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A Guerra de Tróia

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Hermes Trismegistus
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A Guerra de Tróia - Página 31 Empty Re: A Guerra de Tróia

Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:00

Recuando, sempre combatendo, chegaram às proximidades do palácio do rei, onde se travava um combate feroz. Os gregos, lançando mão de escadas, tentavam galgar os muros, enquanto os troianos, postados no telhado, atiravam-lhes telhas e pedras que conseguiam arrancar. Apesar da surpresa imposta pelos gregos, a batalha não deixou de ser-lhes cruenta, pois, embora a maioria dos inimigos estivesse desarmada, defendiam-se na medida do possível. Uns atiravam contra os atacantes vasilhas, outros mesas, tições, pedras; alguns conseguiram armar-se de espetos, machados, de tudo quanto lhes caía nas mãos. E os gregos, durante o ataque, tiveram também suas perdas, com mortos e feridos, entre os quais o príncipe Abas. Houve os que tombaram abatidos por pedradas, outros morreram nas chamas das casas incendiadas ou ficaram esmagados sob os edifícios que desabavam. Quando, finalmente, se lançaram ao assalto do castelo de Príamos, onde estavam reunidos inúmeros troianos muito bem armados, inúmeros foram os aqueus que tombaram no duro combate, aos golpes dos defensores movidos pelo desespero.

E Enéias ouviu bradar uma voz vinda do palácio:

— Os assassinos vão em busca de nosso rei!

Enéias e o seu grupo arremessaram-se para lá e, quando chegaram, assistiram a uma das cenas mais impressionantes. Postado à entrada do palácio, um grupo cerrado de defensores tentava barrar a entrada dos invasores com longas lanças, enquanto os outros, empunhando também armas de igual tamanho, arremessavam-se em direção à porta. Dezenas de homens, já mortos, permaneciam espetados nos longos chuços, com as cabeças pendidas, enquanto os combatentes tentavam adiantar-se ou impedir o avanço uns dos outros.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:01

E finalmente, começaram a tombar os nobres troianos, um a um. Diómedes matou Eurídamas, o genro de Antenor. Nisso, viu pela frente Ilioneus, um dos mais importantes anciãos de Tróia; mas Ilioneus, prostrando-se de joelhos diante da espada desembainhada do grego, e erguendo com uma das mãos a sua própria arma, abraçou com a outra a perna de Diómedes, e suplicou-lhe:

—Sejas quem fores dentre os argivos, aplaca tua ira! Qualquer homem só conquista glória quando enfrenta um inimigo mais jovem ou mais forte do que ele. Tem piedade deste velho, portanto, e lembra-te de que tu também desejas tornar-te velho.

Diómedes parou um instante. Logo depois, levantou a espada e mergulhou-a na garganta do troiano, dizendo:

— Espero ter o prazer de desfrutar de tranquila velhice, sem dúvida, mas agora emprego a força, mandando para Hades todos os meus inimigos!

Em seguida, continuando furiosamente a destruição, matou outros inúmeros inimigos.

À medida que fervia a luta, no interior do recinto ia aumentando a claridade por efeito dos incêndios, cada vez mais numerosos, e dos infindáveis archotes agitados pelos aqueus. Por isso, a batalha ia-se tornando cada vez mais acirrada e brutal, uma vez que os vencedores não corriam o risco de confundir amigos e inimigos.

Através de uma passagem secreta, conhecida somente pelos comandantes de Tróia, Enéias conseguiu juntar-se aos defensores do palácio. Enquanto estes impediam o inimigo de transpor os muros, um grupo de jovens gregos, comandados por Pirros Neoptólemos, conseguiu com perseverante esforço, por abaixo as portas. Os guardas não resistiram por muito tempo à investida furiosa e, depois de uma luta encarniçada mas curta, os gregos irromperam impetuosos no palácio, cujas salas ressoaram com o fragor da batalha.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:02

Enéias, então, acompanhado de um grupo de dárdanos, subiu até o topo da mais alta torre do castelo, de onde se avistava toda a cidade e o mar adiante. Depois de escalar as centenas de degraus, chegaram exaustos ao topo. E Enéias, agarrando uma alavanca e tirando pela base a sustentação do madeiramento, gritou:

— Vamos, arranquemos todos os alicerces!

Ulisses, avançando em direção do palácio de Príamos, reconheceu dois filhos de Antenor, Licáon e Glaucos, e fugiam para abrigar-se em algum lugar. Ulisses, posicionando-se diante deles, mandou seus soldados que os levassem ilesos a um lugar seguro e não permitissem que fossem atacados. Mandou-lhes dar atendimento médico a Licáon, que estava ferido. Ulisses resolveu poupá-los em consideração de Antenor. E tinha esperança de encontrá-lo também e, em sinal de amizade, ajudá-lo, mas não o viu em lugar algum. Imediatamente, mandou se pendurasse uma pele de leopardo à porta da casa de Antenor, para indicar que ela deveria ser respeitada. Assim, foi a Morte entrando, de casa em casa, mas só uma foi respeitada: a do velho Antenor, que havia salvo a vida e dera boa acolhida a Menelaus e Ulisses, quando estes tinham vindo a Tróia na qualidade de legados, e por ter ajudado a Diómedes e ao filho de Laertes a roubarem o Paládio do Templo de Atena. Como agradecimento, os dânaos lhe respeitariam a vida e os bens.

