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O Dilúvio na Mitologia

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O Dilúvio na Mitologia - Página 7 Empty Re: O Dilúvio na Mitologia

Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:33

Mas a voz lhe falhava, não saía. Já com raivosos ladrilhos o líder da matilha, antes seu cão predileto, o alcançava, ferrando-lhe as costas, até que todos se precipitavam sobre ele e o feriam com os dentes agudos, e Actéon ficou com sua perna direita quase toda mordida. Algumas vezes, alguns cães voltavam os olhos como que aguardando a chegada de seu senhor para buscar a caça. E Actéon, como a implorar, caiu de joelhos e em muda queixa voltou-se para seus algozes. Nesse momento, como que avisados, chegavam os seus companheiros, atraídos pelo ladrar dos cães. Com os brados habituais, açulavam a ruidosa matilha e debalde chamavam pelo caçador que julgavam estar por perto:

— Actéon! Onde estás? Olha esta excelente presa!

— Aonde te meteste, Actéon?

E outro, que o tinha com mais consideração, inconformado por não tê-lo junto naquela hora, dizia:

— Seria o seu maior troféu...!

— Os cães estão aqui! Eles o pegaram!

E assim clamavam, ecoando pela floresta, enquanto o infeliz, tentando responder, foi fatalmente atacado no pescoço e no focinho, e entregava a alma sob os golpes de seus amigos. E ainda ouviu o amigo Fílon lamentar:

— Sinto muito, Actéon... mas desta vez tu não terás do que te vangloriar.

Em seguida, logo que o cervo deu seu último suspiro, os cães começaram a ganir e uivar, buscando seu dono por toda a parte, durante horas, até chegarem à caverna do centauro Quíron, aos pés do Pélion. O bom centauro os acolheu e lhes deu água. Depois, fez com bronze uma enganadora estátua com a imagem de Actéon. Logo que viram, os cães saltaram sobre ele, insensível. lamberam-no, acariciaram-lhe as mãos e os pés e moveram-se de um lado para outro tão contentes como se na verdade tivessem-no reencontrado.

Com a morte de Actéon, o pai Aristeus, desconsolado, deixou casa e esposa e foi para a Trácia, onde passou a morar no monte Hémos. Mais tarde, foi juntar-se a Dionisos em suas viagens.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:34

A METAMORFOSE DE CADMOS E HARMÔNIA

Enquanto isso, nas terras dos bárbaros, a Dor e a Amargura alcançavam Cadmos e Harmônia no exílio: chegava-lhes a notícia de que seu outro neto, Actéon, tornara-se uma trágica vítima da ira da deusa Ártemis.

Cadmos sentia-se extremamente amargurado por ver que os deuses tinham-se voltado contra ele. Só então se lembrou das remotas palavras de Atena no dia em que ele matara o dragão de Áres:

“...e talvez um dia ele te faça pagar por essa perda, por mais justificada que ela tenha sido.”

E Cadmos, erguendo os olhos para o Céu, gritou:

— Se este é o preço que tenho de pagar pela morte do dragão de Áres, prefiro transformar-me numa criatura como ele a ver meus filhos e netos punidos com tanta crueldade!

Nem acabara de falar, sentiu o corpo se adelgar e alongar, e viu escamas formando-se sobre a pele. A cabeça estreitou-se e ganhou forma de cunha. Sua língua bifurcou-se. Cadmos transformara-se em serpente.

— Oh, Cadmos querido! O que fizeram contigo os perversos deuses?

Um sibilo foi a única resposta que Cadmos pôde dar naquele momento. Desesperada e sozinha, Harmônia implorou aos deuses, abanando a cabeça e esmurrando o peito:

— Era esta, então, a última desgraça que nos faltava acontecer, não bastassem todas as outras que nos desabaram?! Oh, mas vós, deuses coléricos e vingativos, não sereis tão cruéis a ponto de me abandonardes aqui, ainda jovem e solitária, sem meu querido Cadmos! Fazei com que ao menos eu compartilhe do destino dele, pois uma miséria compartilhada já não parece tão funesta a um mortal!

Os deuses não hesitaram em atender logo aos rogos da velha Harmônia: num instante estava também transformada numa comprida serpente, que foi logo juntar-se à outra, que parecia satisfeita, a chacoalhar os guizos. Logo as duas deslizaram pela relva, sumindo-se pelo bosque adentro.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:34

— Do que tu falas, Harmônia? Jamais ouvi falar de Zeus, até o momento que pisei na Hélade! E como eu deveria saber que o raptor de Europa era um deus? Ademais, Agenor, nosso pai em Sídon, ordenou-nos que saíssemos à sua procura, e assim fui, eu e meus irmãos e minha mãe, errando por terras nunca vistas antes, sem jamais ter encontrado pistas de Europa. Hoje compreendo que, por qualquer lugar que eu ande, ou rasteje, estou sobre ela, pois os deuses e os homens honram este mundo com seu nome.

— Se não a encontraste, por que decidiste ficar?

— Eu, assim como meus irmãos e minha mãe, receava voltar a Sídon de mãos vazias, em vista de meu pai ser excessivamente cruel. Por isso, decidi ficar e fazer meu próprio destino.

— E então?

— Então consultei o Oráculo, o qual foi claro ao me dizer que eu deveria seguir uma vaca que aparecesse em meu caminho e me estabelecer aonde ela parasse para descansar.

— Bela história, Cadmos: encontraste a vaca e a seguiste por longas distâncias até parar em algum lugar, e este lugar certamente ficava onde hoje ergue-se Tebas...

Retrucou o mal-humorado Cadmos:

— Agora percebo por que tu tens uma língua fendida: é para que fales por nós dois...

— Adiante, Cadmos.

