao observar aqueles gestos tão realistas, embora a umbigada seja feita, como dissemos, de maneira bastante discreta, fica-nos a impressão de que no pingacho, pelo menos primitivamente, teria existido um fundo marcado de sensualismo. Isto permite admitir a hipótese de que este bailado representa um reliquat de alguma velha dança, inerente a um remoto e gentílico culto fálico (10) de que, de resto, tantas sobrevivências, mais ou menos vagas, nos aparecem em muitos usos e costumes populares de Portugal e da Espanha
Miranda do Douro - Página 2 Pingacho06Fig. 6 - Costas-com-costas segue-se flexão brusca do tronco que os leva a, dobrados para diante, embaterem com vigor as regiões nadegueiras, ao mesmo tempo que cantam: Tamien de traseira.

Miranda do Douro - Página 2 Pingacho07Fig. 7 - A dança termina com os pares face-a-face num picado saltitamte, ao mesmo tempo que cantam: Ora assi que te quiero morena, ora assi que te quiero salada.

Sabemos como já o escreveu o Abade de Baçal (11) «que entre os antigos iberos uma das formas do culto externo era constituído pela dança; não qualquer dança, mas sim uma especial consagrada pelas fórmulas litúrgicas, que tinha passos tregeitos, ritmos e cadências próprias – dança sagrada».
Muitas eram estas danças rituais entre os povos antigos.
Delas nos chegaram até hoje restos mais ou menos vivos, mais ou menos flagrantes.
A própria dança dos Paulitos que fazia parte integrante das procissões das festas religiosas em muitas regiões do leste transmontano (12) deve ter tido, de início, um significado essencialmente cultural e litúrgico.
Não parece nem ousado nem destituído de certo fundamento concluir que o Pingacho é um bailado de origem remota, certamente gentílica pré-romana, em ligaçao com velhos ritos de fecundidade, e dos quais o culto fálico foi de grande expansão nos povos primitivos peninsulares, a ajuizar pelas remeniscências que do mesmo ainda hoje se encontram em muitos usos e costumes populares. O Pingacho será um deles.

(1) Afonso Valentim, António Mourinho e Santos Júnior, 0 Galandum, Malha do cereal na Cardenha e cora dos malhadores, in «Douro- Litoral», n.· VII-VIII, 6.ª série, pág. 3 a 26, com 17 figs., Porto, 1955.
(2) Como é bem sabido o trasmontano lê o ch como tch, e assim dizem pingatcho.

Este trabalho foi por nós (A. M. e S. J.) apresentado à reunião cientifica da Sociedade de Antropologia, na F. C. da U. P. no dia 11 de Fevereiro de 1955. Foi publicado in «Douro Litoral», Boletim da Comissão Provincial de Etnografia e Historia, 8.ª Serie, n.º I-II, Porto, 1957, pág. 5 a 23, 19 figs., por António Mourinho, Santos Júnior Bento Bessa. Este colheu e escreveu a música.

(3) Para se ter ideia da posição em extrema oriental de Paradela, basta dizer que ela fica aproximadamente no meridiana que passa por Sevilha.
(4) Este bailado é também conhecido pelo nome de Flaire cornudo e tem afinidades, ao menos na letra, com um bailado que se dança em Burgos e na Estremadura espanhola, onde tem os nomes de «El tropeletré» e «La geringonza del Flaire». Conf. Domingo Hergueta y Martin, Folklore Burgales, Burgos, 1934, 240 págs.; vd. págs. 102-105. Ver também Olmeda, Cancioneiro popular de Burgos, apud Domingo Hergueta y Martin, cit. Flaire é palavra mirandesa arcaica que significa frade. Em espanhol fraile.
(5) P.e Francisco Manuel Alves (Abade de Baçal), Memórias Arqueológico-Históricas do distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, pág. 287 a 296 e pág. 323.
(6) P.e Francisco Manuel Alves (Abade de Baçal), A Festa dos Rapazes – Usanças tradicionalistas. – Notas Etnográficas. – Vestígios de um ciclo coreográfico prestes a extinguir-se, in «Ilustração Trasmontana», 3.° ano -1910, Porto, 1910, pág. 178 a 181, 3 figs.; transcrição, pág. 180; id., Mem. Arq. Hist. do dist. de Bragança, cit., vol. IX, pag. 295.
(7) O compasso de remate do estribilho na parte em que cantam o «salada» com o seu requebro, é pura e tipicamente espanhol.
(Cool Leite de Vasconcelos, Estudos de Filologia Mirandesa, Lisboa, 1900, vol. I, pág. 341.
(9) Dicionário de la lengua castellana, por la Academia Española, Madrid, 1852.
(10) José de Pinho, A propósito duma velha jóia ibérica, in «Trabalhos da Sociedade portuguesa de Antropologia e Etnologia», vol. v, Porto, 1931, pág. 37 a 59. A este trabalho bem cabia o subtítulo de vestígios do culto fálico em Portugal. Das págs. 45 a 67, o A. refere muitos factos e, práticas populares em que e licito ver sobrevivências, mais ou menos flagrantes, dum velho culto fálico.
(11) P.e Francisco Manuel Alves (Abade de Baçal), Mem. Arq. Hist. do dist. de Bragança, cit. vol. IX, pág. 295.
(12) P.e Francisco Manuel Alves (Abade de Baçal), Mem. Arq. Hist. do dist. de Bragança, cit. vol. IX, pág. 240-241.
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 21:18

