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O Dilúvio na Mitologia

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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 13:55

— Eu? Esta novilha? Bem, eu estava passeando pela região quando vi pastando mansamente, às margens do rio, esta encantadora novilha. Achei-a um belo animal e fiquei observando-a um pouco.

Héra já sabia: Zeus tinha o costume de transformar suas amantes em animais para despistar a esposa, Héra não se deixaria enganar, e desceu ao encontro do marido e acercou-se de Io.

— É, de fato, uma bela novilha.

E alisou o seu pelo sedoso e macio. Héra comentava sobre a beleza da novilha, e Zeus fingia não estar interessado.

— Realmente magnífica. Me dize-me: a quem pertence esta novilha, Zeus?

— Er... da Terra, eu acho. É, pertence à Terra, de fato.

Então, Héra, fingiu-se satisfeita com a resposta.

— Dá-me de presente. Gostaria de tê-la.

Zeus assustou-se com aquele pedido; se lhe entregasse a novilha, perderia a sua amada, se a recusasse, despertaria suspeitas. Decidiu abdicar, por um momento, da donzela, entregando-a à esposa, mesmo que Héra pudesse fazer algum mal a ela. No entanto, ele poderia, mais tarde, recuperar a novilha e transformá-la de novo em sua amante, a bela Io.

Aparentemente satisfeita com o presente, levou-a com uma corda ao pescoço para onde fosse difícil encontrá-la e deixou-a sob a guarda de Árgos, um gigante de cem olhos, que era filho de um tal Aréstor, para que o marido Zeus não pudesse raptar a amada que lhe fora arrancada. Este gigante não era um ser malvado, mas um benfeitor que recentemente havia livrado as pessoas daquele país de um terrível sátiro que as escandalizava e um touro que devastava os campos e os rebanhos.

— Árgos, tenho uma tarefa para ti!

— Pois não, rainha das deusas.

— Estás vendo esta novilha?

— Sim, poderosa Héra, meus cem olhos não poderiam deixar de admirar tão belo animal.

— Silêncio! Quero apenas que a leves para um local afastado, mantendo-a sob a mais estrita vigilância.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 13:56

Árgos obedeceu, retirando-se logo em seguida juntamente com a infeliz Io. A pobre ninfa derramava escondida grossas lágrimas de pesar, enquanto era carregada pelo horrendo criado para um vale deserto. Uma vez ali, Árgos soltou-a, sentando-se numa alta pedra, de onde podia observar toda a região.

Árgos Panoptes vigiava a novilha, e quando estava com sono, apenas cinqüenta de seus olhos se fechavam, enquanto os demais cinqüenta vigiavam. E se alternavam.

Sob os olhos de Árgos, Io poderia pastar, durante o dia, numa abundante pastagem, mas o gigante permanecia o tempo todo perto dela, vigiando. E, quando o Sol se punha, ele a trancafiava, atando-lhe o pescoço com pesadas correntes. Ervas amargas e folhas de árvores eram o seu alimento, seu leito era o chão duro, sequer coberto de folhas, e ela bebia água de poças lamacentas. Io esquecia com freqüência que já não era um ser humano. Para suplicar piedade, queria estender os braços a Árgos, mas então se lembrava de que já não tinha braços. Queria fazer-lhe súplicas tocantes, mas de sua boca apenas saíam mugidos assustadores. E pensava cheia de tristeza:

— Jamais me livrarei da vigília deste maldito monstro.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 13:56

Porém Árgos não permanecia com ela sempre no mesmo local. Fazendo com que Io mudasse freqüentemente de lugar, Héra queria afastá-la do marido. E a intenção de Héra seria exatamente fazer com que Io se acostumasse dessa forma e fizesse parte naturalmente de algum rebanho para sempre. Por isso, seu vigia percorria as terras com ela, e foi assim que ela chegou a sua antiga cidade natal, às margens do rio onde, durante a sua infância, tantas vezes brincava. Foi então que ela viu, pela primeira vez, sua imagem na água. Quando a cabeça do animal com chifres a olhou da água, ela recuou, horrorizada. Cheia de saudades, buscou aproximar-se de suas irmãs, que pastoreavam, e de seu pai, Ínacos, contudo eles não a reconheceram. Ínacos acariciou o belo animal, oferecendo-lhe folhas arrancadas de um arbusto. Agradecida, Io lambeu-lhe a mão, cobrindo-a de beijos e lágrimas. Mas o velho não tinha ideia de quem era aquela que ele acariciava e que também o acariciava.

A beleza da novilha logo atraiu multidões de humanos, mas Io não podia falar em sua forma de novilha, e portanto não conseguia ajuda. Um dia, apegado a ela, Ínacos veio visitar-lhe, mas nada ela pôde fazer. No entanto, Io, percebendo que seu pai aparecia freqüentemente para vê-la, aprendeu a escrever seu nome com uma das patas e o fez quando viu seu pai, chamando sua atenção. Ninguém entendeu, mas Ínacos sim. Nada pôde fazer, e chorou desconsolado o destino da filha. Passando o braço em volta do pescoço da bela novilha, exclamou em prantos:

— Pobre de mim! é assim que tenho que reencontrar-te, depois de procurar-te por todas as terras? Ai de mim,estava sofrendo menos enquanto te procurava. Permaneces calada? Não és capaz de me dizer nenhuma palavra de consolo, só consegues me responder com mugidos?

O povo ao seu redor o estava julgando um tolo, doente por confundir a novilha com sua própria filha, mas Árgos percebeu que ele a tinha reconhecido, e resolveu tomar providências, enquanto ainda o desconsolado pai lamentava:
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 13:57

— Que tolo sou, pensava em como fazer para encontrar-te um marido digno, só pensava na tocha matrimonial e no himeneu. Porém agora tu és parte de um rebanho...

Ínacos não pode ficar com ela, pois Árgos, observando o que se passava, puxou-a e levou-a para longe, ao cume de uma elevada montanha, e lá continuou a vigiá-la, desta vez mais de perto.

