Música Clássica e Cinema

sombriobyte escreveu:
Bem lembrado o grande Bernard Herrmann, criador original e que sempre inovou:
usou apenas cordas em "Psicose", contrariando a todos e acertando em cheio.

"Psicose" contém talvez o tema mais famoso do cinema, o do assassinato sob o chuveiro de Marion Crane, quando o Hitchcock exigiu que não tivesse nenhum fundo sonoro musical. Herrmann não deu a menor bola, criou um tema de forte impacto, só com cordas, imitando grasnidos de aves, dando um recado, antes de qualquer indício no filme que o assassino tinha relação com aves, no caso o empalhador de pássaros Norman Bates.
Procurem ouvir a suíte do filme, orquestrada só para cordas, tentando se desligar do filme e percebam a beleza de música tão intrigante e original.

Quem quiser ouvir a mais bem elaborada trilha sonora do Bernard Herrmann, procurem apreciar a OST do filme VERTIGO (Um corpo que cai).
Este autor sempre inovou e utilizava nestes filmes de Hollywood, músicas contendo Habanera, Fandango, tango, etc, tão sutis que às vezes não nos apercebemos delas...

Embora eu esteja me repetindo, acho que nunca é demais lembrar de dois compositores que julgo muito interessantes:

Alex North que escreveu, entre outras, as trilhas de "Spartacus", de "Cleopatra" e até uma trilha para o filme do Fred Astaire (uma trilha-balé) "Papai Perna-longa" ("Father Long Loose"), mas cuja obra não sei se "limitou-se" (ele morreu com 81 anos!) a cinema;

e Wojciech Kilar, que fez a trilhas de "Drácula", do Coppolla, de "O Pianista", além de várias outras para filmes poloneses, e cuja obra é mais ampla.

Bem, fui pesquisar e ele não compôs só para cinema; inclusive estudou música na Rússia: foi o primeiro americano a faze-lo!

Vejam só que curioso: Alex North compôs a trilha sonora de "2001" de Kubrick, que no entanto, às vésperas do lançamento, mudou a trilha para a que conhecemos.

A trilha originalmente composta foi lançada , em CD (*), separadamente, constituindo-se, pois, numa autêntica "musica original escrita para cinema que ganhou vida própria..." como sugere o tópico. Ou não?

(*)(Alex North's 2001 Jerry Goldsmith - National Philharmonic Orchestra
1993 Varese Sarabande Records, Inc., VSD-5400 )

Siegfried,
De pleno acordo com o que vc disse. Tenho muita vontade de conhecer esta trilha do Alex North. No resto sempre gostei de suas trilhas, principalmente Cleópatra. O que consta com sendo uma tremenda injustiça que o Kubrick fez com ele, já que com a trilha toda pronta, o diretor numa ideia repentina, a substitui com músicas clássicas de R. Strauss, J. Strauss Jr, Ligetti, etc.
Como Kubrick é um gênio indiscutível, a história do filme tem mostrado que ele acertou em cheio, mas não dou minha opinião com certeza pois não conheço a música descartada.
Caso de trilha descartada que ganhou vida própria foi a de Bernard Herrmann para o filme "Cortina Rasgada" do Hitchcock, que brigando definitivamente com o compositor, rompendo uma parceria celébre e antiga, a substitui pela música de John Addison. Hoje a de Bernard Hermmann foi gravada em CD da Varese Sarabande e foi aproveitada com retoques do Elmer Bernstein no filme o Cabo do Medo, remake do Scorsese, em que foi usada também de B. Hermmann, a trilha do filme orignal O Círculo do Medo (Cape Fear).
Muitas das trilhas sonoras modernamente tem sido gravadas de maneira espetacular, com boas orquestras e bons maestros, através de sons magníficos e tem tudo para ganhar vida própria independentemente das películas às quais estão vinculadas.
Quem quiser tirar a dúvida escute como amostragem o CD que Esa-Pekka Salonen gravou com a L. A. Symphony Orchestra com suítes das trilhas do Bernard Herrmann!
Abraços

Alquimista, eu ainda não conhecia Patrick Gowers, mas agradeço demais pela dica.
Abraços

Pessoal, e o Philip Glass?

