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A Saga de Ulisses

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A Saga de Ulisses - Página 12 Empty Re: A Saga de Ulisses

Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 18:47

E os heróis responderam com certeiras lançadas: Ulisses atingiu Demoptólemos, Telêmacos atingiu Euríades, Eumeios atingiu Élatos, e Filétios atingiu Pisandros. Os quatro morderam o pó. Os que restaram trataram de abrigar-se no canto mais distante da sala, mas pouco depois voltaram ao ataque, armados de lanças arrancadas dos cadáveres e, mais uma vez, as atiraram, errando, novamente. Só a de Anfimédon arranhou o pulso de Telêmacos; a de Ctésipos feriu levemente o porqueiro no ombro, por cima do escudo. Em troca, ambos tombaram sem vida, e Eumeios, ao mesmo tempo em que atirava a sua lança contra Ctésipos, proferia:

— Tome, maldito linguarudo, pela perna de boi que atiraste em Ulisses!

O golpe de Ulisses havia abatido Eurídamas. Depois, derrubou Agelaus, filho de Adamástor, enquanto Telêmacos varava com seu dardo o ventre de Leócritos. Atena, do teto, agitou a fatídica égide, infundindo tal espanto nos pretendentes, que, como crianças assustadas, começaram a correr em todas as direções. Ulisses e os seus companheiros entregaram-se a terrível carnificina; ouvia-se apenas o ruído de crânios despedaçados e estertores de agonia. O sangue corria em torrentes pelo chão.

Liodes ajoelhou-se aos pés de Ulisses, pedindo clemência:

— Tem pena de mim! Jamais cometi excessos em tua casa; pelo contrário, esforcei-me por deter os outros, mas não me deram ouvidos. Sou um vidente e nada fiz. Eu também terei de morrer?

— Se és vidente deles, sombriamente, deves ter rogado por esses infames!

E Ulisses degolou-o com a espada de Agelaus, que se encontrava do lado do cadáver.

Perto do postigo, encontrava-se Fêmios, o aedo, com a cítara nas mãos. Presa de impressionante medo, não sabia se fugia por aquela pequena porta ou se abraçaria os joelhos de Ulisses. Finalmente, decidiu-se pela última opção e, colocando o instrumento no chão, entre a cratera e a cadeira, foi prostrar-se diante do rei e abraçou seus joelhos.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 18:48

— Apieda-te de mim. Tu próprio te arrependerias, mais tarde, se matasses um aedo que, com os seus cantos, alegras deuses e homens. Sou discípulo de um deus e, como um deus, hei de te enaltecer nos meus cantos. Teu filho pode testemunhar que não vim aqui por vontade minha, e que eles me obrigavam a diverti-los.

Ulisses ergueu a espada, mas vacilou antes de golpear, quando Telêmacos gritou-lhe:

— Detém tua espada, meu pai! Não mates esse inocente. Perdoemos também o arauto Médon, se é que tu ou os pastores já não o matastes, pois, quando eu era criança, sempre de mim cuidou, com muita dedicação.

Médon, que se ocultara debaixo de uma cadeira, envolto na pele de um boi recém-sacrificado, ouvindo tais palavras, alegrou-se e foi-se mostrar, prostrando-se diante de Telêmacos. Ulisses não pode reter um sorriso:

—Tranquilizai-vos, homens. A súplica de Telêmacos vos protege. Saí daqui para poderdes dizer aos outros como são mais vantajosas do que más as boas ações.

Ambos saíram correndo da sala e, tremendo ainda de medo, foram sentar-se no vestíbulo.

O REENCONTRO COM PENÉLOPE

Olhando em torno, não viu Ulisses nenhum inimigo em pé, apenas jaziam estendidos no chão. Então, ordenou que o filho chamasse a ama Euricléia, a qual viu o senhor de pé no meio dos mortos, com os pés e as mãos cobertos de sangue. A mulher prorrompeu em gritos de júbilo, visto ser o espetáculo grandioso e impressionante:

— Rejubilas-te, anciã, mas não grites. Não é piedoso mostrar alegria pela morte de quem quer que seja. Foram estes abatidos pela justiça dos deuses, não por mim. Agora, dize-me o nome das criadas que me desonraram e das que me foram fiéis.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 18:48

— Há cinquenta servas no palácio. Lhes ensinamos a tecer vestidos, a desfiar a lã e a incumbir-se da labuta doméstica. Doze delas se afastaram de ti e não quiseram obedecer nem a Penélope, nem a mim. Permite-,e, ó rei, que vá buscar minha senhora e lhe dê a boa nova.

— Não, ainda não; ainda não acabei o serviço. Manda-me, antes, as doze servas infiéis.

Apressou-se Euricléia em obedecer, e as servas surgiram, trêmulas. Ulisses, chamando o filho e os dois fiéis pastores, disse-lhes em particular:

— Retirai todos estes cadáveres, e que estas mulheres vos ajudem. Em seguida, mandai-as limpar com esponjas o chão, as cadeiras e as mesas. Quando tiverem terminado, levai-as para fora, entre a cozinha e a parede do pátio e executai-as todas a faca, para que paguem a insolência à qual se entregaram com os pretendentes.