As desventuras de Io eram tantas, causaram tanta tristeza ao velho rei seu pai, que Ínacos tratou de vingar-se de Zeus, perseguindo-o com ultrajes e ameaças. Porém, o deus, como castigo a tamanha ousadia, enviou a terrível Tisífone, uma das Erínias, para atormentá-lo. E finalmente Ínacos, num acesso de loucura, se atirou ao rio Haliácmon, que a partir daquele momento mudou de nome para chamar-se Ínacos. E deixou a esposa, a oceânide Mélia, mais os filhos Foroneus, Egiáleo, Micena, Árgos, Pelasgos, Cásos, Filódice e a desgraçada Io.

Prometeus sabia que não escaparia do duro castigo que Zeus lhe preparava. Por isso, sigilosamente procurou Atena, a deusa de brilhantes olhos azuis, que também amava a humanidade.

— Um destino terrível me espera. Serei preso com correntes infrangíveis e sofrerei torturas medonhas por toda a eternidade. Entretanto, não é isso o que mais temo, e sim que a humanidade fique desprotegida.

— Os sofrimentos que tu estás condenado a suportar já te bastam. Não te tortures também com o destino dos homens. Farei tudo que tu me pedires e muito mais.

Então, Prometeus sentou-se ao lado da deusa e ensinou-lhe arquitetura, astronomia, matemática, construção naval, trabalhos em metal, medicina e várias outras artes, para que ela pudesse ensiná-las à humanidade.

— Talvez seja melhor assim, Atena. Zeus te ama e não obstruirá teu caminho. Além disso, tu sabes como convencê-lo, e eu certamente não sei.

— Fica tranquilo, filho de Jápetos. Podes confiar em mim. E tem coragem.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 13:58

Na verdade, de todos os Imortais, Atena era a única que podia levar adiante a obra de Prometeus. Sua determinação reconfortou o grande benfeitor da humanidade. Tranquilizado, ele correu o olhar pela fértil terra verde e imaginou quanto ficaria mais bela com o trabalho dos homens. Mas lamentava e temia que a ira de Zeus abalasse tudo quanto os seres humanos haviam trabalhado. Mas tinha Atena ao seu lado. E a felicidade inundou seu coração, e com voz decidida, ele disse:

— Agora, que recaia sobre mim toda a fúria de Zeus. Eu estou pronto.

O tilintar sinistro das pesadas correntes ecoava pelo deserto árido enquanto o titã Prometeus, filho de Jápetos e Clímene, caminhava pelos rochedos com as pernas e os braços acorrentados por elos indestrutíveis. Sobre seus ombros pesava um grande castigo por haver desafiado as ordens de Zeus, tendo roubado o fogo dos Céus para presenteá-lo aos homens. O grande senhor do Olimpo ordenara que ele fosse preso por correntes fortíssimas e cravado numa rocha no deserto, onde deveria ficar por toda a Eternidade. Essa foi a decisão de Zeus, e todos sabiam que não podia ser mudada. Era irrevogável, salvo se ele mesmo desejasse mudar o destino de Prometeus.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 13:58

Destemido, de cabeça erguida, o titã Prometeus subiu à rocha, enquanto na Terra vivia seu irmão Epimeteus ao lado de sua amada Pandora, e sofriam o castigo eterno seus irmãos Mênetos e Átlas. Ele sabia dos terríveis sofrimentos que o esperavam naquele lugar, embora seu único crime fosse apenas o seu grande amor pela humanidade. Pesados grilhões pendiam de seus pulsos e tornozelos, e as pontas das correntes eram seguras por uma escrava carrancuda, criada de Zeus, que caçoava do titã a todo instante e sem medo. Seu nome era Bia, a personificação da Violência, filha de Pálas e Estige. Atrás dele, com profunda tristeza na expressão e cabeça baixa, caminhava Hefaístos, o ferreiro dos deuses. Seu rosto demonstrava tanta angústia por causa de Prometeus, e o deus do fogo maldizia seu próprio ofício porque agora teria de trabalhar contra seu melhor amigo, cravando-o à rocha. O pior de tudo é que ele sabia que, em vez de estar sendo punido por um crime, Prometeus estava sendo castigado por um bem que havia feito à humanidade. E a dor de Hefaístos aumentava à medida que se aproximavam do ponto escolhido.

Depois de muito caminhar, afinal eles chegaram. Haviam atravessado a Trácia, cruzado o rio Istros, toda a Cítia e agora viam-se diante dos imponentes picos do Cáucaso de onde se avistava, ao longe, o mar encrespado pelos Ventos. Ninguém jamais havia posto os pés naquele desolado ponto do deserto, lugar de rochas agudas e precipícios, onde o vento soprava assustador. Não se via uma única folha de vegetação por ali, tudo era só solidão. Desde os tempos imemoráveis, os picos eram fustigados pelos áridos Ventos, e as costas nuas recebiam as pancadas das impetuosas ondas do tempestuoso Axeinos, o futuro Póntos Euxinos.

Aos pés da montanha, Bia, a serva de rosto de pedra, parou. Seus lábios se entortaram com um riso sinistro:
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 13:59

— O lugar é aqui. Este rochedo recebe o total impacto do Bóreas. As tempestades e as nevascas do inverno castigarão para sempre o teu corpo e, durante o verão, Hélios vai transformar-te em cinzas. Que tu, Prometeus, sejas acorrentado a esta rocha para mostrar aos homens que ninguém fica impune quando desafia as ordens de Zeus!

Depois, olhando ameaçador para Hefaístos, gritou, furioso:

— Vamos, o que estás esperando? Começa a trabalhar! Prende-o à rocha imediatamente para que ele não escape! Depois, enterra este cravo no peito dele para segurá-lo de pé, impedindo-o de ajoelhar-se ou inclinar o corpo para os lados, a fim de que jamais possa dormir! Prometeus não terá sequer um único instante de repouso em sua eterna tortura! É bom que ele seja imortal, porque, com isso, Tânatos jamais porá fim aos sofrimentos deste criminoso!

Hefaístos pigarreou e respondeu:

— Não sei qual de nós é o criminoso. Talvez sejas tu ou mesmo eu... mas Prometeus não! Oh, filho de Jápetos, meu coração está dilacerado por tua causa, mas não posso desobedecer as ordens de meu pai! Preciso acorrentar-te a essa rocha. E por quê? Só porque tu deste tantos bens aos homens!

— Cuidado com o que dizes, ferreiro! Não desperdices tua tristeza com este ladrão!

