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Sexo na Antiguidade

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Mensagem por Galego 7/2/2024, 22:38

Falar a verdade é perigoso... Até hoje...
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Mensagem por Eremita 8/2/2024, 02:12

As Barregãs de Cléricos: mulheres pecadoras e malditas

Nos séculos XIV e XV, as leis do Reino de Portugal definiram a barreguice clerical como um crime punível pela justiça régia, estipulando punições rigorosas às mulheres transgressoras. O discurso jurídico que legitimou a perseguição empreendida pela monarquia às barregãs de clérigos encontrava-se informado pelas teorias do direito medieval e pelos valores religiosos cristãos. Apesar da rigidez das penalidades prescritas pelas Ordenações afonsinas, havia a possibilidade, por meio das cartas de perdão escritas para a defesa de mulheres acusadas ou condenadas por barreguice clerical, de que o rei comutasse as penas estabelecidas ou perdoasse o crime.


A palavra barregã é muito antiga. Em Castela, ela surgiu ao final do século XI, para referir a mulher que participava de uma união conjugal dissolúvel e fundada na vontade livre das partes. No plano legislativo, a relação de barreguice garantia direitos para a mulher e para os filhos nascidos da união (Pastor, 1986, p. 200). No Fuero viejo de Castilla, uma compilação de leis datada do século XIII e reelaborada no século seguinte, as barregãs são definidas como mancebas solteiras ou como concubinas.


Em Portugal, nos séculos XII e XIII, as imagens das barregãs não estavam associadas às representações aviltantes das concubinas, que foram construídas pela Igreja durante a Reforma Gregoriana, movimento que estabeleceu a separação estrita entre a esposa e a mulher que vivia em concubinato. Anteriormente ao século XIV, a barreguice, na sociedade portuguesa, era uma relação não muito distinta do casamento e a condição de barregã não era considerada torpe e desprezível. Os livros de linhagem do século XIII referem-se com respeitabilidade às barregãs e aos seus filhos, que eram qualificados como descendência prestigiosa. O Livro velho das linhagens, por exemplo, registra informações sobre estirpes nobiliárquicas marcadas pelas presenças de sucessivas barregãs. A prática da barreguice não impedia às fidalgas que se unissem novamente a homens nobres ou contraíssem matrimônio. A circunstância de que houvessem sido barregãs de padres ou de bispos também não configurava nenhum demérito. José Mattoso, que estudou os significados da palavra barregã, não identificou indignação ou reprovação, nessas fontes, contra a coabitação entre homens e mulheres. Contudo, desde o século XI, os poderes eclesiásticos combatiam em defesa da imposição de um único modelo de relação conjugal para os laicos. Para o medievalista português, a tolerância em relação à barreguice decorria dos costumes matrimoniais romanos, que, profundamente arraigados nas práticas de união marital da Península Ibérica, coexistiam com o modelo proposto pela ortodoxia da Igreja. Na sociedade medieval portuguesa, eram reconhecidos o casamento realizado sem solenidades religiosas; o contraído sem testemunhas, mas confessado pelos noivos; o que resultava da coabitação (conhecido como casamento de pública fama); e o casamento a furto, considerado união clandestina (Herculano, 1865). Essas diversas práticas de união eram consideradas legítimas pela Igreja e pelo poder real e, mesmo após a Reforma Gregoriana, demoraram a adquirir uma dimensão ignominiosa.


O casamento religioso somente se tornou um sacramento obrigatório no século XII, com o movimento reformista, cujas diretrizes foram posteriormente confirmadas pelo IV Concílio de Latrão, em 1215. Nessa época, a Igreja instituiu o casamento religioso em sociedades que assentavam a base da família nos modelos laicos de relação conjugal. Em um longo processo de impasses, transigências e conflitos, o casamento religioso impôs-se ao secular, promovendo a cristianização da união marital. As autoridades espirituais e, posteriormente, as temporais conjugaram esforços para difundir a nova moral do matrimônio, fundamentada nos ensinamentos das Sagradas Escrituras, mas as práticas conjugais laicas persistiram. Em Portugal, as dificuldades de implantação da nova ordem são atestadas pelas numerosas e extensas leis eclesiásticas e civis criadas nos séculos XIV e XV, com o objetivo de estabelecer a obrigatoriedade do casamento religioso.