O processo de desmonte, no entanto, prosseguia no alto, comandado por Enéias. De repente, um fragoroso estrondo anunciava aos defensores que a torre estava para desabar. Fugindo para outros aposentos, abandonando a luta, os troianos escaparam no último instante ao desabamento; a torre, desmanchando-se em uma miríade de pedaços, veio abaixo, esmagando grande número de invasores.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:03

Naquele momento, Pirros, filho de Aquiles, tão feroz quanto o pai, invadia com alguns mirmidões a soleira do palácio. Com sua machadinha fez saltar longe os gonzos de bronze da porta que impedia o acesso aos aposentos do rei, à sala do trono e dos banquetes. Um grito de triunfo escapou das gargantas dos aqueus, enquanto um uivo de agonia foi arremessado pelas gargantas das mulheres protegidas lá dentro. Do mesmo modo, o pequeno e terrível Ájax e o cretense Idomeneus estavam entregues à faina de destruir, enquanto que o rei Príamos envergava sua armadura para fazer frente ao invasor, apesar da avançada idade. Sua mulher tentou dissuadi-lo, alegando a inutilidade de qualquer resistência:

— Meu marido, que loucura pretendes cometer? Que proteção tu pensas poder oferecer a nós todos com este cansado braço que mal pode empunhar a espada? Vamos, larga isto e vem buscar refúgio junto aos deuses, únicos que ainda podem mover à piedade o coração desses assassinos!

— Vai, Hécuba! Procura Andrômaca e outras mulheres e crianças, e ide juntas procurar asilo no Templo de Atena! Não me entregarei a esses cães sem luta!

Nesse momento, Polites, um dos seus filhos, passou por eles correndo, perseguido por Pirros e gravemente ferido, agonizante, com uma lança cravada nas costas. Pirros já havia matado dois deles, sem contar Agenor, que, um dia, ousara combater-lhe o pai. Diante dos pais, vergaram-se-lhe as pernas, e o príncipe, caindo ao chão, expirou.

— Filho! Meu filho Polites! Que os deuses castiguem a todos por sua maldade!

O rei não se conteve:

— Não se mata um filho diante dos pais! Vangloria-te de ser filho de Aquiles, mas ele assim não procedia: era nobre! Tendo vencido meu filho Heitor e ouvindo minhas súplicas, devolveu-me seu corpo para que recebesse condigna sepultura! Por que demonstras maior vileza do que ele, ser perverso?
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:04

E, erguendo a lança, arrojou-a contra Pirros; mas foi fraco o arremesso e a lança resvalou no escudo de bronze do pelida e caiu ao chão, sem lhe causar o menor dano. Pirros vociferou:

— Vai contar a meu pai que sou indigno dele!

Com as mãos tintas de sangue, agarrou o velho rei pelos cabelos e arrastou-o até o altar de Zeus, que ficava ao ar livre, assistido de longe pela esposa Hécuba aos gritos. Pirros ergueu a espada, e o velho rei desafiou sua ira:

— Mata-me, valente filho de Aquiles! Depois de ter visto tombar quase todos os meus filhos, como pretendes que eu continue a contemplar a luz do Sol? Ah, por que me poupou a vida teu pai? Vamos, menino, sacia-te em mim e livra-me de tão grandes dores!

— Ancião, tu me instigas a fazer o que o coração exige que eu faça.

Diante do altar de Zeus e, levantando as mãos para a estátua de Zeus, Príamos reuniu suas forças e começou a orar. O jovem guerreiro, sem a menor piedade, cravou a espada até o cabo no corpo do infeliz ancião. E, de um só golpe, decepou a cabeça de Príamos, como se cortasse uma espiga de milho. O corpo tombou por sobre outros cadáveres, enquanto a cabeça foi rolar aos pés das mulheres da corte, que, horrorizaram-se e soltaram gritos histéricos. Era o fim da dinastia de Príamos. Assim morreu Podarces, conhecido por todos pelo nome de Príamos, que reinara sobre muitas cidades e muitos povos da Míssia e, particularmente Tróade. Brutalmente assassinado, seu corpo foi arrastado, preso à biga de um guerreiro acaio, depois foi jogado na praia, com a cabeça decepada e o corpo irreconhecível.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:05

Maior ainda era a crueldade dos soldados comuns do exército de Ulisses. Furiosos, não poupavam nem ao menos as crianças. E Andrômaca, temendo que tomassem de seus braços o filho querido, ordenou que corresse o mais que pudesse e agarrou uma criança qualquer, fazendo-o passar por Astíanax. Enganou a todos, exceto a Pirros, que entrara com seus mirmidões e flagrara a manobra da princesa troiana, mas permaneceu calado e não a denunciou. Os ítacos, encontrando no palácio o suposto Astíanax, filho de Heitor, agarrado à força por Andrômaca, arrancaram-no dos braços da princesa, que o defendia, pois sabiam que se tratava do futuro rei de direito. E ela, suplicante, foi agarrar-se aos joelhos de Pirros, que se aproximava.

— Não! Astíanax não! É só uma criança!

O filho de Aquiles, ainda que apiedando-se da suposta mãe suplicante, teve que agir de forma insuspeita e intransigente e afastou-a com um repelão.

— Nenhum varão desta casa deve permanecer vivo!

E impelidos pelo ódio que sempre tiveram por Heitor, os ítacos ameaçaram atira-lo do alto das ameias, mas Pirros, tomando-o pelos tornozelos, fê-lo ele mesmo, jogando-o do alto da torre. A mãe, desesperada pela vida do menino, cruelmente assassinado, mas feliz por dentro por livrar seu próprio filho, gritou aos algozes:

— Assassinos! Por que não me atirais também deste muro, por que não me atirais às chamas? Desde que Heitor foi morto por vós, vivi exclusivamente para meu filhinho. Mas, agora, livrai-me, por favor, do martírio de continuar a viver!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:05

Os assassinos, transtornados pelo ódio, não lhe deram ouvidos e, amarrando-a, levaram-na como cativa. No decorrer do incêndio de Tróia, Andrômaca viu perecer seu pai e seus sete irmãos, imolados por Aquiles, depois sua mãe, depois Heitor e quase por fim seu filho Escamândrios, chamado Astíanax pelos troianos, que na verdade só por causa dele é que Heitor havia defendido Tróia até sua morte. O menino, livre da morte, foi misturar-se aos que eram recolhidos como prisioneiros, não distanciando-se muito de sua mãe Andrômaca.