Eumeios, Filétios e Telêmacos voltaram de soslaio o olhar para as servas infiéis, que, trêmulas, agruparam-se aos prantos. Eles obrigaram-nas a realizar o trabalho; em seguida, depois de tudo limpo, sob o olhar frio de Ulisses, os pastores conduziram-nas para a parte externa, entre a cozinha e a parede do pátio, e Telêmacos disse:

— Estas criaturas execrandas, que desonraram a mim e a meu pai, que serviram de prostitutas aos pretendentes de minha mãe, são igualmente culpadas e deve pagar com a morte.

Disse, e amarrou de coluna a coluna, ao longo da parede da cozinha, uma corda. Daí a pouco, com o laço ao pescoço, ficaram pendentes as doze servas, sacudindo-se um instante no ar, antes de entregarem a alma a Caronte, o barqueiro do Estige.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 18:49

E foi a vez de Melântios ser levado ao pátio e ser executado. Encontraram-no aos gritos, desamarraram-no e levaram-no para o pátio da Morte. Quando Telêmacos e os pastores terminaram, terminou também a obra de vingança, e eles voltaram à sala, para junto de Ulisses, que andava para lá e para cá com as mãos unidas em suas costas. E o rei, ao vê-los, ordenou a Euricléia que trouxesse numa panela fogo e ervas aromáticas para purificar a casa e o vestíbulo. Ela, porém, antes de iniciar a tarefa, trouxe um manto e uma túnica ao seu amo e senhor:

— Filho querido e senhor de todos nós, não continues coberto de farrapos...

Ulisses, afastando as vestes, mandou-a começar o trabalho; enquanto ela ia pelos aposentos, fumegando-os, mandava chamar as servas fiéis para reuni-las. Em breve, reuniram-se todas, admiradas, em volta do amo querido, dando-lhe as boas-vindas com lágrimas de júbilo, apertando a face às suas mãos e beijando-as várias vezes. Também Ulisses chorava. Finalmente, tinha diante dos olhos as criaturas que lhe haviam permanecido fiéis.

Depois disso, chamou a fiel Euricléia e disse:

— Vai comunicar à rainha que seu marido voltou.

A velha Euricléia sentiu as pernas jovens, de tanta alegria estava possuída. A rainha dormia. Euricléia, achegando-se ao seu leito, tocou-a:

— Acorda, minha filha, para contemplar aquilo por que todos os dias ansiavas.

— Euricléia, és tu? O que queres? Eu estava tendo um sonho... Sonhava que Ulisses voltava para casa...

— Pois Ulisses tardou mas chegou. Ele está no palácio! Nenhum dos perversos homens que te atormentava está vivo. Ulisses matou todos!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 18:59

Penélope, esfregando os olhos, para recobrar a lucidez, respondeu:

— Por certo estás doida, querida ama. Os deuses transtornaram-te, do contrário não cometerias o despropósito de me acordar quando eu tinha o mais lindo sonho, desde que Ulisses partiu para Tróia. Jamais consegui dormir tão bem como agora... Se fosse qualquer outra escrava que tivesse feito isso, eu a castigaria severamente. Vai, deixa-me!

— Não te zangues, não é loucura nenhuma. Ulisses está aqui. O estrangeiro com quem falaste não é outro se não teu esposo! Telêmacos já sabia; mas nada revelou para que Ulisses surpreendesse os pérfidos pretendentes.

— Euricléia, não tentes me enganar. Aéton é um velho.

— Pois transfigurou-se perante todos. Eu o vi!

Penélope estava confusa, mas saltou alegremente do leito, abraçou a ama com efusão, enquanto pela face as lágrimas escorriam.

— Ó querida, parece incrível! Se me contaste a verdade, como pôde ele sozinho matar tantos inimigos?

— Isto eu não sei dizer. As portas do salão estavam fechadas e nós, as mulheres, amedrontadas, fomos trancafiadas na cozinha. Apenas ouvíamos gemidos, muito barulho. E só quando Telêmacos foi me chamar é que entrei lá. E vi Ulisses, nas roupas do velho Aéton, de pé no meio dos mortos caídos uns sobre os outros. Que alegria teria se o visse! Parecia um leão coberto de sangue e suor. Agora os cadáveres já estão empilhados no pátio e as escravas fazem a limpeza do salão. E já purifiquei a sala com enxofre. Por isso, não tardes mais. Vem comigo, que todas as tuas provocações chegaram ao fim. Ulisses te espera.

Penélope ainda duvidava:

— E se não for ele? Quem sabe não será um deus que tomou a sua aparência? Não pode ser Ulisses, que está distante, muito distante, e deve estar morto!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:04

Euricléia protestou, sacudindo a cabeça:

— Incrédula! Como posso enganar-te, filha minha, se vi com meus próprios olhos a cicatriz que a dentada do javali deixou na perna do meu senhor? Vi-a quando lavei seus pés. E, se me calei, foi porque ele me impediu de falar, por achar mais conveniente.