— Tua língua é ainda mais monstruosa do que teu próprio rosto! Já era tempo de tu entenderes que roubar e dar são coisas diferentes!

— Se o senhor de todo o mundo disse que ele é um ladrão, um criminoso, para mim basta. O que Zeus pensa, eu também penso, pois neste mundo só o próprio Zeus é livre. Tu sabes perfeitamente que a liberdade que temos devemos apenas a ele.

— Liberdade para fazermos o mal! Liberdade para obedecermos sem discutir! Isto é liberdade? Pois entre nós existe um ser com espírito corajoso e muito mais nobre do que podemos imaginar — um ser que é mais livre que o próprio Zeus, embora esteja ele acorrentado!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:00

— Prometeus? Ficaste maluco, Hefaístos? Se Zeus escutar tuas palavras, vai-nos fulminar com um raio... e não vejo porque eu seja obrigado a pagar por tua língua venenosa. Prometeus é um ladrão e criminoso, foi o que Zeus outorgou, e assim o é. Agora, faze o teu serviço! Acorrenta-o à rocha e deixa que ele se amole!

— Não, não! Se existe alguma luz, alguma liberdade neste mundo, ela está aqui, acorrentada diante de nós. Eu preferia não haver nascido do que ser obrigado a crucificar com minhas próprias mãos o mais nobre de todos os deuses! Mas existe uma única esperança que me anima: é que, no final, a verdade há de triunfar. Por mais que dissimulem ou disfarcem os fatos... a verdade há de triunfar!

E Bia ordenou, erguendo os punhos:

— Basta! Se não te cuidares, acabarás tendo o mesmo destino dele. Talvez só um castigo desses fará tu pensares direito e dares maior valor à pouca liberdade que possuímos.

Hefaístos resmungou:

— Então, agora a Violência vai querer se meter e nos ensinar o que é liberdade? Entende isso, amigo: não tenho medo dos sofrimentos que Móros possa nos reservar, sabias?

Dizendo isso, a expressão de Hefaístos ficou ainda mais triste. Então, ele acrescentou:

— Se eu ligo ou não para o que possa me acontecer, há uma coisa que não posso fazer: é ir contra a vontade de meu pai e evitar o Destino que me foi traçado!

Fez-se alguns momentos de silêncio. A expressão de Bia ficou ainda mais carrancuda. Estava mais do que visível que ela não se aguentava mais de impaciência. Hefaístos, porém, não lhe deu atenção. Só depois de um bom tempo que, limpando a garganta, pegou o martelo e começou a trabalhar.

— Mais força! Enterra fundo o cravo na rocha!

A sólida rocha retiniu, e todo o Cáucaso estremeceu aos terríveis golpes desfechados pelo ferreiro dos deuses. As marteladas ecoavam como trovões pelo mundo inteiro. Agora, Prometeus estava firmemente preso à rocha por correntes tão fortes que nem o próprio Hefaístos conseguiria partir.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:02

Depois, baixando de novo a cabeça, Hefaístos foi embora. Enquanto caminhava, mesmo cabisbaixo, continuava vendo os olhos vivos e desafiadores do titã. Por isso, lágrimas rolaram-lhe pelo rosto.

Agora sim Prometeus estava só.

Uma noite, Pandora teve um sonho diferente. Sonhou que de dentro da ânfora misteriosa, presente de Zeus, saíam, como num passe de mágica, cavalos alados da cor do mar e aves luminosas de diversos tons esmeraldinos. Dos bicos prateados das gigantescas aves originava-se uma canção de magnífica beleza, que a enterneceu até o âmago mais profundo da alma. Homens e Ninfas abraçavam-se nus, em pleno ar, ao som da canção embriagadora, misturando-se àquelas criaturas de tal modo, que pareciam ter asas como elas.

Despertando com o sonho maravilhoso, a jovem Pandora suspirava, ofegava, mal podia voltar a dormir, atormentada pela curiosidade profunda e atroz de saber realmente o que havia na misteriosa ânfora. Por fim, ao amanhecer, quando Epimeteus já havia saído, não conseguiu resistir mais, e decidiu:

— Abrirei a ânfora apenas um momento, olharei rapidamente o seu interior e, no mesmo instante, fecharei com todo o cuidado... Epimeteus nem sequer suspeitará do que vou fazer.

Pandora, então, esposa de Epimeteus, morando agora em sua casa, aproveitou a ausência de seu marido e de Prometeus e foi, pé ante pé, examinar a ânfora do deus Hermes.

— Que coisa mais linda! Toda adornada com figuras esculpidas... Com certeza algum deus a fez...

Uma das imagens, que se destacava das demais, parecia-lhe falar. Era uma figura soberana. Pandora desgostou-se:

— O que é que tu estás me olhando tanto?

Pandora nunca saberia dizer se ouvira mesmo ou se apenas imaginara. Mas do estranho rosto que se animara e sorria, palavras pareciam convidá-la a ter coragem de abrir a ânfora:

— Tu vais adorar!

— Será?...
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:02

E ficou pensando no deus Hermes. Ele teria mesmo dito a Epimeteus que não mexesse na ânfora? E lembrou-se que até Zeus lhe havia dado essa ordem. No entanto... chegou-se um pouco mais, alisou a tampa da ânfora. Resolveu experimentar o peso da ânfora, já que parecia estar indecisa.

— Não vou abrir. Só vou sentir o peso.

Era muito pesada. Ergueu-a muito pouco. Não tinha força bastante para removê-la. Ao tentar erguê-la, deixou-a escapar, e a ânfora beliscou-lhe o pé, causando-lhe dor, a primeira vez sentida. Pensou em fugir, gemendo de dor, mas de novo a tentação voltou. E, esquecendo-se da dor que sentia, passou os dedos no cordão de ouro e no complicado nó que protegia os segredos da ânfora.

— Que nó mais complicado! Parece que eles não querem mesmo que a ânfora seja aberta... E eu não vou abrir! Não querem que eu abra, então eu não abro!

Tornou a olhar a cara de riso misterioso esculpida na tampa.

— Abre, menina. Abre...

Seria imaginação sua? Nisso, levou um susto. Distraída, brincando com o nó difícil de desatar, de repente viu que, sem querer, desfizera o nó.

— Zeus! O que é que eu fui fazer?!