Danças Mirandesas - O Redondo

O Redondo é um bailado paralelo quase exclusivo da povoação de Ifanes, onde se dançava somente na tarde e noite de 25 de Novembro, festa de Santa Catarina, junto da grande fogueira no meio do grande terreiro da aldeia.
Dançavam homens e mulheres casados, rapazes e raparigas solteiras, ora só cantando, ora ao toque de gaita de fole, do tamboril e do bombo.
Este bailado tinha como caracteristica o grito hô … !
Este brado era gritado alto no acto da nalgada, em que o homem e a mulher de cada par embatiam com certa violência as regiões nadegueiras. O grito era dado pelo chefe da dança como sinal para o embate do fundo das costas.
No trespasse cruzam-se as filas, passando cada uma para lugar da outra. O desenho coreográfico sobrepunha-se aos passos dos outros bailados paralelos ou de coluna.
Pode dizer-se que o redondo foi para a cova com o já citado José da Igreja, por alcunha o Zé da Gaita, falecido há anos.
A música foi recolhida por Michel Giacometti, em ifanes em 1956, e editada em disco em 1960 pelo Arquivo de Estudos Portugueses-Antologia da Música Popular Portuguesa-Trás-os-Montes.
Ao dançarem o Redondo era habitual cantarem a seguinte quadra.

Nós daqui e vós daí
Sodes tantos como nós.
Mataremos um canhono,
Os cornos são para vós.

Outras quadras sem terem significado especial, digamos, qualquer quadra, vulgar e corrente, era cantada ritmando os passos da dança.

Os bailados repasseados mirandeses constituem um grupo de danças, mais de uma dúzia, são uma das mais puras, senão a mais pura, expressão mesológica na variada e rica coreografia popular mirandesa.
Os repasseados constituem uma verdadeira familia de danças que se executam em grupos de 4 dançantes, ou seja, cada grupo formado por dois pares, ao toque da gaita de fole, flauta pastoril, tamboril, bombo, pandeiro, e ferrinhos. Muitas vezes com acompanhamento apenas de alguns destes instrumentos e de assobio pastoril.
O repasseado e um tipo de bailado de terreiro que pode considerar-se como autêntica dança agrícola rural, cuja música deve remontar ao seculo XVII, ou talvez mais atrás.
A letra dos vários repasseados, de que as geriboilas constituem, provavelmente, o núcleo primordial e castiço, é em redondilha menor, de puro dialecto mirandês.
Na série dos repasseados mirandeses citaremos os seguintes: As Geriboilas, Fui-me a confessar, Balentim trás trás ou Só quero Balentim, Verde gaio, Solidana, Madre abadessa, Para namorar marena, Maripum, etc.

(1) Pelos autores (Prof. Santos Junior e P.e Dr. Antonio Mourinho) foi feita uma comunicação no anfiteatro de Zoologia da Faculdade de Ciências do Porto, em sessão cientifica da Sociedade Portuguesa de Antropologia e Etnologia, no dia 16 de Fevereiro de 1963, subordinada ao titulo Bailados repasseados de Terra de Miranda. O Prof. Santos Júnior aludiu à estreita colaboração de há anos com o P.e Dr. A. Mourinho, que permitiu e condicionou estudos em conjunto de vários aspectos do folclore do leste trasmontano.