No século XIV, a Igreja e a realeza portuguesa passaram a requerer que todos os casamentos fossem celebrados por um sacerdote, conforme os ritos sagrados, mas a realidade social da Idade Média impunha a necessidade de concessões, de modo que as uniões ilegítimas não eram anuladas. Entretanto, a tolerância em relação à diversidade das práticas matrimoniais não contemplou duas modalidades de relação conjugal (desaprovadas pela Igreja desde os primórdios do cristianismo) que se tornaram definitivamente proibidas e ilegais após a Reforma Gregoriana: o casamento clerical e o concubinato de clérigos.
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Mensagem por Eremita 8/2/2024, 02:13

As transformações nas práticas matrimoniais do Ocidente medieval repercutiram lentamente nos costumes portugueses relativos ao casamento e ao concubinato. Nos séculos XIV e XV, a ascensão do casamento religioso alterou os significados da palavra barregã. Em textos legislativos e judiciais da Baixa Idade Média portuguesa, como as Ordenações afonsinas e as cartas de perdão, o termo barregã passou a ser utilizado como sinônimo de concubina. A condição das mulheres que viviam em barreguice era equiparada à situação social das mulheres adúlteras e das prostitutas. No códice afonsino, existem numerosas leis que condenam a barreguice (especialmente a clerical), classificando-a como prática criminosa. As modificações semânticas relacionavam-se à criação de novas representações sobre as barregãs, que as caracterizavam como más e praticantes de pecados mortais, e foram acompanhadas pela perseguição e punição, empreendida pelo poder régio, de mulheres que viviam em concubinato. No entanto, não se deve considerar que as imagens depreciativas das barregãs fossem compartilhadas pelo conjunto da sociedade medieval portuguesa. Conquanto tivessem se tornado hegemônicas, não eram as únicas.


A interdição à barreguice clerical – qualificada como pecado pelo direito canônico e enquadrada como crime pela legislação civil – constituía uma norma importante para a afirmação do celibato sacerdotal e do casamento religioso, dispositivos fundamentais para a organização da sociedade portuguesa na Baixa Idade Média. A perseguição e a punição que o poder régio promoveu à barreguice clerical estavam relacionadas às crenças religiosas, aos valores morais e às teorias jurídicas medievais.


A representação menosprezível das concubinas, apropriada pelas Afonsinas e pelas cartas de perdão, fora construída pela Igreja durante o movimento em defesa da instauração do celibato dos padres e do casamento indissolúvel para os leigos. A condenação do concubinato insere-se no longo processo de construção da instituição e de formação da identidade eclesiástica, o qual esteve caracterizado pela normatização de comportamentos e pela delimitação e classificação dos desvios.
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Mensagem por Eremita 8/2/2024, 02:13

Durante a Reforma Gregoriana, a Igreja preocupou-se atentamente com os temas do casamento e do concubinato de religiosos. Os matrimônios de padres foram invalidados. As mulheres casadas com clérigos e as concubinas de clérigos foram consideradas adúlteras e prostitutas – elas transformavam-se em um entrave para o projeto de controle social da Igreja, prejudicando o movimento reformista, que, empenhado na purificação da Cristandade, pretendia santificar a conduta dos religiosos. Com a Reforma, que encerrou oficialmente o período dos padres casados, o concubinato clerical converteu-se em um grande perigo que afetava todos os setores da Igreja,tanto o clero segular quanto o clero regular.
Pela contenção dos instintos sexuais, a castidade santificava os religiosos e os diferenciava do restante da sociedade, justificando a superioridade do seu estado em relação ao dos laicos. O combate ao casamento e ao concubinato de clérigos veiculava também a mensagem sobre a obrigatoriedade do matrimônio religioso para os leigos. Com o exemplo da continência dos padres, desencorajava-se os pecados da carne; através da inclusão de todos os laicos em um único modelo de casamento, monogâmico e indissolúvel, disciplinava-se as práticas sexuais. Na sociedade portuguesa dos séculos XIV e XV, os religiosos barregueiros deviam ser constrangidos a observar o celibato sacerdotal e as barregãs de clérigos deviam ser perseguidas, punidas e reintegradas ao corpo social como mulheres honestas, pelos mecanismos do casamento, do ingresso em uma ordem religiosa e do emparedamento.