Receando que Epimeteus aparecesse e visse o laço desfeito, tratou de refazer o nó. Mas não conseguiu. Quanto mais tentava, mais se atrapalhava.

— Ele não vai, de jeito algum, acreditar que eu não fiz de propósito. O que eu faço agora? Epimeteus vai se zangar...

Tentou de novo, e nada... Aí, teve uma ideia:

— Bem, já que fiz, está feito. Agora é só levantar a tampa. Eu vou dar só uma espiada. Não vou tirar nada de dentro. Depois fecho, e não se fala mais nisso...

Naquele momento, Epimeteus olhou para o Céu e viu que as nuvens claras de sempre tornavam-se escuras. O Sol escondia-se por detrás das nuvens negras. E começou a ficar assustado... Tinha a impressão de haver ouvido um grito de Pandora, muito diferente dos gritos que ouvia nas correrias, brincadeiras e folguedos de seus amigos. O grito de Pandora coincidiu com a pancada da ânfora no dedo de seu pé.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:03

— Que será que Pandora anda fazendo?

Assustado, resolveu investigar. Voltou correndo. Quanto mais corria mais a escuridão aumentava, tirando a beleza do lugar e causando pavor e correria aos seus amigos.

Quando chegou em casa, viu de longe Pandora e a ânfora com o lacre desfeito.

— Ah! menina danada! Ela vai abrir a ânfora...

Seu primeiro impulso foi correr e não permitir. Mas, no fundo, Epimeteus andava também curioso para descobrir o segredo da ânfora, e sabia que Pandora, mais cedo ou mais tarde, tentaria abri-la. Olhou para o Céu e disse:

— Zeus é testemunha. Pandora é quem está abrindo a ânfora. Eu bem que...

Não terminou a falar, um vento forte começou a soprar, vindo de frente, e um zumbido terrível encheu o espaço e começaram a aplicar ferroadas, enquanto da ânfora saíam vapores e fumaças escuras. Eram abelhas que começaram a morder os que encontravam pela frente, causando-lhes dor, sofrimento e lágrimas. As mesmas abelhas que antes só produziam mel e delícias para as pessoas. Foi então que Epimeteus percebeu que não eram só abelhas, mas centenas de outros, como mosquitos, pernilongos, vespas e mutucas, todos insetos antes inofensivos, e eram tantos que obscureceram o Sol. As bênçãos divinas, libertadas pela Cobiça, voltavam a tomar a forma de todos os males da Terra.

Então, Zeus olhou para a Terra, e viu o que Pandora havia feito. Os deuses, assustados, rapidamente desceram para inutilmente acudir a raça humana, mas Zeus preferiu deixá-las livres para castigar a humanidade, contudo tornou as Nosoi mudas, para que ninguém pudessem ouvi-las chegar.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:03

Epimeteus, perseguido pelos insetos, foi em socorro de Pandora. Ouviu os seus gritos. Uma nuvem de insetos cobria a esposa e amiga, e mal conseguia vê-la. Mas distinguiu, perfeitamente, acima da cabeça de Pandora, uma face horrível, como uma caveira, a esboçar um sorriso de vidro. Em seguida, viu seus maxilares horripilantes batendo repetidas vezes, como numa gargalhada humilhante. E, assim que ela viu Epimeteus, sumiu numa nuvem de poeira, que saiu pela janela do quarto.

Outros garotos passavam correndo, tentando proteger-se. Milhões de pequenos demônios alados haviam saído da ânfora aberta, como num passe de mágica, e infestaram o mundo. E não haveria como retê-los novamente. Os insetos se espalharam e se multiplicaram. E levaram consigo, na ponta do ferrão, o sofrimento, amarga novidade que viria a transformar todas as coisas e envenenar todas as vidas.

Os insetos constituíam a família dos males do mundo. Uns representavam as preocupações, as tristezas, os terrores. Outros, as más paixões, os maus pensamentos. Alguns levavam nas suas asas de aparência inocente os desastres, as calamidades, as guerras. Uma infinidade deles levava as enfermidades, todas os tipos de dor, a dor moral, a dor física. Tudo saía da ânfora cuja tampa Pandora havia aberto.

Então, diante de seus olhos, apareceu-lhes a Inveja, assim, sob a forma de uma mulher velha, com seus cabelos finos e prateados, de onde surgiam aranhas negras. Seus olhos amarelos, raiados de sangue, fuzilavam o rosto de Pandora. Da boca deixava escapar uma baba verde, que lhe escorria pelo queixo, e com elas a odiosa velha teceu uma corda musgosa e nojenta, com a qual envolveu o pescoço de Pandora, decidida a estrangulá-la. Porém, foi vista por Epimeteus, e ela recuou e deu um grande grito. A seguir, ergueu a mão ossuda no ar e, franzindo os dedos e ameaçando acertá-la, mas arremessou-se subitamente pela janela, dando um silvo agudo.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:04

Epimeteus foi protegê-la, quando a Gula, sob a forma rotunda de uma mulher toda nua, escapou-se também da ânfora. Suas banhas sacudiam, caindo umas por cima das outras, em grossas camadas. De toda ela escorria um suor pegajoso, como se suasse azeite pelos poros. Suas bochechas pareciam prestes a explodir, e de seus olhos escorria uma graxa amarela e malcheirosa, que ela lambia com furor assim que lhe chegava aos lábios inchados.

E não menos culpado era Epimeteus. Ainda havia tempo de impedir, pois sabia o que Pandora desejava. Mas sua imprudência e curiosidade superaram sua responsabilidade, e deixou Pandora entregue ao seu capricho. E Zeus foi testemunha...

Pandora e Epimeteus estavam sofrendo. Mas toda a humanidade, daí por diante, ia sofrer também. As crianças, os jovens, não seriam mais assim para sempre. Envelheceriam. Os risos iriam ser alternados com lágrimas. A vida, então, poderia acabar, porque estavam perambulando pelo mundo as doenças e os desastres. E as guerras... As flores, depois de colhidas, ou mesmo nos jardins, murchariam, durariam pouco. Assim, toda a Natureza. Tânatos e Hipnos, até então bebês nos braços acolhedores de Nix (a Noite), desgarraram-se e foram habitar entre os seres do mundo. Tânatos passou a levar a Morte para cada ser existente, já Hipnos, em contraposição, levaria o Sono, o Descanso.