Foi quando Acamas, filho de Teseus, reconheceu na casa de seus inimigos sua velha avó Aetra, que segurava o pequeno Múnitos, de quem Acamas tivera com Laódice. Só então descobriu que Laódice era nobre e pertencia à casa real de Príamos. Temendo por suas vidas, em meio à carnificina, retirou Aetra e o pequeno Múnitos das mãos dos gregos e conduziu a ambos a um lugar seguro, sob a proteção dos atenienses.

A FUGA DE ENÉIAS

Enéias, do telhado do palácio, presenciou o assassinato do rei. Escondeu o rosto com as mãos. Foi então que lembrou-se do velho pai, da esposa Creúsa e do pequeno filho Ascânios, que haviam ficado em casa, sozinhos e indefesos. No pátio do palácio jaziam muitos troianos mortos ou agonizantes, e os que ainda podiam andar tratavam de se pôr a salvo, pois viam que de nada adiantava defender o palácio após a morte de seu rei.

Esgueirando-se pelas ruas ainda escuras, iluminadas apenas pelo clarão dos numerosos incêndios que se alastravam, o prepotente Enéias saiu combatendo valentemente no alto dos muros, esforçando-se por enfrentar os assaltantes. Porém, inopinadamente, avistou a bela Helena, que havia sido a causa de toda aquela guerra. Ela assomou ao portal do Templo de Héstia, assustada, temendo a vingança do povo troiano, que a culpava de todos os seus infortúnios e intermináveis sofrimentos.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:06

Tomado de súbita cólera, Enéias não achava justo que a maldita grega retornasse sã e salva a Esparta; que voltasse ao lar e à companhia dos filhos, levando talvez consigo mulheres troianas como servas; que nada sofresse, quando por sua causa Tróia fora destruída e o rei Príamos assassinado.

Apesar de não ser tarefa honrosa punir uma mulher, tomou a resolução de matá-la, ou de fazê-la refém para fazer os gregos baixarem suas armas, mas teve uma súbita visão de sua mãe, a deusa Afrodite, que o exprobou:

— Não culpes essa mulher, meu filho!

— Minha mãe...!

— Por que esse ódio? Nem Helena, nem Páris promoveram a ruína de Tróia; foi a cólera dos deuses que a destruiu. Dissiparei a névoa que cega tua vista. Vê, lá está Poseidon, o deus do mar, abalando os alicerces das muralhas e derrubando-as com seu tridente! Mais além, Héra, a deusa suprema do Olimpo, dominada pelo ódio que vota a Tróia, guardando as portas da cidade de lança na mão, enquanto as naus gregas despejam na praia levas intermináveis de soldados! E Atena, em meio a negras nuvens de tempestade, rugindo sobre a cidadela e brandindo o terrível escudo da Górgona! Olha... o próprio Zeus incentiva os inimigos de Tróia!

Diante dos olhos de Enéias, iam-se aos poucos desenhando os vultos das divindades mencionadas por Afrodite, todas empenhadas na destruição da cidade de Príamos.

— Pensa em teu pai Anquises, em tua esposa Creúsa e em teu filho Ascânios, de tenra idade! Foge, Enéias! Eu te acompanharei até chegares em segurança ao lar.

E a visão se desfez.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:32

Abandonando a luta, tomou apressadamente o caminho de casa, procurando evitar as labaredas dos incêndios que lavravam por toda parte e passar despercebido pelos inimigos, até seus aposentos. Relatando à família o que se passava, resolveu que fugissem da cidade em chamas, mas o velho pai Anquises recusou-se a acompanhá-los. Preferia morrer a deixar a Pátria. As razões de Enéias e as lágrimas de Creúsa foram impotentes para demover Anquises do seu propósito, já se dispondo Enéias a renunciar à fuga, pois nem por um momento cogitava de abandonar o pai. De súbito, deu-se um fato assombroso. Uma luz resplandecente cingiu a cabeça de Ascânios, iluminando-lhe os cabelos e contilando-lhe na fronte. Anquises, que era um sábio, imediatamente compreendeu que se tratava de um sinal divino e que o pequeno Ascânios, seu neto, era um eleito dos deuses e precisava ser salvo. Ergueu os olhos para o teto e, estendendo as mãos em súplica, pediu a Zeus que por algum indício confirmasse essa suposição. Momentos depois, ribombou um trovão e uma estrela cadente riscou o céu negro, passando em arco sobre os telhados da cidade e sumindo por trás das matas do monte Ida.

Anquises não levantou mais objeções à partida. Como não tivesse forças para atravessar a cidade, por sua idade avançada, pois já tinha oitenta anos, Enéias fê-lo subir em seus ombros, depois de cobri-los com uma pele de leão; segurou a mão da criança e apressou-se em sair da cidade, seguido por sua amada Creúsa e, pelas portas do outro lado das muralhas, percorrendo ruas escuras e becos. Os servos da casa escolheram outro itinerário, tendo ficado resolvido que todos tornariam a reunir-se junto ao Templo de Deméter, que se erguia num sítio isolado, distante da cidade, e onde estariam em relativa segurança.

Quando se avizinhavam das portas da cidade, ouviram muitos passos.

— Corre, filho, corre! São os gregos! Vejo o brilho dos seus escudos e espadas!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:33

Enéias apressou o passo, olhando inquieto para todos os lados. Ascânios apertava-se ao pai, e os seus pés mal tocavam o solo, enquanto caminhavam por entre um sem-número de mortos. Afrodite, mãe de Enéias, velava por ele, pois onde quer que pusesse os pés, as chamas se abriam, separavam-se as nuvens de fumaça, e as flechas e os dardos dos gregos não o ameaçavam.

E, por aquele intrincado labirinto, cheio de subterrâneos, passagens sem saída, foram andando, tendo que parar de vez em quando e retroceder, até que se viram perdidos em lugares desconhecidos da cidade. Seguiram para os fundos de Tróia, alcançando uma pequena porta que os levou para fora.