A Igreja e a monarquia portuguesa associaram-se para preservar a integridade do sacerdócio e a do casamento cristão. As regras do direito canônico e do direito régio devotaram-se à prevenção e à punição das práticas sexuais e das uniões matrimoniais consideradas ilícitas. A execução das penalidades castigava os pecadores/criminosos e operava como exemplo para o corpo social, cujos membros eram advertidos das terríveis conseqüências das atividades transgressoras.
A primeira lei concernente à barreguice clerical foi outorgada em 1387 nas Cortes de Braga, cujas deliberações foram posteriormente incorporadas às Ordenações afonsinas. De acordo com o códice afonsino, foram os procuradores dos concelhos que denunciaram o fato de que muitos padres mantinham barregãs em suas casas, às vistas de todos (prelados e povo), trazendo-as melhor vestidas e guarnecidas do que os leigos as suas esposas, que muitas mulheres virgens deixavam de tomar maridos legítimos e de viver conforme as regras que Deus estabelecera no mundo e se juntavam com clérigos em pecado mortal (Ordenações afonsinas, livro V, título XIX, artigo 1, p. 58-59).


O concubinato clerical era apontado como causa de perturbações sociais e familiares. Os religiosos barregueiros eram acusados de estimular, pelo exemplo, uniões maritais em desacordo com os preceitos da Igreja. Eles também eram responsabilizados pelo desvirtuamento de mulheres virgens, que renunciavam à vida religiosa ou ao casamento legítimo para viver em barreguice: “filhas lídimas, posto que fossem virgens, por induzimento dos ditos Clérigos [...] deixavam seus Pais e Mães e iam-se para os Clérigos [...], para serem suas barregãs” (Ordenações afonsinas, livro V, título XIX, artigo 1, p. 59).


A barreguice clerical instaurava precedentes para a transgressão de regras de conduta que fundamentavam o projeto de normatização da sociedade. Os procuradores dos concelhos apresentaram as conseqüências danosas que as barregãs de clérigos causavam ao Reino, tanto no plano temporal quanto no espiritual, como o escândalo que a quebra dos votos de castidade provocava no povo e a ineficácia dos sacramentos ministrados por padres barregueiros. Os procuradores argumentavam que a maioria dos fiéis desprezava os cultos celebrados por esses sacerdotes, recusava-se a se confessar com eles e exigia que os religiosos respeitassem os preceitos da Igreja. Como a barreguice clerical desencadeava terríveis prejuízos ao Reino e causava grande perigo às almas dos religiosos e dos fiéis, os procuradores solicitaram ao rei que solucionasse o problema (Ordenações afonsinas, livro V, título XIX, artigo 2, p.59).
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Mensagem por Eremita 8/2/2024, 02:13

O desprezo ao sacramento ministrado por sacerdotes concubinários difundira-se nas sociedades medievais no período anterior à Reforma Gregoriana, mas se intensificou, por meio de exortações aos fiéis, na época do papado de Gregório VII. Seguindo os exemplos papais, parte dos religiosos portugueses admoestava a população a não freqüentar missas celebradas por padres barregueiros. Em um de seus sermões, pronunciado em 14 de agosto de 1383, o religioso Geraldo Groote afirmou que era pecado freqüentar missas de padres que vivam em concubinato. A pregação de Groote assentava-se no pressuposto de que os sacramentos atuavam em conformidade com a santidade dos sacerdotes que os ministravam (Ventura, 1997, p. 524).