— Ainda não estou convencida. Contudo, vou ter com meu filho e ver os pretendentes mortos e o homem que os matou, quem quer que ele seja.

Chegando ao salão, depois de cruzar o limiar, foi se sentar no canto mais escuro, longe da lareira, enquanto Ulisses, sentado de costas para uma coluna, olhando para o chão, esperava que a nobre esposa lhe falasse. Ela, porém, assombrada, permaneceu sem dizer uma palavra. Observava-o, mas não o reconhecia depois de vinte anos de separação.

Telêmacos não se conteve:

— Mãe insensível! Que coração de pedra é o teu! Será que tu não podes falar com meu pai? Vai, senta-te perto de meu pai, pergunta-lhe qualquer coisa! Que outra mulher se comportaria como tu, se visse o marido regressar ao cabo de vinte anos, após inúmeros sofrimentos e vicissitudes?

Penélope respondeu com serenidade:

— Meu querido filho, só eu sei como o meu coração está abalado e como a minha mente está confusa. Palavra alguma sai de minha boca, nem consigo observá-lo de frente. Mas se é realmente o meu Ulisses que retorna, haveremos de nos reconhecer, pois possuímos sinais ocultos e secretos.

O rei virou-se para o filho e, sorrindo docemente, disse-lhe:

— Não sejas impaciente, Telêmacos! Tua mãe acabará por me reconhecer. Dá tempo ao tempo. Devemos, agora, nos precaver. Precisamos esconder, durante algum tempo, esta matança. Os mortos têm sempre quem os vingue. E nós liquidamos a fina flor da nobreza de Ítaca.

— Meu pai, isto te compete. És tido no mundo inteiro pelo mais sensato dos conselheiros.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:05

— Ouve-me, Telêmacos. Evitemos que a cidade se revolte contra nós. Tomemos um banho e arrumamo-nos da melhor maneira possível. Também as donzelas usarão os melhores vestidos; vamos dar uma festa com música e dança. Quem lá fora passar pensará que estamos celebrando o casamento da rainha. Enquanto a notícia do morticínio não se espalhar, teremos tempo e calma para meditar. Os deuses haverão de nos inspirar.

Assim o aedo cantou aos acordes da cítara, e servos e servas dançaram, trajando suas melhores vestes.

Na rua, as pessoas que passavam e ouviam, comentavam:

—Sem dúvida, Penélope tornou a casar-se; eles devem estar realizando as núpcias.

— Infeliz! Não podia ter esperado que voltasse o marido?

Por fim, ao anoitecer, dissolveram-se os grupos. Ulisses banhou-se, ungiu-se com óleo perfumado, vestiu roupas condignas, e Palas-Atena tornou-o mais esbelto, a cabeça ornada por uma farta e ondulada cabeleira. E Ulisses, entrando na sala, acercou-se de Penélope, que se encontrava com Euricléia.

— Senhora, os deuses puseram em teu peito um coração insensível. Qual a mulher que não se atiraria aos braços do marido, após vinte anos de espera? Terei de dirigir-me a ti, Euricléia, minha boa mãezinha, para rogar-te que me prepares um leito em algum lugar, visto possuir esta mulher um coração de ferro?

— Não, ele é manso. Lembro-me muito bem do teu rosto, quando deixaste Ítaca. Mas meu coração foi vítima de tantas palavras falsas, na longa espera, que se encheu de desconfiança. Temo que me enganem ainda. Os homens são férteis em ardis. Euricléia, prepara-lhe o leito fora do quarto.

E Ulisses, erguendo os olhos, disse, aborrecido:

— Pois é muito fácil provar que sou Ulisses.

— Tua cicatriz? Quantos bravos heróis já foram mordidos por um javali?
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:06

— As tuas palavras me mortificam. Há uma coisa que só nós dois sabemos. Havia uma oliveira no pátio, cujo tronco engrossara tanto que mais parecia uma coluna. Em torno dele construí uma câmara com telhado e porta. Depois cortei todos os galhos e, perfurando laboriosamente o tronco, transformei-o em cama, que enfeitei com incrustações de ouro, prata e marfim. Esse é o nosso leito, Penélope. Se não a destruíram, embora não fosse muito fácil, em seu lugar ainda deve estar.

Penélope, afinal, rendeu-se à evidência, e, levantando-se da cadeira, lançou-se nos braços do marido com beijos e afagos.

— Ulisses!

— Penélope...

— Não te zangues comigo! Sempre foste o mais prudente dos homens. Os deuses eternos nos mandaram a Desgraça porque nos invejavam, vendo-nos tão unidos na mocidade e não querendo que, assim, chegássemos à velhice. Não me guardes rancor por não ter corrido para os teus braços, logo no primeiro instante. Temia que fosses um impostor. Agora, reconheço que és mesmo Ulisses, pois me disseste o que nenhum mortal sabia, senão tu, eu e a nossa velha criada Áctoris, que me acompanhou da casa de meus pais.