Chegando ao Templo de Deméter, onde não havia ainda movimento de soldados gregos, ali avistaram vários fugitivos de Tróia e pararam para descansar e esperar os demais que fugiam.
Porém, dando-se por conta, percebeu que Creúsa já não o seguia, e não a encontrou. Chamou-a, com desesperada angústia, mas só o eco lhe deu resposta... Devia estar perdida no labirinto de ruelas que tiveram que percorrer.

Desatinado e aflito, voltou sozinho à cidade, pelo mesmo caminho, procurando-a por toda parte. No palácio do rei e no Templo de Héra, viu Ulisses e Fênix recolhendo tesouros e objetos sagrados, e indo à sua casa encontrou-a em chamas. Errou longo tempo pelas ruas escuras e olhou em todas as ruelas e becos que momentos antes havia percorrido, chamando-a pelo nome. Quando, de repente, uma visão lhe cerrou o caminho, seguida por uma voz vinda do outro mundo:

— Enéias! Sou eu — Creúsa. Por que te afliges tanto, querido? Precisamos curvar-nos à vontade dos deuses.

— Por que não me seguiste, Creúsa? Vamos embora!

— Não... Os deuses quiseram que eu perdesse a vida nesta fuga. Não chores... querido. Segue teu caminho, embarca, leva contigo os troianos sobreviventes e faze-te de rumo para a Hespéria, para além da Hélade, onde corre o Tiberis, pelos campos férteis e admiráveis. Lá, encontrarás um novo reino e uma nova esposa de estirpe real. Vai, enquanto há tempo.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:34

— Creúsa, não...!

— Não derrames lágrimas por Creúsa, pois foi Zeus quem nos separou. Adeus, e cuida com amor de Ascânios, nosso filho, que um dia ocupará teu lugar...

Antes que Enéias pudesse dizer qualquer coisa, a visão desapareceu, e, contendo a muito custo os soluços, prosseguiu, e o dia clareava quando alcançou os demais, no Templo de Deméter. Lá estavam quase todos os seus servos, homens e mulheres, e um bom número de guerreiros, troianos, dárdanos e lícios, que haviam escapado da Morte e da escravidão. Todos estavam dispostos a acompanhá-lo para onde quisesse conduzi-los. Pouco depois, partiam rumo às montanhas, enquanto o Sol subia no horizonte. Seguiram rumo ao norte, levando consigo os Penates, ídolos divinos.

MENELAUS DIANTE DE HELENA

Helena, o pivô da guerra, estava escondida em seus aposentos quando os gregos finalmente invadiram a sagrada cidadela de Príamos. Em nenhum momento, depois que houvera sanado suas dúvidas acerca do cavalo de madeira, sentiu-se animada a tentar evitar o massacre de seus novos patrícios, os troianos: votada exclusivamente a Afrodite, Helena detestava violências, pois o espectro da princesa já havia, após tantos anos, incorporado definitivamente o seu aspecto e as suas virtudes.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:34

Helena de Tróia não era troiana, nem o espectro, muito menos a própria Helena, que jamais havia pisado naquela cidade; nunca se sentira como uma delas. Apesar de ter sido íntima da princesa Andrômaca, viúva do grande Heitor, consolando-a nos momentos de aflição, nunca pudera simpatizar com o jeito sisudo daquelas mulheres, beatas em excesso e votadas exclusivamente ao dever, como a uma inescapável sina. Afinal, Helena chegou em Tróia na condição réproba e adúltera, e mesmo assim foi cegamente admitida no coração do povo troiano. Na verdade, desde o dia em que pusera seus pés naquele país que o coração volúvel de Helena começara a ser minado pelo sentimento da saudade daquilo tudo que deixara para trás. Mas a saudade que sentia não era da Pátria, mas somente de Esparta, de seu cão de estimação, de seus pertences e... de sua filha Hermíone. Abandonou-a quando tinha apenas nove anos de idade, saudade esta que adquirira com o tempo, quando o espectro enganoso começou a acostumar-se com todas as características da Helena verdadeira, e por isso imaginava, sempre, como estaria agora sua filhinha Hermíone... com dezenove anos de idade...

Helena sacudiu a cabeça; o ruído dos gritos aumentara a tal ponto que ficava cada vez mais impossível ignorá-los. A cidade inteira ardia, enquanto Helena estava entregue a seus pensamentos. E, nesse instante, começava a preocupar-se como seria tratada assim que fosse encontrada pelos seus compatriotas.

— Helena de Árgos...? Helena de Tróia...?

Apesar de tudo, ela gostava muito de Páris. Pelo menos fora mais descontraído que o antigo marido, e mais dedicado. Agora, com um novo esposo, como ela seria vista pelo seu antigo povo?

— Helena de Árgos.... ou melhor, Helena de Esparta. É, acho que acabarei conhecida mesmo por esse nome.

Mas passou-lhe pela cabeça que seu ex-marido poderia querer lhe prejudicar; talvez fosse punida por Menelaus.

— Helena do Aqueronte... Que vingança estará prestes a desabar sobre a minha cabeça?
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:35

Menelaus devia estar à sua procura: o que estaria se passando em seu coração, dez anos depois? No primeiro ano, seguramente, sentira ódio. Exclusivamente ódio. Mas depois de mais nove anos de ausência, alguma coisa certamente teria mudado. Se ele a amava de verdade, ela ainda teria uma boa chance de escapar desta com vida, no entanto...

— Mas se algum aqueu mais afoito chegar antes dele e me encontrar? Alguém disposto a vingar um amigo ou um parente morto? Que será de mim? E se os próprios troianos se voltarem e estiverem dispostos a entregar meu corpo desfigurado a Menelaus em troca de sua liberdade? Eu morreria por uma causa nobre?

E, fechando os olhos, começou a rezar em voz baixa para que os deuses lhe dessem uma morte digna, decente.

Noutros pontos, a carnificina prosseguia. E Menelaus só tinha um pensamento: a vingança, estar frente a frente com sua esposa infiel. O rei, forçando que lhe revelassem os aposentos de Helena, enfim correu para lá chegar. Neste momento, entrou no quarto Deífobos, filho de Príamos. Estava muito ferido, e ainda um tanto embriagado pelas festividades, descabelado e com sua roupa manchada de vinho.

