Umberto Eco

sombriobyte escreveu:
Os que querem comparar Eco a Brown não perceberiam nem a orelha do coelho...

heahueaueahueauhea

O que parece inadmissível para leitores de Eco é que Dan Brown tenha feito ressurgir de fato algumas discussões já propostas nos calhamaços de Umberto Eco. Assim, comparam um livro e outro sem distinguir o público-alvo, os moldes da narrativa, e coisas do gênero, cabendo a inequívoca exaltação a Umberto Eco. Por outro lado, as pessoas parecem ressentidas quanto ao fato de que O Código da Vinci é um livro muito mais ágil do que O Pêndulo de Foucault, por exemplo, e não estou colocando na balança o teor informativo de ambas as obras, mas apenas o quanto elas podem prender o leitor e gerar discussões (profícuas ou superficiais, não importa e isso mais depende do interlocutor do que do livro em si), etc, etc, etc, que não quero ficar me alongando na questão.

Inadmissível, caros senhores, é Paulo Coelho dizer à Veja que James Joyce não sabe escrever, e que Hermann Hesse, prêmio Nobel, não soube terminar o Sidarta, ao mesmo tempo em que mostra que não leu o livro, pois questionou o final da história com uma pergunta incoerente para o contexto ali contido.

O Dan Brown não usa ideias do Umberto Eco, sobre essas teorias da conspiração, e o próprio Eco escreveu o livro dele depois de ter feito uma longa pesquisa acadêmica sobre o tema - ou seja, com inovações inventivas dos dois lados, os dois misturam muito do que se vem dizendo no universo de conspirações já há muito tempo.

A diferença maior dos livros, pra mim, são os escritores, uheahuehuea. Enquanto você vê que o Eco sabe muito mais do que coloca no livro, e várias coisas que ele acha interessante ele apenas cita de passagem, o Dan Brown obviamente sabe muito menos do que seria necessário pra escrever o livro dele.

Ele não entende a Monalisa, por exemplo. Se você lê a História da Arte, do Gombrich, porra, você entende porque a Monalisa é tão admirável. O Dan Brown só fala um monte de merda sem sentido.

Agora, apelar porque comparam um com o outro é coisa de fã de Dan Brown, eu acho. Um preconceito bobo de idolatria. Um sentimento religioso em relação a celebridades, visões de mundo, ou quaisquer outras coisas que você considera sagrado. É o que leva as pessoas a discutirem sobre times de futebol.

Se você está lendo Umberto Eco e não conseguiu sentir essa indiferença pacífica e um bom humor desinteressado diante do estúpido no mundo, pô, leia de novo, cara!

Os romances do Eco são populares... enfim...

...mas muita gente não capta nem um terço da intertextualidade, da erudição que está por baixo, ou melhor, na tessitura da intriga. É que Eco dá para muitos níveis de leitura. Cada um faz aquele que pode.

Dan Brown... é aquilo.
Paulo Coelho... nem me falem.

Acho que a ficção e a licença poética permitem a Dan Brown escrever qualquer coisa, inclusive que Monalisa é uma viajante do tempo apreciadora de ketchup Heinz e cerveja Heineken. Talvez ele, Brown, até tenha conhecimentos factuais relacionados à história da Arte, e precisamente por isso goste de umas pinceladas no terreno da ficção. Bem ou mal, ele disse uma coisa coerente em entrevista passada: "é mais difícil escrever um livro que agrade o grande público do que uma obra erudita destinada a um grupo seleto de leitores". Em minhas incursões pela literatura de massa, essas coisas tornaram-se mais claras para mim, e o teste fatal está em oferecer a um leitor não-assíduo um Antonio Lobo Antunes e um Sidney Sheldon.

Também não devemos fazer da fala de Brown um cavalo de batalha, como se escrever uma obra erudita fosse de fato mais fácil que aquela que agrade a gregos e troianos. É compreensível o que ele disse, embora distante da possibilidade que torne mais fácil o surgimento de um novo Crime e Castigo ou Complexo de Portnoy.

Finalizando - por ora-, o que gostei mesmo foi do alvoroço causado na igreja católica, protagonizado pelo Código. Só por isso o livro já vale a leitura. Por outro lado, não podemos esperar do livro nenhum raciocínio filosófico mais profundo, senão relegarmos a leitura a um mero passatempo, e só. Há questões interessantes no livro, que Brown poderia ter trabalhado melhor (ainda que sob a tutela da ficção), tirando-as do rol de best-seller, mas negócios são negócios, e ele com certeza riu à toa.

Em tempo: os católicos que me perdoem, mas foi o maior barato. De uma hora pra outra tinha gente canonizando o Dan Brown, e fazendo do Código da Vinci a nova Bíblia, o que me levou a dar uma espiada nos escritos do sujeito. Pelo menos isso faz com que as pessoas repensem suas crenças, ou as enxerguem sob um novo ângulo.