E Éros fez uma visita a Ulisses e Penélope. Uma seta divina partiu rumo ao coração de ambos, e o amor foi inevitável, enquanto sorria de satisfação Atena, a deusa amiga. Ouvindo-a falar, a alma do herói estremeceu de suave melancolia, e ele, chorando, apertou entre os poderoso braços a fiel esposa.

Metade da noite passaram contando um ao outro todas as dores que tinham curtido durante os vinte anos de separação. A rainha só logrou dormir, depois de lhe haver o marido relatado todos os pormenores de suas aventuras.

Finalmente, os moradores do palácio trataram de repousar, após os memoráveis sucessos do dia.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:06

ULISSES E SEU PAI LAERTES

No outro dia, bem cedo, Ulisses disse a Penélope:

— Querida, nós dois sofremos muito e por dilatado tempo. Tu aqui suspirando pelo meu demorado regresso, eu curtindo, longe, aflições e muita saudade. Juntos estamos novamente, mas há ainda muitas coisas a realizar. Cuida dos bens que tenho no palácio, que eu cuidarei dos rebanhos devastados. Haverei de recuperá-los, seja arrebatando reses aos meus inimigos, seja obrigando os parentes dos pretendentes a reporem o que me foi roubado. Antes de tudo, porém, preciso ver meu velho pai, que tão pungido deve estar por minha causa. Mas ouve bem o que eu vou te recomendar: não vai tardar que na cidade se espalhe a notícia do fim dos pretendentes; vai para os teus aposentos com as servas e lá fica me esperando, para que ninguém te veja e te faça perguntas.

Ulisses, pendurando a espada ao ombro, chamou Telêmacos, Eumeios e Filétios. Armaram-se e partiram, quando a luz do Sol já se difundia pela Terra, com Ulisses à frente. Palas-Atena envolveu-os em densa névoa, tanto que ninguém os reconheceu.

Depressa chegaram às cultivadas terras do velho rei Laertes. Este adquirira-as há muito tempo e, à custa de infinda trabalheira, as transformara em solo fértil. Ali vivia, cercado de leais escravos para os quais construíra choupanas à volta da sua casa. Uma velha siciliana, Seguilé, com todo o carinho, cuidava do ancião.

E Ulisses ordenou ao filho e aos servos:

— Entrai, tomai dois porcos e esmerai-vos em assá-los. Vou procurar meu pai no campo para ver se ele é capaz de me reconhecer. Não tardaremos em voltar ambos, e faremos um belo banquete.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:07

Entregando as armas para que as guardassem, enfiou-se pelo pomar, onde não encontrou ninguém, nem o mordomo Dólios nem seus filhos e ajudantes; todos tinham ido buscar material para fazer um cercado destinado ao vergel de árvores frutíferas. Lá estava o pai arrancando ervas daninhas. Trazia uma túnica suja e cheia de rasgões; protegia as pernas, contra os espinhos e urtigas, com rústicas perneiras de couro cru; para não se ferir nas pedras, usava grosseiras luvas; defendia a cabeça, já meio calva, com um surrado gorro de pele de cabra. Parecia um criado qualquer.

Ao contemplar o pai, vergado pela velhice e pela pobreza, Ulisses ficou muito comovido, e parou junto de uma pereira para se apoiar e chorar, não sabendo se devia correr a abraçá-lo, dizendo-lhe quem era, ou se devia saudá-lo para ver se o ancião o reconhecia. Decidiu, afinal, experimentá-lo e encaminhou-se para o pai, que abria uma cova ao pé duma árvore.

— Meu bom ancião, estou vendo que sabes cuidar da terra. Não há um palmo de chão desaproveitado. Viçosas estão as oliveiras, as pereiras, as parreiras, as hortaliças, tudo enfim está perfeito. Mas não te zangues se reparo que não cuidas de ti mesmo. Estás sujo e mal vestido. E, no entanto, logo vejo que não és um escravo preguiçoso, punido pelo teu senhor. Não há em ti, aliás, nada de servil; pelo contrário, tens toda a aparência de um rei. Quem és? E a quem pertence este belo pomar?
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:07

Laertes voltou-se para o estranho e, olhando-o curiosamente, a tudo ouvia sem dizer palavra. Ulisses continuou a falar, enquanto o velho rei continuava seu trabalho:

— Ah, antes, porém, me responde se, na verdade, esta terra é a ilha de Ítaca. Perguntei a um homem, que encontrei no caminho, e ele não me deu atenção. Parecia um tolo. Tenho empenho em saber, pois, há muitos anos, hospedei um varão que dizia ser daqui. Nunca hospedei ninguém tão simpático. Ficamos muito amigos, retive-o no meu palácio o quanto pude. Quando partiu, ofereci-lhe sete talentos de ouro, uma jarra de prata, doze mantos e outros tantos tapetes. Contou-me que nascera em Ítaca e que seu pai era o rei Laertes.