Fez depois considerações sobre a dança como manifestação séria do modo de ser e de sentir dos povos, nas suas várias modalidades, e sua evolução histórica. Descreveu as geriboilas típico bailado repasseado mirandês, com os desenhos coreográficos respectivos, do repasseado, de trespasses e do contrapeado. Projectou fotografias e fez ouvir a música, que registou em Duas Igrejas em fita electromagnética.

Em seguida o P.e Dr. A. Mourinho tomou como base as geriboilas, «expressão mesológica das mais puras na variada coreografia mirandesa, autentica dança agricola rural, cuja música remontará ao séc. XVII». Descreveu alguns bailados repasseados, como Fui-me e confessar, Só quero Balentim ou Balentim trás-trás, Verde gaio, etc., comparativamente com as geriboilas, incluindo os repasseados de terreiro ao toque da flauta pastoril, do tambor, da gaita de fole, caixa e bombo, «que foram e são ainda a verdadeira e lidima expressão da dança mirandesa». Citou um grande número de danças hieráticas, de cunho sagrado, que em Espanha se dedicam à Sagrada Escritura, à Mãe de Deus, ao Apostolo Santiago e outros santos e em Terra de Miranda glorificando a Virgem Maria, e o Santíssimo Sacramento.
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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 21:19

Danças Mirandesas - Para namorar morena


Este bailado, música e letra foi recolhido em Caçarelhos, Vimioso, já por 1947, por A. M. É manifesto o sentido maldizente e de escárneo da letra cantada.

Nu me gusta l pã centêno
Que m’amarga la costreza


Estribilho
«Para namorar,
Para namorar, morena,
Para namorar,
Bu çapato i bona mëia! … »
Se algu diê, falei cutigo,
Nu mc pesa, nu me pesa. ..
Para namorar,
Para namorar, morena, etc.
Roubóru la Malgarida,
Pula ripa del tilhado;
Para namorar,
Para namorar, morena, etc.
Pensando, q’era u toucinho,
Que stába despindurado!. ..
Para namorar,
Para namorar, morena, etc.
U bielha döu u peido,
A la porta de la scôla,
Para namorar,
Para namorar, morena, etc.
Salíru ls studiantes todos,
«-Santa Barbola! … q’ atrôna! …»
Para namorar,
Para namorar, morena, etc.
Miranda do Douro - Página 2 Paranamorar01Figura 1 - Música da dança para namorar morena

Miranda do Douro - Página 2 Paranamorar02Fig. 2 - Passos da dança Para namorar morena: a - Roda: bailam frente a frente com seu par; dão 2 passos, eles em frente elas as arrecuas; logo meia volta para dançar com o outro par; de novo meia volta para dançar com o seu par. Estas meias voltas são bisadas: b - Trespasse dos pares: c - Trespasse dos homens que passam ombro a ombro e não como uma giriboila, uma para lá e outro para cá: d - Trespasse das raparigas também de ombro a ombro.

Aconteceu com este bailado o que tem acontecido e está sucedendo com outros. De alguns só nos ficou o titulo como sucedeu com a chula mirandesa da qual só resta a tradição, como já referimos.
Senhor Galandum
Senhor Galandum

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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 21:21

Danças Mirandesas - Solidana


Bailado repasseado recolhido em Duas Igrejas em 1945.
Dança-se como as Geriboilas com os passos indicados Fig. 2 e cantado com a musica da Fig. 1.
Miranda do Douro - Página 2 Solidana01Figura 1 - Música da Solidana

É um dos da numerosa família dos repasseados, com coro ou sem coro.
Por nos parecer (A. M.) a letra deste bailado a mais naturalista e adaptada à vida e às coisas dos mirandeses, o realçamos.

Desde há vinte anos atrás havia despique deste bailado e de outros repasseados, como dos grupos dos Pauliteiros, na romaria da Senhora do Naso, 5 a 8 de Setembro.
Miranda do Douro - Página 2 Solidana02Figura 2 - Passos da dança da Solidana: a roda; b trespasse dos homens; com remate saltado a pés juntos; c voltam à posição inicial; d volvem a dançar frente a frente com troca de par; e trespasse das mulheres que termina com salto batido a pés juntos; f voltam à posição inícial.