A Igreja preocupava-se com a publicidade dos casos de barreguice clerical. Os clérigos que viviam com barregãs colocavam em risco a instituição eclesiástica, debilitando as crenças e os valores religiosos que lhe serviam de sustentação. O desrespeito ao celibato, por parte dos clérigos, lesava a imagem do sacerdote como depositário e representante dos bens da salvação. A renúncia à pureza sacerdotal rompia o contrato que unia o padre aos fiéis. Os crentes escandalizavam-se e se indignavam porque consideravam a castidade uma condição imprescindível para a eficácia dos rituais litúrgicos.


Atendendo aos pedidos dos procuradores dos concelhos, o monarca agiu de acordo com as expectativas que a sociedade sustentava em relação à ação do poder régio e assumiu o compromisso de perseguir e punir as barregãs de clérigos, mas requisitou à Igreja, com base nas constituições eclesiásticas, que repreendesse e castigasse os religiosos barregueiros:


E nós querendo a isto [a barreguice clerical] por remédio com direito, para que vivam fora de tal pecado tão público, escrevemos aos Prelados dos nossos Reinos para que pusessem tal remédio aos clérigos e Religiosos de seus Arcebispados e Bispados de bem viver, para não viverem em tão grande pecado tão público [...] (Ordenações afonsinas, livro V, título XIX, artigo 3, p. 59-60).
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Mensagem por Eremita 8/2/2024, 02:14

As autoridades eclesiásticas acataram o pedido, afirmando que era um serviço devido a Deus e “em prol da terra”, para o qual iam utilizar as suas constituições sobre o assunto, “pondo aos Clérigos e Religiosos que barregãs tivessem pena de Excomunhão e suspensões e outras penas que entendiam que sobre isto deviam pôr” (Ordenações afonsinas, livro V, título XIX, artigo 3, p. 60). Não obstante, a Igreja alegava que, para resolver o problema, era indispensável que as punições impostas aos religiosos fossem acompanhadas de penalidades às suas barregãs, porque a imoralidade do clero era muito grande e, do contrário, por maiores que fossem os castigos estipulados, os clérigos não deixariam de viver em barreguice e “não arredariam do mal fazer” (Ordenações afonsinas, livro V, título XIX, artigo 4, p. 60-61).
Margarida Garcez Ventura e Luís Miguel Duarte, que estudaram a documentação eclesiástica do período joanino (1385-1433), não encontraram processos contra padres barregueiros. Ambos acreditam que esses processos nunca existiram, embora a Igreja houvesse assumido o compromisso de processar os religiosos que praticassem a barreguice. Duarte afirma que não possuímos “os processos dos clérigos apanhados em falta pelo braço espiritual [...]; não os temos, nem garantimos que tenham existido” (Duarte, 1993, p. 322). Os casos que envolviam o delicado problema parecem haver sido resolvidos somente no âmbito da justiça secular (Ventura, 1997, p. 552; Duarte, 1993, p. 322). A distância entre o discurso e a prática sugere que as autoridades eclesiásticas, informadas por representações misóginas, responsabilizavam as barregãs pela conduta pecaminosa dos clérigos. Ou seja, para a Igreja, a repressão à barreguice clerical era responsabilidade do poder régio, porque as culpadas pelo ato ilícito pertenciam à jurisdição civil.


D. João I deferiu as solicitações dos procuradores do Povo e as dos representantes da Igreja, criando leis que estabeleceram punições às barregãs de clérigos: “pelo estado que nos Deus deu para reger estes Reinos, fomos tendo de trabalhar quanto podemos, [para] que os nossos sujeitos vivam sem escândalo e sem pecado”. Afirmando a sua obrigação de zelar pela moral cristã e de combater o pecado, o rei prometeu punir as mulheres “que tão publicamente cometem este pecado [a barreguice clerical], castigando-as e refreando-as de o fazer” (Ordenações afonsinas, livro V, título XIX, artigo 4, p. 60).
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