Laertes parou e, perturbado, virou-se para o estranho, deixando escapar lágrimas dos seus olhos, e disse-lhe:

— Sim, estrangeiro, esta é Ítaca. Mas desgraçadamente ela está dominada por uma legião de homens atrevidos e iníquos. Se encontrasses aqui o varão que abrigaste, por ele serias recebido com a mesma hospitalidade que a ele dispensaste e sairias carregado de valiosos presentes. Mas elucida-me uma coisa: há quanto tempo recebeste meu filho em teus domínios? Pois, a verdade, é que aquele vão era mesmo meu filho Ulisses!

O velho rei mal esperou Ulisses responder algo, e continuou trabalhando, pois imaginava a resposta:

— Ai de mim! Triste foi o seu destino. Pereceu longe da Pátria e dos amigos. Foi comido pelos peixes do mar ou pelas feras da Terra... Nada sabemos. Mas a fiel Penélope não lhe cerrou os olhos, nem eu e a mãe choramos sobre o seu corpo amortalhado.

E virou-se para o estrangeiro:

— Dize-me quem és, donde vens, quem são teus pais e como aqui chegaste...
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:08

— Eu me chamo Epéritos, sou de Álibas, e meu pai é o rei Áfidas. Venho da Trinácria, a ocidente, enfrentei uma tempestade e ancorei minha nau perto deste campo. Há quatro anos que Ulisses deixou a minha cidade. Certamente teria um feliz regresso, pois os presságios eram favoráveis e assim foi com alegria que me despedi dele, e prometi-lhe um dia visitá-lo.

O velho rei sentiu-se tomado pela dor. Gemendo, sentou-se e, apanhando um punhado de terra, esfregou-a na veneranda cabeça encanecida, aos prantos. Fremiu de emoção o coração de Ulisses e, num impulso incontido, não mais resistindo experimentá-lo, estreitou o velho contra o peito, beijou-lhe a testa e disse-lhe:

— Pai! Eu sou Ulisses, que volto depois de vinte anos. Vamos, seca as lágrimas, deixa de sofrer.

— Não...

— Pai, eu liquidei os pérfidos pretendentes no meu próprio palácio. Não resta nenhum. Pagaram com a morte todo o mal que praticaram.

— Não, amigo, não tentes enganar-me por teres piedade de um velho como eu.

— Sou eu, pai, o teu filho!

Laertes duvidava:

— Meus olhos estão gastos para reconhecer-te. Dá-me uma prova de que és mesmo meu filho.

— Lembra-te da cicatriz deixada pela dentada do javali, quando eu caçava no Párnassos, quando fomos à casa de Autólicos? Pois aqui está ela.

Ulisses mostrou-a a Laertes, que teve dificuldade em vê-la, e continuou:

— Não basta como prova? Posso dar outra ainda, mais convincente. Vou apontar neste pomar as árvores que, a meu pedido, me deste, quando eu era menino. Nem mesmo me esqueci o número delas. Quando eu era pequenino, costumava acompanhar-te ao pomar e, passando por entre duas fileiras de árvores, tu me ias dando o nome das diversas espécies. Deste-me treze pereiras, dez macieiras e quarenta figueiras. Deste-me, além delas, cinqüenta videiras de diferentes qualidades, cada uma das quais dava frutos em épocas diversas.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:09

O velho Laertes, com as pernas tremendo e a respiração fugindo, quase desfaleceu. Mas, refazendo-se, retribuiu o apertado abraço filial.

— Zeus misericordioso! Afinal tenho-te de volta, meu filho! Pena que tua mãe não viveu o suficiente para te esperar. Não resistiu a tua falta. E os pretendentes foram exterminados como mereciam por seus malefícios.

E, separando-se um pouco de Ulisses, olhou-o assustado e alertou-o:

— Mas tenhamos cuidado. Receio que os nobres de Ítaca e das ilhas vizinhas formem um exército e marchem contra nós para vingar seus mortos.

— Não tenhas medo, pai. Eu saberei resolver o caso. Vamos agora para a tua casa. Telêmacos, Eumeios e Filétios lá ficaram preparando uma bela refeição!

— Opa! Vamos depressa, então!

E para a aprazível morada se encaminharam, onde encontraram Telêmacos e os dois pastores ocupados em cortar a carne e por vinho nas jarras. Enquanto esperavam a comida, Seguilé deu um banho no velho rei, perfumou-o e vestiu-lhe uma túnica nova. Palas-Atena, sempre oportuna, fê-lo mais robusto e majestoso, de maneira que Ulisses, ao vê-lo, exclamou:

— Ó meu pai! Por certo foi um deus que lhe concedeu tão perfeita aparência.

— Se, rejuvenescido e forte tal qual me sinto, tivesse estado ontem perto de ti, participando da luta, podes ter a certeza de que vários homens eu teria feito tombar aos meus joelhos.

E se sentaram para comer, mas, mal haviam começado, eis que chegou do campo o velho escravo Dólios, acompanhado dos seis filhos. Ao dar com Ulisses, logo o reconheceu e ficou estupefato. Ulisses, rindo, chamou-o:

— Deixa de espanto, Dólios. Vem para cá comer, que já estamos cansados de esperar-te.