— Mandei, então, que meus criados fossem procurar água pura para que fizéssemos a libação aos deuses. Como eles demorassem, fui à sua procura. Ao entrar no bosque onde eles haviam ido, me deparei com uma gruta. Do lado de fora haviam muitas poças de sangue e alguns pedaços das roupas dos meus pobres servos.

— O monstro os havia devorado e aguardava somente a tua chegada para devorá-lo também...

— Sim. Jamais esquecerei aquele dragão terrível, com os maxilares ensanguentados, tendo ainda nos dentes alguns bocados de meus homens! Que ódio insano se apoderou de mim naquele momento, Harmônia!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:35

E continuou:

— Travamos um verdadeiro duelo. Até que atirei uma lança, a qual penetrou entre sua casca asquerosa, dilacerando sua carne imunda. Ela, depois de se contorcer, veio em minha direção com a boca escancarada e cheia de veneno; tive que recuar, mas, mais cedo do que pensava, consegui encurralar a fera junto ao tronco de uma árvore. Aproveitei, é claro, para enterrar minha lança com toda a força em sua garganta, e o fiz com muita raiva, que o peso dela curvou o tronco, até tirar-lhe a vida.

Cadmos fez uma pausa para retomar o fôlego, e continuou:

— Estava com o monstro abatido a meus pés quando escutei uma voz bem nítida que me dizia que eu deveria arrancar os dentes do dragão e semeá-los. Claro que segui à risca o que a voz dizia — só podia ser a de um deus! — e dali a pouco vi brotar do chão um exército inteiro de soldados armados já de lanças e escudos! Uma colheita de verdadeiros guerreiros!

— E foi aí que os derrotaste. Como realmente conseguiste sozinho?

— Estranhamente, nem bem haviam se livrado da sujeira da terra, começaram a brigar uns com os outros. Provoquei-os, certamente, mas era um exército portentoso, de muitos e muitos homens armados — não sei dizer quantos eram —, e a briga se estendeu pela noite inteira, sob o brilho das estrelas. Me vi ameaçado e quis combater também, mas a mesma voz de sempre convenceu-me tratar-se de uma luta entre irmãos!

— E como terminou o massacre?

— Ao cabo da luta restavam somente cinco deles vivos e em pé no meio de um mar de cadáveres. Detiveram a sua fúria, quase como um milagre, e em seguida juntei-me a esses valorosos guerreiros, e juntos construímos a cidade que batizei Cadméia.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:36

A noite já vinha caindo, e as duas serpentes já estavam cansadas de relembrar, de sorrir, de chorar, de sofrer, de se aborrecer. Para felicidade delas não foram obrigadas a relembrar os fatos que se seguiram muito depois, e a terrível maldição que se abateu sobre a casa de Cadmos. Seus filhos e netos foram extremamente infelizes.

Eis que uma luz brilhou diante das duas serpentes: era Hermes que vinha, a mando de Zeus, para conduzir até os Campos Elíseos as duas serpentes.

— Eis que os deuses apiedaram-se de vós, e é chegada a hora de passardes ambos ao ameno Eliseus.

Suas almas não desceram para as escuras e tenebrosas profundezas: viajaram para as Ilhas dos Bem-Aventurados, onde não há tristeza nem angústia. E esta foi a primeira e única vez que serpentes adentraram o Paraíso. E, no lugar onde morreram, foram construídos dois túmulos em forma de serpentes.

Muito tempo depois, a tribo dos Enquelianos ainda carregava cobras como estandartes, costume que esteve, possivelmente, ligado à soberania de Cadmos e Harmônia sobre essas tribos do norte. Afirma-se que eles alcançaram o Adriático com o seu grupo de vacas no ponto em que ora se erguia a cidadezinha portuária de Buto (hoje Budva), nome comemorado pelas “vacas ligeiras” do rei e da rainha de Tebas.

Passaram-se anos, e um homem chegou do Norte. Era Ilírios, o filho mais novo de Cadmos e Harmônia — o filho de sua velhice. Movido pelo amor aos pais, viera à Hélade para buscá-los. Entretanto, orientado a seguir para as terras bárbaras dos Enquelianos, a noroeste, foi procurar as suas sepulturas, e não as encontrou. Acabou fixando-se naquelas paragens, e a elas, terras inóspitas, chamou de Ilíria, e onde passou a reinar.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:36

ANFÍON E ZÉTOS

Quanto ao rei Lábdacos, travou uma guerra contra seu vizinho, o rei Pandíon, de Atenas, e foi vencido. Com a morte de Lábdacos, de apenas um ano de governo, o sucessor ao trono deveria ser Laios, seu filho, mas era ainda muito jovem para reinar — apenas um ano de idade. Por isso, em seu lugar, subiu novamente ao poder Nicteus para garantir o trono a Laios.

Nicteus tinha uma bela filha, chamada Antíope, que era amada pelo pai dos deuses. Mas Epopeus, que também ouvira falar de sua beleza, foi cortejá-la. Porém, tão desumano era Nicteus, irmão de Licos, o rei de Tebas, que recusara a mão de Antíope a Epopeus, um pretendente seu que reinava em Mecone (a futura Sícion), na Acaia, simplesmente porque queria mantê-la consigo para confortá-lo na velhice. Por isso, manteve-a sob seu controle, apenas admitindo que suas ancilas a ela se aproximassem.

A respeito de Antíope, era filha de Nicteus, e sua beleza era tamanha que o próprio Zeus havia se apaixonado por ela; e foi procurá-la, e ela se entregou a Zeus, perito na arte de colecionar amantes.

Assim que sentiu um bebê mexer-se em seu ventre, Antíope tremeu de medo pensando na ira de seu pai, sempre atemorizante quando ficava irado. E tomou uma decisão:

— Epopeus é o único a quem posso confiar. Ele entenderá e me dará proteção.