A amizade dos seres humanos para com os animais estava findando. Somente poucos animais, por seu instinto de sobrevivência, permaneceriam seus amigos, como o cão, o gato e o cavalo. Enfim, a partir de então, os animais se dividiriam, tentando sobreviver cada qual em seu “habitat”. Também as pessoas, na luta pela sobrevivência, se dividiriam, buscando, em famílias, um melhor lugar para a sua existência. E, por isso, nascia a inimizade entre os povos que, a partir de então, passariam a surgir em diversos pontos da Terra.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:05

Assim, a Geração de Bronze tomava uma forma mais aterradora. Os homens tomaram uma aparência amedrontadora, guerreiros destemidos. Moldados de bronze, estavam sempre dispostos à guerra. Suas armas eram forjadas com bronze, como as ofuscantes armaduras. Suas ferramentas eram de bronze, e ainda não sabiam fazer uso do ferro, e mal sabiam fazer uso do fogo. Construíam suas casas rusticamente, às vezes até escavadas nas rochas. Não cultivavam a terra: viviam da caça e da coleta de frutos silvestres, e a Guerra era sua constante companheira. Contudo, apesar de sua poderosa força e estatura serem uma dádiva dos deuses, e não obra deles, aos poucos ficaram arrogantes e vaidosos, cheios de um tolo orgulho. Seus modos tornaram-se rudes e dominadores, seu coração, duro como pedra.

Muito aborrecido e dolorido, Epimeteus — que não estava sujeito a velhice por pertencer à raça dos Imortais — olhou caçoando para a companheira, enquanto os demônios perambulavam, e disse-lhe:

— De cabeça inchada, não é?

Pandora limitou-se a fungar, enxugando os olhos, pois não era só a cabeça, mas o rosto e os braços, assim como Epimeteus. Este, porém, não se atrevia a censurá-la, já que sabia ser sua boa parte da culpa.

— Espero que Zeus me perdoe.

Porém, Pandora pensou:

— A humanidade que me perdoe, pois sou responsável pelo mal que pratiquei para sempre.

E olhando para a ânfora aberta, comentou:

— Também, uma coisa dessas não se fecha com um simples cordão. Podiam tê-la fechado de forma mais segura... A impressão que tenho é que alguém queria que fosse aberta.

— Certamente, quando os maus instintos, que libertamos, começarem a dar seus frutos, como roubos e assassinatos, as pessoas terão que se trancar em suas casas. Triste será o mundo...

— E a culpa é minha...

Pandora recomeçou a chorar, olhando para a tampa da ânfora, deitada ao chão. Nisso, ouviu, de dentro, um rumor parecido com vozes. Pandora, às pressas, pôs a tampa de volta.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:06

— Zeus! Ainda há mais desgraça dentro da ânfora!

— Calma, Pandora. Não deve haver mais desgraças aí, senão já tinha saído!...

Nisso, uma voz doce e suave, que parecia um bater de asas de beija-flor, soou aos seus ouvidos, vinda do interior da ânfora.

— Não sou desgraça alguma... Só quero o bem de vós...

Não era a voz da Hipocrisia, nem de Maldade, nem de Insensatez. Era voz de bondade, de amor, de profundo interesse. Pandora logo a sentiu. Punha a mão direita no ouvido, em forma de concha, para melhor recolher os sons que saíam da ânfora.

— Não tende receio. Não sou igual aos monstros que havia aqui dentro e que os deuses não queriam libertar.

— Quem és tu?

Perguntou assim Epimeteus, desconfiado. E a voz disse-lhe:

— Solta-me que eu conto.

Epimeteus insistiu:

— Não! Diz primeiro quem és... Eu já cometi erros suficientes por hoje...

Um doce riso, amigo e suave, ouviu-se de dentro da ânfora, como uma única resposta aos receios de Epimeteus. Pandora, mais convencida, tentou persuadir Epimeteus:

— Parece sincero... Vamos abrir? Pode ser a salvação de todos nós...

Epimeteus coçou a cabeça.

— Eu? Se quiseres, abre tu. A responsabilidade é tua...

— Eu assumirei a responsabilidade.

E, decidida, Pandora ergueu a tampa da ânfora, enquanto Epimeteus saiu correndo, amedrontado. Qual não foi a surpresa de Epimeteus quando viu que, mais rápido que ele, um vulto surgira em voo sutil, e se postava, risonho, à sua frente, fazendo-o parar.

— Fica onde estás, amigo. Não deves ficar desesperado. Não tenhas medo...

O jovem titã começou a mentir, de forma que foi o primeiro a fazê-lo:

— Não estou fugindo, senhora. Eu estou querendo ir até os meus amigos, para vê-los.

— Vês como tu precisas de ajuda? Estás desanimado, pessimista, já nem contas mais com teus companheiros. Foi exatamente por isso que eu vim... Para dar-vos ânimo novo, confiança no futuro, confiança em vós mesmos. Sem minha intervenção, nunca mais poderá haver alegria no mundo...
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:06

Pandora contemplava maravilhada aquela imagem fascinante, que tinha asas como as borboletas e as libélulas, asas onde a luz do Sol punha cores e tonalidades lindíssimas.

— Quem é a senhora?

— Eu sou Elpis, a Esperança, o único bem que Zeus concedeu aos homens, no meio de tantas amarguras... Venho para salvar-vos, e a todas as crianças do mundo...

Epimeteus, olhando-a melhor, perguntou:

— Tu és uma deusa?

— Sou mais do que deusa. De agora em diante eu sou a vida, uma condição para todos os seres humanos. O mal se libertou. As doenças, as desgraças, as perturbações, as tristezas, os maus pensamentos, as intenções maldosas, as dores, a agonia, o desânimo, as guerras, o egoísmo, a inveja, tudo isso vai acompanhar os homens e as crianças, e agora as mulheres, através dos tempos. Mas quando tudo isso estiver atormentando-vos, quando tudo estiver pesando sobre vós em forma de inquietação, de dor, de miséria, de sofrimento, enfim, basta me chamar.

Epimeteus estava confuso, não entendia suas palavras.

— Mas onde é que vais morar? Onde é que podes ser encontrada?