Dólios se aproximou e beijou o punho de Ulisses:

— Meu amado senhor! Foram os deuses que te trouxeram. Cansados estávamos de te esperar. Sê bem-vindo! Penélope já sabe da tua chegada? Precisamos avisá-la.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:09

— Ela sabe de tudo, meu velho. Não mete o nariz nestas coisas... Comamos e bebamos, que é melhor.

Dólios tomou o seu lugar na mesa, e cada filho, após estreitarem a mão e darem boas-vindas ao herói de quem tanto ouviam falar, fez o mesmo. E todos comeram e beberam alegremente.

REVOLTA EM ÍTACA

Conforme Ulisses havia calculado, a notícia da mortandade cedo e rapidamente se espalhou pela cidade. E, subitamente, de todos os cantos acudiram parentes ao palácio, pranteando os seus mortos, amontoados num recanto do pátio, e levando os corpos para enterrar; e, para os cadáveres daqueles que provinham das ilhas vizinhas, foram encarregados pescadores, que os entregaram às suas enlutadas famílias. Terminada a fúnebre tarefa, houve reunião na ágora da cidade. E um varão poderoso e de grande prestígio, ainda robusto, mas corroído pela inconsolável dor causada pela morte de seu filho, foi o primeiro a levantar-se disposto a opinar sobre o caso; era Êupites, pai de Antínous, a primeira vítima do furor de Ulisses:

— Amigos, lembrai-vos das inúmeras calamidades trazidas a Ítaca e às cidades vizinhas pelo homem que eu acuso. Foi monstruoso o crime que Ulisses praticou contra o seu povo! Há vinte anos, levou para Tróia numerosos e valentes varões das ilhas que compunham o arquipélago, perdeu todos os navios e nenhum homem sequer voltou. E, mal chegado, assassinou a fina flor da nossa raça. Será uma vergonha eterna se não vingarmos a morte de nossos filhos e irmãos! Apressemo-nos para impedir que Ulisses e aqueles que o ajudaram fujam para Pilos ou para Élis. Por mim, prefiro morrer a suportar a afronta! Prouvera aos deuses matar-me quanto antes e dar-me, assim, a oportunidade de estar ao lado dos meus mortos! Vamos, pois, se sois homens! Vamos, antes que tomem um navio e escapem!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:10

A multidão se agitou, pois aquele homem estava extremamente magoado. Porém, naquele instante, saíam do palácio Fêmios, o aedo, e o arauto Médon; este último ergueu a voz:

— Um momento, homens de Ítaca! Ouvi-me. Foi por vontade dos deuses que Ulisses premeditou e realizou essa façanha, asseguro-vos. Eu, com os meus próprios olhos, vi um deus ao seu lado, disfarçado na figura de Mentor. Incitava-o à luta e fazia desviar as lanças dos pretendentes de sua esposa. Se morreram todos, foi por obra divina.

A multidão espantou-se. Aí, levantou-se um benevolente homem, famoso por desvendar o passado e o futuro. Seu nome era Haliterses, filho de Mástor. E, com calma, falou:

— Ouvi o que tenho a dizer, cidadãos de Ítaca. Os fatos horrendos que aconteceram são a colheita daquilo que vós mesmos semeastes. Não me escutastes, nem escutastes o sábio Mentor, quando exortávamos que pusessem fim aos desatinos dos vossos filhos, os quais com funesta insolência dissipavam a fortuna de Ulisses, e lhe ultrajavam a esposa, seguros de que ele nunca mais voltaria. Agora, segui o meu conselho, se sois sensatos. Não deveis marchar contra o rei, se não quiserdes que um mal maior desabe sobre vossas cabeças.

Haliterses calou-se. Alguns ouviram; outros, todavia, capitaneados por Êupites, teimavam em pegar as armas e marchar contra Ulisses. Os que se rebelavam foram-se reunir em campo aberto, fora da cidade. Colocou-se à sua testa Êupites, e a tropa marchou, disposta a vingar a morte de seus filhos e parentes. Entretanto, no Olimpo, Palas-Atena interrogou Zeus, seu pai:

— Qual é a tua vontade, meu pai e senhor supremo? Deixarás que lutem ou determinarás que reine a paz entre Ulisses e o seu povo?
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A Saga de Ulisses - Página 12 Empty Re: A Saga de Ulisses

Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:11

— Por que fazes tal pergunta a mim, filha? Não foste tu que tramaste o plano de vingança de Ulisses? Agora, continua como quiseres. Mas se desejas realmente saber o que penso, ouve: Ulisses, após deter todos os inimigos, celebrará um pacto sagrado, e ele ficará para sempre rei de todos em Ítaca. Que os homens esqueçam o morticínio dos filhos e dos irmãos, reine o mútuo afeto e se tornem amigos como antes; e assim vivam, desfrutando a abundância e a tranqüilidade.

Então, acolhendo com alegria a decisão e o conselho do pai, Atena despencou do Olimpo, ansiosa para apaziguar o povo de Ítaca.

Na casa de Laertes, porém, acabada a refeição. Estavam ainda conversando, quando disse o previdente Ulisses:

— Creio que os nossos inimigos, na cidade, não devem estar nada satisfeitos. É bom que alguém vá lá fora ver o que se passa.