Por isso, com medo de que a criança morresse, preferiu fugir de Tebas e foi para junto de Epopeus, filho do famoso rei árcade Aloeus, de Tégea. Esse rei ocupava o trono de Mecone, ou por ele chamada de Épopos, por ocasião da morte de Bunos, o antigo rei de Éfira (futura Corintos), e reuniu ambas cidades em seu poder. Portanto, Epopeus recebeu-a com grande alegria, aceitou a gravidez por obra divina de sua amada e deu-lhe um lar. Antíope se sentia segura em suas mãos, e com ele se casou.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:37

— E o que poderemos fazer?

— Deixa-a comigo. Eu sei o que fazer.

— Dirce, espero que tu não...

A malvada mulher interrompeu-o pondo seu dedo nos lábios de Licos, e disse-lhe doce e cinicamente:

— Confia em mim...

Dirce trancou Antíope num úmido e sombrio calabouço, onde a ela não poderia ter acesso quem quer que fosse, e a malvada rainha apenas tratava de alimentá-la e acompanhar a sua gravidez. Certamente pretendia matar a criança que de Antíope nascesse.

Algum tempo depois, na prisão, Antíope deu à luz não um filho de Zeus, mas dois, dois gêmeos.

A rainha de Tebas, ao saber do nascimento das crianças, correu para conferir e arrancou dos braços da mãe os filhos recém-nascidos e escondeu-as dentro de um cesto, enquanto implorava piedade aos gritos e lágrimas a mãe desesperada. Em seguida, Dirce ordenou ao seu servo mais fiel:

— Pega estas crianças, sobe o monte Citéron e deixa-as na encosta mais selvagem e deserta que encontrares. Não estou mandando matá-las: os deuses decidirão se devem viver. Não quero carregar a culpa de tal crime.

Essas palavras, naturalmente, eram pura hipocrisia. Dirce sabia muito bem que, expostos na encosta da montanha, os bebês não demorariam muito a morrer — isso se, antes, não fossem devorados pelos lobos.

Tendo-se livrado das crianças, ela ordenou que outro servo prendesse Antíope com correntes e pusesse duas trancas na porta da cela para que ela jamais escapasse.

Contudo, Zeus não abandonaria seus filhos. Apesar do servo de Dirce ser o seu mais fiel servidor, o Senhor do Olimpo verteu o espírito da justiça e da clemência no espírito odioso daquele homem. Seus olhos abriram-se para a crueldade da soberana, e ele rendeu-se à piedade pelos indefesos bebês. Então, no alto do monte Citéron, no lado ático, que ficava entre Ênoe e Eleutérios, encontrou um bondoso pastor e confessou-lhe a ordem que recebera. O pastor teve pena dos meninos e concordou, de boa vontade, em ficar com eles e dar-lhes proteção e criá-los como seus.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:38

E disse-lhe o servo tebano:

— Agora estou com a consciência tranquila, pois tenho certeza de estar deixando estas indefesas criaturas nas mãos de um homem bom e honesto. Eles são filhos de Antíope, filha do rei Nicteus e esposa do rei Epopeus, de Mecone, e ambos foram para o Mundo das Sombras.

— E onde se encontra a mãe destas crianças?

— Eu não devia te contar, pois nunca abri minha boca para falar das injustiças que vi, mas esta última foi insuportável. Antíope está trancada num calabouço e não lhe é permitido sequer ver a luz do dia, embora não tenha feito nada para merecer tal punição. O pior de tudo é que os filhos foram arrancados de seus braços e ela pensa que os perdeu para sempre. Eu te suplico, bondoso pastor, para minha segurança, que guardes segredo. Tudo o que te contei deve ficar só entre nós. Promete-me que essas crianças nunca saberão quem é sua mãe.

O pastor prometeu, o servo retornou a Tebas dizendo à rainha que suas ordens haviam sido cumpridas e que àquela hora os bebês já deviam ter sido devorados pelos lobos selvagens. Dirce ficou satisfeitíssima.

Enquanto isso, no alto do Citéron, uma fonte surgiu milagrosamente no lugar onde as crianças se encontravam, e o bondoso pastor deu-lhes ali o seu primeiro banho.

As crianças cresceram no Citéron, perto de Eleutérios, sob os cuidados do bondoso pastor. Ele os alimentou com leite de cabra e mel da montanha, ensinou-os a chamá-lo de “pai” e deu-lhes os nomes de Zetos e Anfíon (Amphíôn). E quando já tinham idade suficiente para entender os perigos da vida, disse-lhes que sua mãe fora raptada por bandidos e que não se sabia se estava viva ou morta.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:38

No alto da colina, Zetos e Anfíon tornaram-se belos rapazes. Embora fossem gêmeos, não se pareciam, eram completamente diferentes. Zetos, de ombros largos e fortes, tinha a aparência de um herói. Adorava caçar, e nem o mais feroz dos animais o fazia tremer. Quanto a Anfíon, não revelava dom algum, não era forte como seu irmão, mas tinha tendências musicais. Uma vez, foi visitado pelo deus Hermes, que lhe deu uma lira e ensinou-lhe música. Por sua vez, tornou-se um menestrel, um poeta. Levava o rebanho para pastar com as notas de sua lira, depois se sentava na encosta da montanha horas sem fim, tocando e cantando. Suas melodias eram tão lindas que comoviam o coração dos pássaros e amansavam a natureza das feras, e até o próprio Apolo vinha ouvi-lo tocar. O poder de Anfíon era tão grande que, diziam, podia mover até as pedras ao seu redor.

Contudo, sob um aspecto, os gêmeos eram muito semelhantes: ambos tinham bom coração. Amavam-se e sentiam grande afeição pelo pastor que acreditavam ser seu pai.

Vinte anos se passaram. Enquanto Zetos e Anfíon tinham se transformado em belos jovens, Antíope continuara enfraquecendo em sua ignóbil prisão, mas fortalecida em espírito pelos deuses justos, que preparavam um destino mais feliz a ela. Quanto a Dirce, desfrutava os privilégios reais, que pensava serem eternos.