— Em vossos corações. Eu sou a Esperança que iluminará o caminho dos mortais... e principalmente das crianças, dos jovens. Para quem sofre, eu serei sempre a Esperança de horas melhores, dias mais felizes. Para os doentes, a Esperança de cura. Para os aflitos, a Esperança de paz. Para os perseguidos, a Esperança de refúgio. Para os jovens, sobretudo, a Esperança de futuro...

Os dois ouviam deslumbrados as palavras da fada, que afastava as trevas e devolvia alegria aos seus corações.

Epimeteus, aos poucos entendendo, disse-lhe:

— Tudo bem. Mas será que, depois, tu não vais nos abandonar?

A boa fada sorriu.

— Não. Vós é que ireis me abandonar muitas vezes. Porém, não me preocupo. Não me zangarei. Quando menos esperardes, eu estarei entrando nos vossos corações e iluminando todos os caminhos.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:07

Os olhos de Pandora, ainda úmidos de lágrimas, brilharam de novo.

— Queres dizer que, apesar de todos os males que eu libertei no mundo, ainda existe para nós a Esperança?

— Sim.

— Que bom! Então vamos brincar outra vez.

Então, tudo serenou, a Natureza voltou a sorrir, pelo menos por enquanto. E, de mãos dadas, Epimeteus e Pandora foram buscar seus amigos para lhes contar as novidades e de novo brincar.

Enquanto os seres humanos passavam o tempo sob a guarda dos deuses, embriagados pelos ambientes paradisíacos daquela época, Io, a novilha de Héra, zelosamente era guardada pelos olhos atentos do gigante Árgos, e, como seu pai, Io sofria. Mas seu sofrimento não havia sido, até então, em vão, pois Zeus, do alto do Olimpo, longe dos olhos de Héra, sua irmã e esposa, resolveu pôr fim ao sofrimento dos dois. Chamou Hermes e lhe deu uma tarefa.

— Tenho uma sigilosa missão para ti. Quero que tu descubras onde está a minha adorada Io e a tragas de volta. Mas antes deverás dar cabo do gigante Árgos, que a mantém prisioneira.

Hermes, o deus mensageiro, mal ouviu as ordens, apanhou seu cetro sonífero, abandonou o palácio de seu pai e partiu imediatamente em sua missão. Em um instante Hermes percorria velozmente todos os vales e pastos do país, tentando descobrir onde estava o lugar que abrigava Io. Sobrevoava uma região pouco conhecida, distante, muito distante, e finalmente a encontrou.

O deus disfarçou-se de pastor, chamou cabras para junto de si e começou a tocar músicas celestiais com a flauta de Pan, seu filho, o que logo chamou a atenção de Árgos que chamou o deus disfarçado para junto de si para melhor ouvir e apreciar:

— Que instrumento maravilhoso é este? Não temas, não te farei mal algum. Sê bem-vindo. Vem descansar aqui perto de mim. Não há, em nenhuma parte, grama mais opulenta para o gado do que aqui, e vê que sombra agradável estas árvores oferecem!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:08

Hermes lhe agradeceu, subiu o morro e sentou-se ao lado do vigia, que mantinha pelo menos uns cinquenta olhos voltados na novilha.

— Lindo dia, não?

Logo já estavam tão entretidos na conversa que o dia já findava sem que Árgos sequer percebesse. No entanto, nem por um instante, Árgos Panoptes deixou de vigiar Io, a novilha.

— Esta é minha flauta, e com ela procuro distrair o tédio durante minhas caminhadas.

— É um instrumento diferente.

— Esta bela flauta que tu estás vendo foi criada pelo grande Pã, nosso protetor. Existe, a propósito, uma lenda interessante que descreve a sua invenção.

— É mesmo? Desculpa-me a ignorância, mas não sou exatamente um pastor; sou um servidor da rainha Héra, que habita entre os deuses.

— Então tu vais adorar esta história. É muito bela, de verdade! Ouve.

E Hermes tentou narrá-la, tornando-a aborrecida na tentativa de adormecer o gigante.

— Hás de saber, tu que me ouves, que em era mais recuada os mais encantadores e majestosos bosques de toda a região foram brindados com o surgimento de uma esplendorosa ninfa.

— Sei...

— Seu nome era Sírinx, cujos lábios carmesins tinham o odor das açucenas e o tom escarlate das cerejas.

— A-ha... Deve ser uma bela história, amigo, mas tenho que tomar conta da novilha que a rainha dos deuses me...

— Espera, ouve outra história, a do grande deus Hermes, que inventou um novo instrumento com o casco de uma tartaruga. Essa história é fabulosa. Foi num tempo mais remoto.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:08

E Hermes, disfarçado de pastor, contou a sua própria história, sobre o dia em que Zeus se apaixonou pela bela Maia, sobre o seu extraordinário nascimento, as suas aventuras, sobre o dia em que roubou o rebanho de Apolo e o escondeu para pô-lo em segurança, e sobre o instrumento que havia inventado. E, além dessa história, para distrair e adormecer o gigante, contou outras mais, já que conhecia muitas. Mas já estava acabando seu repertório de histórias. Então, só restou-lhe tocar a sua flauta, até notar que os cem olhos de Árgos começavam a piscar sonolentos. Mas Árgos, temendo o ódio de sua senhora, caso ele deixasse de vigiar a prisioneira, lutava contra o Sono, e quando uma parte de seus olhos cochilava, ele se concentrava e permanecia desperto com a outra parte. Aos poucos, os olhos iam se fechando, se fechando... se fechando... se fechando... e finalmente dormia o filho de Aréstor. O mensageiro de Zeus, então, baixou o tom de voz, tocou com o seu bastão mágico, uma depois da outra, as cem pálpebras fechadas, reforçando assim o entorpecimento, para não correr riscos, já que Árgos era um gigante muito perigoso. E aí, aproveitando esse momento, não vacilou em triturar a sua cabeça com uma pedra e, com o seu Herpé, cortou a cabeça de Árgos a mando de Zeus.

— Pronto, Io, agora já estás livre!

E levou-a para lugar seguro.

Héra, percebendo que algo não ia bem, foi verificar se seu vigia cumpria com as suas obrigações, e ficou furiosa ao ver a cabeça de Árgos inerte no campo e, em homenagem ao gigante que bravamente a servira, estampou seus cem olhos na cauda do pavão. Furiosa, esbravejou contra e deuses e homens, e começou a procurar Io por toda a parte para castigá-la.