Um dos filhos de Dólios apressou-se em atender o senhor. Não passou da soleira da porta.

— Eles já estão se aproximando...

Ulisses correu para a porta e gritou:

— Armemo-nos, depressa!

Correram às armas precipitadamente, Ulisses, Telêmacos, Eumeios, Filétios e os seis filhos de Dólios. Laertes e Dólios, apesar da velhice, não fizeram por menos. E saíram com Ulisses à frente, dispostos a vender bem caro a vida. Foi quando Palas-Atena apareceu semelhante a Mentor na figura e na voz. Ulisses logo viu de quem se tratava e, confiante, disse ao filho:

— Telêmacos, sê agora digno das ilusões de teu pai. Mergulha na luta, na vanguarda, e honra a tua estirpe, que sempre se destacou pelo seu valor.

O brioso moço retrucou:

— Ainda duvidas da minha coragem, depois da luta que sustentamos contra os pretendentes? Jamais envergonharei a nossa linhagem, meu pai.

E o velho Laertes, cheio de júbilo, exclamou:

— Agradeço aos deuses um dia tão feliz. Como revive o meu coração envelhecido! Meu filho e meu neto disputarão a palma da valentia!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:11

Neste momento, Atena, na figura de Mentor, se aproximou do velho rei e disse-lhe:

— Filho de Arcésios, a quem mais estimo dentre todos os meus companheiros de luta, eleva uma prece ao grande Zeus para que fortaleça teu braço e arremessa a lança!

Laertes obedeceu, orou e atirou a lança; atravessou a viseira do elmo de Êupites, que tombou pesadamente ao chão. Então, Ulisses e Telêmacos lançaram-se sobre os inimigos, iniciando terrível luta corpo-a-corpo, com espadas e lanças. Mas Atena fez ouvir a sua divina voz:

— Cessai, homens de Ítaca, este inútil derramamento de sangue! Parai, segundo a vontade do Olimpo!

À voz da deusa, o medo apoderou-se de todos, que debandaram. Ulisses, soltando seu grito de guerra, tentou persegui-los, seguidos dos seus companheiros e de Atena, mas Zeus despediu um raio, que foi cair aos pés da deusa. E ela gritou:

— Pára, Ulisses! Domina o teu ímpeto! Não provoques a ira de Zeus!

Ele parou, e também os outros. Atena acompanhou-os à cidade. Ficaram todos na ágora, de onde foram enviados arautos para convocar a assembléia do povo. Cumpriu-se, então, a promessa de Zeus: de todos os corações desapareceu o ódio. E, sob os auspícios da deusa, que se apresentava com a figura e a voz de Mentor, em solene pacto, a paz foi celebrada entre Ulisses e o seu povo.

Após o massacre dos pretendentes, depois que a Paz voltou a reinar no país, Ulisses finalmente tirou um tempo para por tudo em ordem. E a primeira atitude foi oferecer um sacrifício expiatório a Hádes, Perséfone e Tirésias, para que pudesse se ver livre de seus atos de violência e se sentisse purificado.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:12

Ulisses foi aclamado rei e senhor de Ítaca e de todas as ilhas vizinhas que ainda a ele não se submetiam, por decisão unânime. Grupos alegres o acompanharam ao palácio, do qual, atraída pelas aclamações de vitória e paz, saíra Penélope, coroada e esplendidamente ataviada, no meio das suas ancilas. O casal, finalmente reunido, passaria desde então a viver longos e felizes anos. E, nesse tempo, Telêmacos ganhava um irmãozinho, que o chamaram Poliportes.

OS TRÁGICOS DESFECHOS

No entanto, Ulisses passou a ser pressionado por príncipes das ilhas vizinhas pelo massacre de seus parentes e amigos. Então, pensando em acabar logo com as pressões, pondo tudo em pratos limpos, mandou chamar o jovem Neoptólemos, que ocupava o trono do Épiros, achando-se assim inviolável e contando com o seu prestígio inabalável. Isso desagradou a sua protetora e amiga, a deusa Atena, mas não abandonou-o.

Mas Neoptólemos, filho de Aquiles, que tornava-se herói nacional em toda a Hélade, recebeu o encargo de julgar os atos de Ulisses, mesmo contra a vontade, e, fazendo-se cumprir a profecia de Tirésias, condenou-o ao desterro. E Ulisses, surpreso e contrariado, lembrando-se das previsões de Tirésias, teve que entregar o trono ao filho Telêmacos, deixando Penélope pela segunda vez. Poucos meses após o seu regresso em Ítaca, Ulisses partiu novamente portando um remo bem talhado sobre seu ombro e foi de barco rumo ao continente, para a Acarnânia. Depois, a pé, seguiu para o país dos tésprotes, ao norte. Ali, ofereceu a Poseidon um sacrifício, para apaziguar a ira do deus.