Antíope era obrigada, durante todo esse tempo, a suportar uma dor enorme. O rei Licos era gentil e bondoso com ela, mas sua mulher Dirce era malévola e extremamente ciumenta. Com muita freqüência ela deixava sua ira cega recair sobre a infeliz. Assim, uma vez ela lhe arrancou os cabelos com um ferro em brasa, outra vez desferiu-lhe um soco no rosto, e a torturava de maneira mais cruel. A pobre Antíope era obrigada a fiar e a trabalhar como uma escrava, e muitas vezes mal recebia água ou pão para alimentar-se. Por vários dias seguidos ficava encarcerada num porão escuro, com fome e com sede, e era obrigada a dormir sobre a pedra nua.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:39

Mas a roda do tempo afinal dera uma grande volta completa. Zeus nunca esquecera que devia ajudar seus filhos e que o trono de Tebas era deles por direito. E assim, certo dia, as pesadas trancas da porta do calabouço caíram no chão de repente, a porta abriu-se e as correntes soltaram-se de seus pulsos, miraculosamente. Antíope estava livre.

Desnorteada, ela levantou-se com dificuldade, foi até a porta e olhou para fora, assustada. Não se via uma única alma. Isso a encorajou: com a energia que ainda restava a seus membros debilitados e apoiando-se na força que a Esperança lhe dava — a mesma que ficara no fundo da caixa de Pandora —, Antíope fugiu direto para o Citéron, tentando esconder-se da furiosa vingança de Dirce. E sua fuga desesperada levou-a exatamente ao lugar onde viviam seus filhos, na choupana de um humilde pastor.

O pastor estava sozinho na cabana. Ela pediu-lhe ajuda, revelou quem era e contou seus enormes sofrimentos. Logo, Anfíon e Zetos chegaram de uma caçada. Anfíon logo se mostrou disposto a acolher a pobre mulher, pois seu coração sentimental sentia-se inconscientemente atraído por ela. Zetos, por sua vez, indiferente, primeiro quis expulsá-la, mas por fim seu coração foi amansado, e lhes deram guarida. Porém, o pobre pastor lutou para controlar os sentimentos, pois sabia que a desventurada mãe estava face a face com os filhos perdidos, sem saber quem eram. Mas ele nada disse: há muito tempo fizera uma promessa e devia cumpri-la. E pensou:

— Quem sabe que novas desgraças poderão desabar sobre Tebas, se eu revelar o segredo?

No instante em que o pastor fazia essa pergunta a si mesmo, a rainha Dirce, que seguiu os passos de Antíope, entrou bruscamente na cabana acompanhada de um bando de Bacantes; e vociferou ao deparar-se com Antíope:

— Miserável! Os deuses condenaram-te a ter a prisão como lar. Chegou tua hora de morrer!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:39

E apontou para Zetos e Anfíon.

— Vós, que estais aí parados! Ordeno que essa mulher seja amarrada nos cornos de um touro feroz, e que seja ela estraçalhada! Essa mulher é culpada de crimes hediondos. Eu deveria tê-la mandado matar há muito tempo, em vez de mantê-la na prisão. Ela pensou que podia escapar, mas os deuses trouxeram-me até aqui e colocaram-na em minhas mãos. E também me deram dois bons rapazes como vós para puni-la como merece.

Os dois rapazes permaneceram imóveis, cabisbaixos.

— Vamos, moleques! Não estais ouvindo o que vos ordeno? A rainha de Tebas está ordenando. Fazei como eu disse! Obedecei às minhas ordens porque essa é a vontade dos deuses também!

Tristes e relutantes, os gêmeos aproximaram-se da mulher desconhecida, que não sabiam era sua mãe. Quando tocaram nela, o pastor atirou-se a seus pés gritando:

— Não! Zeus me perdoe! Vós não sabeis a quem ireis tirar a vida! É vossa mãe, princesa de Tebas!

— Mentira!

Dirce esbravejou, mas em resposta o pastor tirou de um baú o cesto em que os rapazes tinham sido levados para o Citéron. As roupinhas que vestiam ainda estavam lá. Antíope, reconhecendo-as, gritou de emoção:

— Meus filhos!

E correu a abraçá-los, enquanto vociferava Dirce:

— Traição! Meus guardas cuidarão disso!

Mas o velho pastor ainda tinha muita força e agarrou-a pelo braço, apertando-o como um torniquete, enquanto gritava para os rapazes:

— Agora sabeis da verdade, e sou eu quem estou mandando! Pegai esta mulher e aplicai nela a punição que ela ordenou para uma inocente: vossa mãe!

Só então Anfíon e Zetos compreenderam. A firmeza das palavras de seu suposto pai lhes enchia o coração de uma certeza: quase haviam condenado à Morte uma inocente. Por isso, agarraram Dirce e amarraram-na aos cornos de um touro bravio. E ela foi despedaçada pela fúria do animal.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:40

Depois que a justiça fora feita, o pastor disse-lhes:

— Meus filhos, esta é a última vez que eu vos chamo desta forma, porque vosso pai não sou eu, lamento dizer. Vossa mãe revelará o nome dele, que eu mesmo desconheço. Chegou o momento de voltardes a Tebas, onde o trono de Cadmos vos espera. Derrubai do trono o tirano Licos e libertai a cidade desse mal. Esse é o último conselho do pai que todos esses anos vós acreditastes que eu fosse. E vos amei como tal. Tende minha bênção, ide agora. Eu ficarei aqui, porque aqui nasci, aqui me tornei homem, aqui fiquei velho e aqui mesmo desejo morrer.

E os filhos de Antíope voltaram-se para ela e aguardaram a resposta desejada. E ela, sabendo que não precisaria lhes contar uma história longa para que entendessem os que os esperava, apenas lhes disse:

— Vosso pai é Zeus, o Senhor do Olimpo.