Apesar de Hermes ter deixado Io em um lugar seguro, a determinação de Héra fora tão superior à esperada que ela acabou por encontrá-la. E, desejando maltratá-la aos poucos, enviou contra ela uma das Erínias para persegui-la.

— Vai, quero que tu atormentes essa desgraçada, perseguindo-a até os confins da Terra!
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:09

E a Erínis, tomando a forma de uma mutuca de tamanho anormal, passou a persegui-la insistentemente. Assim, na primeira picada, a novilha pôs-se a correr em desespero. Io fugiu para Dodona a fim de buscar a proteção de Zeus, mas este nada pode fazer, e Io, a toda pressa, empurrada pelas violentas picadas do inseto molestador, foi para o norte. Cruzou campos, rios e montanhas, e a mutuca continuava a persegui-la. Passou pelos limites da Hemônia até chegar no rio Istros, na Ilíria, atravessou a Trácia, até avistar e chegar na ponta mais oriental. Alcançou a Propôntida, onde teve seu primeiro rebento: uma filha, humana, mas nasceu com um corno de ouro na testa, o que lhe valeu o nome de Céressa — de Kéras, “corno”. A menina haveria de crescer e, unida a Poseidon, daria à luz dois meninos: Bizas e Estrombos.

Desesperada, novamente descoberta, Io, para escapar daquele terrível inseto, jogou-se no mar e nadou, nadou, nadou, até a exaustão. Mas a mão de Zeus a empurrava, e fê-la alcançar a outra margem do estreito, que passou a chamar-se de Bósforo, em sua homenagem. Ao chegar na outra margem, conseguiu uma trégua, e parou para descansar.

Em seguida, depois que Io fez nascer mais um filho que levava no ventre, voltou a ser violentamente atacada pela mutuca que a procurava, e Io abandonou o pequeno Tróquilos à própria Sorte e seguiu o leito do rio Hibristes, no país dos cimérios, até avistar ao longe os picos do majestoso Cáucaso.

Aí, o silêncio do deserto foi quebrado pelo profundo gemido que escapou do peito do titã acorrentado. Só depois que seus algozes foram embora que ele deixou transparecer a dor que sentia.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:10

— Ó Terra, Céus e o brilhante Sol que a tudo observais! Vede como sofre um deus acorrentado à rocha por castigo daqueles de sua própria espécie, por haver ele cometido um crime que não é crime algum! Acusou-me Zeus de ter-lhe roubado o fogo para entregá-lo à humanidade! Sim, eu roubei! Eu também sabia qual castigo me esperava porque posso prever o futuro. Mesmo assim, não hesitei. Sejam quais forem as torturas que terei de enfrentar, eu não me arrependo! Sofrerei humilhação e castigo eternos até que a justiça triunfe e se espalhe por toda a Terra!

Em seguida, Prometeus calou-se. Parecia ter ouvido alguma coisa, um som semelhante ao de folhas secas arrastadas pelo Vento. Pouco depois, viu que as Oceânides, deusas das águas, se aproximavam. Eram as filhas do velho Océanos, o grande titã que abraçava o mundo inteiro com suas águas.

Elas se aproximaram... e ao verem de perto a terrível cena, um grito de dor escapou-lhe dos lábios. Por uns momentos, ficaram imóveis, caladas, incapazes de acreditar no que estavam vendo. Finalmente, a mais idosa do grupo quebrou o silêncio:

— Ouvimos as pancadas do martelo e aqui estamos para trazer-te as bênçãos de nosso pai para tentar suavizar-te a dor, ó infeliz Prometeus! Entretanto, o que estamos vendo vai muito além de nossa imaginação. Não conseguimos compreender a cena que nossos olhos vêem!

— Ó filhas do grande Océanos, fiéis amigas! Onde quer que haja sofrimento, vós sempre sois as consoladoras. Pois aqui estais vendo a tortura à qual Zeus me condenou: ficar acorrentado a esta rocha como um sentinela que ninguém deseja libertar!

— Nossos corações estão partidos por tua causa, Prometeus. Tu és a luz e a esperança da humanidade. Zeus, porém, governa com extrema severidade e terríveis castigos. Se é justa ou injusta a tua punição, ainda não sabemos. Mas mesmo que tu fosses culpado, não acreditamos que crime algum merece tal castigo!

— Merece.

— Então, dize-nos qual horrível falta tu cometeste!

— Salvei a raça humana que Zeus planejava destruir.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:10

— Oh, isso foi um nobre feito e não um crime!

— Roubei o fogo e dei-o de presente à humanidade.

— Mesmo assim, tu prestaste um grande serviço e não cometeste mal algum contra os deuses!

— Ensinei os mortais a curarem as doenças e enchi-lhes os corações de esperanças.

E as filhas de Océanos começaram a soluçar.

— Que coração mais generoso eles cravaram a esta rocha!

— Ensinei artes e ciências aos homens. Ensinei-os a ler e a escrever. Ensinei-os a construir casas e dei-lhes o calor das lareiras.

— Sendo assim, depois de haver feito tudo isso, como tu ainda és punido?

— Sou punido por esses e muitos outros atos de bondade que ofereci aos homens. Mas prestai atenção ao que digo: se eu tivesse feito um grande mal, talvez nunca me houvessem punido deste modo. Os injustos punem com os piores castigos aqueles que lutam contra a injustiça!

— Tu disseste uma grande verdade, infeliz Prometeus!

Ao dizer isto, a oceânide olhou para o Céu:

— Olhai, irmã, algo está-se aproximando!

Todos olharam, inclusive Prometeus, e logo reconheceram entre as nuvens um carro puxado por um cavalo alado, à altura do horizonte. Era Océanos, filho de Úranos e Géa, que aproximava-se chegando de suas distantes terras para, naquela hora de dificuldades, ajudar o seu amigo e sobrinho. Humilde e puro de coração, o titã Océanos vivia solitário, afastado do Olimpo, porque não suportava ver a injustiça que dominava o mundo. Agora, porém, seu grande amigo e sobrinho estava em uma situação difícil, e ele achou que deveria ir ajudá-lo.

Quando Océanos viu o grande benfeitor da humanidade cravado à rocha, seu coração encheu-se de tristeza.