— Helena, tudo farei para proteger-te da ira do perverso Menelaus.

Mal sabia que isto era tudo o que ela não queria. Helena sabia que se estivesse só poderia com muito mais facilidade mover à piedade o coração do ex-marido. Ela sabia muito bem como fazê-lo. Mas tendo Deífobos ao seu lado, isto só serviria para atiçar a cólera do ultrajado rei.

De novo Deífobos tentou acalmá-la, dizendo-lhe estas palavras inspiradas:

— Somente à custa de minha vida, meu amor, tornará este perverso a pôr as suas mãos imundas sobre ti.

Helena, olhando para ele, com um princípio de desdém, teve mesmo vontade de lhe dizer:

— Perverso? Mãos imundas? Como te atreves a falar nestes termos do pai de minha filha?

E ouviram os passos de alguém chegando. Eram Menelaus e seus homens, e gritava:

— Demônia maldita, abre logo esta porta!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:37

E um estrondo terrível abalou os gonzos da porta. Um pedaço de madeira saltou longe, e Helena viu a mão do marido introduzir-se pela fenda aberta. A porta cedeu, e Menelaus entrou com mais três ou quatro homens. E ele, deparando-se Deífobos, o irmão preferido de Heitor, e atrás dele Helena, ordenou aos companheiros:

— Fora! Deixai-me sozinho com estes dois!

Deífobos, filho de Príamos, desde a morte de seu irmão Heitor, mesmo não sendo o mais velho, passara a ser o sustentáculo da casa e do povo. E era Deífobos o atual esposo de Helena, que, no momento da invasão dos gregos, ambos passavam uma das tantas noites de núpcias. No instante em que Menelaus invadiu seus aposentos, Deífobos estava ainda sob o efeito embriagante da orgia noturna. Ao ver que o átrida se aproximava, levantou-se com esforço do chão e meteu-se na frente de Helena.

Menelaus, então, notou o ar altivo e soberbo da infiel esposa, e, estudando a situação, pensou:

— Não, não me enganarás de novo...!

E, olhando-a melhor, sentiu-se surpreendido:

— Ela está com medo, sim, ela está... seus joelhos tremem e sua face está pálida...

Deífobos, entretanto, adiantou-se. Com a acha segura firmemente em sua mão direita, brandiu-a e ameaçou:

— Aqui está, cão dos aqueus, o que te espera, se ousares dar mais um passo!

— Vais pagar, agora, canalha, por tudo o que fizeste a mim e a meu povo! Prouvera aos deuses que a minha arma tivesse varado o coração do causador de toda esta desgraça! Páris já tombou há tempo, e agora pretendias tu gozar da formosura de minha mulher? Nenhum criminoso escapa ao braço de Têmis, a deusa da justiça!

Helena, então, ao ver que Deífobos dera um passo adiante para enfrentar o oponente, sacou das dobras interiores de seu manto um afiado punhal, que trazia consigo, enterrou-o nas costas do príncipe troiano, que, virando-se, com os olhos arregalados, despencou em seguida, agarrando-se aos pés de Helena.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:38

E Helena ouviu uma voz entranha dizer:

— Menelaus, aí está morto um dos que tanto te ultrajaram! Mata-me agora, para que a vingança seja completa e a tua honra, restaurada!

Era a sua voz — a voz de Helena, não a do espectro. E tão logo retomou consciência, ela abriu a parte superior de suas vestes, descobrindo o peito para que Menelaus enterrasse nele a sua espada. Seus dois seios libertos, ainda extraordinariamente firmes e empinados, saltaram livres para fora, em um mudo desafio.

Menelaus arregalou os olhos ao ver outra vez os seios desnudos de sua amada. Não disse uma palavra, mas o seu primeiro impulso foi matá-la, dominado pelo ciúme, mas Afrodite, que a tornara mais formosa, acudiu e tirou a espada da mão de Menelaus, ao mesmo tempo em que lhe afugentava do peito a cólera, inflamando-o de novo com o velho amor. Menelaus, contemplando a beleza extraordinária de Helena, sentiu-se incapaz de erguer de novo o braço, e, num momento, esqueceu toda a culpa daquela mulher, mesmo lhe parecendo não ser a mesma mulher que conheceu há tempos atrás. Tinha a beleza de uma deusa, era sedutora, mas faltava-lhe a doçura, digna de uma filha de Zeus.

De repente, ouviu o furioso ruído da rebelião, e dele se apoderou um sentimento de vergonha, ao pensar que revia a esposa não como vingador de um ultraje, senão como escravo de Helena. Tornando a pegar a espada, que deixara cair ao chão, e abafando o violento amor que o possuía, atirou-se contra a mulher, embora no íntimo do coração sofresse cruelmente. Por isso, foi com agrado que viu entrar Agamémnon o qual, colocando-se imediatamente ao seu lado e pondo-lhe a mão no ombro, lhe disse:

— Não faças isso, meu caro irmão! Não parecerá bem abateres tua esposa, por quem tantas fadigas tivemos que enfrentar. Creio que a culpa não é tanto de Helena quanto de Páris, que tão covardemente fez uso do direito de hospitalidade. Agora, ele, e sua raça e todo o seu povo já foram devidamente castigados.
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A Guerra de Tróia - Página 31 Empty Re: A Guerra de Tróia

Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:38

E Menelaus, cedendo àquelas razões, embora aparentemente vacilasse, estava, na realidade, muito satisfeito. Então, tomou-a pela mão e passou com Helena pelos seus próprios soldados e levou-a para fora, onde Helena pôde, mais detalhadamente, tudo aquilo que ele mesmo causara.

Enquanto tudo isso se verificava na Terra, os Imortais, envoltos em densas nuvens, lamentavam a queda de Tróia. Somente Héra e Tétis estavam radiantes de alegria.