Foi o suficiente. Zetos e Anfíon arrumaram suas coisas e partiram com a mãe para a cidade.

Os gêmeos invadiram Tebas. Licos, depois de seus vinte anos de governo, foi obrigado a defender o trono com unhas e dentes, e só não foi morto pelos gêmeos enfurecidos graças à intervenção do deus Hermes, que trazia-lhes uma mensagem do divino pai , Zeus, que ordenava que Licos lhes entregasse o trono voluntariamente. Então, após abdicar, Licos conseguiu escapar ileso para longe de Tebas. Tal ação inesperada fez com que muitos abandonassem Tebas às pressas, inclusive Laios foi expulso e obrigado a exilar-se para o reino do soberano Pélops, na Élide.

Em seguida, os gêmeos levantaram uma pira e queimaram os restos de Dirce e espalharam suas cinzas sobre a fonte de Áres. A partir de então, a fonte e o regato, que, mais do que todos os outros, fornecia água pura a Tebas, levaram o nome de Dirce.

Zetos e Anfíon tornaram-se os novos reis de Tebas, e governaram juntos; o primeiro como o protetor da cidade e o segundo para glorificá-la, entoando hinos aos deuses.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:41

Antíope, no entanto, não permaneceu em solo tebano. Como ela havia sido a causa da morte de Dirce, que cultuava Dionisos, foi ensandecida pelo deus e punida como errante. Ela andou inconsciente de um lado para outro, até chegar na Fócida, onde o seu herói-epônimo, Fócos, filho de Poseidon, encontrou-a e resolveu ajudá-la. Curou-a de sua insanidade e, depois de um tempo, tomou-a por esposa.

Antíope, amada por Zeus, após sua morte, foi sepultada junto com seu esposo Fócos em algum lugar perto de Titoréia, na Fócida. Quando o Sol entrava no Signo de Touro, os titoreanos costumavam roubar terra do túmulo dos filhos de Antíope e espalhá-la sobre o túmulo da mãe, costume esse que provou a conexão entre Antíope e um touro divino, Zeus, até depois de sua morte. Acreditavam os titoreanos que, se fossem bem-sucedidos no roubo, sua terra seria abençoada com mais fertilidade, naquele ano, do que a dos tebanos.

Níobe era filha de Tântalos, o rei da Meônia (futura Lídia), e viera para a Hélade em companhia de seu irmão, Pélops. Depois de andarem de um lado para outro, buscando asilo, enquanto Pélops permanecia e reinava na Élide, Níobe casou com Anfíon, o tocador de lira, que, com seu irmão Zetos, havia destronado Licos e se apoderado de Tebas. E Níobe lhe dera sete filhos e sete filhas, prole numerosa que lhe transmitia dignidade e respeito, chegando a se vangloriar. Seus filhos eram: Damasícton, Agenor (também chamado de Eupínitos), Amáleo, Fédimos, Ismênio, Sípilos e Tântalos. E as filhas chamavam-se: Ftia, Astíoque, Neera, Cleódose, Etoséia ou Téra, Ogígia e Pelópia, também chamada de Melibéia.

Sendo mulher de Anfíon e mãe de tantos filhos, Níobe era a mulher mais feliz do mundo. Era rainha, amava o marido profundamente e acima de qualquer coisa adorava os quatorze filhos, o orgulho e a alegria de seu coração. Eram a razão de sua vida. Ela os banhava e penteava, não suas ancilas, mas ela mesma, alimentava os menores e rejubilava-se com a família bela e unida que formara com Anfíon. E seria assim por algum tempo.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:42

Muito tempo depois, com o passar dos anos, Anfíon e Zetos decidiram levantar os muros que cercariam e protegeriam Tebas. Até então, Tebas era o que antes fora Cadméia. Contaram com a ajuda do amigo Lócros, que era irmão dos dois reis por parte de Zeus. Ajudaram-nos também seus filhos, enquanto observava o povo estupefato: com o toque mágico da flauta de Anfíon, as pedras, uma a uma, iam-se colocando nos seus devidos lugares, enquanto Zetos usava a força bruta.

Destarte, com a força física e as notas mágicas, os dois irmãos erigiram muralhas impenetráveis, com sete entradas para a cidade, que passou a ser conhecida como Tebas das Sete Portas, tal qual as sete cordas da lira de Anfíon. E a cada porta, deu o nome de suas sete filhas. Nascia ao redor da acrópole de Cadméia a fortificada cidade de Tebas.

Aédon era a esposa de Zetos. Mas nem todo o seu poder e dinheiro tinham lhe trazido a felicidade. Segundo um boato, a filha de Pandáreos havia sido amaldiçoada por renegar o culto de Dionisos. Por isso, Aédon tinha apenas um filho: Ítilos. E por mais que ela sonhasse ou pedisse aos deuses a vinda de outros filhos, não conseguia engravidar novamente. Para que sua decepção fosse completa, ela tinha a cunhada, Níobe, esposa do rei Anfíon, a qual repudiava com todas as forças. Isso porque a rainha tinha sete filhos e sete filhas, que despertavam uma imensa inveja em seu coração. Aliás, os irmãos Anfíon e Zetos reinavam juntos em Tebas, mas o nome de Anfíon era mais glorificado e mencionado pelas ruas da cidade.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:42

Níobe, tendo ofendido a deusa Leto por ter mais filhos que ela, foi castigada. Apolo e Ártemis mataram todos seus filhos, exceto Âmiclas e Melibéia, que foram levados para Árgos, aonde, mais tarde, construiriam um templo dedicado à deusa Leto. Melibéia, também chamada Pelópia, conhecida assim em honra de seu tio Pélops, agora intitulada Clóris pela sua palidez, haveria de se casar com um homem de Pilos, um certo Neleus, de família nobre, e lhe daria bom número de filhos, entre os quais, Nestor, o abençoado. O deus Apolo, para compensar a morte dos Nióbidas, concedeu a este todos os anos de vida que ele e Ártemis haviam tirado da prole de sua mãe; Nestor morreria muito, muito velho.