— Que é isso que meus olhos vêem? Por que há tanta injustiça no mundo?

— Lembra-te, Océanos, daquela vez quando ajudamos Zeus contra teus irmãos?
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:11

— Claro que me lembro! E até hoje vivo retirado do Olimpo. Hei de fazer Zeus lembrar-se de nossa velha amizade! Sei como abrandar-lhe o coração para que te liberte. Mas procura manter-se sempre longe, Prometeus. Tu sabes como Zeus é severo ao aplicar suas leis sobre os demais deuses... e ninguém o pode desobedecer!

— Esse é o ponto. Esse é exatamente o motivo pelo qual te peço para não ires conversar com Zeus. Cuidado, Océanos meu tio! Do contrário, o mal poderá cair sobre tua cabeça também. Talvez em lugar de conseguir abrandar o coração de Zeus, tu o deixarás ainda mais irritado. Nada conseguirá fazê-lo deixar de sentir o ódio que sente por mim agora.

— Sim, eu vou falar com ele! Tu não podes continuar sofrendo tal injustiça! Não me importa o perigo que eu possa correr!

— Sempre soube que tu és meu amigo de verdade. Como sabemos, é nos momentos mais difíceis que contamos com nossos melhores amigos. Obrigado, Océanos! Mas pensando em tua segurança, não admito que corras tais riscos. Tu não conseguirás fazer Zeus mudar de ideia. Além disso, não é certo que vás pedir misericórdia em um caso de injustiça. Não quero que seja assim. Agora, adeus. Se mesmo assim ainda não concordas comigo, não insiste porque esta é a minha decisão.

O rosto do velho titã entristeceu ao ouvir essas palavras, pois acabava de compreender que nada poderia fazer para ajudar, uma vez que o próprio Prometeus não queria mudar de ideia. Com o coração apertado, Océanos voltou ao carro, pegou as rédeas e afastou-se pelo Céu afora puxado pelo corcel de grandes asas. E gritou às filhas:

— Não o deixai sozinho!

Pouco depois desapareceu.

Entregues ao desespero, agora que viam toda a esperança perdida, as Oceânides puseram-se a lamentar o terrível destino do titã acorrentado.
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:12

— Não só o povo que rodeia o Olimpo que chora por ti, ó titã. No mundo inteiro os homens choram e sofrem por tua causa! São os artesãos da Ásia, as virgens da Cólquida, todas as tribos da Hiperbórea, as hordas guerreiras da Arábia e todos os que vivem vizinhos à poderosa fortaleza dos rochosos picos do Cáucaso!

Em seguida, elas evocaram Átlas, o poderoso irmão de Prometeus, aquele que segurava nos ombros o pesado firmamento, no outro extremo do mundo:

— Mesmo os sofrimentos de Átlas não podem ser comparados com os teus, o grande amigo da humanidade! Até hoje não se tem notícia de um castigo que pudesse ser comparado à tua eterna agonia!

As Oceânides prosseguiram se lamentando da sorte do titã. Prometeus, porém, continuou em silêncio. De repente, erguendo os olhos, olhou para as filhas do amigo Océanos e disse-lhes:

— Não é o cansaço nem a dor que me impedem de falar. São as recordações e os pensamentos que passam por minha mente. Eu esperava, menos que vós, que Zeus me castigasse deste modo. Houve um tempo quando ele e eu fomos grandes amigos. Muito mais que isso, estávamos unidos por uma nobre causa. Naquele tempo, nós dois nos preocupávamos com a injustiça que reinava a nossa volta, éramos contra o modo injusto pelo qual Cronos reinava. Nós vimos como a injustiça semeou a Loucura, a Fome, o Ódio, a Doença e a Guerra, esses terríveis males sobre o mundo. Nós vimos esses males crescendo, derrotando os homens e transformando a vida em um inferno. Por isso, resolvemos derrubar Cronos de seu trono, e os deuses se reuniram para a grande batalha contra os Titãs. Zeus sabia que sem a ajuda de seus irmãos, ele jamais venceria, mas mesmo com essa ajuda, ainda seria pouco. Eu o auxiliei. Fui de grande valia.

E continuou:
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Mensagem por Hermes Trismegistus 25/3/2021, 14:13

— Primeiro, consegui aliados: minha sábia mãe, Clímene, meus tios Océanos, Tétis e Têmis, a poderosa Géa, que governa a Terra, e, finalmente, os Cíclopes, que deram a Zeus o poder de lançar raios e trovões. Ainda consegui convencer meu jovem irmão Epimeteus a manter-se de lado, evitando seguir o exemplo de Átlas e Mênetos, os quais acabaram sendo castigados. Eu, como os demais, lutei ao seu lado durante os dez anos em que durou a terrível batalha contra os Titãs e cujo término foi com a vitória de Zeus. Depois, um por um, consegui prender todos os monstros que durante o reinado de Cronos haviam saído e se espalhado sobre a Terra. Eu os aprisionei em uma grande ânfora de barro. Para que eles não escapassem, deixei o vaso para que meu irmão Epimeteus, a quem eu confiava, tomasse conta e, feito isso, pus-me a ajudar a humanidade. Para tirar os homens da miséria em que se encontravam, presenteei-os com o fogo. Zeus ficou furioso! Por quê? Que mal a humanidade havia-lhe causado? Teria ele, de repente, ficado com medo dos homens? Não sei! Seja qual for o motivo, Zeus mudou sua conduta com relação aos homens e continuou firme em sua decisão de fazer-lhes o mal. A coisa toda começou com o sacrifício do boi em Mecone. Zeus não queria que os homens comessem a carne. Queria que eles somente a queimassem e a oferecessem aos deuses no altar. Impedi-lo de agir assim, porém. Depois, ele tomou dos homens o meu presente, o fogo, para que não pudessem cozer a carne que lhes dei. Diante disso, voltei a roubar o fogo de Zeus e novamente entreguei-o à humanidade. Por esse motivo, tornamo-nos inimigos. Agora, o único objetivo de Zeus é castigar-me.

Enquanto se passavam inúmeros acontecimentos do mundo, que o tempo para os deuses significava muito menos que para os homens, o titã narrava-os para suas primas, as Oceânides, que preenchiam seu tempo ao ouvi-lo.
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