O incêndio e a carnificina duraram muito tempo. A coluna das chamas se ergueu à grande altura, anunciando a ruína total da infeliz cidade aos habitantes das ilhas e aos navegantes que, nos seus barcos, sulcavam as águas daqueles mares. Também olhavam para trás, com tristeza, aqueles que fugiam sob o comando de Enéias, que já haviam saído da cidade, indo-se refugiar em algum lugar seguro, num ponto em que o Ida morria no mar. Viam de longe a sagrada Ílion de Ilos, Tróia de Trós, agora em ruínas e em chamas, a mesma cidade que os antigos poetas diziam que seria... eterna. Conseguiram alcançar o porto de Antandros. Lá, puseram-se a construir barcos que os pudessem levar para o alto-mar. Depois de um tempo, com uma pequena frota, embarcaram todos, e um vento propício enfunou as velas e impeliu os navios para o Egeus. Eram homens, mulheres e crianças, sujeitos a enfrentar o mar e os perigos que nele existissem, sem saberem para que terra os levaria o Destino e em que lugar encontrariam paz.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:39

Era início da primavera quando haviam partido do porto de Antandros. Anquises fora o primeiro em proferir o adeus eterno à Pátria aniquilada. Enéias e seus compatriotas e aliados rumariam para terras desconhecidas, sempre em direção do sul e do oeste, passando pela Trácia, pela Macedônia, pela Samotrácia, por Creta, aonde fundariam a cidade de Pérgamos; passariam por Delos, por Cítera, pela Lacônia, pela Arcádia, até alcançarem a Hespéria, nome pelo qual eram conhecidas as terras do Ocidente, um país que seria renomadamente chamada de Itália, aonde seus descendentes fundariam aquela que seria a mais poderosa cidade do mundo: Roma.

DIVISÃO DOS DESPOJOS

Durante os dez anos de tormento e conflitos, muitos tombaram, nas hostes gregas e nas hostes troianas. Grande número de homens mordeu o pó da terra, heróis que foram de encontro ao Hades de escuridão eterna. Heróis gregos como Antílocos, filho de Nestor, Tersandros, Protesilaus, Antílocos, filho de Héracles, Antífates, Ájax, filho de Télamon, Aquiles, Macáon, Pátroclos, e heróis troianos e aliados, como Sarpédon, Anfímacos, Pândaros, Mémnon, Glaucos, Pentesiléia, Acamas e os valentes filhos de Príamos, como Heitor e Páris. Foram tantas vidas perdidas, que afinal conseguiram Zeus e os deuses do Destino realizar seu intento, tal como havia-se sucedido na guerra dos Sete Chefes Contra Tebas e na guerra dos Epígones: reduzir o grande número de seres humanos que povoavam a Terra. Foi preciso criar os Gigantes e os Monstros para aniquilar a vida, e ainda provocar os mais cruéis conflitos da Humanidade... Ó deuses imprevisíveis e indiferentes! Agora, só restava aos que venceram recolher seus despojos e suas presas, como troféus para exaltar sua honra abalada, por um equívoco banal que desconheciam, já que Helena não passava de uma sombra perversa...
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:40

Com o surgimento da Aurora, os gregos, não encontrando mais nenhuma resistência, depositaram tudo fora do palácio. Para transportar tudo quanto haviam-se apoderado, os gregos trataram de partilhar os despojos e as presas de guerra entre si. Cada chefe recebeu seu quinhão, mas alguns despojos, entre tantos tesouros e escravos, lhes foram mais satisfatórios. E para que tudo fosse devidamente feito da maneira mais justa, seguiram as orientações de Ulisses, que aconselhou a Agamémnon não avaliar o desempenho de seus homens com pagamentos proporcionais em ouro, pois poderia causar descontentamentos. Sugeriu que se dividissem os despojos com os chefes segundo as suas próprias conquistas, oferecendo-lhes e a seus guerreiros broches simbólicos e um farto banquete para o próximo dia. Ulisses foi ouvido e seu conselho devidamente seguido.

A Agamémnon, filho de Atreus, coube a bela Cassandra, a filha sacerdotisa de Príamos. E com ela já adiantou-se, levando-a para o leito. Forçada a fazer o que não queria, com o rei dos aqueus teve dois filhos, prematuros, os quais foram chamados de Telédamos e Pélops, que viriam a nascer antes do regresso de sua chegada na cidade de Árgos.

A Ulisses coube a rainha Hécuba, para servir como escrava de sua esposa, Penélope, em Ítaca. E recebeu de Pirros, de volta, as armas de Aquiles, julgando-o ser digno de possuí-las.
A Estênelos, filho de Capaneus, coube uma imagem de Zeus com três olhos, feita de madeira, que antes pertencera a Príamos.

A Neoptólemos, filho de Aquiles, coube a nobre Andrômaca, viúva do grande Heitor, e Hélenos, o único filho varão de Príamos que sobreviveu à queda de Tróia, e ainda um garotinho que, aos olhos de cada grego, não passava de um qualquer, mas foi agarrar-se amedrontado nos braços de Andrômaca, que evitava chama-lo pelo nome para não denunciá-lo.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:41

A Eurípilos, filho de Évemon, coube um cofre misterioso, que, ao abrir, enlouqueceu. Calcas, o adivinho, através de um Oráculo, proferiu que Eurípilos só ficaria curado quando encontrasse em sua viagem de regresso um sacrifício desusado. E deveria estabelecer-se naquele país. E ninguém ousou saber o que havia naquele cofre; imediatamente foi fechado e abandonado.

Demofóon, filho de Teseus, obteve de Diómedes o Paládio, a estátua troiana de Palas-Atena.