''Eu inventei Dan Brown'', diz Eco:

http://veja.abril.com.br/blog/meus-livros/livros-da-semana/a-invencao-de-dan-brown-por-umberto-eco-e-outras-historias/

Trechos selecionados - Baudolino

''Mas, afinal, isso tudo é conversa; quando um guerreiro entra numa cidade, não há religião que resista.''

''Em Paris, hás de estudar retórica e ler os poetas: a retórica é a arte de dizer bem aquilo que não é certo que seja verdade, e os poetas têm o dever de inventar belas mentiras.''

''Na juventude temos a inclinação de nos apaixonarmos pelo amor.''

''– Mas tu, Zózimo, jura, jura que não tentarás outro golpe...''
''Juro por todos os doze santíssimos apóstolos'', disse Zózimo.
''Onze, onze seu desgraçado'', gritou Baudolino, agarrando-o pela vestimenta, ''se dizes doze estás incluindo Judas também!''
''Está bem, onze''.

Genial, nada menos que genial.
Pra mim, foi o melhor livro que já li, achei muito melhor que "O Nome da Rosa".
Mescla com maestria a ironia histórica, o humor, os questionamentos, o conteúdo ideológico.
É perfeito.

E por falar em "O nome da Rosa"...

Minha parte favorita de "O nome da rosa" é o capitulo da discussão entre os franciscanos espirituais e os avignoneses sobre a pobreza de Jesus que é narrada na prima do quinto dia.
O debate começa com um tom solene (como o assunto e a época exigiam), porém termina no maior barraco "à moda italiana" com impropérios, xingamentos e quase violência fisica.
Achei o modo como Eco narra a briga muito hilário (curioso uma cena desta num livro que discute exatamente o riso...).
Da teologia a porrada com frei Guilherme suplicando a proteção de São Francisco enquanto seus filhos caem na vulgaridade total.
Lembra as brigas homéricas entre esquerda e direita na Itália contemporânea - eu não sei se Eco quis fazer esse paralelo e comparações são perigosas neste tipo de obra - mas enfim....Eu adoro esse capítulo!

Por falar nisso, na opinião de vocês qual o melhor romance para iniciar?

O nome da rosa?

Não é das piores escolhas... De fato, é menos denso que O Pêndulo de Foucault, na minha opinião.

A Misteriosa Chama da Rainha Loana também é um romance bom pra iniciar, embora não seja, na minha opinião, tão vislumbrante quanto O Nome da Rosa.
Eu ficaria com as histórias de William de Baskerville e o jovem Adso.

Bem...

O Nome da Rosa.

É... eu estou lendo Baudolino, e é o meu primeiro livro de Eco.
Estou maravilhado!!!!

Baudolino...

Você ri do começo ao fim... kkk ... muito divertido mesmo... e a história é muito interessante.

Definitivamente o pior pra começar pra mim é o Pêndulo de Foucault, narrativa mais densa que O Nome da rosa inclusive.

Claro que se deve iniciar com O Nome da Rosa. Aliás, leio 1 vez ao ano esse livro, que continua me fascinando a cada nova releitura.

Baudolino é muito divertido.

Mais do que começar a ler o Umberto, o melhor é não parar, comece talvez pelo Nome da Rosa, mas dê mais atenção aos sermões do que a história em si, e depois, é claro, quando chegar ao Pêndulo, leia até o final, sem parar, você vair ver...

Mais importante que começar é seguir adiante.

Concordo que mais importante que escolher o livro para começar a ler a obra de Eco é buscar ler mais de um. Acho muito interessante o paralelo que pode ser traçado entre os vários gêneros, ou seja, como há relações entre escritos como os Diários Mínimos (ou as Bustinas) e os romances, ou, ainda, entre a obra ficcional e a teórica.

Só para completar meu comentário: ficção e teoria se interpenetram em Eco como em outro erudito escritor com quem Eco tem débitos, o argentino Borges.

Eco se inspirou em muitas coisas de Borges.
Eu acho lindo um escritor homenagear o outro retomando seu raciocínio e mostrando seu fascínio, e Eco o faz muito bem. Seus textos remetem aos escritos de Borges.
Eu leio os dois autores e vejo essa relação, não sei se estou correto.

O que vocês pensam das mulheres de Eco? Hipátia é uma das minhas favoritas, mas tem também Lia (a segunda esposa do narrador no Pêndulo), e Paula e Sybilla na Rainha Loana. Parece que as mulheres são ao mesmo tempo a voz do bom senso e da fantasia, oráculo e sirene, e sempre profundamente incompreendidas pelo narrador. O que vocês acham? Qual é sua personagem feminina favorita de Eco?

A rosa sem nome, meio animal, meio força da natureza, silêncio, enigma, enfim tudo o que atrai numa mulher elevado a vigésima.