Por lapso nos três desenhos da linha de baixo não se riscou o traço a indicar os homens .

É corrente cantarem a letra que segue.

Inda hoje reparei
Quem andava no terreiro;

Estribilho:

Ai Solidana, agora, agora.
Ai Soiidana, agora aqui!
Anda o cravo e anda a rosa,
Anda o ramalhete inteiro.

Estribilho

Ai Solidana, agora, agora.
Ai Solidana, agora aqui!
Minha mãe, minha mãezinha,
Que linda mãe tenho eu!

Estribilho

Derramou o seu colete
Para me compor o meu!

Estribilho

Rua abaixo rua acima
Toda a gente me quer bem

Estribilho

Só a mãe do meu amor
Não sei que raiva me tem

Estribilho

A solidana é uma dança de convite, como aliás parecem ser todos os repasseados.
Senhor Galandum
Senhor Galandum

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Mensagem por Senhor Galandum 6/2/2024, 21:23

Danças Mirandesas - Verde Gaio


Bailado repasseado colhido em Duas Igrejas, em 1945.
A letra deste Verde Gaia, pelo menos a 1.a quadra é geral em todo o pais. Assim a canção do Verde Gaio, existe no Alentejo, na Extremadura, nas Beiras, no Minho e em Trás-os-Montes.
Miranda do Douro - Página 2 Verdegaio01Figura 1 - Música do Verde Gaio

A música deste nosso bailado, cantada a duas e três vozes, bem parece um coral minhoto cheio de vida. Por este e outros motivos, se nos revela que esta Terra de Miranda foi ponto de encontro de canções e bailados populares de muitas gentes de Portugal e de Espanha, afluindo a este recanto Nordeste, encravado entre as Serras de Mogadouro e da Senábria e os rios Sabor e Douro. Gentes desta zona saíam em busca de vida, a trabalhar, no tempo das ceifas, para terras de Zamora, Salamanca e Burgos, e de lá traziam novas canções populares castelhanas e leonesas. Outros iam para Andaluzia, para a apanha da azeitona, e outros para as vindimas no baixo Douro.
Da Galiza, vinham as amoladores, os peneireiros e os pedreiros com suas familias, que traziam seus costumes, suas canções, seus instrumentos musicais e seus bailados.
Do Minho, vinham as serradores em grande número que também traziam seus corais e seus bailados; por isso, não sabemos se este nosso Verde Gaia será uma versão mirandesa do Verde Gaia portugues, se a versão de urn Verdegar minhoto.
A coreografia, aferida pela Giriboilas e pela Solidana, é um puro e tipico repasseado mirandês muito vivo e movimentado; rematado no fim do estribilho com um saltado de forte, uníssono bater de pés juntos, como se verifica com outros repasseados.
O canto é ligeiro como indica a música da Fig. 1 que é tocada pelo número variavel de instrumentos, e sempre pelo bater do tamboril, do bombo ou do pandeiro e pandeireta.
E com frequência acompanhada pelo assobio pastoril.
A letra com que, habitualmente, cantam o Verde Gaia, em Duas Igrejas é a que segue:

O verde gaio é meu
Que me custou meu dinheiro;

Estribilho
É do verde gaio,
Toma lá, toma lá!
É do verde gaio
Toma lá dá cá!
Custou-me quatro vintens,
Lá no Rio de Janeiro! ..
E da verde gaio, etc.
Na Rua Direita do Porto,
Mataram a Manuel,
É do verde gaio, etc.
Com uma pistola de prata.
Oh que morte tão cruel!
É do verde gaio, etc.
Na Rua Direita do Parto,
Mataram a Mariana
É do verde gaio, etc.
Com uma pistala de prata
Oh que morte tão tirana! …
É do verde gaio, etc.

O Verde Gaio é dança corrente em muitas aldeias portuguesas, com as naturais modalidades. Pode dizer-se que se encontra de norte a sul do país. É pois dança popular muito generalizada.
Em boa hora a prestigiosa e benemérita Fundação Calouste Gulbenkian meteu no seu programa de bailados o «ballet» do Verde Gaio, num requinte e apuro de exaltação artística, que tern sido muito justamente apreciado.
Aliás já esta dança havia sido lançada no «ballet» nacional pelo Secretariado Nacional de Informação.
Senhor Galandum
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