Ao valente Acamas, outro filho de Teseus, depois de recuperar sua avó Aetra e seu filhinho Múnitos, seu principal objetivo em Tróia, coube também a anciã Clímene, mãe de Alexírroe, uma das antigas amantes do rei Príamos e mãe de Ésacos, para lhe servir de escrava. E a ele coube ainda a bela princesa Laódice, a quem amava. Porém, Laódice, revoltada com os resultados da guerra e do destino de seus compatriotas, e não querendo viver como escrava na Hélade, tomou o filho Múnitos dos braços de Aetra, que então estava com dez anos de idade, fugiu diante dos vencedores, que a perseguiram. O menino tropeçou, e Laódice, na intenção de apanhá-lo, foi engolida pela Terra, aos olhos dos soldados gregos. Múnitos, aos prantos, foi levado ao navio de Acamas, seu pai.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:42

Os habitantes de Tróia, ou tinham morrido ou se tornaram escravos. E os dânaos haviam-se apoderado dos imensos tesouros da cidade. Depois, trataram de transportar para os barcos todo o produto do saque: ouro, prata, pedras preciosas, utensílios domésticos, como ânforas, taças e trípodes, entre anciãs, donzelas e crianças. No meio do tumulto, Menelaus arrancou da cidade em chamas Helena, envergonhada, mas ao mesmo tempo, contente por haver recuperado o que era seu. Ao seu lado, avançava Agamémnon com a nobre Cassandra. Andrômaca, a viúva de Heitor, era levada por Pirros, filho de Aquiles. Quanto a Hécuba, a rainha, caminhava trôpega sob a guarda de Ulisses, em direção ao cativeiro, debulhada em lágrimas. Seguiram-se inúmeras mulheres troianas, jovens e velhas, também mocinhas e crianças. Confundiam-se as mulheres do povo e as princesas do palácio. Somente Helena não participava daquele geral desespero, pois que um profundo sentimento de vingança a mantinha afastada das demais. Os seus olhos cravavam-se no chão, e um fortíssimo rubor lhe cobria as faces. No íntimo, tremia, pensando no que a aguardaria futuramente, empalidecendo ao lembrar-se de Menelaus e caminhando com muita timidez.

Chegados aos navios, os que ainda não haviam visto Helena ficaram assombrados ao vê-la em sua extraordinária formosura, e reconheceram que valera a pena acompanhar Menelaus a Tróia e transcorrer dez anos no meio de dores e perigos. E viram em Menelaus o homem traído que se inclinara ao perdão.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:43

As prisioneiras, uma a uma, eram levadas para os barcos dos aqueus. Hécuba, presa de guerra de Ulisses, ao subir ao seu navio, viu que na praia jazia um corpo, que reconheceu ser o de seu filho Polidoros, que já havia sido cremado e enterrado, e miraculosamente o mar houvera devolvido o cadáver à Terra, e, com isso, lembrou-se que o filho havia sido confiado a Polimnéstor, o rei da Trácia, e compreendeu que, por sua culpa, havia morrido Polidoros. Sabendo que Polimnéstor encontrava-se entre os gregos, como um traidor, mostrando-se útil aos gregos para não ser morto por eles, pediu a um servo que o chamasse, sob um falso pretexto, a notícia de que sabia onde havia um tesouro escondido e pretendia revelar-lhe. Polimnéstor, ganancioso como sempre foi, acorreu à rainha, e esta, saltando sobre ele, lhe arrancou os olhos. Depois que o viram cego, outras cativas troianas agarraram e mataram dois filhos que tinha levado com ele. Os gregos agarraram-nas, mas tarde demais: Polimnéstor já havia sido castigado.

Enquanto reinava a alegria nos barcos e todos saboreavam as iguarias, um cantor exaltava, ao som da cítara, os feitos do saudoso Aquiles, cujas aventuras reviviam na mente de todos. A festa prolongou-se até a noite. Depois, cada um foi-se recolher, ou nas tendas que sobraram, ou nos navios.

Helena, já sozinha com o marido, caiu-lhe aos pés e, abraçando-lhe os joelhos, disse:

— Muito bem sei que tens o direito de castigar-me com a morte. Mas lembra-te de que não abandonei o palácio de Esparta por vontade própria, senão que fui raptada pelo traidor Páris, quando tu estavas ausente, e eu não dispunha da tua proteção. Todas as vezes que tentei matar-me, as donzelas do palácio sempre me retiveram, suplicando-me que pensasse em ti e em nossa tenra filha Hermíone. Agora, submeto-me à tua vontade. Aqui me tens, aos teus pés, arrependida.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:44

Menelaus ainda duvidava do arrependimento de Helena — talvez sentisse algo estranho e diferente, mas a amava. Abraçando-a, então, beijou-lhe os lábios, em sinal de reconciliação. Depois, ambos choraram ardentes lágrimas de comoção.

MAIS UM DIA EM TRÓADE

Quando surgiu a filha da Manhã, a Aurora dos dedos róseos, começaram os gregos a despertar. As chamas de Tróia ainda viviam, alimentadas pela brisa matinal. Menelaus, rei de Esparta, mais uma vez rolou na esteira com a recuperada esposa, tirando mais um pouco dos dez anos de atraso. Na tenda vizinha, Agamémnon, rei de Árgos, tentava o mesmo com sua cativa Cassandra, mas sem muito sucesso. O máximo que conseguia, por ora, eram beijos indiferentes e união sem paixão.

Eupirórnitos, chefe dos cozinheiros aqueus, despertou seus assistentes para o preparo do banquete da vitória. Grandes braseiros foram acesos com o fogo de Tróia, e carnes abundantes foram temperadas e colocadas nos espetos. Eram diferentes cortes de bois e vitelas, porcos e javalis, cervos, carneiros e cabritos; e muitíssimas aves, pelas quais Eupirórnitos era renomado, tanto que se nome significava mais ou menos isso: “o que bem prepara aves ao fogo”. O certo é que, quando os primeiros aromas do frango assado perfumaram os ares, encheu-se de água a boca dos heróis helênicos.