Infelizmente nada tenho a acrescentar ao conteúdo das discussões deste site, mas tenho uma questão: gostaria de saber de onde foi retirada uma música que aparece naquele filme "Laranja Mecânica" (a clockwork orange) de Kubrick, no momento em que o protagonista se apresenta ao espectador. Se por acaso alguém tiver conhcimento da trilha sonora deste filme é a faixa que se chama "Beethoviana".

Nota sentimental: concidentemente, houve uma época, no colégio em que estudei, que o sinal para o recreio era essa mesma música.

Alquimista,

Na minha humilde opinião, a música minimalista elabora um esquema de repetições em série, com um mínimo de material melódico, em prol do "efeito hipnótico" ou seja lá o quê. Ela é praticamente desprovida de emoções profundas e isso a torna enfadonha se ouvida em profusão. Acho que ela fica muito bem como trilha sonora (a trilogia Qatsi, Anima Mundi), mas sozinha ela não se segura.
Sinceramente, gosto de Philip Glass apenas em quantidades homeopáticas.

Um abraço!

Paranhos,
essa música é uma versão eletrônica de Wendy Carlos para a Música para o Funeral da Rainha Mary ("Music for the Funeral of Queen Mary"), de autoria de Henry Purcell, que viveu na segunda metade do século 17.

Kubrick era fascinado por música erudita e ele geralmente incluía nos roteiros dos filmes onde ele queria que fossem colocadas as músicas, em AI por exemplo que foi dirigido pelo Spielberg mas o roteiro é original do Kubrick, no momento em que os robôs entram na cidade em que o pequeno dróide quer fazer consultas sobre sua origem, é tocada uma parte de uma música de Tchaikovsky se não me engano...

Aproveitando que se fala em Kubrick, alguém sabe quem originalmente compôs o tenebroso tema que Wendy Carlos adaptou para a abertura de "O Iluminado"? Este tema aparece também no finale da Sinfonia Fantástica de Berlioz.

A versão do Wendy para o filme é de arrepiar.

Mesmo com todas as ponderações que são feitas, e digo que devem ser feitas ponderações - com certeza - a múscia de Philip Glass tem seu valor e que merece ser reconhecido. É certo que muita coisa de Glass você suportaria escutar uma vez na vida, mas para o aprofundamento e para adquirir conhecimento (musical e cultural, se não estas andarem juntas), ouvir Philip Glass pelo menos alguma vez, é sempre de grande valia. Eu, tenho uma certa admiração pela sua música, em particular - jamais preferência.

Siegfried,

Na verdade, o tema que Kubrick imaginou para este filme era "O Cavaleiro da Rosa", de R. Strauss. Mas não indicou exatamente em que cena. O compositor da trilha sonora John Willians, meio que sem saber onde colocá-la, inseriu um pequeno trecho na entrada da cidade.

Kubrick era mestre em inserir música clássica como trilha sonora.
Acho estupendo o famosíssimo corte de sequência em 2001. Da desolação da paisagem primitiva, o macaco ancestral arremessa um osso. Ouvimos um vento assobiando ao fundo. Corte seco. Avançamos então milhões de anos no futuro e uma nave espacial cruza a tela. No silêncio do espaço estrelado, a orquestra inicia, em pianíssimo, o "Danúbio Azul" de J. Strauss. Espetacular!

Siegfried,
Sobre o filme ''O Iluminado'', o tema é o Dies Irae, cantochão do serviço fúnebre católico. Não tem compositor, parece-me que foi inicialmente criado sobre as letras do poema...

Alguém já leu o livro de Anthony Burguess, que deu origem ao filme ''Laranja Mecânica''? É igualmente genial, porém não existe menção à nona de Beethoven... o protagonista também é aficionado por música clássica, mas as citações a Bach e Mozart são desassociadas de maiores implicações para o enredo.

Alguém aqui conhece o filme de Kubrick "Barry Lyndon"? É o filme de época mais bonito que já vi... e novamente a trilha tem incursões clássicas, entre elas uma sarabanda de Handel e o magnífico andante do trio em mi bemol maior op. 100 de Schubert.