Os filhos e filhas de Níobe permaneceram insepultos; e Níobe não pôde mais suportar: devido ao grande desespero e dor que dela se apossou, Níobe petrificou-se, transformou-se num bloco de pedra. E conforme a angústia da rainha aumentava, avolumava-se a rocha em que ela se transformara, elevando-se cada vez mais, ameaçadora, como uma acusação contra a impiedade dos Imortais.

Quando os deuses viram aquele enorme pilar de pedra e as lágrimas que começavam a verter dele, censurando-os por sua hedionda vingança, compreenderam o mal que haviam feito. Primeiro ficaram envergonhados, depois atemorizados... Sabendo agora que aquilo não fora uma vitória, mas um confronto humilhante, depois de dez dias, eles vieram secretamente, à noite, e sepultaram eles mesmos os filhos de Níobe. Depois, desencadeando um terrível redemoinho, levantaram a pedra e transferiram-na para uma montanha da Meônia; puseram-na atrás do monte Sípilos, para que fosse esquecida, e, debulhada em lágrimas, fez jorrar seu pranto, sob a forma de uma fonte perene — a mesma rocha que hoje se vê nas encostas do monte Mahnissa.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:43

LAIOS E O NASCIMENTO DE ÉDIPOS

Com a morte de Anfíon e Zetos, Tebas, agora rodeada por muralhas, ficara sem rei, e o povo decidiu procurar Laios (nome abreviado de Laómedon, “rei do povo”) para suceder os reis gêmeos. E o encontraram exilado na companhia do jovem Crísipos, filho do soberano Pélops. E Laios prontamente aceitou tornar-se o novo rei de Tebas. Mas os deuses exigiam que Laios devolvesse Crísipos ao seu pai. Pélops lançava-lhe terríveis maldições, e o povo se mantinha indiferente à presença do jovem príncipe de Pisa. As maldições de Pélops sobre Laios trariam terríveis conseqüências. Além de Laios ser ameaçado por um Oráculo funesto sobre a sua descendência, Tebas estava destinada a ser importunada por um espectro maligno vindo dos confins da Etiópia: a Esfinge.

Laios desposou uma filha de Meneceus; chamava-se Jocasta. Contudo, não tinha filhos e estava muito preocupado em não haver um herdeiro de sua linhagem para o trono.

— Querida esposa, irei para Delfos, consultar o Oráculo de Apolo, para saber o que está acontecendo e pedir a ajuda do deus para que eu tenha um herdeiro.

Embora Jocasta não desse muita importância a oráculos, concordou com o marido. Assim, Laios, levando consigo ricos presentes, foi pedir a ajuda de Apolo.

Laios achegou-se diante da Pítia, a sacerdotisa de Apolo, que se encontrava sentada sobre a trípode, inspirando exalações de folhas de loureiro queimadas. E fez um pedido a Apolo:

— Ó Apolo, concede-me a graça de um filho!

Quando, porém, a Pítia lhe proferiu o Oráculo em versos, como costumava proferir, Laios ficou aterrorizado. Em sua mente, claramente a Pítia lhe proferia e o advertira da maldição de Pélops:

— Filho de Lábdacos! Tu pediste a dádiva de ter descendentes e teu desejo realizar-se-á. Terás um filho, mas o teu destino é morrer pelas mãos dele e toda a tua raça se afogar em sangue. Assim decidiu Zeus, o filho de Cronos, que quer que tu pagues pelo pecado que cometeste contra Crísipos, o filho de Pélops!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:44

Enquanto a mãe do bebê transbordava de felicidade, voltava à tona a preocupação na cabeça real do pai. Temia a realização do oráculo. Laios foi consultar Tirésias, que lhe revelou a mesma fatídica notícia do Oráculo, que a criança mataria o pai e, ainda mais, se casaria com a própria mãe. Para evitar o cumprimento do Oráculo previsto por Tirésias, no terceiro dia desde o nascimento do filho, Laios mandou seu servo de confiança a abandoná-lo no monte Citéron, nas vizinhanças de Tebas, como era de costume, e deixá-lo à mercê das feras. No entanto, o servo hesitou, e o rei ameaçou-o:

— Vamos, homem, o que estás esperando? Leva o menino e amarra-o numa árvore para que não saia engatinhando e não o encontrem! Se tu não fizeres exatamente como estou ordenando, eu mesmo te aplicarei morte horrenda!

E o servo, amedrontado, sabendo que não seria castigado pelos deuses, já que o rei o obrigava, baixou a cabeça e respondeu:

— Meu senhor, eu farei o que me mandaste.

O servo de Laios, então, correu com a criança nos braços, ocultando-se nas sombras dos becos escuros de Tebas, e chegou no monte Citéron. Amarrou o menino por um pé num galho de árvore, com nó apertado, e abandonou-o à própria sorte. Hesitou mais uma vez, mas manteve-se firme e deixou-o.

Contudo, enquanto ia embora, ressoava em seus ouvidos o lamento mortificado de Jocasta, a mãe que estava perdendo a coisa mais preciosa que uma mulher podia desejar. Assim, o pobre homem, espantando rapidamente todo e qualquer intuito de abandonar a criança na floresta, dava tratos à imaginação para encontrar um modo de salvá-la.

No alto da montanha, encontrou um outro pastor, que conhecia de longa data e que cuidava dos rebanhos de Pólibos, rei de Sícion. Era um homem de bom coração, e resolveu contar-lhe toda a verdade, no que lhe propôs o pastor de Corintos:

— Entrega-me o bebê. Eu o levarei a Sícion, ao rei Pólibos, que não tem filhos. Creio que ele o receberá com alegria.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 19:44

— Mas com uma condição: não digas a ninguém que fui eu quem lhe entregou a criança. Contes uma história qualquer, só não digas que foi um empregado do rei de Tebas, pois terei morte certa.