O Carro de Hélios subia nos céus, e Eupirórnitos dirigiu-se ao setor de carnes bovinas. Embora sua fama viesse das aves assadas, sabia que as peças de boi eram as de ponto mais difícil, devendo ficar escuras por fora e róseas e suculentas por dentro. Deixou, pois, as aves por conta de um assistente, crendo-as devidamente encaminhadas.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:45

Ora, esse assistente era grande devoto de Dionisos, o deus do vinho. Tendo descoberto onde estavam os odres de reserva especial dos reis e príncipes, dava escapadelas freqüentes para praticar libações a seu deus de devoção. Quando aumentou o calor, Hipnos pesou-lhe as pálpebras e trouxe-lhe o sono dos ébrios. Despertou-o a catástrofe, algum tempo depois: a banha das gordas aves escorrera, e, sem água que as controlasse, transformara as brasas em chamas fortíssimas. Queimaram-se quase todas as aves, embora umas poucas, situadas em um canto mais remoto, tivessem atingido um ponto ideal.

Eupirórnitos retornou, atraído pelo odor de carne carbonizada. Decapitou imediatamente o assistente inepto, e foi levar a infausta nova ao chefe Agamémnon, temeroso do justo castigo.Mas o rei de Árgos não era de atitudes precipitadas, e conduziu o cozinheiro ao astucioso Ulisses, para que dele ouvissem alguma ideia que sanasse a situação.

— Espertíssimo Ulisses, muito têm os aqueus a aproveitar dos teus conselhos. Enquanto o valoroso Aquiles insistia em tomar Tróia a ferro e fogo, e acabou perdendo a vida, tu concebeste o estratagema do cavalo de pau que nos levou à Vitória. Quando nos aconselhaste a não contaminar o espírito de nossos guerreiros com recompensas fúteis, substituímos a costumeira partilha do botim por um banquete comemorativo, no qual faríamos belos discursos e distribuiríamos pequenos broches simbólicos. Ora, um cozinheiro imbecil deixou que as aves se queimassem. Tal é a reputação dos frangos assados deste infeliz Eupirórnitos, que temo uma revolta quando nossos guerreiros descobrirem o ocorrido. Tu sabes, estão todos exaustos, ansiosos, e precisam de um farto banquete, pois foi-lhes prometido.

E o cozinheiro-chefe arrojou-se aos pés de Ulisses, bradando soluçante:

— Salva-nos, grande Ulisses, não por mim, que não passo de uma mosca do esterco do cavalo de Tróia, mas por nossa amada Pátria! Salva-nos, tu que foste preceptor do grande Aquiles!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:46

— Meu caro Eupirórnitos, podes ser um cozinheiro magnífico, mas és um bajulador ignorante. Fui eu quem trouxe Aquiles para esta terra, mas não fui eu seu preceptor. Os mestres de Aquiles foram o ilustre Quíron, o centauro, e o grande Fênix, filho de Amíntor.

E Ulisses calou-se para pensar um pouco. Aves queimadas, o grande Fênix... A grande Fênix! Em um clarão intelectual, Atena, a deusa da sabedoria, acabava de sussurrar-lhe outra idéia de gênio. E disse a Agamémnon:

— Prezado colega, não temas. Ordena que se reúnam nossos guerreiros, pois tenho importante comunicação a fazer-lhes.

E tendo-se reunido os guerreiros em assembléia, na ágora do improvisado acampamento, assim lhes falou o astuto Ulisses:

— Bravos guerreiros da Hélade! Regozijai-vos, porque visitou-nos hoje um grande prodígio dos deuses!

Fez uma pequena pausa dramática.

— Bem sabeis o quanto as aves que singram os ares são apreciadas pelos senhores do Olimpo. O supremo Zeus muitas vezes manifestou-se através delas, e continua a falar aos nossos adivinhos através de suas entranhas. Mudou-se em águia veloz para arrebatar aos céus o jovem Ganímedes, de Tróia, e apresentou-se como cisne para seduzir Leda, gerando o ovo divino no qual nasceu a belíssima Helena, causa nobre dessa nossa heroica conquista. Mas nenhuma ave representa os poderes cósmicos tanto quanto a Fênix, que se esconde por séculos até imolar-se nas chamas, nos grandes momentos da história dos homens.

Mais uma pausa permitiu aos guerreiros absorver, em silêncio, a eloquência do genial Ulisses. E este bradou novamente:

— Pois sabeis todos que nesta manhã a grande Fênix imolou-se nas chamas de Tróia, anunciando a alvorada da gloriosa civilização helênica!

Ulisses pausou o suficiente para que todos emitissem um sussurro de assombro.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 4/3/2021, 19:47

— Ocorre que das chamas que consumiam Fênix soltou-se uma língua de fogo que consumiu quase todas as aves de nosso banquete. Com isso ensina-nos a Fênix que não devem os homens devorar aves, para que ela possa renascer gloriosamente, e voltar a imolar-se pelos homens no futuro longínquo. Sobraram umas poucas aves assadas, que deverão ser deixadas para os altos sacerdotes. No caso presente, por coincidência, os altos sacerdotes somos nós mesmos, os vossos reis e príncipes. Faremos o sacrifício de consumir aves esturricadas, sentindo o gosto de penas, em honra da grande Fênix. Enquanto isto vós vos deleitareis com suculentas picanhas e saborosos pernis!

Um pouco tristes por privarem-se dos frangos assados de Eupirórnitos, os guerreiros resignaram-se e trataram de louvar ao deus Dionisos mais que o normal. Passou-se a tarde e Hélios mergulhou seu carro no Oceano profundo. Até reis e príncipes foram recolher-se, e Menelaus arrastou Helena para mais uma noite. Um tanto ébrio, a caminho de sua tenda, o rei Agamémnon dirigiu-se a Ulisses, enquanto chupava a última coxinha:

— Tenho mais uma vez que louvar tua genialidade. Voltarás agora para os braços da charmosa Penélope, após tantos anos?

— Meu caro Agamémnon, talvez eu tenha férias para gozar antes disso. Anunciaram-me os áugures que não verei tão cedo a minha Pátria. Temo que demorarei um pouco a rever minha rainha Penélope.

— E crês que tua bela esposa se manteve fiel, quando possivelmente outros que querem tomar o teu lugar se prostram ante seus joelhos? Há alguma mulher que consiga resistir tantos anos longe de seu marido?
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