A música minimal tem apenas uma razão de ser: a artística. Tal como, a arte minimal o que interessa é reduzir a melodia ao mínimo possível, sem artíficios nem coisas do género. Portanto, acho a arte minimal um exercício formal tal como muitas artes. E que deve ser respeitada não tanto pelo que soa mas pelo conteudo ideológico.

Saudações musicais...

sombriobyte escreveu:
Alguém aqui conhece o filme de Kubrick "Barry Lyndon"? É o filme de época mais bonito que já vi... e novamente a trilha tem incursões clássicas, entre elas uma sarabanda de Handel e o magnífico andante do trio em mi bemol maior op. 100 de Schubert.

Também acho Barry Lyndon o filme de época mais bonito que já vi. Kubrick utilizou lentes pioneiras da NASA que conseguiram captar a luz natural dos ambientes internos durante toda a filmagem.

Quanto à trilha sonora, além das belíssimas peças que você citou, há também muita música tradicional irlandesa (''celta'') com destaque para o The Chieftains. Enfim, é um filme maravilhoso!

Me inscrevi neste fórum por causa deste tópico,

É com prazer que inicio minha participação com um assunto que gosto tanto que é sobre as trilhas sonoras de cinema. Espero poder contribuir.
Tudo começou na primeira metade do século, com o desembarque em Hollywood de compositores como Max Steiner, Franz Waxman, Dimitri Tiomkin e outros, procedentes de uma Europa devastada por duas grandes guerras. Desde então, muitos "mestres" têm surgindo, e hoje temos uma nova geração de especialistas, incluindo John Williams, Ennio Morricone, Jerry Goldsmith, James Horner e James Newton Howard. Atualmente, alguns críticos consideram essas "soundtracks" como arremedos de música clássica. Outros já acham que as trilhas sonoras de cinema serão consideradas, no futuro, como a verdadeira música "clássica" do século XX. A questão que eu coloco para os colegas é exatamente esta: como devemos analisar as composições escritas originalmente para o cinema, os chamados "original scores"? É um gênero de música à parte?

Seja bem-vindo, Necromante!

Necromante, este ponto que você coloca é importantíssimo. De fato, a "música de cinema", produzida para servir como trilha sonora, é uma das manifestações musicais mais importantes do nosso tempo. E de uma qualidade absolutamente indiscutível. Considero estes críticos que a consideram como "arremedos de música clássica" extremamente ingênuos. Um compositor da genialidade de um Enio Morricone dificilmente pode escapar da imortalidade que os grandes compositores merecem. Acredito que o uso de música "clássica", por assim dizer, em trilhas sonoras é uma aplicação musical prática - da mesma forma que o é nas óperas, balés e assim por diante - que consegue atingir um público muito maior do que a original "música de concerto". Há alguns anos eu estava na plateia de um concerto de um conjunto de metais, que após tocarem Holst, Gershwin, etc, etc, tocaram "Star Wars", acho que como bis. Lembro-me das pessoas falando "essa eu conheço!".

Tudo que é novo e todas as mudanças nunca são aceitas facilmente, elas sempre tem de esperar uma próxima geração para serem reconhecidas, seja na ciência, na arte...Lembro agora de casos como de Galileu, Darwin, que foram perseguidos pelos seus novos conceitos que hojem aceitamos como fatos comprovados, na música, nada melhor que citar Stravinsky, arrasado pelos críticos pela hoje reconhecida como obra-prima a Sagração da Primavera, temos também Gershwin e outros que não me recordo. A influência da música clássicas nas trilhas sonoras são tão claras, que muitos filmes usam a música de compositores famosos para compor suas trilhas, casos como 2001 - Uma odisséia no espaço, que usou Strauss, e um mais recente, Shine, que popularizou Rachmaninoff e seu maravilhoso concerto para piano n 3. Se hoje as trilhas não são consideradas clássicas, tenho certeza que muito em breve serão, temos verdadeiras pérolas, como as trilhas sonoras de Psicose de Herrman, Guerra nas Estrelas e Indiana Jones de Williams e vários outros.

Considerar as trilhas como arremedos da música erudita é de fato purismo bobo....o que deve definir sua aceitação como obras musicais deve ser tão somente sua qualidade. O que é o ALEXADER NEVSKY senão uma partitura para cinema, hoje incorporada ao repertório de concertos devido à sua qualidade? Purismo por purismo é pura bobagem.