Feito o acordo, o pastor de Laios ensinou-lhe o caminho e voltou apressadamente para Tebas. O pastor de Sícion, cujo nome era Forbas, ao ver o bebê amarrado pelo pé e chorando, desamarrou-o com cuidado, tratou de suas feridas e levou o menino para casa, onde mostrou-o a outros pastores. No entanto, sua mulher, encantada, desejou ardentemente adotá-lo, e propôs:

— Fiquemos com ele!

Forbas pensou um pouco, mas sabia que não poderia contrariar o destino que lhe era reservado. Portanto, cuidaram dele por algum tempo e, depois, o entregaram a Pólibos, filho de Drias e neto do deus Áres, que havia sido outrora abandonado por sua esposa, Alcínoe, pelo amor de Xantos, um homem de Sámos. Agora, como soberano de Sícion, casara novamente, desta vez com Peribéia (ou Mérope), que, por não terem filhos, estavam tristes, pois não havia nenhuma criança que lhe alegrasse a corte, e que, com o surgimento dessa criança enjeitada, após consultar sua esposa, ambos ficaram extremamente felizes e passaram a criá-lo.

Por ter sido encontrado amarrado por um pé, puseram-no o nome de Edípodes, significando “de pés inchados”, já que o pastor Forbas assim o havia encontrado. Ambos criaram-no com tantos cuidados e amor que o menino cresceu acreditando ser mesmo filho legítimo dos soberanos de Sícion. Com o tempo, Pólibos acabou chamando-o simplesmente de Édipos, e ensinou-lhe pessoalmente as letras e os conhecimentos que o tornariam, mais tarde, um rapaz culto e com inteligência reconhecida, e com um futuro promissor: se tornaria um rei.

FIM
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Mensagem por Freud explica 3/4/2021, 14:47

Bem, poderia ser este dilúvio representativo ou de fato uma versão simbólica de algo que aconteceu? Todas as culturas antigas, eu disse todas, de alguma forma colocam este momento de inundação como ocorrido. Na versão grega é colocado o ponto de afastamento dos homens com os deuses como sendo a causa do Dilúvio.
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Mensagem por Freud explica 3/4/2021, 14:49

Vamos analisar simbolicamente o dilúvio segundo alguns estudiosos. A verdade histórica é apenas esta: a lenda do dilúvio corresponde a um dos arquétipos mentais atualmente estudados pela psicologia profunda. Os estudos de Carl Jung a respeito são bastante esclarecedores. O arquétipo coletivo, que corresponde no plano social aos complexos psicanalíticos do plano individual, não é uma abstração. Pelo contrário, é uma realidade psíquica enraizada nos fatos concretos. O dilúvio, por isso mesmo, tem duas faces: uma é a realidade histórica, a ocorrência real da catástrofe; outra é a interpretação alegórica, enraizada no arquétipo coletivo. Sustentar como realidade histórica a figuração ingênua de uma lenda, conferindo-lhe ainda autoridade divina, é ridicularizar o sentimento religioso e minar as bases da concepção espiritual do mundo. Foi esse processo infeliz de ridicularização que levou o nosso tempo ao materialismo e à descrença que hoje o dominam.
Vamos esclarecer esse problema, mostrando que o "arquétipo coletivo" do dilúvio é responsável pelo seu aparecimento em diversos capítulos da História das Religiões, e até mesmo na Pré-história, entre os povos selvagens. É esse um dos pontos mais curiosos da psicologia das Religiões.
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Mensagem por Freud explica 3/4/2021, 14:53

Minha conclusão:

Quando o dilúvio surge? Quando os homens já não conseguem mais viver em sociedade e são conduzidos por tamanho egoísmo que não conseguem o mínimo de reciprocidade com o outro. Sendo assim, o dilúvio representa a "inundação" cultural, que afoga (Matando) e fecunda o indivíduo para que este possa transcender seus desejos individuais e transforma-los para favorecer seu grupo social. O Dilúvio é a linguagem, os conceitos, as abstrações, que foram criadas por seres-humanos, mas não nós. Sendo assim, todos somos afogados com verdades de uma realidade que não fomos nós que criamos. Podemos criar sim, mas com que já foi determinado e pré-estabelecido subjetivamente, caso contrário seriamos psicóticos ou denominados loucos pela sociedade. A Antropologia nos ajuda a entender essas questões quando comparamos culturas. Bem, você que está lendo isso viveu em si mesmo o "dilúvio". Eu vivi e todos viveram.

Antes dessa imersão nas águas sociais havia o "caos" social, quer dizer, não havia social, porém antes desse "caos" social havia sim uma harmonia social, porque não nos dávamos conta de que éramos humanos e agíamos sincronizadamente.

Sim, o dilúvio aconteceu, provavelmente 6 mil anos AC de cristo... É uma data bem coerente simbolicamente falando para a Humanidade.
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Mensagem por Alquimista 3/4/2021, 15:02

Do princípio: usar Jung, que foi produtivo consideravelmente para artes e um pouco para a psicologia, não sendo realmente científico, é despropositado mitologicamente; ele não era filólogo, helenista ou coisa do tipo, mas tinha uma visão pessoal em que agrupava tipos: de forma míope funciona, mas considerando as particularidades, não funciona. Usar Jung na mitologia não é seriedade. Além disso, nem comentarei o infeliz comentário sobre metafísica: Kant, Schopenhauer e até Platão não precisam ser lembrados para demonstrar a infelicidade da afirmação.