Na Tesprótia, conheceu a rainha Calídice, que lhe ofereceu metade de seu reino, enamorada que estava, tornou-se sua esposa e teve dele o filho Polípoetes. Tal atitude, pela segunda vez, desagradou a Palas-Atena, que tinha sentimentos nobres de fidelidade e pudor.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:12

Ulisses, já tomado pelo esquecimento e pela perda de suas virtudes, que sempre lhe foram caras, seduziu Evipe, filha de Tírimas, o rei do Épiros, e dela teve um filho, Euríalos. Esse foi mais um motivo para entristecer a deusa da sabedoria.

Anos mais tarde, após a morte de sua consorte, a rainha Calídice, Ulisses voltou anonimamente para Penélope, em Ítaca. E um Oráculo advertiu-o que tomasse cuidado com seu próprio filho, que poderia fazer-lhe algum mal. Ele, com muito medo que Telêmacos o matasse, exilou-o impiedosamente para a ilha de Córcira. E esse foi o derradeiro motivo do afastamento de Palas-Atena, que passou a desprezá-lo, contra seu desejo, entregando-o à própria sorte, apesar de amá-lo intimamente. Mas Ulisses, percebendo o quanto havia mudado desde que retornara para Ítaca e houvera assassinado os pretendentes de sua esposa, e pressionado por Penélope, que o censurava por atitude indigna de um pai, manteve-se à distância, procurando ocupar o lugar que por muitos anos ocupou Laertes, pastoreando e cuidando de suas plantações no campo.

Estando em Córcira, a ilha dos Feácios, Telêmacos apaixonou-se profundamente por Nausícaa, a filha do rei. Casaram-se em meio de grandes festejos e viveram felizes por muitos anos. Nausicaa deu-lhe um filho, Persépolis (Perseptólis, segundo Aristóteles, ou Ptoliportos, segundo Díctis de Creta).

Na longínqua ilha de Eéa, onde reinava a feiticeira Circe, já atingiam idade adulta os filhos que Ulisses havia deixado naquele lugar, muito distante de sua Pátria. Após sua partida de Eéa, Telégonos e Cassífone foram criados pela mãe Circe; em seguida, nasceram Ágios e Latino. E Telégonos, “nascido muito longe”, vendo a saber sobre a fama de seu pai e de seu paradeiro, decidiu ir conhecê-lo e reclamar a herança que lhe era de direito. Mas partiu sozinho, sem seus irmãos.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:13

Chegando em Ítaca, começou por tentar apossar-se de uma parte dos rebanhos de cabras, sem saber que eram de seu pai Ulisses. Este, assim que soube do salteador estrangeiro, saiu para a costa em defesa dos seus bens ameaçados, e foi ferido gravemente pela lança do próprio filho, na batalha que se seguiu. A ponta de sua arma era formada pelo ferrão de uma arraia. Morto Ulisses e inteirado Telégonos da identidade da vítima, chorou amargamente pelo crime cometido. Para honrar o pai, celebrou funerais, sem cremá-lo ou enterrá-lo, preservando o corpo com ervas mágicas oriundas de seu país, e Telégonos desposou Penélope, então viúva, bem mais velha que ele apesar de sua incontestável juventude.

Telêmacos, já bastante tempo longe de Ítaca, decidido em afastar-se ainda mais, seguiu para o Ocidente, atraído por uma força oculta, e foi dar nas costas da ilha Eéa, onde reinava Circe. Lá, reconhecido como filho de Ulisses, casou-se com sua filha Cassífone. Mas, não suportando o gênio despótico e imperioso de Circe, finalmente matou-a. Cassífone, vendo a mãe sucumbir, ela que tivera o poder mágico de viver muitos e muitos anos sem envelhecer, absorveu o desejo de vingança, e tirou a vida do esposo à traição.

Porém, mais tarde, Telégonos, temendo ser atacado e morto por parentes e amigos de seu pai, o homicida tomou nos braços o corpo de Ulisses e levou-o para a ilha encantada de sua mãe, a ocidente da Itália. Segundo dizia o povo daquela terra, após ser ressuscitado por Circe, Ulisses foi morar com ela e os filhos na Tirrênia, adotando o nome de Nanos, e lá fundou pelo menos trinta cidades, e o próprio Telégonos fundou uma cidade, Túsculo, destinada a ser próspera e famosa.

Na versão do povo tirreno, um certo Rómus passava por ser filho de Ulisses, e desse nome os latinos haveriam de encontrar inspiração para fundar a mais poderosa das cidades do Mundo Antigo: Roma.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 18/3/2021, 19:14

Depois de atingir avançada idade, o muito famoso Ulisses caiu nos braços da Morte e foi assumir seu lugar entre os grandes heróis, na Ilha dos Bem-aventurados. Seja por Helena ou Penélope, tudo se fez pela beleza, a sensualidade e a fragilidade da seda, que envolviam as mulheres da antiga Hélade. Assim Ulisses, que esteve presente e agiu em todos os momentos decisivos, fez mover a história que seria transformada nos versos de Homero.

FIM




Espero que tenham gostado. A partir de agora, o tópico está aberto a discussões, críticas construtivas, curiosidades, opiniões, complementos...
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