Os gregos realmente arcaicos estavam "envolvidos" num ambiente cultural diferente daqueles que já estavam no território considerado, hoje, como grego. Seja lá quem morasse naquelas terras, os gregos vieram de outro canto, compartilhando com outros povos as bases idiomáticas e culturais (isso é bem conhecido): a subsequente cultura grega é o resultado de um desenvolvimento conjunto da cultura autóctone com a cultura aclimatada, digamos. Assim, mitos que tratam de tempos muito pretéritos existem em muitas versões e são repletos de interferências de releituras e influências externas, não podendo ser considerados como argumento histórico indubitável.

Há sei lá quantas motivações diferentes, além dos contatos culturais, que inspirariam mitos do tipo dilúvio. E a clara ausência desse mito em Homero, na estatuária, pintura, cerâmica primitivas já demonstra seu caráter excepcional: ou já era diverso e controverso já em épocas arcaicas, ou era influência externa (digamos, por exemplo, que os acadianos e sumérios deram real importância a esse tipo de mito de forma muito mais veemente: com eles, talvez, se pudesse supor algum tipo de realidade histórica a respeito). Esse tema, de que não me recordo em gravuras, estatuária, frisos, passagens relevantes nos clássicos, se existe é escasso: isso evidencia sua importância e seu entendimento.
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Mensagem por Alquimista 3/4/2021, 15:08

Agora, queria deixar mais claro um assunto interessante: quando algum fenômeno físico/climático é importante ou determinante, a história e a mitologia acabam por desvirtuá-lo e não podem retratar a sua real natureza física. A data exata me escapa, mas minha memória tenta registrá-la entre 1600aC a 1000aC (ela é bem mais precisa, varia em apenas 40 anos, eu é que não me lembro), mas houve uma calamidade mediterrânea bem registrada geologicamente e por testemunhas fósseis (pólen, principalmente, além de anéis arbóreos) e testemunhas de gelo, que influenciaram uma alteração cultural e geopolítica generalizada na região. Hoje sabemos exatamente o que foi isso, seu alcance e sua identidade: as mitologias são contraditórias, confusas e obscuras.

Nessa data, o enorme vulcão onde hoje ficam os pitorescos destroços insulares de Santorini explodiu, lançando cinzas em todo o mediterrâneo oriental, alcançando o rio Indo, a Eritréia e o Saara. A temperatura global, devido à poeira vulcânica na atmosfera, caiu em 4°C (ou seja, a média anual de todos os pontos resultou mais baixa: as temperaturas efetivas locais variaram muito mais... todo o alarde do aquecimento global representa 0,4°C de variação na tal temperatura global, que é de cerca de 15°C) por alguns anos, recuperando-se gradativamente e demorando talvez mais de um século para voltar à normalidade. A região afetada ao redor sofreu distúrbios climáticos intensos: chuvas ácidas severas, secas, inundações e, principalmente, invernos longos e rigorosos...

Ao redor dessa data, não só por causa disso (não se deve ignorar nunca as relações culturais, técnicas e políticas), mas antes por influência disso, registra-se a abrupta queda populacional generalizada, culturas modificadas ou desaparecidas: minóicos, hititas e micênicos, por exemplo, sofreram modificações tão intensas que modificaram suas culturas até perderem a identidade, além de tornarem-se alvo de ataques... as tão famosas e misteriosas migrações atacantes "povos do mar".
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Mensagem por Alquimista 3/4/2021, 15:13

Os povos mesopotâmicos registram quedas de dinastias, mudanças culturais, êxodos. O Egito registra fabulosas pragas, invasões e mudança de dinastia. Os hebreus registram o êxodo e relatam uma geopolítica conturbada. Até iranianos e hindus registram mitologicamente e historicamente esse período como um período particular.

Depois dele, a escrita seria abandonada na península balcânica, e, junto com ela, sua arquitetura, artes, cerâmica... tudo isso apareceria de outra forma (mudança cultural) séculos mais tarde. Os hititas quase desapareceram da história. Os judeus celebram o marcante êxodo de um Egito conturbado e talvez devastado. O Egito sofre com invasores, sofre conturbadas crises estatais, torna-se instável. O jogo político se reorganiza na Mesopotâmia.

De todos os relatos e mitos, quem poderia supor uma explosão vulcânica? Pragas, guerras, secas e inundações, invernos rigorosos, revoltas e doenças não descrevem precisamente uma explosão vulcânica em algum ponto remoto do Mediterrâneo: registrou-se as particulares influências físicas e sociais ocorridas, mas o evento em si se perdeu, se é que foi percebido como tal. Os indícios míticos, de várias mitologias, indicam que algo incomum havia ocorrido: tudo estava diferente e até caótico: mas por quê? Pela própria mitologia, um evento tão assombrosamente distinto e potente como esse não poderia ser adivinhado, sequer suposto.

E esse evento bem conhecido é relativamente mais recente do que qualquer suposta inundação localizada entre 10000aC e 6000aC. É absolutamente não científico, nada sério, basear-se em mitos de dilúvio para descrever algum acontecimento preciso em época tão remota, depois que os mitos se difundiram e se modificaram por milênios e toda sorte de cultura teve tempo de modificá-lo.

A versão grega do dilúvio não é autêntica (um possível acontecimento seria em lugar totalmente diverso num tempo muito remoto) e não é representativa de algo realmente importante: a iconoplastia o atesta.
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Mensagem por Freud explica 3/4/2021, 15:23

Alquimista, fique com sua Mitologia Científica... Pra pessoas que estão no funcionamento operatório concreto é impossível compreender certas coisas. Sobre a Metafísica, eu não vou prolongar o assunto pois o tópico é de mitologia e não de Filosofia, sendo assim, respeito sua posição mas ainda fico com a minha.

E eu disse que o "dilúvio social" aconteceu 6000 mil anos AC, não um dilúvio marítimo, pomba! Que puta falta de abstração! Às vezes me irrito com tanta *&¨%#$#@%¨&&***(#@!...
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